打印全文
Processo nº 872/2018
(Autos de recurso laboral)

Data: 10/Janeiro/2019

Recorrente:
- A (Autor)

Recorrida:
- B, S.A.R.L. (Ré)

Acordam os Juízes do Tribunal de Segunda Instância da RAEM:

I) RELATÓRIO
A intentou junto do Tribunal Judicial de Base da RAEM acção declarativa de processo comum do trabalho, pedindo a condenação da Ré no pagamento do montante de MOP328.560,00, acrescido de juros legais até efectivo e integral pagamento. A pedido do Autor, o Tribunal procedeu à correcção dos valores dos pedidos constantes da petição inicial, mais precisamente, de patacas para dólares de Hong Kong, perfazendo, a final, um total de MOP446.095,00.
Realizado o julgamento, foi a Ré condenada a pagar ao Autor, entre outras, a compensação do trabalho prestado em dias de descanso semanal e feriado obrigatório, no montante que se vier a liquidar em execução de sentença, mas foi julgado improcedente o pedido de compensação da prestação de 30 minutos de trabalho para além do período normal de trabalho diário.
Inconformado, recorreu o Autor jurisdicionalmente para este TSI, em cujas alegações formulou as seguintes conclusões:
“1. Versa o presente recurso sobre a douta Sentença na parte relativa à condenação da Ré (B) na atribuição de uma compensação devida ao Autor pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal e, bem assim, na parte relativa à condenação da Ré (B) na atribuição de uma compensação devida ao Autor pelo trabalho prestado em dias de feriado obrigatório remunerado na medida em que as concretas fórmulas de cálculo utilizadas na Decisão Recorrida se distanciam da Lei e das fórmulas de cálculo que têm vindo a ser seguidas pelo Tribunal de Segunda Instância.
2. Assim, não obstante os montantes a apurar pela violação dos créditos devidos pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal e de feriado obrigatório terem sido relegados para liquidação de Sentença, está o Recorrente em crer que a douta Sentença enferma de um erro de aplicação de direito quanto à concreta forma de cálculo devido pela prestação dos mesmos e, desta forma, em violação ao disposto nos artigos 17º, 19º e 20º todos do Decreto-Lei n.º 24/89/M, de 3 Abril.
Acresce que,
3. Está o Recorrente em crer existir um erro de julgamento no que respeita à decisão proferida a respeito da prestação pelo Autor de 30 minutos de trabalho para além do período normal diário que igualmente faz inquinar a Decisão Recorrida.
Em concreto,
4. Entendeu o Tribunal a quo ser de sufragar o entendimento seguido pelo Tribunal de Última Instância e, em consequência, condenar a Ré a pagar ao Autor apenas ao correspondente ao valor de um salário em singelo no que respeita ao trabalho prestado em dia de descanso semanal durante todo o período da relação laboral, a liquidar em execução de sentença.
5. Porém, salvo melhor opinião, ao proceder à condenação da Ré apenas em singelo, o Tribunal a quo terá procedido a uma interpretação menos correcta do disposto na al. a) do n.º 6 do art. 17º do Decreto-Lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril, pelo que a decisão deve ser julgada nula e substituída por outra que condene a Ré em conformidade com o disposto na referida Lei Laboral.
6. Com efeito, resulta do referido preceito que o trabalho prestado em dia de descanso semanal deverá ser remunerado pelo dobro do salário normal, entendido enquanto duas vezes a retribuição normal por cada dia de trabalho prestado em dia de descanso semanal, para além do valor relativo ao próprio dia de trabalho prestado.
7. Trata-se, de resto, da interpretação que tem vindo a ser seguida de forma uniforme pelo Tribunal de Segunda Instância, onde se entende que a fórmula correcta para compensar o trabalho prestado em dia de descanso semanal deverá ser a seguinte: (salário diário X n.º de dias devidos e não gozados X 2).
Acresce que,
8. Entendeu o douto Tribunal a quo que na determinação da quantia devida pelas Rés ao Autor a título de trabalho prestado nos dias de feriados obrigatórios o Autor terá direito a receber das Rés as compensações compostas pela remuneração em singelo, acrescida do dobro dessa remuneração.
9. Ora, tendo o Tribunal a quo explicitado que pelo dobro da retribuição se deve entender o equivalente a mais um dia de salário em singelo (nos termos que têm vindo a ser seguidos pelo TUI nos Acs. 28/2007, 29/2007, 58/2007 e 40/2009) tal significa que, neste particular, a douta Sentença igualmente se afasta do entendimento que tem vindo a ser sufragado pelo Tribunal de Segunda Instância, nos termos do qual se entende que a fórmula mais correcta de interpretar o referido preceito será conceder ao Autor, ora Recorrente, um “acréscimo salarial nunca inferior ao dobro da retribuição normal, para além naturalmente da retribuição a que tem direito” – o que equivale matematicamente ao triplo da retribuição normal, e não somente o dobro da retribuição normal como parece ter decidido o Tribunal Judicial de Base.
10. De onde, também por aqui deve a douta Decisão ser substituída por outra que atenda ao pedido de condenação da Recorrida nos termos e com base nas fórmulas de cálculo avançadas pelo Autor na sua Petição Inicial e idênticas às que têm vindo a ser seguidas pelo Tribunal de Segunda Instância.
Por último,
11. Provado que durante o período da relação de trabalho o Autor sempre compareceu no lugar de trabalho no início que cada turno com antecedência de 30 minutos e, bem assim, que não ficou provado o não pagamento pela Ré pelo trabalho prestado durante os referidos 30 minutos, a única conclusão aceitável seria concluir pela condenação da Ré naquele mesmo período de tempo de trabalho prestado.
12. Ao não decidir assim, a Decisão Recorrida enferma de um vício que em caso algum poderá deixar de conduzir à sua nulidade, por manifesta oposição entre os fundamentos e a própria decisão, razão pela qual deve a mesma ser, nesta parte, julgada nula e substituída por outra que atenda ao pedido de condenação da Ré no pagamento ao Autor de uma quantia pela prestação de 30 minutos de trabalho para além do período normal de trabalho prestado em cada dia de trabalho efectivo.
13. De resto, a Decisão Recorrida parece afastar-se claramente da posição que tem vindo a ser pacificamente seguida pelo Tribunal de Segunda Instância para situações em todo similares à dos presentes autos, razão pela qual se impõe que a mesma seja substituída por outra que condene a Ré a pagar ao Autor as quantias por este reclamadas na sua Petição Inicial a título de trabalho extraordinário no início de cada turno com antecedência de 30 minutos.
Nestes termos e nos mais de Direito que V. Exas. encarregar-se-ão de suprir, deve a douta Sentença ser julgada nula e substituída por outra que decida em conformidade com a Lei e com a Jurisprudência que tem vindo a ser seguida pelo douto Tribunal de Recurso, assim se fazendo a já costumada JUSTIÇA!”

