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Processo nº 905/2018 Data: 24.01.2019
(Autos de recurso penal)
Assuntos : Crime de “jogo fraudulento”.
Crime de “burla”.
Vícios da decisão da matéria de facto.
Concurso real.
Tentativa.
Qualificação.


SUMÁRIO

1. Preenchendo a conduta dos arguidos as normas que incriminam os tipos de crime de “jogo fraudulento” e “burla”, devem os mesmos ser condenados pela prática de tais crimes em concurso real.

2. O crime de “burla” cometido na forma tentada pode ser qualificado pelo “valor do prejuízo” que a conduta dos arguidos, se consumada, causaria ao ofendido.

O relator,

______________________
José Maria Dias Azedo

Processo nº 905/2018
(Autos de recurso penal)






ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:





Relatório

1. Em audiência colectiva no T.J.B. responderam:
(1°) A,
(2°) B,
(3°) C,
(4°) D,
(5°) E,
(6°) F,
(7ª) G,
(8°) H,
(9°) I,
(10°) J,
(11°) K,
(12°) L,
(13°) M,
(14°) N,
(15°) O,
(16°) P,
(17ª) Q, e
(18ª) R, todos com os sinais dos autos.

A final, e realizado o julgamento, decidiu o Tribunal condenar:

–– o (1°) arguido A, como co-autor da prática de:
- 2 crimes de “jogo fraudulento”, p. e p. pelo art. 6°, n.° 1 da Lei n.° 8/96/M, nas penas parcelares de 2 anos e 3 meses e 1 ano e 9 meses de prisão; e,
- 2 crimes de “burla (agravada)”, um deles, na forma tentada, p. e p. pelo art. 211°, n.° 4, al. a) e 196°, al. b) do C.P.M., nas penas parcelares de 3 anos e 1 ano e 6 meses de prisão;
Em cúmulo jurídico, foi o arguido condenado na pena única de 5 anos e 3 meses de prisão.

–– o (2°) arguido B, como co-autor da prática de:
-1 crime de “jogo fraudulento”, p. e p. pelo art. 6°, n.° 1 da Lei n.° 8/96/M, na pena de 1 ano e 9 meses de prisão; e,
- 1 crime de “burla (agravada)”, na forma tentada, p. e p. pelo art. 211°, n.° 4, al. a) e 196°, al. b) do C.P.M., na pena de 1 ano e 6 meses de prisão;
Em cúmulo jurídico, foi o arguido condenado na pena única de 2 anos e 3 meses de prisão.

–– os (3°, 4°, 5°, 6°, 9°, 11°, 12°, 14° e 15°) arguidos C, D, E, F, I, K, L, N e O, como co-autores da prática de:
- 2 crimes de “jogo fraudulento”, p. e p. pelo art. 6°, n.° 1 da Lei n.° 8/96/M, na pena individual de 1 ano e 9 meses de prisão cada; e,
- 2 crimes de “burla (agravada)”, um deles, na forma tentada, p. e p. pelo art. 211°, n.° 4, al. a) e 196°, al. b) do C.P.M., nas penas parcelares e individuais de 2 anos e 9 meses e 1 ano de prisão;
Em cúmulo jurídico, foram os arguidos condenados na pena única (e individual) de 4 anos de prisão.

–– a (7ª) arguida G, como cúmplice da prática de:
- 2 crimes de “jogo fraudulento”, p. e p. pelo art. 6°, n.° 1 da Lei n.° 8/96/M e art. 26° do C.P.M., na pena de 1 ano de prisão cada; e,
- 2 crimes de “burla (agravada)”, um deles, na forma tentada, p. e p. pelo art. 211°, n.° 4, al. a), 196°, al. b) e 26° do C.P.M., nas penas parcelares de 2 anos e 6 meses de prisão;
Em cúmulo jurídico, foi a arguida condenada na pena única de 2 anos e 6 meses de prisão.

–– os (8°, 13°, 16°, 17ª e 18ª) arguidos H, M, P, Q e R, como co-autores da prática de:
- 2 crimes de “jogo fraudulento”, p. e p. pelo art. 6°, n.° 1 da Lei n.° 8/96/M, na pena individual de 1 ano e 6 meses de prisão cada; e,
- 2 crimes de “burla (agravada)”, um deles, na forma tentada, p. e p. pelo art. 211°, n.° 4, al. a) e 196°, al. b) do C.P.M., nas penas parcelares e individuais de 2 anos e 6 meses e 9 meses de prisão;
Em cúmulo jurídico, foram os arguidos condenados na pena única (e individual) de 3 anos e 6 meses de prisão.

–– o (10°) arguido J, como co-autor da prática de:
- 1 crime de “jogo fraudulento”, p. e p. pelo art. 6°, n.° 1 da Lei n.° 8/96/M, na pena de 1 ano e 9 meses de prisão; e,
- 1 crime de “burla (agravada)”, na forma tentada, p. e p. pelo art. 211°, n.° 4, al. a) e 196°, al. b) do C.P.M., na pena de 1 ano de prisão;
Em cúmulo jurídico, foi o arguido condenado na pena única de 2 anos de prisão.

–– Decidiu ainda o Tribunal condenar os (1°, 3° a 9° e 11° a 18ª) arguidos A, C, D, E, F, G, H, I, K, L, M, N, O, P, Q e R, no pagamento solidário da quantia de RMB¥400.000,00 e juros ao (1°) ofendido dos autos; (cfr., fls. 1499 a 1544 que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).

*

Inconformados, os (1°, 2°, 3°, 4°, 5°, 6°, 7ª, 8°, 9°, 11°, 12°, 13°, 14° e 15°) arguidos A, B, C, D, E, F, G, H, I, K, L, M, N e O, recorreram.

Os (1°, 6°, 7ª e 9°) arguidos A, F, G e I, consideram existir “concurso aparente” entre o crime de “jogo fraudulento” e o de “burla”; (cfr., fls. 1930 a 1977 e 1720 a 1723-v).

Os (2°, 8° e 13°) arguidos B, H e M, dizem (tão só) que “excessiva” é a pena e que lhes devia ser “suspensa na sua execução”; (cfr., fls. 1981 a 1985-v, 1724 a 1727 e 1737 a 1740).

Os (3°, 11° e 15°) arguidos C, K e O, assacam à decisão recorrida os vícios de “erro notório na apreciação da prova” e “errada aplicação de direito”, pugnando por uma alteração da qualificação jurídica da sua conduta em relação ao 2° crime de “burla”, no sentido de serem condenados como co-autores de 1 crime de “burla (simples, na forma tentada)” do art. 211°, n.° 1 e 2 – e não, (agravada), do n.° 4 – do C.P.M., afirmando também existir “concurso aparente” entre o crime de “jogo fraudulento” e o de “burla”, e pedindo a “redução da pena”; (cfr., fls. 1816 a 1835, 1837 a 1856 e 1858 a 1877).

