Proc. nº 1124/2017
Relator: Cândido de Pinho
Data do acórdão: 17 de Janeiro de 2019
Descritores:
- Prova
- Livre apreciação da prova
SUMÁRIO:
I - A matéria exceptiva invocada pelo réu por ele deve ser provada (cfr. art. 335º, nº2, do CC). Não conseguindo ele demonstrar a sua “verdade”, a dúvida é resolvida contra si, ao abrigo do art. 437º, do CPC.
II - Relativamente à matéria do direito invocado pelo autor, a este cabe o respectivo ónus probatório. Se o tribunal dispuser de elementos bastantes para concluir pela razão do autor e réu não conseguir, na impugnação, colocar a dúvida no espírito do julgador sobre se os factos invocados pelo autor são verdadeiros, o julgador não pode responder à matéria quesitada contra o autor nos termos do art. 437º, do CC).
III - Quando a primeira instância forma a sua convicção com base num conjunto de elementos, entre os quais a prova testemunhal produzida, o tribunal “ad quem”, salvo erro grosseiro e visível que logo detecte na análise da prova, não deve interferir nela, sob pena de se transformar a instância de recurso, numa nova instância de prova.
IV - A decisão de facto só pode ser modificada nos casos previstos no art. 629º do CPC” e o tribunal de recurso não pode censurar a relevância e a credibilidade que, no quadro da imediação e da livre apreciação das provas, o tribunal recorrido atribuiu ao depoimento de testemunhas a cuja inquirição procedeu.
Proc. nº 1124/2017
Acordam no Tribunal de Segunda Instância da RAEM
I – Relatório
A, também chamada AA, do sexo feminino, casada, da nacionalidade americana, titular do passaporte dos EUA n.º XXXXXX emitido em 7 de Abril de 2010, residente em XXXXXX, EUA;
B, também chamada BB, do sexo feminino, casada, da nacionalidade portuguesa, titular do passaporte de Portugal n.º XXXXXX emitido em 14 de Março de 2011, residente em XXXXXX, EUA;
C, do sexo feminino, casada, da nacionalidade chinesa, titular do BIRM n.º XXXXXX emitido em 30 de Setembro de 2014, residente na XXXXXX, Macau; e
D, do sexo masculino, casado, da nacionalidade chinesa, titular do BIRM n.º XXXXXX emitido em 6 de Fevereiro de 2014, residente na XXXXXX; (adiante designados por “quatro autores”);
Instauraram no TJB (Proc. nº CV1-15-0115-CAO) contra: ------
E, do sexo masculino, casado, da nacionalidade chinesa, titular do BIRM n.º XXXXXX; e a sua mulher
F, do sexo feminino, casada, da nacionalidade chinesa, Que ora residem na XXXXXX, Macau (adiante designados por dois réus) ------
Acção declarativa sob a forma ordinária, reivindicando a entrega de uma fracção habitacional que identificam, dizendo-se donos dela, com o fundamento de que os RR se negam a entregar-lha, pedindo ainda a condenação destes nos prejuízos que dizem estar a sofrer com a ocupação.
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Foi na oportunidade proferida sentença, que julgou a acção procedente e condenou os RR a entregarem a fracção no prazo de 30 dias livre de pessoas e bens, bem como a pagarem uma indemnização de 7 000 patacas por cada mês a contar da ocupação desde Janeiro de 2015.
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Contra esta sentença vem agora o presente recurso jurisdicional interposto pelos RR, em cujas alegações formularam as seguintes conclusões:
“1. Os recorrentes entendem que, a partir do despacho saneador, mostra-se gravemente insuficiente a matéria de facto, saltam imensos factos constantes dos autos e relevantes para apuramento da realidade, não se faz uma análise sintetizada da relação entre os autores e os recorrentes, assim, profere-se um acórdão errado.
2. Os recorrentes alegaram muitos factos na contestação, os quais são relevantes para o caso, nomeadamente para perceber correctamente o motivo de celebração da escritura pública de divisão de herança entre os autores e o 1º réu, todavia, o Tribunal a quo completamente não levou em consideração os factos alegados pelos recorrentes.
3. Os factos incluem os 19º a 27º e 89º a 91º factos da contestação.
4. Esses factos correspondem aos factos provados na sentença n.º CV2-12-0103-CAO.
5. Os referidos factos são importantes para analisar se padece do vício de nulidade a escritura pública de divisão de herança celebrada em 27 de Outubro de 2009 entre o 1º recorrente e os autores.
6. Embora os factos não sejam necessários, são indispensáveis para a investigação e a percepção dos necessários. Portanto, cumpre ao Tribunal investigar simultaneamente todos os factos instrumentais relacionados.
7. Esses factos instrumentais também desempenham função relevante para entender a declaração de vontade da celebração da escritura pública de divisão de herança entre as partes, a qual influencia necessariamente o juízo de factos e a qualificação jurídica sobre o pedido reconvencional apresentado pelos recorrentes.