Ao recurso respondeu a recorrida nos seguintes termos conclusivos:
“I. Veio o Autor, ora Recorrente, insurgir-se contra a decisão proferida pelo Tribunal Judicial de Base no que respeita à fórmula de cálculo seguida pela douta decisão recorrida no que respeita à compensação pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal e em dia de feriado obrigatório remunerado, por entender que, nesse particular, a sobredita decisão enferma de erro de aplicação de Direito e se mostra-se em violação do preceituado nos artigos 17º, 19º e 20º do Decreto-lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril, assacando ainda à decisão recorrida o mesmo vício de errada aplicação do direito quando “se debruça sobre a prestação de 30 minutos de trabalho para além do período normal diário”.
II. Quanto à forma de cálculo adoptada pelo Tribunal a quo para apuramento da compensação pelo trabalho prestado em dias de descanso semanal e feriado obrigatórios nada há a apontar à Decisão Recorrida, onde é feita uma correcta interpretação e aplicação do preceituado nos artigos 17º, 19º e 20º do Decreto-lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril.
III. Nos termos do preceituado no artigo 17º, n.º 6, alínea a) do Decreto-lei 24/89/M, estando em causa o pagamento do trabalho em dias de descanso semanal, pelo dobro da retribuição normal, tendo o Recorrente sido pago já em singelo, importa ter em conta esse salário já pago e pagar apenas o que falta (e não o dobro).
IV. A tese defendida pelo Recorrente nas suas doutas alegações subverte por completo a letra da lei e, a seguir-se tal tese, onde se lê que o trabalhador que aufira um salário mensal tem o direito a ser pago pelo dobro da retribuição normal quando presta trabalho nos dias de descanso semanal, ler-se-ia que o pagamento em apreço deveria corresponder ao triplo da retribuição normal.
V. A Decisão em Recurso para além de encontrar total sustentação na letra da lei, encontra-a também na jurisprudência unânime do Tribunal de Última Instância de Macau, nos Acórdãos proferidos no âmbito dos processos n.º 40/2009, n.º 58/2007 e n.º 28/2007 e, bem assim, naquele que foi já entendimento unânime no Tribunal de Segunda Instância no Acórdão de 29.03.2001 no processo n.º 46/2001, para cuja fundamentação se remete.
VI. Se o trabalhador já recebeu a remuneração só terá de receber o “equivalente a 100% dessa mesma remuneração a acrescer ao salário já pago” (neste sentido vide “Manual de Formação de Direito do Trabalho em Macau”, Miguel Pacheco Arruda Quental, pags. 283 e 284).
VII. Do mesmo modo, de acordo com o n.º 1 do artigo 20º do Decreto-lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril, se o trabalhador prestar trabalho no dia de feriado obrigatório, para além do salário que já recebeu em singelo, terá direito a uma compensação equivalente ao dobro desse salário e não ao triplo, como pretende o Recorrente.
VIII. Aliás, neste sentido vai o Venerando Tribunal de Última Instância nas decisões proferidas nos processos n.º 40/2009, n.º 58/2007 e n.º 28/2007, para cuja fundamentação se remete e de onde resulta claramente que tendo o trabalhador sido remunerado em singelo pelo trabalho prestado em dia de feriado obrigatório, o mesmo só terá direito a auferir o dobro da sua retribuição.
IX. O Recorrente não tem razão no recurso que apresenta, devendo o mesmo ser considerado totalmente improcedente.
X. Relativamente à prestação dos 30 minutos de trabalho para além do período normal diário por cada dia de trabalho efectivo o Autor teria de ter alegado que não foi compensado pelo trabalho extraordinário no início de cada turno, o que não sucedeu.
XI. Foi a falta de alegação e consequente prova de factos constitutivos do alegado direito do Recorrente que encaminharam a decisão no sentido da improcedência, pelo que, salvo devido respeito, não poderá esse Tribunal julgar procedente o recurso nesta parte.
XII. Ainda que assim não se entenda, e venha a julgar-se que o Autor alegou e provou factos bastantes para sustentar o seu pedido – o que apenas por mera cautela de patrocínio se concede – sempre se diga que o Recurso não poderá, ainda assim, proceder.
XIII. A Lei é clara ao determinar que os 30 minutos se destinam à preparação do início do trabalho e que este período de tempo não será tido em conta para a contabilização do tempo de trabalho (“duração do trabalho”) e como tal, não poderá ser considerado como trabalho extraordinário.
XIV. A matéria vertida na resposta ao quesito 28º da Base Instrutória enquadra-se perfeitamente na preparação para o início do trabalho que o Autor teria de prestar naquele dia, pelo que, este período de 30 minutos não poderá ser considerado como trabalho extraordinário, porquanto não consubstancia qualquer violação à lei, devendo portanto improceder o recurso também nesta parte.
Assim, e nestes termos, sempre com o mui douto suprimento de V. Exas., deverá o Recurso a que ora se responde ser julgado improcedente, assim se fazendo a costumada JUSTIÇA!”