Os (4°, 12° e 14°) arguidos D, L e N, imputando ao Acórdão recorrido os vícios de “insuficiência da matéria de facto provada para a decisão”, “erro notório na apreciação da prova”, “contradição insanável da fundamentação” e “errada qualificação jurídica”, considerando existir “concurso aparente” entre o crime de “jogo fraudulento” e o de “burla”, e pedindo também a “redução da pena”; (cfr., fls. 1703 a 1711, 1728 a 1736-v e 1741 a 1749-v).

O (5°) arguido E, é também de opinião que incorreu o Colectivo a quo no vício de “errada qualificação jurídica”, considerando existir “concurso aparente” entre o crime de “jogo fraudulento” e o de “burla”, pedindo, igualmente, a “redução da pena”; (cfr., fls. 1712 a 1719).

*

Respondendo, entende o Ministério Público que os recursos não merecem provimento; (cfr., fls. 1998 a 2006).

*

Neste T.S.I., e em sede de vista, juntou o Exmo. Representante do Ministério Público o seguinte douto e detalhado Parecer:

“Os recorrentes impugnam o acórdão de 24 de Julho de 2018, do 4.° juízo criminal, exarado a fls. 1499 e seguintes, com versão portuguesa a fls. 2084 e seguintes, imputando-lhe os erros e vícios que desenvolvem nas suas motivações de recurso e que condensam nas respectivas conclusões.
Aos recursos respondeu o Ministério Público pela forma que consta de fls. 1998 e seguintes, onde rebate os argumentos dos recorrentes e defende a bondade do acórdão, cuja manutenção preconiza.
Vejamos:
I. Recursos de A, G, F e I:
O recorrente A foi condenado na pena conjunta de 5 anos e 3 meses de prisão, resultante do cúmulo jurídico das seguintes penas parcelares de prisão: 2 anos e 3 meses e 1 ano e 9 meses pela co-autoria de dois crimes de jogo fraudulento; 3 anos e 1 ano e 6 meses pela co-autoria de dois crimes de burla, um dos quais na forma tentada.
A recorrente G foi condenada na pena conjunta de 2 anos e 6 meses de prisão, resultante do cúmulo jurídico das seguintes penas parcelares de prisão: 1 ano por cumplicidade no cometimento de cada um de dois crimes de jogo fraudulento; 2 anos por cumplicidade na prática de um crime consumado de burla e 6 meses por cumplicidade na prática de um outro crime de burla, este na forma tentada.
Cada um dos recorrentes F e I foi condenado na pena conjunta de 4 anos de prisão, em resultado do cúmulo jurídico das seguintes penas parcelares de prisão: 1 ano e 9 meses pela co-autoria de cada um de dois crimes de jogo fraudulento; 2 anos e 9 meses e 1 ano pela co-autoria de dois crimes de burla, um na forma consumada e outro na forma tentada, respectivamente.
Sustentam estes recorrentes, em essência, que os crimes de jogo fraudulento por que foram condenados se encontram numa relação de concurso aparente com os crimes de burla por que igualmente foram condenados, o que deveria ter levado o acórdão impugnado a excluir a aplicação de uma das normas punitivas, com a inerente repercussão na medida das penas. Acham os recorrentes A e G que apenas deveriam ter sido punidos por jogo fraudulento; entendem os recorrentes F e I que apenas deveriam ter sido punidos por burla.
Está em causa a temática do concurso de infracções.
Sobre esta matéria, dispõe o artigo 29.°, n.° 1, do Código Penal, que o número de crimes se determina pelo número de tipos de crime efectivamente cometidos, ou pelo número de vezes que o mesmo tipo de crime for preenchido pela conduta do agente. A doutrina considera que esta norma adopta o critério teleológico na destrinça entre unidade e pluralidade de infracções, fazendo depender o número destas do juízo de censurabilidade, sendo cometidas tantas infracções quantas as vezes que a conduta seja susceptível de reprovação.
O acórdão condenatório laborou no pressuposto do concurso efectivo de infracções e efectuou a punição em função do número de tipos preenchidos.
Os recorrentes contrapõem que apenas havia lugar à punição por uma das normas incriminadoras (jogo fraudulento ou burla), já que a aplicação de uma importa a exclusão da outra, por via de subsidiariedade ou consumpção.
Só que, para chegarem a tal conclusão, incorrem em manifesta petição de princípio, só assim conseguindo dar ao caso uma roupagem que o aproxime do concurso aparente de infracções. Partem, com efeito, do pressuposto de que os tipos incriminadores preenchidos pelas suas condutas tutelam os mesmos bens jurídicos, o que, salvo melhor juízo, não é exacto.
A análise das normas em confronto (artigos 6.°, n.° 1, da Lei 8/96/M, e 211.° do Código Penal) demonstra que são diferentes e não sobreponíveis os bens jurídicos por elas protegidos. No caso da burla, a protecção vai dirigida ao património, como é sabido. No caso do jogo fraudulento, previsto no aludido artigo 6.°, embora a norma possa proteger reflexamente o património, parece-nos que o valor jurídico primacial objecto de protecção é a preservação da verdade da sorte, da verdade da álea do jogo. Aliás, só esta diferença de bens jurídicos atingidos justifica que, no plano da acção, a mesma conduta tenha logrado consumar um dos ilícitos (jogo fraudulento) e não tenha passado de tentativa relativamente ao outro (burla).
Pois bem, quer o concurso real (pluralidade de crimes com pluralidade de acções), quer o concurso ideal, nas suas duas modalidades, heterogéneo e homogéneo (pluralidade de crimes realizados através de uma acção) integram o designado concurso efectivo de infracções, a punir em função do número de tipos preenchidos. Se porventura uma conduta só formalmente preenche vários tipos legais, mas por via de interpretação das normas se conclui que essa conduta é exclusiva e totalmente absorvida por um só tipo, de modo tal que todos os demais devem ceder, então, aí sim, estamos perante o concurso aparente ou impuro, em que a aplicação de uma das normas legais em convergência importa a exclusão da aplicação de outra, na observância das regras da especialidade, subsidiariedade, consumpção e facto posterior não punível. No mesmo sentido, cf., v.g., acórdão de 24 de Setembro de 2004, do Supremo Tribunal de Justiça português, exarado no processo 1795/04, da 3.ª Secção:
Sucede que as condutas imputadas aos recorrentes atingem normas cujo âmbito de protecção vai dirigido a bens jurídicos diversos, conforme acabámos de justificar. Assim, ainda que porventura seja defensável a existência de uma certa unidade de acção, a ofensa de bens jurídicos diversos, querida e procurada pelos recorrentes, demanda a punição pelos diversos tipos realizados, dado o juízo de censura ou reprovação que lhes é imputável pela ofensa a cada um daqueles bens, no quadro do critério teleológico adoptado pelo apontado artigo 29.°, n.° 1, do Código Penal.
Improcedem, pois, estes recursos.
II. Recursos de B, H e M:
O recorrente B foi condenado na pena conjunta de 2 anos e 3 meses de prisão, resultante do cúmulo jurídico das penas parcelares de 1 ano e 9 meses e de 1 ano e 6 meses de prisão, respectivamente pela co-autoria de um crime de jogo fraudulento e de um crime de burla na forma tentada.