8. Só podemos analisar correctamente o art.º 2.º da base instrutória quando saibamos o motivo das partes.
9. Embora esteja em causa a acção de reivindicação, os recorrentes têm como fundamento de excepção e de pedido reconvencional a existência de acto simulado, o qual consiste em dissimular com a escritura pública de divisão de herança a escritura pública de compra e venda que reserve o direito de usufruto vitalício.
10. A dissimulação visa, além de provavelmente economizar a custa de registo, fazer com que o 1º recorrente preste a declaração de vontade com base na fraude dos autores, ou dissimular a intenção original de dar os bens à guarda dos filhos.
11. A declaração de vontade do 1º recorrente padece de vício por causa de, além do acto simulado, muito provavelmente, segundo os factos, da fraude prevista no art.º 246.º do Código Civil e do erro previsto nos art.º 240.º, 241.º e 245.º do mesmo Código. Incumbe ao Tribunal averiguar se o 1º recorrente e os autores só celebraram a escritura pública de divisão de herança porque o 1º recorrente achava por erro, em face do acordo com os 4 autores, que poderia morar no apartamento em apreço até o seu falecimento mesmo tendo transferido todos os seus bens aos filhos.
12. Todavia, o Tribunal a quo não considerou esses factos relevantes ao proferir o despacho saneador, até não ampliou a base instrutória na audiência de julgamento nos termos do art.º 553.º do Código de Processo Civil, havendo erro notório.
13. Não se excluindo a possibilidade de serem esses factos directamente dados provados no presente caso e ser proferido um outro acórdão nos termos do art.º 629.º n.º 1 alíneas a) e b) do Código de Processo Civil, o Tribunal de recurso deve anular o acórdão a quo, ampliar a base instrutória e reenviar o processo ao TJB para novo julgamento, com fundamento em sentença incorrecta resultante da grande omissão no juízo sobre a matéria de facto, nos termos do art.º 629.º n.º 4 do Código de Processo Civil.
14. Por outro lado, as 4 testemunhas dos recorrentes declararam unanimemente que o 1º recorrente só transferiu todos os seus bens aos filhos para diminuir a dúvida destes sobre a 2ª recorrente (os filhos opor-se-iam ao casamento dos recorrentes se não tivesse transferido todos os bens), os 4 autores comprometeram-se a permitir ao 1º recorrente morar no apartamento em causa até o seu falecimento, senão, seriam punidos com trovão.
15. O Tribunal a quo não admitiu os depoimentos das testemunhas (entendeu que a alegação do 1º recorrente às testemunhas não tem qualquer razão de ciência), até deu assente, com base em factos duvidosamente provados, que não havia qualquer acordo entre as partes, os autores só impediram o pai de morar no apartamento em causa por razão do 1º recorrente.
16. O Tribunal recorrido aproveitou uns factos não provados (que não foram discutidos pelas partes) e obviamente incorrectos, que estão desconforme às regras de experiência comum e cultura tradicional chinesa, padecendo do vício de nulidade.
17. De acordo com as referidas provas documentais e testemunhais, o 1º recorrente transferiu todos os seus bens aos 3º e 4º autores só para persuadir os autores a aceitar o casamento dos recorrentes. O 1º recorrente só entregou os seus bens à guarda dos filhos através da transferência da propriedade para evitar a 2ª recorrente de obter qualquer interesse do património do 1º recorrente.
18. Com o fim de evitar os bens do 1º recorrente de ser obtido fraudulentamente pela 2ª recorrente, os autores exigiram ao 1º recorrente transferir todos os bens aos 3 º e 4º autores com pressuposto de poder morar no respectivo apartamento até à morte.
19. Segundo as referidas provas documentais e testemunhais, a transferência pressupõe que os autores concordam com o casamento do pai e 2ª recorrente; ou seja, agora já está completada a transferência, o que significa que os autores concordam com o casamento dos recorrentes, os recorrentes vão morar juntos, isto é, os autores concordam em permitir-lhes morar juntos no apartamento em causa.
20. Esse tipo de acordo entre os familiares normalmente não é feito por escrito, tampouco por transferência com reserva do direito de usufruto.
21. Com base nisso, quanto ao 2º facto da base instrutória, o Tribunal a quo devia dar provado que “antes de transferir as quotas do apartamento aos 3 º e 4º autores, as partes acordaram que o º réu poderia morar com a 2ª ré no apartamento em causa até à morte do 1º recorrente.”
22. Pelo exposto, o Tribunal de recurso deve alterar o juízo sobre o 2º facto da base instrutória feito pelo Tribunal a quo, nos termos do art.º 629.º n.º 1 alínea a) do Código de Processo Civil.
23. Se entender que não está preenchida a condição para alteração, pede-se que, nos termos do art.º 629.º n.º 4 do Código de Processo Civil, como há omissão e contradição na decisão sobre a matéria de facto, seja anulado o acórdão a quo e reenviado o processo para novo julgamento, nomeadamente sobre o 2º facto da base instrutória e os outros factos que o Tribunal de recurso entende relevantes, especialmente os instrumentais, incluindo os 19º a 27º e 89º a 91º factos.