   Corridos os vistos, cabe decidir.
***
II) FUNDAMENTAÇÃO
A sentença recorrida deu por assente a seguinte factualidade:
Entre 9 de Novembro de 1997 e 14 de Maio de 2002, o Autor esteve ao serviço da Ré, prestando funções de “guarda de segurança”, enquanto trabalhador não residente. (A)
O contrato de prestação de serviço n.º 2/96 foi objecto de apreciação, fiscalização e aprovação por parte da Entidade Pública competente. (B)
Durante todo o tempo que prestou trabalho, o Autor sempre prestou a sua actividade nos locais (postos de trabalho) indicados pela Ré. (C)
O Autor foi recrutado pela Sociedade X – Serviço de Apoio e Gestão Empresarial Cia, Lda. - e exerceu a sua prestação de trabalho ao abrigo do Contrato de Prestação de Serviços n.º 2/96, aprovado pelo Despacho n.º 687/IMO/SAEF/96, de 25/03/96. (1º)
Durante todo o tempo que prestou trabalho, o Autor sempre respeitou os períodos e horários de trabalho fixados pela Ré. (2º)
Os locais de trabalho do Autor eram fixados de acordo com as suas exclusivas e concretas necessidades. (3º)
Durante todo o tempo que prestou trabalho, o Autor sempre prestou a sua actividade sob as ordens e as instruções da Ré. (4º)
Ao longo do período em que prestou trabalho, a Ré apresentou ao Autor contratos individuais de trabalho, previamente redigidos e cujo conteúdo o Autor se limitou a assinar, sem qualquer negociação. (5º)
Os contratos individuais de trabalho apresentados ao Autor eram idênticos para os demais trabalhadores não residentes, guardas de segurança do Nepal. (6º)
Durante o período em que prestou trabalho, a Ré pagou ao Autor a quantia de HKD$7,500.00, a título de salário de base mensal. (7º)
Resulta do ponto 3.1. do Contrato de Prestação de Serviços n.º 2/96, ser devido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes com ele contratados) a quantia de “(…) $20,00 patacas diárias por pessoa, a título de subsídio de alimentação”. (8º)
A Ré não pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de alimentação. (9º)
A Ré não entregou ao Autor qualquer tipo de alimentos e/ou géneros. (10º)
Resulta do ponto 3.4. do Contrato de Prestação de Serviços n.º 2/96, ser devido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes com ele contratados) “(…) um subsídio mensal de efectividade igual ao salário de 4 dias, sempre que no mês anterior não tenha dado qualquer falta ao serviço”. (11º)
A Ré não pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de efectividade. (13º)
A Ré não fixou ao Autor, em cada período de sete dias, um período de descanso de vinte e quatro horas consecutivas, nem um período de descanso consecutivo de quatro dias por cada conjunto de quatro semanas ou fracção, sem prejuízo da correspondente retribuição. (14º)
O Autor prestou a sua actividade de segurança por forma a garantir o funcionamento contínuo e diário dos vários Casinos operados pela Ré. (15º)
A Ré não fixou ao Autor um outro dia de descanso compensatório em consequência do trabalho prestado em dia de descanso semanal. (16º)
O Autor prestou a sua actividade de segurança em 1 de Janeiro, Ano Novo Chinês (3 dias), 1 de Maio e 1 de Outubro, por forma a garantir o funcionamento contínuo e diário dos vários Casinos operados pela Ré. (17º)
A Ré não pagou ao Autor um qualquer acréscimo salarial pelo trabalho prestado nos referidos dias de feriado obrigatório. (18º)
Aquando da contratação do Autor no Nepal, foi garantido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes de origem Nepalesa) alojamento gratuito em Macau. (19º)
Durante o período em que o Autor prestou trabalho, a Ré procedeu a uma dedução no valor de HKD750.00 sobre o salário mensal do Autor, a título de “comparticipação nos custos de alojamento”. (20º)
A referida dedução no salário do Autor era operada de forma automática, e independentemente do Autor residir ou não na habitação que lhe era providenciada pela Ré e/ou pela agência de emprego. (21º)