Cada um dos recorrentes H e M foi condenado na pena conjunta de 3 anos e 6 meses de prisão, resultante do cúmulo jurídico das seguintes penas parcelares de prisão: 1 ano e 6 meses pela co-autoria de cada um de dois crimes de jogo fraudulento; 2 anos e 6 meses pela co-autoria de um crime consumado de burla e 9 meses pela co-autoria de um crime tentado de burla.
Estes três recorrentes pretendem ver reduzidas as penas, que reputam excessivas, entendendo o primeiro que a pena global não deverá ir além dos 2 anos de prisão, e pugnando os restantes por penas globais não superiores a 3 anos, todos sustentando que a respectiva execução deve ser suspensa.
Cremos que os argumentos em que fundam a suas pretensões não procedem, como aliás o Ministério Público em primeira instância já salientou na sua resposta às motivações dos recursos.
Nem há excesso nas penas parcelares, que se situam no patamar inferior das molduras, aliás próximo dos mínimos legais, nem o há nas penas dos cúmulos, que observam a limitação do artigo 71.°, n.° 2, do Código Penal, situando-se, também estas num patamar baixo da moldura do cúmulo. E não pode esquecer-se que o crime ocorre num círculo de interesses ligados à principal actividade económica de Macau, em que a questão da prevenção geral positiva tem um peso relevante na determinação da medida da pena.
Ademais, o tribunal tomou em devida conta os fins das penas, os critérios que presidem à sua determinação e, bem assim, as demais circunstâncias atendíveis, pelo que, sabendo-se que os parâmetros em que se move a determinação da pena, adentro da chamada teoria da margem de liberdade, não são matemáticos, há que aceitar a solução encontrada pelo tribunal do julgamento, a menos que o resultado se apresente ostensivamente intolerável, por desajustado aos fins da pena e à culpa que a delimita, o que não é o caso.
Assim, e sendo as penas de manter, como nos parece, só se coloca a questão da eventual suspensão no caso do recorrente B, pois só quanto a ele se verifica o necessário requisito formal do artigo 48.° do Código Penal. O acórdão recorrido explicou suficientemente as razões da não suspensão, afigurando-se que o juízo emitido a tal propósito não merece censura. Na verdade, tomando em conta os aspectos a considerar nos termos do artigo 48.° do Código Penal, não é de formular um juízo de prognose favorável relativamente ao comportamento do recorrente no futuro. Apesar de não lhe serem conhecidos antecedentes criminais, a sua personalidade, desde logo manifestada nos factos, na forma como aceitou o plano engendrado e contribuiu para lhe dar corpo, é reveladora de uma insensibilidade a valores muito caros à organização económica de Macau, o que não aconselha a que o tribunal, mesmo com a margem de risco que sempre tem que correr nos casos de suspensão da execução da pena, possa apostar na simples censura do facto e ameaça da prisão para ter por satisfeitas, de forma adequada e suficiente, as finalidades da punição. E, sabido que uma das finalidades da pena é justamente a protecção dos bens jurídicos violados, poderia a suspensão colocar este desiderato em xeque e fazer abalar a confiança da comunidade na tutela da norma violada.
Ante o exposto, improcedem também os fundamentos destes recursos.
III. Recurso de E:
Este recorrente foi condenado na pena conjunta de 4 anos de prisão, resultante do cúmulo jurídico das seguintes penas parcelares: 1 ano e 9 meses pela co-autoria de cada um de dois crimes de jogo fraudulento; 2 anos e 9 meses pela co-autoria de um crime consumado de burla e 1 ano pela co-autoria de um crime tentado de burla.
Também ele sustenta que há uma relação de consumpção entre os crimes de jogo fraudulento e os crimes de burla por que foi condenado, o que deveria ter levado o acórdão a puni-lo apenas por jogo fraudulento. Além disso, e para a hipótese de não vingar esse seu entendimento, pretende ver reduzidas as penas, que considera excessivas, achando que a pena conjunta não deve ultrapassar os 3 anos e 6 meses.
Os argumentos em que se funda este recurso reconduzem-se aos que foram alinhados nos recursos de A e outros e de B e outros versados nos pontos I e II deste parecer. Damos aqui por reproduzido tudo quanto dissemos a propósito dos fundamentos dos recursos tratados naqueles pontos.
Por consequência, também este recurso se mostra improcedente.
IV. Recursos de D, N e L
Cada um destes recorrentes foi condenado na pena conjunta de 4 anos de prisão, resultante do cúmulo jurídico das seguintes penas parcelares: 1 ano e 9 meses pela co-autoria de cada um de dois crimes de jogo fraudulento; 2 anos e 9 meses pela co-autoria de um crime consumado de burla e 1 ano pela co-autoria de um crime tentado de burla.
Estes recorrentes imputam ao acórdão recorrido uma série de vícios relativos à matéria de facto (insuficiência da matéria de facto para a decisão, erro notório na apreciação da prova e contradição insanável na fundamentação) e ainda erros na aplicação da lei, quer no tocante ao concurso de infracções, quer quanto à determinação da medida das penas.
Vejamos, começando pela alegada insuficiência para a decisão da matéria de facto provada.
O que os recorrentes neste ponto alegam é que foram condenados só com base na versão unilateral do primeiro arguido.
Não é verdade, bastando uma rápida leitura da fundamentação do acórdão para concluir em sentido contrário. Mas, ainda que tal fosse exacto, isso não configuraria a imputada insuficiência. Quando o legislador fala em insuficiência da matéria de facto pretende aludir à omissão de abordagem e tratamento de factos que fazem parte do objecto do processo, quer porque integram a acusação ou a pronúncia, quer porque foram carreados pela defesa, ou mesmo porque resultam da discussão da causa e se revelam importantes para o esclarecimento da globalidade do objecto do processo. Ora, não é isto, manifestamente, o que os recorrentes abordam neste ponto da sua motivação. O que eles põem em causa é a apreciação das provas feita pelo tribunal, actividade que, como é sabido, está coberta pelo princípio da livre apreciação da prova, o que a torna insindicável.
Improcede este fundamento dos recursos.