Pelo exposto, deve-se julgar procedente o presente recurso e:
(a) Revogar o acórdão a quo, ouvir de novo a gravação da audiência n.º Translator3/Recorded on 06-Jun-2017 at 15.35.39 (2-18(M)106511270.WAV, 34:50 a 01:18:20, nomeadamente 41:20-48:15 (depoimento da testemunha G), 57:10-58:20 (depoimento da testemunha H), 01:04:00-01:06:55 (depoimento da testemunha I) e 01:11:00-01:17:40 (depoimento da testemunha J), alterar directamente a decisão sobre a matéria de facto; ou
(b) Anular o acórdão a quo, ampliar os factos da base instrutória (os factos a acrescentar abrangem nomeadamente os 19º a 27º e 89º a 91º factos da contestação e os outros factos que o Tribunal entende relevante para proferir boa sentença) e reenviar o processo ao TJB para novo julgamento; ou
(c) Anular o acórdão a quo e reenviar o processo para novo julgamento especialmente sobre o 2º facto da base instrutória e os outros factos que o Tribunal de recurso entende relevante, designadamente os instrumentais, incluindo mas não exclusivamente os 19º a 27º e 89º a 91º factos da contestação.”
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Os AA responderam ao recurso nos seguintes termos conclusivos:
“1. Na motivação, os 2 recorrentes impugnaram os factos dados assentes pelo Tribunal recorrido pediram ao Tribunal superior ouvir de novo os depoimentos das suas testemunhas no registo da gravação da audiência, com o fim de questionar a avaliação do Tribunal a quo sobre as provas, e pediram alterar a decisão do Tribunal a quo sobre os factos.
2. Pelo que, os recorridos precisam de indicar as passagens da gravação que infirmem as conclusões dos recorrentes nos termos do n.º 3 do art.º 599.º do Código de Processo Civil e ouvir de novo a gravação da audiência.
3. Isto é, os recorridos podem responder dentro de 40 dias nos termos do art.º 613.º n.º 2 e 6 do Código de Processo Civil, pelo que, a presente resposta é apresentada com tempestividade.
4. Quanto ao objecto do recurso, através dos pedidos na motivação dos recorrentes, permite-se saber que, os recorrentes impugnaram o juízo do Tribunal a quo sobre os factos com fundamento em existência de omissão e contradição, entendendo principalmente:
(i) A partir do despacho saneador, o Tribunal a quo ignorou os factos relevantes alegados pelos recorrentes na contestação, dos quais se pode concluir que a transferência é acto simulado, não fez uma análise sintetizada da relação entre os 4 autores e o 1º réu, assim, proferiu uma sentença incorrecta; e
(ii) Em juízo sobre os factos o Tribunal a quo teve em conta a hipótese fáctica infundamentada e não provada, erradamente deu assente que não havia qualquer acordo entre os 4 recorridos e o 1º recorrente sobre a permissão de aproveitamento do apartamento em causa, padecendo assim do vício de nulidade.
5. Salvo o devido respeito, os 4 recorridos não concordam e entendem que não assiste razão aos recorrentes.
6. Quanto aos alegados factos relevantes ignorados pelo Tribunal a quo, os recorrentes indicam que, a partir do despacho saneador, se mostra insuficiente a matéria de facto, o Tribunal a quo ignorou os 19º a 27º, 89º, 90º a 91º pontos da contestação dos recorrentes, os quais são importantes para perceber o motivo pelo qual os autores e o 1º réu celebraram a escritura pública de divisão de herança e se pode concluir que a transferência é acto simulado.
7. Daqui se vê que os recorrentes não concordam com a selecção da matéria de facto, feita pelo Tribunal a quo. Se os recorrentes entendessem que o Tribunal a quo ignorou uns factos relevantes, deviam, depois de ser notificados da referida selecção da matéria de facto, apresentar reclamação. Entretanto, os recorrentes não reclamaram dessa selecção, nem responderam à reclamação dos recorridos (sobre a selecção da matéria de facto).
8. Da conduta dos recorrentes, pelo menos conclui-se que aceitaram a selecção da matéria de facto feita pelo Tribunal a quo, é difícil entender porque só até à fase de recurso os recorrentes indicam que o Tribunal a quo não integrou uns factos relevantes para julgamento.
9. Segundo a interpretação a contrário do art.º 430.º n.º 2 e 3 do Código de Processo Civil, não havendo reclamação sobre a selecção da matéria de facto, não se pode impugná-la no recurso interposto da decisão final.
10. Mesmo entendendo que os recorrentes podem impugnar nesta fase a selecção da matéria de facto (pura hipótese por cautela), os recorridos entendem que os factos não são importantes de maneira nenhuma para o conhecimento do mérito.
11. Na verdade, trata-se duma acção de reivindicação, está em crise verificar quem é o proprietário do apartamento em causa e julgar se aqueles que nele moram podem viver legitimamente neste apartamento.
12. Como indica o Tribunal a quo no juízo sobre a matéria de facto, e segundo os autos, os 4 autores são, material, jurídica e registralmente proprietários da fracção em causa e gozam do direito de propriedade.
