Processo n.º 932/2018
(Recurso de decisão jurisdicional)
Relator: Fong Man Chong
Data: 17/Janeiro/2019
Assuntos:
- Competência do Director da DSSOPT em matéria da emissão da Planta de Condições Urbanísticas
SUMÁRIO:
I - Quando a Requerente, na qualidade de concessionária de um terreno, pretendendo obter uma planta para poder cumprir o contrato de concessão, cujo termo se avizinha, sendo que, na sua óptica, a pretendida planta já devia ter sido emitida há muito tempo, formulou o pedido nestes termos, ao abrigo do disposto no artigo 31.º do Regulamento Administrativo n.º 5/2014, de 24 de Fevereiro, só que o órgão competente, o Director da DSOPT, em vez de emitir a requerida planta, veio a alegar que ia fazer estudos complementares, posição esta (de não emissão da Planta de Condições Urbanísticas) que produz necessariamente um efeito externo negativo.
II - Portanto, trata-se de uma estatuição autoritária, de indeferimento implícito, no caso concreto, assumida pelo órgão administrativo competente, no âmbito de poderes jurídico-administrativos, produtora de efeitos externos. Ou seja, estamos perante um acto administrativo na acepção do artigo 110.º do Código do Procedimento Administrativo, passível de controlo contencioso.
O Relator,
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Fong Man Chong
Processo n.º 932/2018
(Recurso de Decisões Jurisdicionais)
Data : 17/Janeiro/2019
Recorrente : Associação X de Macau (澳門X會)
Obj. do Recurso : Despacho que julgou procedente a excepção da irrecorribilidade do acto recorrido (裁定被訴行為欠缺可上訴性的抗辯理由成立之批示)
Entidade Recorrida : Director dos Serviços de Solos, Obras Púbicas e Transportes (土地工務運輸局局長)
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ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA RAEM:
I - RELATÓRIO
Associação X de Macau (澳門X會), Recorrente, devidamente identificada nos autos, não se conformando com a decisão proferida pelo Tribunal Administrativo, datada de 29/05/2018, que julgou procedente a excepção de irrecorribilidade do acto, veio, em 23/07/2018, interpor o presente recurso jurisdicional para este TSI, com os fundamentos constantes de fls. 78 a 86, tendo formulado as seguintes conclusões:
1. A discricionariedade prevista no artigo 31º do Regulamento Administrativo n.º 5/2014 quanto à escolha dos actos procedimentais aí previsto é uma discricionariedade de escolha não uma discricionariedade de acção.
2. Como discricionariedade de escolha a Administração não dispõe de liberdade quanto à oportunidade de seguir um dos actos procedimentais previstos no artigo 31º do Regulamento Administrativo n.º 5/2014, tem de escolher um dos actos aí previstos, ou 1) Realiza estudos complementares, sempre que se revele indispensável, tendo em consideração as opiniões apresentadas e o parecer do CPU, ou; 2) Procede à alteração do projecto de PCU, ou 3) Emite a PCU no prazo de 45 dias a contar da data de recepção do parecer do CPU.
3. Para tal concorre a natureza do procedimento de elaboração de PCU como procedimento vinculado, uma vez que tendo em conta a natureza dos actos de planeamento e de procedimento que decorre da Lei, o procedimento de elaboração da PCU apresenta-se como um procedimento necessário.
4. O que significa que o desenho rigoroso previsto pelo legislador, de cada um dos passos procedimentais pelos quais a elaboração da PCU terá de passar, tais trâmites deverão ser considerados como trâmites vinculados, o que terá como consequência pois, que o procedimento de elaboração da PCU terá natureza de procedimento vinculado.
5. Na doutrina portuguesa é esse o entendimento de Fernando Alves Correia1, em que os procedimentos desta natureza são vistos como procedimentos necessários, justificados na necessidade de compensação da ampla margem de discricionariedade de que a entidade planeadora goza na definição do conteúdo do plano, no caso a PCU.
6. A lógica subjacente é, quanto mais abertas forem as normas de direito material, como acontece no caso das normas de planeamento, maior valorização deverá ser conferida às normas de procedimento e de forma que garantam uma correcta formação da vontade administrativa2,
7. Pelo que, o procedimento rigoroso, seria a forma encontrada pelo legislador para garantir que o plano seja efectivamente o produto de uma adequada ponderação dos vários interesses que podem por ele ser tocados.
8. Concluindo-se, no caso, que a Administração nos actos de procedimento não tem margem de agir ou não agir, a Administração tem de decidir, e, portanto, a discricionariedade não é uma discricionariedade de acção, mas de decisão, de escolher uma das alternativas predefinidas na lei.