Quanto ao erro notório na apreciação da prova, os recorrentes intentam convencer, por um lado, que não há qualquer prova material que permita concluir que houve jogo fraudulento em 08/06/2017 (primeira vez), e, por outro, que nada os permite ligar ao cometimento dos crimes de burla. Como é óbvio, os recorrentes traçam a sua própria leitura da prova, adoptando uma visão e uma leitura notoriamente afeiçoadas ao interesse directo que detêm no desfecho do caso. Intentam retirar dividendos da circunstância de não terem sido surpreendidos em flagrante, na primeira das ocasiões em que desenvolveram a actividade de jogo fraudulento, e procuram demarcar-se do contacto directo com os ofendidos, para fugirem à punição pelos crimes de burla. Mas o certo é que colaboraram conscientemente nas duas acções, fazendo-se passar, o D por croupier, os dois restantes por clientes, assim encenando uma atmosfera enganadora e contribuindo para fazer crer ao ofendido S que estava a jogar numa sala VIP, o que levou a que fosse vítima de trapaça no jogo e ludibriado a abrir mão de CNY ¥400,000.00, tal como contribuíram para enganar os demais ofendidos, fazendo-lhes crer que jogavam numa legal e regular sala VIP, só não conseguindo determiná-los enganosamente a abrir mão de avultadas importâncias por motivos de todo estranhos às suas vontades, devido à intervenção das autoridades. Os recorrentes prestaram-se a este papel, quer na primeira, quer na segunda sessão, sendo avultadas, variadas e irrefutáveis as provas que permitiram concluir nesse sentido, incluindo as declarações prestadas perante o Juiz de Instrução Criminal, que tiveram que ser lidas em audiência por via da mudança de versões entretanto ensaiadas pelos arguidos.
Pois bem, o erro notório na apreciação da prova pressupõe que a partir de um facto se extraia uma conclusão inaceitável, que sejam preteridas regras sobre o valor da prova vinculada ou tarifada, ou que se violem as regras da experiência ou as leges artis na apreciação da prova – acórdão do Tribunal de Última Instância, de 4 de Março de 2015, exarado no Processo n.° 9/2015. Ora, nada disto vem posto em causa, não vindo explicitada, nem se apurando, a existência de qualquer erro, muito menos o erro notório susceptível de enquadrar o vício previsto no artigo 400.°, n.° 2, alínea c), do Código de Processo Penal.
Improcede igualmente este fundamento dos recursos.
Em matéria de contradição insanável, os recorrentes isolam uma passagem da fundamentação do acórdão, onde se diz que este casino não possuía fichas verdadeiras ou dinheiro, eles de facto nem tinham capital para pagar aos clientes se estes ganhassem, então de que maneira podiam dizer que usaram meios normais para explorar um casino falso, para, a partir dela, porem em causa a razão da condenação por jogo fraudulento, qual seja a de ter havido cooperação entre os recorrentes e os demais arguidos na exploração de um casino falso onde lograram garantir a sorte de forma fraudulenta.
Não divisamos a falada contradição. Aquela passagem da fundamentação visa rebater a tentativa ensaiada, nomeadamente pelo primeiro arguido, de fazer passar a ideia de que, embora o casino fosse falso ou ilegal, ele teria funcionado, da primeira vez, como casino normal, sem recorrer à trapaça. E as afirmações constantes da referida passagem são pertinentes e não entram em contradição com a condenação por jogo fraudulento. É evidente que as fichas não eram verdadeiras, já que não representavam, na verdade, um valor que pudesse ser rebatido ou recuperado, caso porventura o portador não as quisesse utilizar. Tudo era encenado e a álea do jogo era falseada através de trapaça. Daí a fraude do jogo. Fraude em que os três recorrentes participaram voluntária e conscientemente, através do seu papel de actores, um como croupier e os outros como clientes, numa encenação que eles bem sabiam destinada a enganar terceiros.
Também este fundamento dos recursos soçobra.
Por fim, em sede de erros na aplicação da lei, quer no tocante ao concurso de infracções, quer quanto à determinação da medida das penas, constata-se que os argumentos utilizados nestes recursos são também similares aos que foram alinhados nos recursos de A e outros e de B e outros versados nos pontos I e II deste parecer. Damos aqui igualmente por reproduzido tudo quanto dissemos a propósito dos recursos tratados naqueles pontos e da respectiva improcedência.
Em suma, todos os fundamentos destes recursos se revelam improcedentes.
V. Recursos de C, K e O
Cada um destes recorrentes foi condenado na pena conjunta de 4 anos de prisão, resultante do cúmulo jurídico das seguintes penas parcelares: 1 ano e 9 meses pela co-autoria de cada um de dois crimes de jogo fraudulento; 2 anos e 9 meses pela co-autoria de um crime consumado de burla e 1 ano pela co-autoria de um crime tentado de burla.
Nas suas motivações de recurso sustentam que o acórdão padece de erro notório na apreciação da prova e de erros na aplicação da lei, desta feita na qualificação do segundo crime de burla em função do valor, na punição do concurso de infracções, e ainda quanto à determinação da medida das penas.
Vejamos a questão do erro notório.
Estes recorrentes sustentam que o tribunal recorrido não dispunha de elementos que permitissem dar por assente a matéria do ponto 12 dos factos provados. Tal como os recorrentes D, N e L também estes procuram convencer que não há provas para concluir que a primeira sessão de jogo foi fraudulenta e que estão alheios à burla ocorrida durante essa sessão, de que foi vítima S.
Mais uma vez, há que dizer que os recorrentes traçam a sua própria leitura da prova, privilegiando uma visão notoriamente afeiçoada ao interesse directo que detêm no desfecho do caso, sendo aqui válidas, mutatis mutandis, as considerações que tecemos a propósito do erro notório também invocado nos recursos de D, N e L, em razão do que se afigura não padecer o acórdão, e nomeadamente o ponto 12 dos factos provados, de qualquer erro na apreciação da prova, também não se detectando qualquer situação de dúvida ou de non liquet que devesse ser valorada em favor dos recorrentes por via do princípio in dubio pro reo.
Improcede este primeiro fundamento dos recursos.
Dizem ainda os recorrentes que, não tendo havido prejuízo efectivo para os ofendidos, no segundo episódio de burla, deveriam tão somente ter sido punidos por tentativa da prática de um crime de burla simples, que não por tentativa de um crime de burla qualificada em razão do valor consideravelmente elevado.
Não têm razão. Tendo ficado provado que pretendiam obter, à custa do correspectivo prejuízo dos ofendidos, um montante de valor consideravelmente elevado, outro não podia ter sido o enquadramento jurídico dos factos, como bem notou o Ministério Público na sua resposta, pelo que também este argumento dos recursos improcede.
Por fim, e quanto às questões do concurso de infracções e da medida das penas, verifica-se que os argumentos utilizados nestes recursos são também similares aos que foram alinhados nos recursos de A e outros e de B e outros versados nos pontos I e II deste parecer. Damos aqui novamente por reproduzido tudo quanto dissemos a propósito dos recursos tratados naqueles pontos e da respectiva improcedência.
Por consequência, todos os fundamentos destes recursos se revelam também improcedentes.
Ante quanto se deixa exposto, deve negar-se provimento a todos os recursos”; (cfr., fls. 2497 a 2503).