13. Os “factos relevantes” que os 2 recorrentes alegam na motivação têm a ver principalmente com o motivo de transferência da quota do lº recorrente e celebração da escritura pública, pugnam que a celebração da escritura pública de divisão de herança entre os 4 recorridos e o 1º recorrente é acto simulado, a fim de dissimular a escritura pública de compra e venda com reserva do direito de usufruto vitalício, economizar a custa de registo, dissimular que é declaração de vontade com base na fraude dos autores e a respectiva finalidade (sic.), não sendo fundamentos de excepção deduzidos pelos recorrentes na contestação.
14. Na verdade, por despacho saneador, o Tribunal a quo já deu assente que constitui acto simulado a alegação dos recorrentes sobre não recepção das tomas, existe distorção da realidade relevante para julgamento, consiste em venire contra factum proprium, assim, condenou os recorrentes como litigante de má fé, julgou improcedente o fundamento de excepção, condenou o 1º réu como litigante de má fé a pagar uma multa em 5UC.
15. Cumpre destacar que, na contestação, os recorrentes não pugnam que o acto simulado tem como objectivo dissimular a escritura pública de compra e venda com reserva do direito de usufruto vitalício, economizar a custa de registo, dissimular que é declaração de vontade com base na fraude dos autores e a respectiva finalidade (sic.).
16. E mais, quer os fundamentos da constituição do acto simulado na contestação, quer os fundamentos deste momento, não foram alegados no processo n.º CV2-12-0103-CAO, a conduta do recorrente é contrariada e distorce por outra vez a realidade relevante para julgamento, a qual é designada na doutrina por “venire contra factum proprium” .
17. O TSI também pronunciou-se pelo mesmo entendimento no acórdão n.º 98/2014 do TSI.
18. Pelo que, depois de ter sido condenado o recorrido (sic.) como litigante de má fé, pugnam por outra vez no recurso os factos que constituíram litigância de má fé, o que consiste em conduta notória e dolosa de litigância de má fé. Assim, pede-se ao Tribunal de recurso condenar os recorrentes como litigante de má fé, impor oficiosamente uma multa não inferior à imposta pelo Tribunal a quo (5UC), nos termos do art.º 385.º do Código de Processo Civil.
19. Por outro lado, os 2 recorrentes pedem para ampliar a base instrutória e anular o acórdão a quo nos termos do art.º 629.º n.º 4 do Código de Processo Civil, com fundamento em que, antes do fim da discussão, o Tribunal a quo não ampliou a base instrutória, de forma a integrar os referidos factos ignorados que foram importantes para perceber a declaração de vontade da escritura pública celebrada entre as partes, influenciaram necessariamente o juízo de factos e a qualificação jurídica sobre o pedido reconvencional apresentado pelos recorrentes.
20. De facto, o art.º 55.º n.º 2 alínea f) do Código de Processo Civil atribuiu ao juiz presidente o poder de ampliar os factos associados ao objecto quando entenda existentes uns factos relevantes para julgamento e não integrados na base instrutória. Porém, dispõe o art.º 629.º do Código de Processo Civil que a anulação do acórdão colectivo para formular nova base instrutória pressupõe o apuramento da matéria de facto articulada pelas partes, que é contrariada e relevante para julgamento.
21. No caso, obviamente, entendendo desnecessário, o Tribunal a quo não exerceu antes do fim da discussão o poder de ampliar oficiosamente a base instrutória.
22.Como acima dito, todos os factos que os 2 recorrentes ora apontados, constantes da contestação mas ignorados pelo Tribunal a quo, pugnam a existência do acordo de aproveitamento. Naquela altura não indicaram que o respectivo acto visa também dissimular a reserva do direito de usufruto vitalício, economizar a custa de registo, dissimular que é declaração de vontade do 1º recorrente com base na fraude dos autores. Entretanto, agora, os 2 recorrentes pretendem provar a existência do acto simulado com esses factos! São violados o princípio dispositivo e o princípio do contraditório, previstos pela lei processual.
23. E, o acórdão do proc. n.º CV2-12-0103-CAO não dá provada a existência de qualquer acto simulado, ao contrário, dá provado que o 1º recorrente entregou à guarda do segundo (sic.) as tomas no valor equivalente à sua quota da fracção em causa, no fim, os 3 º e 4º recorridos foram condenados a devolver a respectiva quantia.
24.No pedido reconvencional dos 2 recorrentes, a alegada existência de acto simulado só se fundamenta em 3 aspectos: (1) os 3º e 4º recorridos não pagaram as tomas; (2) o 1º recorrente não recebeu as tomas; e (3) preço falso.
25. Não tendo sido os respectivos factos (dissimulai a reserva do direito de usufruto vitalício, economizar a custa de registo, dissimular que é declaração de vontade do 1º recorrente com base na fraude dos autores) alegados na contestação, se o Tribunal superior julgasse insuficiente o juízo do Tribunal da primeira instância sobre os factos e decidisse novo conhecimento para apurar a matéria de facto indispensável para proferir sentença jurídica, o Tribunal superior iria ultrapassar o poder conferido pelo art.º 629.º do Código de Processo Civil.