9. A Administração não pode modelar ao seu próprio interesse o procedimento, portanto agir ou não agir face à natureza vinculada dos trâmites previstos no procedimento de elaboração da PCU.
10. E foi exactamente o que fez, decidiu não emitir a PCU e avançar para outro tipo de decisão, fazer estudos complementares, o que só o podia fazer se devidamente fundamentado, em face dos critérios de celeridade, eficiência e racionalidade da actuação administrativa previstos na Lei para este tipo de procedimentos.
11. Sendo que do conteúdo do acto, que negou a emissão da PCU à recorrente, nenhuma fundamentação existe para que se perceba porque é que Administração decidiu fazer estudos complementares.
12. E daqui partimos para a discussão de saber se o acto posto em crise é um acto recorrível ou não.
13. Sendo a discricionariedade contida no artigo 31.° n.º 1 do Regulamento Administrativo n.º 5/2014 uma discricionariedade de escolha, decisória, os actos alternativos aí previstos terão também a natureza de actos decisórios que visam produzir efeitos numa situação individual e concreta do requerente, no casa a elaboração da PCU.
14. O que o ofício da DSSOPT veio comunicar foi que o Director da DSSOPT optou pela decisão de praticar um acto para a realização de estudos complementares;
15. Ou seja, quando a entidade recorrida responde expressamente ao requerimento da recorrente de 11.09.2017 onde se pedia a emissão da PCU com base no parecer final (10.05.2016) do CPU, que está a proceder a estudos complementares, está a comunicar implicitamente que indeferiu a emissão da PCU.
16. Doutra maneira não se pode entender a não resposta expressa ao pedido formulado pela recorrente.
17. A vontade da Administração manifestou-se através de um acto que está incluído outro, ou mediante factos de que necessariamente se deduza (facta concludentia) como é o caso.
18. Ora, daí decorre com toda a clareza que o acto de indeferimento da PCU é um acto administrativo para efeitos do artigo 110° do CPA.
19. Assim, dando como adquirido o 2° elemento (órgão da Administração) e 3º elemento (Ao abrigo de normas de direito público) por nos parecer não haver dúvidas que o acto em crise é um acto jurídico praticado por um órgão da Administração (Director da DSSOPT) ao abrigo de normas de direito público corno é o caso do Regulamento Administrativo n.º 5/2014.
20. O primeiro dos elementos da noção legal de acto administrativo consiste em ser ele uma decisão no sentido de uma estatuição, ordenar por estatuto ou decreto,
21. ou prescrição, ordenar precisamente o que se há-de fazer.
22. Decisão está aqui no sentido de determinação sobre ou de resolução de um assunto, de uma situação concreta jurídico-administrativa quer envolva a prática de acto de natureza vinculada ou discricionária.
23. E pese embora a noção de acto administrativo seja construída em redor de urna estatuição autoritária, tal não significa que o conceito de acto não se aplique também à Administração prestadora ou até planificadora3.
24. Diga-se ainda, que, como decisão, o acto administrativo que crie, modifique e extinga (acto com efeitos positivos) ou se recuse a criar, modificar ou extinguir (acto com efeitos negativos) uma relação jurídica administrativa define inovatoriamente direito para um caso concreto.
25. Olhando de perto o caso concreto e tendo em conta as três opções dadas pelo legislador à Administração no artigo 31° nº 1 do Regulamento Administrativo n.º 5/2014 a saber 1) Realização de estudos complementares, sempre que se revele indispensável, tendo em consideração as opiniões apresentadas e o parecer do CPU; 2) Proceder à alteração do projecto de PCU, ou; 3) Emitia a PCU no prazo de 45 dias a contar da data de recepção do parecer do CPU, não temos dúvidas ao afirmar que qualquer das três configura um acto decisório com eficácia externa que define o direito a aplicar.
26. Ao escolher avançar para estudos complementares e não emitir a PCU com base no parecer final (10.05.2016) do CPU), a Administração ordenou, prescreveu o que se havia de se fazer tendo decidido que se devia avançar para a opção 1) realização de estudos complementares.
27. A escolha realizada pela Administração é um acto decisório regulador que visou produzir efeitos jurídicos numa situação individual e concreta.
28. Indeferir a emissão da PCU com base no parecer final (10.05.2016) do CPU por escolher avançar para estudos complementares é decidir inovatoriamente, é produzir efeitos jurídicos numa situação individual e concreta.
29. Escolher avançar para estudos complementares é regular o caso concreto, haverá estudos complementares e não haverá emissão da PCU no prazo de 45 dias a contar da data de recepção do parecer do CPU.