*

Nada parecendo obstar, passa-se a decidir.

Fundamentação

Dos factos

2. Do julgamento resultou provada a seguinte matéria da acusação, (nenhum facto ficando por provar).

Tem a decisão o teor seguinte:

“ (1)
O 1º arguido A tinha ajudado alguém a abrir casino falso no Interior da China, com intenção de obter benefício ilegítimo, daí apreendeu como criar casino falso para defraudar o dinheiro de terceiros. Desde 2015, o arguido A começou a recrutou um grupo de pessoas para participar, através de colaboração de esforços e divisão de tarefas, no plano de alugar uma suite num hotel em Macau para ser transformada em sala de jogo VIP. Essas pessoas iam fingir ser dono da sala VIP, pessoal de relações públicas, funcionário de tesouraria, croupier, guarda de segurança, empregado de mesa etc., e, posteriormente, iam angariar no Interior da China pessoas com interesse no jogo, mas que nunca tinham vindo a Macau ou que não conheciam concretamente a situação das salas de jogo VIP para jogar nesse casino falso.
(2)
O 1º arguido A recrutou C (3º arguido), D (4º arguido), E (5º arguido), F (6º arguido), G (7ª arguida), H (8º arguido), I (9º arguido), J (10º arguido), K (11º arguido), L (12º arguido), M (13º arguido), N (14º arguido), O (15º arguido), P (16º arguido), Q (17ª arguida), R (18ª arguida) e W (suspeito). E G (7ª arguida) é a namorada do 1º arguido A.
(3)
No intuito de defraudar os clientes no sentido de obter o dinheiro deles através dos jogos realizados no casino falso aberto em Macau, os arguidos utilizavam distribuidores de cartas adaptados, fichas falsas, mesas de jogo de bacará desmontáveis, expositores de resultado de jogos anteriores, placas de aviso de limites de aposto e cartas de jogo. Todos os utensílios de jogo, bem como os uniformes dos empregados e guardas de segurança do casino falso e aparelhos walkie-talkie foram adquiridos e fornecidos pelo arguido A ou através do arguido E.
(4)
Os arguidos A E e C transportaram separadamente o material e utensílios de jogo supramencionados para Macau antes de 31 de Julho de 2015. Em 31 de Julho de 2015, sob instruções do arguido A, o arguido C deslocou-se ao mini armazém “XX迷你倉” no XXXXXXX, com objectivo de alugar um mini armazém para guardar nele o material e utensílios de jogo.
(5)
Para que os jogadores acreditassem que o casino era verdadeiro, eles não necessitaram de levar com eles dinheiro, podendo a tesouraria do casino falso “emprestar” fichas aos clientes. Após os jogos, os arguidos iam recuperar o dinheiro aos clientes que tivessem perdido no jogo.
(6)
O ofendido S conheceu, através do amigo “T” (suspeito) um homem chamado de U (suspeito) que exercia a actividade de “bate-fichas” em Macau. No Princípio de Junho de 2017, o suspeito U convitou o ofendido S para jogar em Macau, dizendo-lhe que bastava o ofendido S pagar primeiro quatrocentos mil reminbi, ele podia levá-lo a jogar numa sala de jogo VIP na Plaza de XXX2 Macau. Acrescentou que, nesta sala de jogo VIP, podia emitir na sala de jogo VIP fichas no valor de quatro milhões de dólares de Hong Kong para o ofendido apostar no jogo. Ao que o ofendido acedeu e transferiu logo uma quantia de quatrocentos mil renminbi para uma conta bancária em nome de “V” no Interior de China, conta esta lhe foi dada pelo suspeito “T” via mensagem telefónica (cfr. imagens capturadas da tela do telemóvel a fls. 12 a 14 do inquérito).
(7)
Os suspeitos U e “T”, comunicaram a deslocação a Macau do ofendido S ao arguido A e seu grupo. Então, os arguidos A, G, F, D, C, N, H, L, E, Q, I, M, O, P, K e R, bem como os suspeitos W e U, entraram sucessivamente em Macau nos dias 7 e 8 de Junho de 2017 para fazerem o trabalho preparatório. Em 7 de Junho de 2017, a arguida G alugou os quartos nºs 2007, 2008, 2010 e 2123 no Hotel XXX3 Macau, para os arguidos alojarem.
(8)
Em 8 de Junho de 2017, pelas 11h45, sob instruções do arguido, A, a arguida, G, dirigiu-se ao Hotel XXX2 para efectuar o “check-in” da suite nº 2018 com o salvo-conduto para deslocação a Hong Kong e Macau passado em nome de X, no intuito de transformar a suite em sala de jogo VIP falsa. Segundo o registo de entrada e saída de X verificado pela polícia, esta não entrou mais em Macau depois de ter saído da Região em 8 de Abril de 2010. Dez minutos depois, os arguidos C, F, A, Q, H, L, I, D, N, E, P, M, K, O e R, bem como o suspeito W chegaram sucessivamente à suite nº 2018, com malas de viagem contendo no seu interior o material e utensílios de jogo e começaram a transformar a suite em sala de jogo VIP falsa. O arguido A prometeu dar, depois daquilo, um montante de mil dólares de Hong Kong, como remuneração, a cada um dos arguidos supra referidos.
(9)
No mesmo dia, à noite, pelas 20h19, os suspeitos U e “T” e o arguido, A, encontraram-se no lóbi do Hotel XXX2 com o ofendido, S, tal como foi combinado entre eles. O suspeito U apresentou o arguido A, ao ofendido, dizendo que o arguido A, era o dono da sala de jogo VIP. Depois, o ofendido foi encaminhado ao quarto nº 2018.
(10)
Naquela altura, a suite nº 2018 já foi transformada numa sala de jogo VIP com duas mesas de jogo de bacará e os outros arguidos estavam com uniformes, fazendo-se passar por guardas de segurança, croupieres, funcionários de tesouraria, empregados de mesa, “bate-fichas” e jogadores, o que levou o ofendido S a acreditar que ali era uma verdadeira sala de jogo VIP.
(11)
O suspeito U levou o ofendido S à mesa de jogo que era responsável pelo croupier desempenhado pelo arguido D. Na altura, o arguido D actuou em cooperação com o jogador desempenhado pelo arguido L, este simulou ganhar sempre no jogo, de maneira que o ofendido S acedesse em jogar naquela mesa de jogo por acreditar que a mesa lhe poderia trazer boa sorte. O suspeito U foi buscar à tesouraria falsa 200 fichas de jogo falsas de valor de $10.000,00 cada e entregou-as ao ofendido S, referindo-lhe, ao mesmo tempo, que a forma do jogo naquela mesa era “face/base”, i.e., o valor do prémio seria dobrado como também o valor da perda. O jogo começou depois de ser obtido o consentimento do ofendido S.
(12)
Na realidade, sob instruções do arguido A, o arguido D, que se fazia passar por croupier, já colocou as cartas no “shoe” (distribuidor de cartas) adaptado segundo a ordem previamente programada. O distribuidor tinha na sua parte lateral interior uma abertura, através da qual o arguido D podia ver os pontos das cartas. Além disso, o aparelho tinha um compartimento secreto no lado interior ao pé da saída de cartas que tinha a função de mudar a ordem das cartas. Assim, pela ordem das cartas especialmente programada e possibilidade de mudar a ordem, o arguido D controlou plenamente o resultado das jogadas. Quando o ofendido S pediu o “corte”, o arguido A, para não baralhar as cartas, rejeitou o seu pedido, dizendo, como pretexto, que o novo regulamento de casinos de Macau proibia a carta de corte. Então, o ofendido S perdeu mais do que ganhou no jogo. Após decorridas duas horas, o ofendido S “perdeu todas” as fichas.
(13)
No mesmo dia, à noite, pelas 22h23, os suspeitos U e “T”, e mais dois homens suspeitos de terem se envolvidos no delito acompanharam o ofendido S a sair da suite nº 2018, levando-o até ao hotel onde permaneceu. O suspeito U exigiu ao ofendido S a restituição de três milhões e quinhentos mil dólares de Hong Kong. Como não sabia da fraude no jogo, o ofendido consentiu em arranjar dinheiro para pagar a dívida.
(14)
Posteriormente, o ofendido S tomou conhecimento, através do seu amigo, de que o 20º andar do Hotel XXX2 era destinado aos quartos a alugar a clientes e não casino ou sala de jogo VIP. Suspeitando ser vítima duma fraude, o ofendido foi fazer queixa à polícia em 12 de Junho de 2017. O ofendido perdeu nesta ocorrência um montante total de quatrocentos mil renminbi.
(15)
Depois de o ofendido S ser levado para fora do quarto nº 2018, os arguidos procederam, de imediato, à reposição do quarto tal como era originalmente e arrumaram rapidamente o material e utensílios de jogo antes de deixarem o local.
(16)
Ao mesmo tempo, a arguida G fez o “check-out” no Hotel XXX3. Os arguidos A e H saíram do Hotel XXX2, dirigindo-se ao Hotel XXX3 para se encontrarem com a arguida, G, no sentido de se irem embora em conjunto de táxi. Os arguidos F, L, I, D, N, E, P, K e O, levaram com eles as malas de viagem contendo o material e utensílios de jogo e deslocaram-se, de táxi, ao Centro Industrial XXX, a fim de esconder no “mini armazém” alugado as malas de viagem contendo o material e utensílios de jogo, que seriam utilizados no próximo ilícito. Os arguidos saíram sucessivamente de Macau através do posto fronteiriço da Portas do Cerco e, depois de chegarem na China, cada um dos arguidos recebeu uma remuneração do arguido A no valor de mil a três mil dólares de Hong Kong. (cfr. auto de visionamento do VCD a fls. 79 a 122, 143 a 170 e 1024 a 1025 dos autos)