26. Os recorrentes não indicaram naquele momento os respectivos factos para provar a existência de acto simulado, o Tribunal a quo absolveu os 4 recorridos dos pedidos em face de não verificação do acto simulado, deste modo, não foi ilidido o acto de compra e venda. Então só estava em crise se os 2 recorrentes têm legitimidade de ocupar, aproveitar e/ou morar na fracção. Portanto, não se mostra inadequado que o Tribunal a quo não ampliasse a base instrutória antes do fim da discussão.
27. Cabe salientar que, embora o Tribunal a quo não integrasse na base instrutória os 19º a 27º, 89º, 90º e 91º pontos da contestação dos recorrentes, de facto, através da acta de audiência, fundamentos do juízo sobre a matéria de facto e acórdão recorrido, pode-se ver que o Tribunal a quo pronunciou-se sobre os respectivos factos.
28. Pelo exposto, os recorridos entendem que todos os factos no acórdão a quo são suficientes para saber a realidade e para proferir uma sentença indubitável.
29. Por outro lado, quanto ao erro na apreciação dos factos da base instrutória, os recorrentes pugnam na motivação que, em juízo sobre os factos o Tribunal a quo teve em conta a hipótese fáctica infundamentada e não provada, erradamente deu assente que não havia qualquer acordo entre os 4 recorridos e o 1º recorrente sobre a permissão de aproveitamento do apartamento em causa, padecendo assim do vício de nulidade.
30. Os recorrentes entendem que o Tribunal recorrido erradamente deu não provado o facto descrito no 2º ponto da base instrutória, principalmente com fundamento nos depoimentos das 4 testemunhas nomeadas por eles, as quais indicaram unanimemente que os 4 recorridos comprometeram-se a permitir ao 1º recorrente morar no apartamento em causa até o seu falecimento, senão, seriam punidos com trovão.
31. Os recorrentes pretendem provar com esses depoimentos que havia acordo verbal entre o 1º recorrente e os 4 recorridos, questionam que o Tribunal deu assente, com base em factos duvidosamente provados, que não havia qualquer acordo entre as partes.
32. No entanto, o Tribunal a quo formulou doutamente jurisprudência no acórdão (vide as fls. 293 e ss. dos autos).
33. Sem dúvida, os 2 recorrentes nunca entregaram qualquer prova documental da existência de qualquer acordo escrito de aproveitamento, nem há outra informação nos autos que a demonstre.
34. Celebram-se por escritura pública, os actos que importem constituição dos direitos de usufruto, uso e habitação de coisas imóveis.
35. Deste modo, faltando prova documental, não se pode considerar existente um acordo de uso e habitação da fracção entre o 1º recorrente e os 4 recorridos, assim sendo, foi correcto para o Tribunal a quo julgar inexistente qualquer acordo entre os recorridos e os recorrentes.
36. Além disso, os 2 recorrentes indicam que foi contrariado aos depoimentos das testemunhas quando o Tribunal a quo deu não provado o 2º facto da base instrutória. Segundo o entendimento dos recorrentes, o acordo de uso pode ser provado por testemunha. Se fosse assim (pura hipótese por cautela), o Tribunal também deveria ponderar os depoimentos das lª, 2ª, 3ª e 5ª testemunhas dos 4 autores, as quais declaram unanimemente que nunca ouviu o acordo de uso.
37. E, cumpre salientar que, as testemunhas dos réus (G, H, I e J) nunca ouviram pessoalmente o compromisso dos 4 recorridos sobre permitir ao 1º recorrente morar lá permanentemente até à morte. As testemunhas dos recorrentes declararam que tomaram conhecimento através do 1º e/ou 2ª recorrente, sendo indirecto e preconceituoso.
38. O Tribunal a quo já justificou explicitamente porque não aceitou os depoimentos das respectivas testemunhas,
39. Cabe dizer que, os 2 recorrentes indicam na motivação que, na tradução simultânea, não foi perfeito traduzir “punir com trovão” por “vida negra”. Contudo, os 4 recorrentes (sic.) entendem que a tradução não se mostra inadequada. Mesmo entendendo que as palavras não podem expressar exactamente o sentido chinês, não exercem influência ao conteúdo material do processo.
40. É de lembrar que, um Juiz adjunto do presente processo, ou seja Juiz titular, sabe falar chinês e português, ouviu directamente e percebeu os depoimentos das testemunhas, podia reparar qualquer eventual questão de tradução.
41. Permite-se ver que, o Tribunal a quo já considerou suficientemente todas as provas documentais e todos os depoimentos das testemunhas nos autos, justificou explicitamente porque não aceitou os respectivos depoimentos, assim, deu assente que não havia qualquer acordo de uso entre as partes.
42. Por outro lado, os recorrentes mencionam a cultura tradicional chinesa, pretendem questionar a convicção do Tribunal a quo sobre os factos, mas na verdade, o que os recorrentes próprios fizeram prejudicou a relação familiar com os 4 recorridos, não está conforme às regras de experiência comum e contraria à cultura tradicional chinesa!
43. É razoável, justo e legal a presente acção de reivindicação intentada pelos recorridos.