30. É exprimir uma resolução que determinou o rumo dos acontecimentos o sentido de conduta a adoptar.
31. Não sendo, pois, um acto instrumental.
32. Os actos instrumentais são aqueles que não implicam qualquer decisão, são actos auxiliares das decisões administrativas como por exemplo chamar alguém a pronunciar-se, optar por ouvir peritos, pedir ou emitir pareceres, etc.
33. Não produzirem efeitos jurídicos inovadores no ordenamento jurídico, não tem repercussões directas e imediatas na esfera jurídica dos administrados.
34. A determinação de avançar para estudos complementares ao invés de emitir a PCU seja um mero acto instrumental no procedimento de elaboração da PCU por várias razões.
35. Em primeiro lugar porque, o acto de escolha da realização de estudos complementares em vez do deferimento da emissão da PCU com base no parecer final do CPU é um acto que exprime uma resolução que determinou o rumo dos acontecimentos o sentido de conduta a adoptar;
36. Essa escolha não visa auxiliar qualquer decisão, é em si mesma uma decisão;
37. Em segundo lugar, o acto de indeferimento da emissão da PCU optando pela realização de estudos complementares é um acto inovador, define uma situação concreta.
38. Ou seja, após a aprovação do CPU a entidade recorrida tem três opções em que pode definir a situação concreta, 1) Realização de estudos complementares, sempre que se revele indispensável, tendo em consideração as opiniões apresentadas e o parecer do CPU; 2) Proceder à alteração do projecto de PCU, ou; 3) Emitia a PCU no prazo de 45 dias a contar da data de recepção do parecer do CPU,
39. A escolha de qualquer uma das opções acima referida, produz efeitos jurídicos que afectam directamente o particular, definindo a situação jurídica do mesmo.
40. A escolha de qualquer uma das opções acima referida, inova na ordem jurídica regulando uma situação não regulada.
41. Em terceiro lugar, porque a decisão tem implicações directas na esfera da recorrente, se se avança para estudos complementares, por exclusão não se emite a PCU.
42. Isto é, o acto decisório de escolha afecta e afectou directamente os interesses da recorrente porque não foi emitida a PCU no prazo de 45 dias a contar da data de recepção do parecer do CPU, uma vez que a recorrente não pôde avançar para a elaboração do projecto urbanístico previsto no respectivo contrato de concessão, levando a uma impossibilidade do cumprimento do contrato de concessão celebrado com a RAEM, por causa imputável ao recorrido.
43. Em suma, o acto de escolher avançar para estudos complementares, é um acto administrativo expresso que traz consigo um outro acto, este implícito, de recusa de emissão da PCU no prazo de 45 dias a contar da data de recepção do parecer do CPU, susceptível de recurso de contencioso.
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Notificada do recurso jurisdicional, a Entidade Recorrida ficou silenciosa.
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O Digno. Magistrado do Ministério Público junto do TSI emitiu o seguinte douto parecer (fls. 97 e 98):
Inconformada com a decisão de 29 de Maio de 2018, do Mm.º Juiz do Tribunal Administrativo, exarada a fls. 69 e seguintes dos autos, que julgou procedente a excepção de irrecorribilidade do acto objecto do recurso contencioso interposto por Associação X de Macau, vem esta recorrer jurisdicionalmente daquela decisão, para o que alinha os fundamentos condensados nas conclusões da sua alegação de fls. 78 e seguintes.
Está em causa saber se o acto que a notificação/comunicação de fls. 18 dá a conhecer é um acto administrativo susceptível de escrutínio através de recurso contencioso.
O Mm.º Juiz considerou que não, louvando-se essencialmente na diversidade de procedimentos que a DSSOPT (Direcção dos Serviços de Solos Obras Públicas e Transportes) pode desencadear, nos termos do artigo 31.º do Regulamento Administrativo n.º 5/2014, e asseverando que estava pendente um desses procedimentos (elaboração de estudos complementares), que inviabilizava a passagem da pretendida PCU (Planta de Condições Urbanísticas), pelo que, neste caso, a resposta da Administração a dar conta da inoportunidade da emissão da planta, além de cumprir o dever de decidir, não implica uma decisão reguladora da pretensão da recorrente, pelo que é insusceptível de recurso contencioso.
Discordamos do assim decidido.
O que a recorrente requereu, de forma inteligível, para um terreno que identificou, foi a emissão urgente da Planta de Condições Urbanísticas, nos termos aprovados pelo Conselho do Planeamento Urbanístico de acordo com o projecto da própria DSSOPT, tendo explicado ex abundanti as razões da pretensão e da sua urgência.