(17)
No final de 2016, o arguido A, conheceu B (2º arguido). Estando os dois muito interessados no plano de abrir sala de jogo falsa para defraudar o dinheiro de terceiros, os dois combinaram que o arguido A se responsabilizaria pelo dinheiro necessário (incluindo as despesas com arranjar pessoas e os ordenados destas, o aluguer de quartos de hotel e o material de jogo) e o arguido B, por angariar jogadores no Interior da China para jogarem em Macau e de recuperar dinheiro dos jogadores depois dos jogos. O arguido B iria obter 20% do dinheiro obtido.
(18)
Em Junho de 2017, o arguido B, contou a Z3, professora universitária que lhe dava aulas, que ele exercia a actividade de “bate-fichas” em casinos de Macau e lhe poderia dar a remuneração correspondente caso ela pudesse angariar pessoas a jogarem em Macau. Z3 acreditou no que ele disse.
(19)
Em 14 de Julho de 2017, Z3 telefonou ao arguido B, dizendo que ia de Hong Kong a Macau com quatro alunos em 18 de Julho de 2017 à tarde. O arguido B informou logo o arguido A disso, para ele fazer o trabalho preparatório e alugar uma suite no Hotel XXX1 Macau destinada à prática do delito.
(20)
Em 17 e 18 de Julho de 2017, os arguidos A, G, F, D, C, H, L, E, Q, I, N, M, O, P, K, J, R e B, entraram em Macau. A arguida G fez o “check-in” do quarto nº 1823 no Hotel XXX3 para os demais arguidos alojarem e permanecerem. (cfr. auto de visionamento do VCD a fls. 1036 a 1050 dos autos).
(21)
Em 18 de Julho de 2017, pela manhã, depois de se encontrarem, os arguidos A e B deslocaram-se ao Hotel XXX1 para efectuar o “check-in” da suite nº 2101 utilizando o nome de B. Ao meio-dia daquele dia, cerca das 12h26, os arguidos C, D, E, L, N, K, O, F e I foram sucessivamente ao “mini armazém” no 6º andar do Bloco III do Centro Industrial XXX, para buscar nove malas de viagem contendo no interior as mesas de jogo desmontáveis e o material de jogo, para serem lavadas à suite nº 2101 no Hotel XXX1. Os demais arguidos chegaram sucessivamente à referida suite de hotel. Os arguidos transformaram em conjunto a suite em sala de jogo VIP. (cfr. auto de visionamento do VCD a fls. 1026 a 1035 dos autos)
(22)
No mesmo dia, pelas 18h00, o arguido B, arranjou uma viatura para ir buscar Z3, Y (ofendido), Z (ofendido), Z1 (ofendido) e Z2 (ofendido) ao Terminal Marítimo Pac On, que acabaram de chegar a Macau de Hong Kong, levando-os ao restaurante perto do Hotel XXX1 para tomarem refeição. Na altura, o arguido B alegou trabalhar no casino de XXX1 e poder assinar fichas para os ofendidos jogarem no casino e assim convidou-os para lá ir. Os quatro ofendidos agradeceram pela hospitalidade do arguido B e aceitaram ir jogar.
(23)
No mesmo dia, à noite, pelas 22h00, e na sequência do jantar, o arguido B levou Z3 mais os quatro ofendidos à suite nº 2010 do Hotel XXX1. A suite já foi transformada em sala de jogo VIP, com duas mesas de jogo de bacará, pelo arguido, A, com os demais arguidos. Foi ainda colocado fora da porta da suite um equipamento de inspecção de segurança com “guardas de segurança”. O arguido A desempenhou o papel de dono da sala de jogo VIP, os arguidos C, J e P estavam vestidos com uniforme de guarda de segurança para se disfarçarem de guardas de segurança, as arguidas Q e R estavam vestidas com uniforme para se disfarçarem de empregadas de casino, os arguidos D, E e K estavam vestidos com uniforme para se disfarçarem de croupieres, o arguido I fez-se passar por funcionário da tesouraria, os arguidos F, M e O fingiram ser “bate-fichas” e os arguidos H, L, N fingiram ser jogadores. A arguida G também estava na sala de jogo VIP. Visto isso, os quatro ofendidos não duvidaram de nada, pensando que estavam numa verdadeira sala de jogo VIP.
(24)
Z3 referiu que não sabia jogar, pelo que ficou num lado a descansar. Os quatro ofendidos Y, Z, Z1 e Z2 foram organizados para jogar na mesa de jogo afastada do bar. O croupier de tal mesa de jogo foi desempenhado pelo arguido D. O ofendido Y sacou vinte mil dólares de Hong Kong para o arguido B trocar em fichas, mas o arguido B referiu que o montante de vinte mil era pouco e que podia emprestar aos quatro ofendidos duzentos mil reminbis para eles jogarem, bem como podiam devolver o dinheiro depois. Os quatro ofendidos concordaram assumir juntos o empréstimo, então o arguido B foi ao balcão de bar e trocou, junto do funcionário da tesouraria desempenhado pelo arguido, I, uma quantia em numerário por fichas falsas de valor nominal de trezentos mil dólares de Hong Kong e entregou-as aos quatro ofendidos. Os quatro ofendidos jogaram rotativamente com tais fichas.
(25)
Na realidade, sob instruções do arguido A, o arguido D, que se fazia passar por croupier, já colocou as cartas no “shoe” (distribuidor de cartas) adaptado segundo a ordem previamente programada. O distribuidor tinha na sua parte lateral interior uma abertura, através da qual o arguido D podia ver os pontos das cartas. Além disso, o aparelho tinha um compartimento secreto no lado interior ao pé da saída de cartas que tinha a função de mudar a ordem das cartas. Assim, pela ordem das cartas especialmente programada e possibilidade de mudar a ordem, o arguido D controlou plenamente o resultado das jogadas. Nesta situação, os quatro ofendidos perderam basicamente no jogo. A fim de ganhar dinheiro mais rapidamente, o grupo do arguido A até fixou o limite mínimo de aposta em 20 mil dólares de Hong Kong em cada jogada.
(26)
Em 19 de Julho de 2017, cerca da 0h10, os investigadores da Polícia Judiciária efectuaram uma investigação à referida suite, na qual interceptaram os arguidos C, P, A, G, D, O, Q, L, H, I, J, N, R, M, K, F, E e B.
(27)
Na altura, os arguidos C, P e J estavam vestidos com o uniforme de guarda de segurança de casino, os arguidos D, E e K estavam vestidos com o uniforme de croupier e os arguidos I, Q e R estavam vestidos com o uniforme de empregado de casino. E a arguida G também estava na sala de jogo VIP.
(28)
Ao ver o pessoal policial, o arguido D, que se disfarçou de croupier, mandou para o chão um papel contendo os números de ordem de jogadas, o qual foi descoberto e apreendido pelo investigador. No local foram encontrados os seguintes objectos (cfr. autos de busca e apreensão a fls. 246 a 263 dos autos):
No espaço perto do balcão de bar na sala de estar:
1. Uma mesa de jogo de bacará desmontável (mesa de jogo nº 1);
2. Uma saia de mesa de jogo, de cor vermelha;
3. Uma toalha de mesa de jogo de bacará;
4. Um distribuidor de cartas (“shoe”) de cor preta (com um baralho de poker no seu interior);
5. Um computador de cor preto e prata nº XXXXXXX;
6. Um monitor com letras “AOC”;
7. Uma placa de sinalização com a expressão “PONTIE16”, para indicar os valores de apostas no jogo de bacará;
8. Uma placa de sinalização com caracteres chineses “包臺”;
9. Uma câmera de vigilância falsa de forma semi-circular;
10. Uma placa de sinalização com caracter chinês “庄” (banqueiro);
11. Uma placa de sinalização com caracter chinês “閒” (jogador);
12. Um baralho de cartas de Poker;
13. Duas tomadas brancas;
14. Um teclado numérico de marca “IBM”, com caracteres chineses “庄(banqueiro)、閒 (jogador)、和 (empate)”
15. Dois transformadores pretos;
16. Duas bases para prato de bola;
17. Trinta e uma fichas redondas, de cores rosa e preta, contendo a expressão “10,000 VIP CASINSO”, perfazendo um valor total de 310.000;
18. Dezoito fichas redondas, de cores verde e preta, contendo a expressão “1.000 VIP CASINSO”, perfazendo um valor total de 18.000;
19. Vinte e duas fichas quadradas, de cores verde e preta, contendo a expressão “50.000 VIP CASINSO”, perfazendo um valor total de 1.100.000;
20. Vinte e oito fichas redondas, de cores laranja e preta, contendo a expressão “50.000 VIP CASINSO”, perfazendo um valor total de 1.400.000;
21. Treze fichas redondas, de cores verde e preta, contendo a expressão “500 VIP CASINSO”, perfazendo um valor total de 6.500;
22. Oito fichas quadradas, de cores rosa e preta, contendo a expressão “10.000 VIP CASINSO”, perfazendo um valor total de 80.000;
23. Quarenta e seis fichas redondas, de cores rosa e preta, contendo a expressão “100.000 VIP CASINSO”, perfazendo um valor total de 4.600.000;
24. Quarenta e seis fichas quadradas, de cores azul e preta, contendo a expressão “100.000 VIP CASINSO”, perfazendo um valor total de 4.600.000;
25. Vinte e cinco fichas redondas, de cores amarela e preta, contendo a expressão “5.000 VIP CASINSO”, perfazendo um valor total de 125.000.