44. Pelo exposto, deve-se julgar improcedente o recurso dos recorrentes.
Pelo exposto, pede-se que:
1. Considerando os fundamentos referidos, julgar improcedente e rejeitar o recurso dos recorrentes; e
2. Como os recorrentes pugnam os factos não alegados na contestação e contrariados ao proc. n.º CV2-12-0103-CAO, a conduta mostra má fé e constitui abuso de direito, condenar os recorrentes como litigantes de má fé a pagar multa nos termos do art.º 385.º do Código de Processo Civil.”
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Cumpre decidir.
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II – Os Factos
A sentença deu por assente a seguinte factualidade:
a) Os quatro Autores são filhos biológicos do 1º Réu e de K;
b) Em 2008, K faleceu em Macau conforme documento a fls. 9 o qual aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos jurídicos;
c) Com base na escritura de 5 de Novembro de 2008, no 2º Cartório Notarial, foi inscrita a aquisição a favor dos quatro Autores e do 1º Réu por sucessão hereditária da fracção autónoma designada por “E28” do XXXXXX, sito em Macau, na XXXXXX, nº 45 a 85, descrito na Conservatória do Registo Predial de Macau sob o nº XXXXX, fls. 39 do Livro B52, tudo conforme consta da certidão narrativa de registo predial constante de fls. 10 a 40 a qual aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos jurídicos1;
d) Na altura, o 1º Réu e os quatro Autores adquiriram conjuntamente aquela fracção sem indicação de partes ou direito;
e) Mais tarde, no dia 27 de Outubro de 2009, no 1º Cartório Notarial, os quatro Autores e o 1º Réu efectuaram escritura de partilha da fracção autónoma referida em c), tendo fixado que o 1º Réu possuía a quota-parte de 6/10 da propriedade da referida fracção, enquanto que cada um dos quatro Autores possuía a quota-parte de 1/10 da propriedade desta fracção;
f) Por escritura de partilhas o 1º Réu recebeu a título de tornas o montante de MOP316.608,00 e cedeu a sua quota-parte da fracção autónoma referida em c) aos 3º e 4º Autores;
g) Conforme resulta da sentença proferida na acção ordinária nº CV2-12-0103-CAO, os 3º e 4º Autores concordaram com o 1º Réu de que montante supra MOP316.608,00 ficará à guarda dos 3º e 4º Autores, sendo no final o 3º e 4º AA. no dia 19.12.2014 devolveram os montantes ao 1º R.;
h) Assim sendo, a partir do dia 27 de Outubro de 2009, os quatro Autores passaram a ser proprietários da fracção autónoma referida em c), possuindo as seguintes quotas-partes: a 1ª Autora e a 2ª Autora possuíam respectivamente a quota-parte de 1/10, e a 3ª Autora e o 4º Autor possuíam respectivamente a quota-parte de 4/10;
i) A propriedade desta fracção encontra-se definitivamente inscrita a favor dos quatro Autores na Conservatória do Registo Predial de Macau sob o nº XXXXXXG;
j) No dia 18 de Fevereiro de 2011, os dois Réus contraíram casamento;
k) A partir de Janeiro de 2015, por várias vezes, os quatro Autores insistiram verbalmente com o 1º Réu e a 2ª Ré para que desocupassem e devolvessem a fracção autónoma referida em c), o que estes sempre recusaram;
l) Mais tarde, no dia 29 de Junho de 2015, através do representante deles, por escrito que os dois Réus saíssem daquela fracção tudo conforme documento a fls. 58/59 o qual aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos jurídicos;
m) Entretanto, os dois Réus não responderam nem saíram daquela fracção;
n) O imóvel supra situa-se numa área com muito movimento e está perto das escolas sendo acessível nos transportes;
o) A dimensão é de 107.35 metros quadrados, fracção autónoma constituída por 3 quartos e uma sala;
p) Através da mesma escritura de partilha, o 1º Réu transmitiu, mediante pagamento das tornas respeitantes à transmissão da herança partilhada no montante de MOP316.608,00 (trezentas e dezasseis mil seiscentas e oito patacas), à 3ª Autora e ao 4º Autor a sua quota-parte da propriedade da fracção autónoma referida em c);
q) Em data não apurada os quatros Autores manifestaram ao 1º Réu que não queriam que este continuasse a viver na fracção autónoma a que se reportam os autos;
r) Os quatro Autores se arrendassem a fracção autónoma a que se reportam os autos receberiam uma renda mensal nunca inferior a MOP7.000,00.
Acrescenta-se ainda a seguinte factualidade:
Os aqui RR instauraram contra os aqui AA uma acção no TJB, a que coube o Proc. nº CV2-12-0103-CAO visando obter a restituição de alguns bens (incluindo dinheiro) que o 1º R lhes tinha entregue para que ficasse à sua guarda.
A sentença julgou a acção parcialmente procedente e transitou no dia 14/11/2014 (fls. 135-141 dos autos; 66-86 do apenso “traduções” e fls. 387 dos autos).
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III – O Direito
1 - O 1º réu era casado com K e ambos eram donos de uma fracção habitacional. Um e outro eram os progenitores dos 4 autores. A mãe dos AA, porém, faleceu, entretanto.
Em 27/10/2009 AA e R procederam à partilha desse bem. Mas a parte que cabia ao 1º R (pai) foi alienada aos 3º e 4º autores, mediante o pagamento de tornas no valor de MOP$ 316.608,00.