A DSSOPT, embora sem o referir expressamente, não satisfez a pretensão da requerente, alegando que estava a fazer um estudo complementar.
Temos para nós, que um tal posicionamento substancia uma implícita decisão de indeferimento. Não importa, nesta fase, saber dos motivos por que não é, ou não pode ser, emitida a Planta. Interessa é atentar no que foi requerido pelo particular, na resposta/solução que a Administração deu ao seu requerimento e apurar se tal produz ou não efeitos externos. Ora, como deflui do requerimento reproduzido a fls. 16 a 17, a requerente, na qualidade de concessionária de um terreno, tem que obter a almejada planta para poder cumprir o contrato de concessão, cujo termo se avizinha, sendo que, na sua óptica, a pretendida planta já devia ter sido emitida há muito tempo. Parece-nos óbvio, face a este enquadramento, que a posição da Administração, de não emissão da Planta de Condições Urbanísticas, produz necessariamente um efeito externo negativo. E, como se disse, esse efeito é independente das razões que possam estar subjacentes à não emissão. Deparamo-nos, pois, com uma estatuição autoritária, de indeferimento implícito, num caso concreto, adoptada por um órgão da Administração, no âmbito de poderes jurídico-administrativos, susceptível de produzir efeitos externos. Ou seja, estamos perante um acto administrativo na acepção do artigo 110.º do Código do Procedimento Administrativo, que, por produzir efeitos lesivos, não pode deixar de estar abrangido pelo escrutínio contencioso garantido pelo Código de Processo Administrativo Contencioso.
Saber se o acto é da autoria do Director dos Serviços de Solos Obras Públicas e Transportes ou da Chefe do Departamento de Planeamento Urbanístico, bem como se é oral ou está contido em suporte documental, nomeadamente no próprio ofício/notificação, já é matéria que escapa do âmbito deste recurso jurisdicional.
Portanto, e em conclusão, está em causa um acto administrativo, que contém uma estatuição implícita de indeferimento, susceptível de produzir efeitos externos lesivos, que por isso é recorrível contenciosamente, nos termos normais.
Procedem, pois, os fundamentos do recurso jurisdicional, devendo revogar-se a decisão impugnada e mandar-se prosseguir o recurso contencioso.
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Foram colhidos os vistos legais.
Cumpre analisar e decidir.
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II – PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
Este Tribunal é o competente em razão da nacionalidade, matéria e hierarquia.
O processo é o próprio e não há nulidades.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária e são dotadas de legitimidade “ad causam”.
Não há excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
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III – FACTOS
São os seguintes elementos considerados assentes, extraídos do processo principal e do processo administrativo com interesse para a decisão da causa:
- A recorrente é concessionária, por aforamento, do térreo sito em Macau, na ... (conforme se junta. fls.21 a 22v dos autos).
- Em Dezembro de 2013, a recorrente requereu a emissão da Planta de Condições Urbanísticas (adiante designado por PCU) (conforme se junta a fls. 41 dos P.A. vol.2 ).
- Em 15 de Agosto de 2014, foi aprovado pelo director do DSSOPT o projecto da PCU n.º. 91A174 e explicação do projecto, através da proposta n.º 443/DPU/2014, para efeito de recolha de opiniões dos interessados e da população (conforme se junta a fls. 237 a 274 dos P.A. vol.2 ).
- Em 13 de Outubro de 2014, a DSSOPT remeteu ao Conselho do Planeamento Urbanístico (adiante designado por CPU) o projecto de PCU e as opiniões acolhidas (conforme se junta a fls. 303 a 343 dos P.A. vol.2 ).
- Em 10 de Maio de 2016, o CPU pela quinta sessão plenária, deu parecer favorável ao projecto da PCU, que mereceu 20 votos favoráveis entre 26 vogais (conforme se junta a fls. 618 a 621 dos P.A. vol.3).
- Em 3 de Março de 2017, foi aprovado o projecto do CPU, revisão pelo subdirector do DSSOPT, através da proposta n.º 195/DPU/2017 (conforme se junta a fls. 823 a 848 dos P.A. vol.3).
- Em 31 de Maio de 2017, foi convocada a quarta sessão plenária do CPU, que propôs o reenvio para a DSSOPT para fazer os estudos complementares 2017 (conforme se junta a fls. 915 a 920 dos P.A. vol.4).
- Em 13 de Junho de 2017, o director da DSSOPT tendo concordado, pela proposta n.º 502/DPU/2017, em realizar mais estudos complementares sobre a emissão da PCU, deu resposta à recorrente (conforme se junta a fls. 926 a 928 dos P.A. vol.4).