No espaço afastado do balcão de bar na sala de estar:
26. Uma mesa de jogo de bacará desmontável (mesa de jogo nº 2);
27. Um distribuidor de cartas (“shoe”) de cor preta (com um baralho de poker no seu interior);
28. Dois pratos de bola;
29. Uma câmera de vigilância falsa de forma semi-circular;
30. Cinquenta e seis fichas rectangulares de $100.000;
31. Um monitor para computador AOC;
32. Dois cabos de alimentação;
33. Um ecrã para mostrar valores de apostas no jogo de bacará;
34. Cinquenta fichas redondas de $100.000;
35. Quarenta fichas redondas de $50.000;
36. Vinte e cinco fichas rectangulares de $10.000;
37. Trinta fichas redondas de $1.000;
38. Dezasseis fichas redondas de $500;
39. Doze fichas quadradas de $50.000;
40. Vinte e seis fichas redondas de $5.000;
41. Uma placa de sinalização indicando banqueiro;
42. Uma placa de sinalização indicando jogador;
43. Um baralho de Poker;
44. Cinquenta fichas redondas de $100.000;
45. Uma ficha redonda de $5.000;
46. Um detector de notas ultravioleta;
47. Um mini computador;
48. Um teclado numérico;
49. Dois adaptadores de corrente eléctrica;
50. Uma saia de mesa de jogo de cor vermelha;
51. Uma toalha de mesa de jogo de bacará;
52. Seis fichas quadradas de $100.000 (colocadas no lugar nº 5 da mesa de jogo nº 2, à frente do lugar onde se sentou o ofendido, Z2);
53. Oito fichas redondas de $100.000 (colocadas no lugar nº 5 da mesa de jogo nº 2, à frente do lugar onde se sentou o ofendido, Z2);
54. Duas fichas redondas de $50.000 (colocadas no lugar nº 5 da mesa de jogo nº 2, à frente do lugar onde se sentou o ofendido, Z2);
55. Quatro fichas redondas de $10.000 (colocadas no lugar nº 5 da mesa de jogo nº 2, à frente do lugar onde se sentou o ofendido, Z2);
56. Uma ficha redonda de $5.000 (colocadas no lugar nº 5 da mesa de jogo nº 2, à frente do lugar onde se sentou o ofendido, Z2);
57. Trinta e duas fichas quadradas de $100.000 (colocadas no lugar nº 5 da mesa de jogo nº 2, à frente do lugar onde se sentou o ofendido, Z2);
58. Duas fichas redondas de $100.000 (colocadas no lugar nº 5 da mesa de jogo nº 2, à frente do lugar onde se sentou o ofendido, Z2);