O 1º R continuou a viver na referida casa. Entretanto, o 1º R. casou com a 2ª ré em 18/02/2011, tendo esta passado a residir na fracção.
A partir de 2014 os AA deixaram de permitir que os RR continuassem a viver na fracção, exigindo que a deixassem livre. Mas tal não terá acontecido.
É esta a posição dos AA nos autos.
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2 - Os RR trazem uma versão um pouco diferente. Diz o 1º R. ter-se apaixonado pela 2ª R., tendo resolvido casar-se com ela. Mas, para tranquilizar os filhos AA - no sentido de que a 2ª Ré não iria ficar com os bens do pai -, acrescenta ter entregado todo o dinheiro das suas contas para os 3º e 4º AA a fim de o guardarem a seu modo. Com o mesmo propósito, diz ter aceitado passar para o nome destes mesmos 3º e 4º AA a quota parte de duas fracções imobiliárias (a reivindicada e outra).
E, a fim de também ele ficar tranquilizado, acordaram todos que o pai ficaria a usar a fracção até à sua morte.
É a posição dos RR. Posição que, porém, não fez vencimento, por falta de prova.
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3 - Vêm agora os RR no recurso pugnar pelo seu provimento, com base nas seguintes questões:
1ª – Deveria o tribunal “a quo” ter tido em consideração factos que alegaram na sua contestação (alguns dos quais foram apreciados no Proc. nº CV2-12-0103-CAO), levando-os à Base Instrutória.
2ª – Errou o tribunal em dar por assente o facto 2º da BI.
Apreciando.
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3.1 - Da selecção da matéria de facto
Entendem os RR que o tribunal deveria ter submetido a julgamento alguma matéria de facto que haviam levado à contestação, por a considerarem relevante, tanto quanto havia sido no âmbito do Proc. nº CV2-12-0103-CAO.
Ora, acontece que a matéria provada naqueles autos – e que o recorrente pretendia fosse aqui reeditada – não tem exactamente o mesmo propósito da destes autos. Pelo menos, não a tem precisamente como o 1º réu nos pretende fazer crer.
O que ele visa, essencialmente, é que o tribunal “a quo” devesse ter permitido provar que ele e os autores chegaram a acordo no sentido de que poderia ficar na fracção até à sua morte. E isto porquê?
Porque o recorrente, por ter falecido a sua mulher (mãe dos AA), se teria apaixonado por uma segunda mulher, com quem viria a casar. E, então, como garantia de que os bens que eram seus não transitariam para esta nova mulher, teria entregado dinheiro e bens para que os filhos guardassem. E quanto à fracção imobiliária em apreço, ele cedeu a sua quota parte nela aos 3º e 4º autores, de modo que todos e apenas eles (os quatro irmãos) ficassem donos dela. Seria essa uma forma de os tranquilizar acerca da intenção de que o casamento não os iria prejudicar em termos patrimoniais.
Portanto, a sua essencial preocupação – compreendemos o 1º réu muito bem quanto a isso – era tentar provar aqui que, depois de entregar bens e dinheiro aos filhos para que eles o guardassem e depois de passar para o nome deles a referida fracção, todos tinham chegado a acordo no sentido de que, em contrapartida do seu gesto, ele e a sua nova esposa poderiam permanecer na fracção até à sua morte!
Ora bem.
Em primeiro lugar, a matéria provada naquele Proc. nº CV2-12-0103-CAO não coincide exactamente com aquela que o recorrente aqui invocou, principalmente quanto ao acordo sobre a utilização da fracção.
Em segundo lugar, estranha-se que só agora, já em sede de recurso, venham os RR invocar essa matéria, quando poderiam ter reclamado da selecção da matéria de facto, pugnando nessa ocasião pelo alargamento da factualidade a incluir na base instrutória. É certo que a omissão não os impede de pedir ao tribunal “ad quem” que repondere se aquela factualidade era ou não relevante ao desfecho da causa. De qualquer modo, fica aqui a estranheza pela tardia preocupação quanto aos factos que pretendia demonstrar.
Em terceiro lugar, e não obstante o que se acaba de dizer, não nos parece necessário fazer o processo andar para trás, a fim de que se proceda à ampliação da matéria de facto, tal como pretendido pelos recorrentes. Com efeito, se aquilo que eles verdadeiramente pretendiam era a oportunidade de demonstrarem ao tribunal o referido acordo familiar, essa matéria acabou por ser incluída no art. 2º da BI. E o que se verificou foi que não se provou que «Após a transmissão da quota-parte da propriedade da fracção acima referida efectuada pelo 1º reu à 3ª autora e ao 4º autor, os proprietários (ou seja, os quatro autores) chegaram a acordo com o 1º réu de que “o 1º réu podia continuar a residir nesta fracção, até que qualquer dos proprietários lhe pedisse para sair” ou “após a transmissão da propriedade, o 1º réu e as pessoas que este autorizava podiam continuar a usar a fracção em causa, até que o 1º réu falecesse, incluindo a autorização para que a cônjuge do 1º reu pudesse viver nessa fracção».