- Em 11 de Setembro de 2017, a recorrente veio a requerer a emissão da PCU (conforme se junta a fls. 1094 a 1095 dos P.A. vol.4).
- Em 18 de Setembro de 2017, foi dada a resposta à recorrente que a DSSOPT está a realizar mais estudos complementares sobre o projecto (conforme se junta a fls. 1096 dos P.A. vol.4).
- Em 20 de Outubro de 2017, foi interposto o recurso contencioso desta última resposta (conforme fls.2 dos Autos).
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IV - FUNDAMENTOS
Ora, o recurso tem por objecto a decisão do Director da DSSOPT, que tem o seguinte teor:
事由:回覆查詢-鄰近馬交石炮台馬路之土地之未有詳細規劃地區的規劃條件圖申請
(Proc.n.º 91A174 T-13391/13.12.2013)
本局茲於2017年09月11日收到 貴會之書面查詢,關於題述地段規劃條件圖草案之事宜,本人現行使刊登於二零一六年五月二十五日第二十一期《澳門特別行政區公報》第二組第11/SOTDIR/2016號批示所授予的權限,回覆如下:
有關題述的規劃條件圖申請,本局已完成編制規劃條件圖草案。根據第5/2014號行政法規《城市規劃法施行細則》第二十九條的規定,已於2017年03月09日至2017年03月23日(共15天)就重新編製的規劃條件圖草案收集利害關係人及公眾之意見。並根據上述行政法規第三十條的規定,城市規劃委員會已於2017年06月31日第四次平常全體會議就本個案進行討論及發表對規劃條件圖草案的意見。
根據上述行政法規第三十一條的規定,本局現正對規劃條件圖草案進行補充研究。
耑此函達,順頌台安﹗
局長
由城市規劃廳廳長代行
…
二零一七年九月十八日
Em Português:
Exma. Associação X de Macau
Avenida…
Sua referência: DMS.126253/2017 Sua Comunicação de 11/09/2017
Nossa referência: 1300/DPUDEP/2017 C. Postal 467 - Macau
Assunto: Resposta à consulta relativa ao requerimento da planta de condições urbanísticas da zona do território não abrangida por plano pormenor da Estrada de D. Maria II
(Proc. n.º 91A174 T-13391/13.12.2013)
Tendo sido recebido a consulta por escrito de V.Exa em 11 de Setembro de 2017, em relação ao projecto da planta de condições urbanísticas do terreno acima referido, e em cumprimento das competências delegadas pelo Despacho n.º 11/SOTDIR/2016, publicado no Boletim Oficial n.º 21, II Série, de 25 de Maio de 2016, vem responder o seguinte:
Relativamente ao requerimento da planta de condições urbanísticas(PCU) acima referido, a presente Direcção já concluiu a elaboração do respectivo projecto de PCU. Nos termos do artigo 29º do Regulamento Administrativo n.º 5/2014 (Regulamentação da lei do planeamento urbanístico), tendo sido recolhido as opiniões dos interessados e da população sobre o projecto de PCU reelaborado durante o período entre 9 de Março de 2017 e 23 de Março de 2017 (total de 15 dias). Além disso, nos termos do artigo 30º do mesmo regulamento administrativo, já procedeu o Conselho do Planeamento Urbanístico à discussão e emissão do parecer sobre o referido projecto da PCU na sua 4ª reunião plenária, realizada em 31 de Junho de 2017.
Nos termos do artigo 31º do referido regulamento administrativo, a presente Direcção encontra-se a proceder ao estudo complementar sobre o projecto da PCU.
Com os melhores cumprimentos,
Directora,
substituta por chefe do Departamento de Planeamento Urbanístico
…
18 de Setembro de 2017
Neste recurso, uma única questão que importa resolver é a de saber se a decisão acima transcrita é ou não um acto administrativo recorrível, em caso afirmativo, a decisão do TA deverá ser revogada, caso contrário, a mesma será mantida.
A propósito do conceito de acto administrativo, escreve-se:
3. A noção legal de acto administrativo que se encontra pressuposta no n.º 1 do presente artigo encontramo-la no Código do Procedimento Administrativo, mais concretamente no seu artigo 110.º. De acordo com essa disposição legal, consideram-se actos administrativos as decisões dos órgãos da Administração que ao abrigo de normas de direito público visem produzir efeitos jurídicos numa situação individual e concreta. É essencial, portanto, que estejamos perante uma manifestação decisória por parte da Administração e não perante uma mera declaração de ciência, um juízo de valor ou uma opinião4. Dentro desta noção legal de acto administrativo, o artigo agora em anotação delimita o círculo dos actos contenciosamente impugnáveis ao estabelecer que a recorribilidade dos actos administrativos depende de os mesmos terem eficácia externa5 6. Acompanhando a melhor doutrina, pode dizer-se que “são externos os actos que produzem efeitos jurídicos no âmbito das relações entre a Administração e os particulares ou que afectam a situação jurídico-administrativa de uma coisa. Ao que, hoje, se devem acrescentar os actos que se inscrevem no âmbito de relações entre entidades públicas. Por contraposição, actos internos são aqueles que se inscrevem no âmbito das relações interorgânicas ou das relações de hierarquia e que apenas indirectamente se poderão reflectir no ordenamento jurídico geral”7.