Durante todo o período da relação de trabalho, o Autor exerceu a sua actividade para a Ré num regime de 3 turnos rotativos de 8 horas por dia:
Turno A: (das 08h às 16h)
Turno B: (das 16h às 00h)
Turno C: (das 00h às 08h). (22º)
Durante todo o período da relação de trabalho com a Ré, o Autor sempre respeitou o regime de turnos especificamente fixado pela Ré. (23º)
Os turnos respeitavam sempre uma mesma ordem sucessiva de rotatividade (A-C)-(B-A)-(C-B), após a prestação pelo Autor (e pelos demais trabalhadores) de sete dias de trabalho contínuo e consecutivo. (24º)
Em cada ciclo de 21 dias de trabalho contínuo e consecutivo, o Autor prestava trabalho durante dois períodos de 8 horas cada num período de 24 horas, sempre que se operasse uma mudança entre os turnos (C-B) e (B-A). (25º)
A Ré nunca pagou ao Autor qualquer quantia (em singelo e/ou adicional) pelo trabalho prestado pelo Autor durante os dois períodos de 8 horas cada prestado num período de 24 horas, em cada ciclo de 21 dias de trabalho contínuo e consecutivo. (26º)
Por ordem da Ré, o Autor estava obrigado a comparecer no seu local de trabalho devidamente uniformizado com, pelo menos, 30 minutos de antecedência relativamente ao início de cada turno. (27º)
Durante os 30 minutos que antecediam o início de cada turno, os superiores hierárquicos do Autor distribuíam o trabalho pelos guardas de segurança (leia-se do Autor), v.g., indicando-lhe o seu concreto posto (local dentro do casino onde o mesmo se devia colocar), os clientes tidos por “suspeitos”, sendo ainda feito um relato sobre todas as questões de segurança a ter em conta no interior do Casino, ou mesmo da necessidade de qualquer participação em eventos especiais. (28º)
O Autor sempre compareceu no início de cada turno com a antecedência de, pelo menos, 30 minutos. (29º)
Cumprindo as ordens e as instruções que lhe eram emanadas pelos seus superiores hierárquicos. (30º)
*
Da compensação do trabalho prestado em dias de descanso semanal
Entende o Autor que, nos termos da alínea a) do n.º 6 do artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 24/89/M, o trabalho prestado em dias de descanso semanal deverá ser remunerado pelo dobro do salário normal, para além do singelo já recebido e do dia de descanso compensatório.
Embora não seja entendimento unânime neste TSI, mas julga-se assistir razão ao Autor.
De acordo com a interpretação que tem vindo a ser adoptada de forma maioritária neste TSI, tem-se entendido que o trabalho prestado em dias de descanso semanal é pago pelo dobro da retribuição normal aos trabalhadores que auferem salário normal, para além do singelo já recebido e do dia de descanso compensatório.
No mesmo sentido, citam-se, a título exemplificativo, os Acórdãos deste TSI, proferidos no âmbito dos Processos 778/2010, 376/2012 e mais recentemente, Processos 61/2014 e 582/2014.
Nesta conformidade, por o Autor ter direito a receber, por cada dia de descanso semanal não gozado, o dobro da retribuição normal, para além do salário em singelo e do dia de descanso compensatório, é revogada a decisão quanto a esta parte, ficando a Ré B condenada a pagar ao Autor quantia devida a título de trabalho prestado em dias de descanso semanal, cuja quantificação do montante dependerá do apuramento dos dias de descanso não gozados levado a cabo em sede de execução de sentença.
*
Da compensação do trabalho prestado em dias de feriado obrigatório
Sobre a questão em apreço, entende-se que o trabalhador que tenha prestado serviço nos dias de feriado obrigatório terá direito a receber três dias de valor pecuniário, para além do já recebido a título de salário.
Aliás é esta a posição jurisprudencial dominante neste TSI.