Ora, assim sendo, não faz sentido voltar o processo à fase da prova de factos que, de uma maneira ou outra, serviriam para demonstrar aquilo que os réus/recorrentes tiveram oportunidade de provar no julgamento já efectuado, quanto à matéria do art. 2º da BI.
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3.2 - Do erro sobre a matéria do art. 2º da BI
O art. 2º da BI tinha a seguinte redacção:
“Após a transmissão da quota-parte da propriedade da fracção acima referida efectuada pelo 1ª Réu à 3ª Autora e ao 4º Autor, os proprietários (ou seja os quatro Autores) chegaram a acordo com o 1º Réu de que “O 1º Réu podia continuar a residir nesta fracção até que qualquer dos proprietários lhe pedisse para sair” ou “após a transmissão da propriedade, o 1º Réu e as pessoas que este autorizava podiam continuar a usar a fracção em causa, até que o 1º Réu falecesse, incluindo a autorização para que a cônjuge do 1º Réu pudesse viver nesta fracção”.
Foi julgado não provado.
Os recorrentes entendem que foi feito um mau julgamento desta matéria de facto, socorrendo-se da tradição chinesa acerca do culto dos falecidos (no caso, da falecida mãe dos AA), que não teria que ser feita na casa de morada dela enquanto viva. Além disso, entendem que os depoimentos testemunhais deveriam levar à demonstração e prova do facto em causa, ao contrário do que foi feito pelo tribunal “a quo”.
Apreciando.
O recurso, quanto a este ponto, socorre-se, em boa parte, de ideias ou convicções pessoais que deveriam ter uma correspondência com o mundo dos factos e com a realidade provada. Como se sabe, o tribunal apenas deve julgar de acordo com a realidade que tiver sido apurada de acordo com os documentos e depoimentos testemunhais.
É certo que a posição dos recorrentes, em especial do recorrente 1º Réu, é verosímil. Ou seja, é possível que tenha transferido a sua quota-parte na propriedade do apartamento referido na alínea C) para os 3º e 4º autores no pressuposto acordado de dessa maneira pudesse ficar a residir na fracção sem qualquer constrangimento. Isso é possível num quadro de entendimento sempre desejável entre progenitores e descendentes, pelo respeito e veneração que os filhos devem ter pelos anciãos.
Contudo, isso não ficou demonstrado de acordo com a prova testemunhal obtida e este TSI não vê, muito sinceramente, que esse julgamento padeça de alguma incongruência e falibilidade. A fundamentação vertida no acórdão de fls. 276 (sobre o julgamento da matéria de facto) é coerente, plausível e lógica.
Efectivamente, as quatro testemunhas ouvidas não assistiram a conversa alguma entre AA e 1º R sobre a existência de tal acordo, limitando-se a servir de veículo àquilo que o 1º R lhes transmitiu, ficando desse modo a razão de ciência muito periclitante e falível sem adicionais elementos coadjuvantes.
Somos, pois, a afirmar que a convicção do tribunal “a quo” está bem exposta, não havendo motivos para ser abalada nesta instância, nem havendo, sequer, razão para o accionamento da faculdade prevista no art. 629º, nº4, do CPC com vista à anulação oficiosa da decisão ou ao reenvio para ampliação e repetição do julgamento da matéria de facto.
Relativamente à matéria do direito invocado pelo autor, a este cabe o respectivo ónus probatório. Se o tribunal dispuser de elementos bastantes para concluir pela razão do autor e réu não conseguir, na impugnação, colocar a dúvida no espírito do julgador sobre se os factos invocados pelo autor são verdadeiros, o julgador não pode responder à matéria quesitada contra o autor nos termos do art. 437º, do CC).
Recordemos que estamos perante matéria exceptiva, cujo ónus de prova impende sobre os RR (cfr. art. 335º, nº2, do CC) e que a não demonstração dos respectivos factos permanece uma dúvida que é resolvida contra si, ao abrigo do art. 437º, do CPC.
Lembremos, por outro lado, “Quando a primeira instância forma a sua convicção com base num conjunto de elementos, entre os quais a prova testemunhal produzida, o tribunal “ad quem”, salvo erro grosseiro e visível que logo detecte na análise da prova, não deve interferir nela, sob pena de se transformar a instância de recurso, numa nova instância de prova”.
E que “A decisão de facto só pode ser modificada nos casos previstos no art. 629º do CPC” e o tribunal de recurso não pode censurar a relevância e a credibilidade que, no quadro da imediação e da livre apreciação das provas, o tribunal recorrido atribuiu ao depoimento de testemunhas a cuja inquirição procedeu” (Ac. do TSI, de 19/07/2018, Proc. nº 915/2017).
Improcede, pois, o recurso.
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IV – Decidindo
Face ao exposto, acordam em negar provimento ao recurso.
Custas pelos recorrentes.
T.S.I., 17 de Janeiro de 2019
José Cândido de Pinho
Tong Hio Fong
Lai Kin Hong
1 Corresponde à alínea C) dos factos assentes tendo contudo a redacção sido alterada para melhor expressar o que consta do registo predial.
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1124/2017 1