4. Para que um acto administrativo seja contenciosamente recorrível é ainda indispensável, nos termos expressos do artigo sob anotação, que o mesmo não se encontre sujeito a impugnação administrativa necessária, ou seja, exige-se que o acto seja verticalmente definitivo8, com o que o conceito de definitividade vertical do acto ganha uma dimensão meramente processual, qualificando os actos que são susceptíveis de impugnação contenciosa imediata9. Como, a este propósito, refere JOSÉ EDUARDO FIGUEIREDO DIAS, “para determinar se um acto é ou não definitivo tem apenas de se analisar quem foi o seu autor e no uso de que tipo de competência o praticou. Tratando-se de um órgão colocado no nível supremo dentro da pessoa colectiva em que se insere, por não existir qualquer superior hierárquico, o acto seria sempre definitivo, o mesmo se passando com os actos dos órgãos independentes; se o autor do acto for um órgão subalterno, tem de se analisar o tipo de competência que com a prática do mesmo se exerceu, uma vez que os actos praticados ao abrigo de competência exclusiva (própria ou delegada) são ainda definitivos, só não o sendo aqueles praticados ao abrigo de uma competência concorrente com o superior hierárquico”10.
Ora, há-de realçar uma nota aqui:
Na resposta, a Entidade Recorrida disse que, aquando da consulta feita pela Recorrente (…), mas, esta não veio a consultar, mas sim veio a formular expressamente um pedido com o seguinte teor:
A Associação X de Macau, com sede em Macau, na …, registada na Direcção dos Serviços de Identificação sob o no….,
澳門X會,總部設於澳門海邊馬路和嚤囉園路,身份證明局登記編號為541,
Vem expor e requer a V. Exa. o seguinte:
現向閣下闡述並請求以下事情:
(…)
18. Assim, após o parecer favorável do CPU cabe, obrigatoriamente, à DSSOPT, sem mais procedimentos, proceder à emissão no prazo legal máximo de 45 dias, a não ser que o Parecer seja no sentido de se proceder a novos estudos complementares ou à necessidade de alteração do projecto de PCU da DSSOPT.
Em face do acima exposto, não tendo havido da parte da Requerente, qualquer objecção ao parecer do CPU, nem ao conteúdo da Planta de Condições Urbanísticas apresentada pela DSSOPT ao referido Conselho,
E, muito menos, apresentado qualquer projecto ou esquema alternativo,
Vem, respeitosamente, requerer a V. Exa se digne, sem mais delongas, emitir a Planta de Condições Urbanísticas, nos termos aprovados pelo Conselho do Planeamento Urbanístico de acordo com o projecto da própria DSSOPT.
Atendendo aos prejuízos elevados já sofridos, alguns dos quais irreparáveis (por, designadamente, não dispor de instalações ampliadas para serviços religiosos, vem ainda requerer a V. Exa. se digne dar o devido tratamento urgente ao presente pedido.
因此,在得到城市規劃委員會的贊同意見後,除非該意見指出需作出新的補充研究或需對土地工務運輸局之規劃條件圖草案進行修改,土地工務運輸局不須再進行其他程序,並須依法在45天的限期內發出規劃條件圖。
綜上所述,申請人既沒有對城市規劃委員會之意見作出任何反對,也沒有對土地工務運輸局提交到城市規劃委員會的規劃條件圖草案之內容作出反對,
除此之外,也沒有提交過任何可作替代的計劃或方案,
故此,現誠懇地請求閣下根據貴局被城市規劃委員會通過之草案盡快發出規劃條件圖。
考慮到申請人所受到的嚴重損失,當中有些甚至為不能彌補的損失(特別是不能建立一較大的設施去提供宗教服務),故此,懇求閣下本請求給予應有的緊急處理。
Pede Deferimento,
懇望接納﹗
É de ver que, em vez de decidir directamente sobre o pedido, a Entidade Recorrida veio a dizer “algo” diferente, o que não deixa de ser incompatível com o artigo 11º do CPA, que prescreve:
“1. Os órgãos administrativos têm o dever de se pronunciar sobre todos os assuntos da sua competência que lhes sejam apresentados pelos particulares, e nomeadamente:
a) Sobre os assuntos que lhes disserem directamente respeito;
b) Sobre quaisquer petições, representações, queixas, reclamações ou recursos formulados em defesa da legalidade ou do interesse geral.