Desta forma, por o Autor ter direito a receber, por cada dia de feriado obrigatório não gozado, o triplo da retribuição normal, para além do salário em singelo, é revogada a decisão quanto a esta parte, ficando a Ré B condenada a pagar ao Autor quantia devida a título de trabalho prestado em dias de feriado obrigatório, cujo quantum deverá ser apurado igualmente em sede de execução de sentença.
*
Da compensação da prestação de 30 minutos de trabalho para além do período normal de trabalho diário
Não obstante se prever na lei laboral que o tempo necessário à preparação para o início do trabalho e à conclusão de transacções, operações e serviços começados e não acabados, que não ultrapasse a duração de trinta minutos diários, não é considerado como período de trabalho (artigo 10.º, n.º 4 do DL 24/89/M), a verdade é que o legislador apenas pretende aqui consagrar um mecanismo mais flexível, criando condições para os empregadores poderem enfrentar, em caso de necessidade, situações anómalas, e nunca tem por objectivo estabelecer um regime obrigatório para os trabalhadores, pois, visando a lei laboral proteger os trabalhadores contra abusos, não devendo interpretar a norma no sentido de que os empregadores poderão exigir com regularidade dos seus subordinados a prática reiterada de actos preparatórios antes do início de cada dia de trabalho ou a realização de trabalhos começados e não acabados já depois do período normal de trabalho. Se assim for, os trabalhadores terão que ser compensados.
Como observa Miguel Quental1: “Importa, todavia, sublinhar – ainda que a letra do preceito não o diga, e até possa sugerir o contrário – que a situação de “tolerância” tão-só se deverá mostrar possível para situações ocasionais; isto é, para situações esporádicas, não podendo tal circunstância se transformar em regra, sob pena de se permitir a ultrapassagem dos limites diário e semanal em termos que mais configuram um aumento absoluto do tempo de disponibilidade do trabalhador para o empregador.”
Em nossa opinião, considerando que a presença dos trabalhadores era obrigatória no local de trabalho 30 minutos antes do início de cada turno, e que essa situação não ocorreu ocasionalmente, antes pelo contrário, operando-se diariamente e com regularidade, assim não vemos razão para não considerar o trabalho prestado naquele período de tempo como trabalho extraordinário.
Sendo assim, por o recorrente ter que estar presente todos os dias 30 minutos antes do início de cada turno, esse período de tempo terá que ser contado como tempo de trabalho, prestado em horas extraordinárias.
Uma vez provado que o Autor apenas recebeu durante o período da relação laboral a quantia de HKD7.500,00, a título de salário base mensal, e não outras quantias, seja a que título for, a Ré B deve ser condenada a pagar ao Autor quantia devida a título de trabalho extraordinário prestado para além do período normal de trabalho diário, cuja quantia deverá ser apurado igualmente em sede de execução de sentença.
***
III) DECISÃO
Face ao exposto, acordam em conceder provimento ao recurso interposto pelo recorrente A e, em consequência, revogar a sentença na parte respeitante à condenação da Ré B, S.A.R.L. no pagamento do trabalho prestado em dias de descanso semanal e feriado obrigatório, bem como à decisão proferida a respeito da prestação de 30 minutos de trabalho para além do período normal diário, nos termos acima consignados, devendo as respectivas quantias serem apuradas em sede de liquidação em execução de sentença.
Mantendo-se a sentença em tudo o mais.
Vai a Ré B condenada nos juros de mora nos termos definidos no Acórdão do TUI, de 2.3.2011, no Processo n.º 69/2010.
Custas pela recorrida.
Registe e notifique.
***
RAEM, 10 de Janeiro de 2019
Tong Hio Fong
(com declaração de voto)
Lai Kin Hong
Fong Man Chong