2. Não existe o dever de decisão quando, há menos de dois anos contados desde a prática do acto até à data da apresentação do requerimento, o órgão competente tenha praticado um acto administrativo sobre o mesmo pedido formulado pelo mesmo particular com os mesmos fundamentos.”
Por outro lado, está e causa um acto regulado pelo Regulamento Administrativo n.º 5/2014, de 24 de Fevereiro. O seu artigo 27.º manda:
“1. O pedido de emissão de PCU, a efectuar pelos interessados, é feito mediante a entrega na DSSOPT de um requerimento, devidamente preenchido e assinado.
2. O requerimento é dirigido ao director da DSSOPT, devendo ser instruído com os seguintes elementos:
1) Cópia do documento de identificação do requerente ou, tratando-se de pessoa colectiva, cópia do documento de identificação do seu representante e do acto constitutivo da pessoa colectiva;
2) Certidão de registo predial, emitida pela Conservatória do Registo Predial, ou documento comprovativo do direito de propriedade sobre a parcela ou lote de terreno;
3) Planta cadastral oficial, emitida pela Direcção dos Serviços de Cartografia e Cadastro;
4) Procuração, caso o requerente seja procurador.
3. O modelo do requerimento é disponibilizado pela DSSOPT através da sua página electrónica.”
Depois, o artigo 31º consagra:
“1. Tendo em consideração as opiniões apresentadas pelos interessados e pela população, e o parecer do CPU, quando não tenha sido dispensada a sua audição, nos termos do n.º 4 do artigo 58.º da Lei n.º 12/2013 (Lei do planeamento urbanístico), a DSSOPT procede, consoante os casos:
1) À realização de estudos complementares, sempre que se revele indispensável, tendo em consideração as opiniões apresentadas e o parecer do CPU;
2) À alteração do projecto de PCU;
3) À emissão da PCU no prazo de 45 dias a contar da data de recepção do parecer do CPU ou da decisão do Secretário para os Transportes e Obras Públicas sobre a dispensa da audição do CPU, consoante o caso.
2. Caso o projecto de PCU tenha sido significativamente alterado, a DSSOPT procede à abertura de um novo período de recolha de opiniões dos interessados e população e à audição do CPU, sendo aplicável o disposto nos artigos 29.º e 30.º, com as necessárias adaptações.
3. A emissão de PCU a requerimento do interessado deve ser notificada ao requerente para efeito do seu levantamento, após o pagamento da respectiva taxa.
4. As PCU emitidas são registadas na base de dados da DSSOPT, nos termos do artigo 14.º da Lei 12/2013 (Lei do planeamento urbanístico) e do artigo 4.º do presente regulamento administrativo.”
É de ver que:
1)- A matéria é da competência do Director da DSSOPT;
2)- A legislação fixa um prazo para tratar do pedido em causa;
3)- Perante o pedido da Recorrente, a Entidade Recorrida tem o dever de decidir sobre ele.
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No caso, é da opinião do Digno. Magistrado do MP junto deste TSI:
Temos para nós, que um tal posicionamento substancia uma implícita decisão de indeferimento. Não importa, nesta fase, saber dos motivos por que não é, ou não pode ser, emitida a Planta. Interessa é atentar no que foi requerido pelo particular, na resposta/solução que a Administração deu ao seu requerimento e apurar se tal produz ou não efeitos externos. Ora, como deflui do requerimento reproduzido a fls. 16 a 17, a requerente, na qualidade de concessionária de um terreno, tem que obter a almejada planta para poder cumprir o contrato de concessão, cujo termo se avizinha, sendo que, na sua óptica, a pretendida planta já devia ter sido emitida há muito tempo. Parece-nos óbvio, face a este enquadramento, que a posição da Administração, de não emissão da Planta de Condições Urbanísticas, produz necessariamente um efeito externo negativo. E, como se disse, esse efeito é independente das razões que possam estar subjacentes à não emissão. Deparamo-nos, pois, com uma estatuição autoritária, de indeferimento implícito, num caso concreto, adoptada por um órgão da Administração, no âmbito de poderes jurídico-administrativos, susceptível de produzir efeitos externos. Ou seja, estamos perante um acto administrativo na acepção do artigo 110.º do Código do Procedimento Administrativo, que, por produzir efeitos lesivos, não pode deixar de estar abrangido pelo escrutínio contencioso garantido pelo Código de Processo Administrativo Contencioso.
Subscrevemos inteiramente este ponto de visto, pois, a forma de actuação da Entidade Recorrida representa uma posição final.
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Ora, mesmo que se entenda que a resposta do ofício representa a hipótese da alínea l) do artigo 31.º do Regulamento Administrativo n.º 5/2014, é em si uma decisão, logo pode ser sindicada contenciosamente.
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Pelo expendido, é de julgar procedente o recurso jurisdicional e consequentemente revogar a sentença recorrida.
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Tudo visto, resta decidir.
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V - DECISÃO
Em face de todo o que fica exposto e justificado, os juízes do TSI acordam em conceder provimento ao presente recurso jurisdicional, revogando a sentença recorrida e mandando prosseguir os autos para conhecer do mérito do recurso.
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Transitado em julgado, baixem-se aos autos ao TA para os fins visados.
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Sem custas.
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Notifique e Registe.
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RAEM, 17 de Janeiro de 2019.
Fong Man Chong
José Cândido de Pinho
Ho Wai Neng
(com declaração de voto vencido
em anexo)
Fui presente
Joaquim Teixeira de Sousa
DECLARAÇÃO DE VOTO VENCIDO
(Proc. nº 932/2018)
Concordo que o acto recorrido traduz-se num indeferimento implícito do pedido da emissão da PCU.
No entanto e salvo o devido respeito da posição maioritária do Colectivo, entendo que tal acto não é contenciosamente recorrível por não ser ainda um acto definitivo, já que a competência do superior hierárquico compreende a do inferior (cfr. artº 17º da Lei nº 2/1999), daí que a competência própria do órgão subalterno, em regra, se presume separada e não reservada ou exclusiva, salvo a disposição legal em sentido contrário, posição esta que é defendida na doutrina1 e jurisprudência dominante2.
Assim, na falta da menção expressa da lei, o acto do Director da DSSOPT está sujeito à impugnação administrativa necessária, dele não caiba recurso contencioso.
Pelo exposto, deveria confirmar a decisão a quo com fundamento algo diverso.
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RAEM, aos 17 de Janeiro de 2019.
Ho Wai Neng
1 Alves Correia, Manual de Direito Administrativo, pág.448.
2 Alves Correia, Manual de Direito Administrativo, pág.448.
3 Apud Mário esteves de Oliveira e outros, in CPA Comentado pág.551.
4 Assim, MÁRIO AROSO DE ALMEIDA, Manual…, p.271.
5 Neste sentido, de que o artigo 51.º do CPTA, norma correspondente, neste parte, ao artigo 28.º do CPAC, estabelece uma delimitação do universo dos actos administrativos impugnáveis e de que, portanto, desse dado normativo parece resultar que a eficácia externa não é um atributo inerente ao conceito de acto administrativo, cfr. MÁRIO AROSO DE ALMEIDA, Teoria…, p.129.
6 Acentuando já esta nota da produção de efeitos externos, positivos ou negativos, como caracterizadora da definição doutrinária do acto administrativo, cfr. ROGÉRIO EHRHARDT SOARES, Direito..., p. 76. Para este Autor, o acto administrativo “é uma estatuição autoritária, relativa a um caso individual, manifestada por um agente da Administração no uso de poderes de Direito Administrativo, pela qual se produzem efeitos jurídicos externos, positivos ou negativos”.
7 Cfr. MÁRIO AROSO DE ALMEIDA‒CARLOS ALBERTO FERNANDES CADILHE, Comentário…, p.307.
8 Nas palavras de DIOGO FREITAS DO AMARAL, Direito…,Volume III, p.234, o acto verticalmente definitivo ”é aquele que é praticado por um órgão colocado de tal forma na hierarquia que a sua decisão constitui a última palavra da Administração activa”.
9 Cfr. JOSÉ EDUARDO FIGUEIREDO DIAS, Manual…, p.221.
10 Cfr. JOSÉ EDUARDO FIGUEIREDO DIAS, Manual…, p.221.
1 Marcelo Caetano, Tratado Elementar de Direito Administrativo, Coimbra, 1943, pág. 159 e 281, bem como Mario Esteves de Oliveira e outros, Código de Procedimento Administrativo, 2ª edição, pág.172.
2 Ac. do TSI, de 03/04/2003, Proc. nº 141/2000, Ac. do TUI de 09/07/2014, Proc. e Ac. do STA, de 11/10/2007, Proc. nº 0229/07.
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2018-932-Recorrível-PCU 24