Declaração de voto vencido
Para o trabalho prestado em dias de descanso semanal, o trabalhador tem direito a receber o dobro da retribuição (“dobro” esse que consiste na soma do salário diário e um dia de acréscimo). Sendo assim, provado que durante a vigência da relação laboral o Autor já recebeu da Ré B o salário diário em singelo, para efeitos de cálculo do valor da compensação do trabalho prestado nesses dias, terá direito a receber apenas mais um dia de acréscimo, sob pena de estar o Autor a ser pago, não pelo dobro, mas pelo triplo do valor diário, ao que acresce ainda o dia de descanso compensatório previsto no n.º 4 do artigo 17.º, o Autor estará a ser pago pelo quádruplo.
Conforme o previsto no n.º 1 do artigo 20.º do Decreto-Lei n.º 24/89/M, para o trabalho prestado em dias de feriado obrigatório, o trabalhador tem direito a um acréscimo de dois dias de salário, para além do singelo. Tendo o Autor recebido, durante toda a relação laboral, o salário diário em singelo, terá agora apenas direito a receber mais 2 dias de salário.
Pelo que não merecem, a meu ver, reparo as fórmulas aplicadas pelo Tribunal recorrido para cálculo da compensação do trabalho prestado em dias de descanso semanal e feriado obrigatório.

1 Manual de Formação de Direito do Trabalho em Macau, CFJJ, 2012, pág.247
---------------

------------------------------------------------------------

---------------

------------------------------------------------------------




Processo Laboral 872/2018 Página 20