Em cima duma mesa junta ao quarto de massagem:
59. Um detector metálico portátil;
60. Uma placa com caracteres chineses “物品檢查 (Inspecção de artigos)”;
61. Um aparelho walkie-talkie;

No armário por baixo do balcão de bar:
62. Vinte e seis fichas rectangulares, de cor verde, contendo a expressão “50,000 VIP CASINSO”, perfazendo um valor total de 130.000;
63. Noventa e sete fichas, de cor castanha, contendo a expressão “10,000 VIP CASINSO”, perfazendo um valor total de 970.000;
64. Setenta e cinco fichas redondas, de cor-de-rosa, contendo a expressão “100,000 VIP CASINSO”, perfazendo um valor total de 7.500.000;
65. Cinquenta e cinco fichas redondas, de cor-de-rosa, contendo a expressão “10,000 VIP CASINSO”, perfazendo um valor total de 550.000;
66. Três fichas redondas, de cor verde, contendo a expressão “1,000 VIP CASINSO”;
67. Cento e dez fichas quadradas, de cor azul, contendo a expressão “100,000 VIP CASINSO”, perfazendo o valor total de 11.000.000;
68. Uma placa de sinalização com caracteres chineses “籌碼兌換 (troca de fichas)”;
69. Uma placa de sinalização com caracteres chinese “貴賓廳 (sala de VIP)”;
70. Dois cartões-chave com capas do quarto do XXX1 Club, contendo a expressão “Mr Zheng 2010”;
71. Uma base para prato de bola;
72. Duas caixas de acrílico transparentes contendo no seu interior cartas de Poker colocadas na ordem pré-programada;
73. Um papel no qual estava escrito “合4人 (no total 4 pessoas)”;

Num quarto da suite:
74. Uma mala de viagem preta (A), de marca: KAI WEI, contendo no seu interior 27 caixas de cartas de Poker, várias cartas de Poker, 9 cartas de corte, um cartão vermelho e um amarelo, uma ficha de nº XXXXXX, um saco com placas de números, uma placa de sinalização com caracter chinês “庄”;
75. Uma mala de viagem preta (B), de marca: SWISS POLO, contendo no seu interior 10 pacotes de cartas de Poker (cada um destes continha 12 maços de cartas de Poker) , 2 baralhos de cartas de Poker, 1 maço vazio de cartas de Poker, vários tiras de papel contendo as expressões “XXX環球娛樂有限公司(XXX Global Entretenimento Limitada)” “XXX會 (Clube de VIP XXX)” e “正式借款單 (talão formal de empréstimo)”, várias fichas de registos de resultados de bacará, 1 caixa de acrílico transparente com fechadura contendo no seu interior um baralho de cartas de Poker colocadas na ordem pré-programada, um objecto redondo de cor vermelha e 3 caixas de cartas de Poker;
76. Uma mala de viagem preta (C), de marca: RURUKADI, contendo no seu interior 2 sacos de fitas para amarração, 1 computador de cor de prata com referência “XXXXXX”, 2 teclados numéricos com caracteres chineses “庄 (banqueiro)、閒 (jogador)、和 (empate)”, 1 par de tesouras, 1 chave de fenda, 1 fita métrica, 1 rato para computador, 1 placa de cor dourada com letras “MGM”, 2 bases, de cor de prata, para placa de sinalização, 1 placa acrílica preta contendo os caracteres chinês “使用說明 (manual de utilização)” e 1 transformador preto;
77. Uma mala de viagem preta (D) , de marca: LONGFA, contendo no seu interior 5 lâmpadas, 1 placa de sinalização contendo os caracteres chineses “休息 (intervalo)”, 1 chave de fenda, 1 saco de parafusos, 2 cintos de pele de cor castanha, 1 x-acto e 2 rolos de fita cola;
78. Uma mala de viagem preta (E), de marca: NAN XIANG;
79. Uma mala de viagem preta (F), de marca: AOBAOTE, contendo no seu interior 1 camisa branca com mangas cumpridas, 2 calças pretas, 2 coletes pretas, 1 capa plástica azul para documentos, 1 maço de talões de empréstimo;
80. Uma mala de viagem preta (G), de marca: GLENFIDDICH, contendo no seu interior 1 boné militar verde com letras “BBA”, 1 capa preta em pele e 1 baralho de Poker;
81. Uma mala de viagem preta (H), de marca: LONGFA, contendo no seu interior 2 sacos de fitas para amarração, 170 fichas quadradas com a expressão “100,000 VIP CASINSO”, perfazendo um valor total de 17.000.000, 30 fichas quadradas com a expressão “50,000 VIP CASINSO”, perfazendo um valor total de 1.500.000, 39 fichas quadradas com a expressão “10,000 VIP CASINSO”, perfazendo um valor total de 390.000, 55 fichas redondas vermelhas com a expressão “100,000 VIP CASINSO”, perfazendo um valor total de 5.500.000 e 2 fichas redondas, de cor de laranja, com a expressão “100,000 VIP CASINSO”, perfazendo um valor total de 200.000;
82. Uma mala de viagem vermelha, de marca: NAXXIANG, contendo no seu interior a estrutura metálica da mesa de jogo nº 2;
83. Uma mala de viagem castanha, de marca: NAXXIANG, contendo no seu interior a estrutura metálica da mesa de jogo nº 1 e um x-acto;
84. Uma mala de viagem vermelha, de marca: NAXXIANG, contendo no seu interior os tampos das mesas de jogo nºs 1 e 2;
85. Uma mala de viagem lilás, de marca: NAXXIANG, contendo no seu interior os rebordos em madeira das mesas de jogo nºs 1 e 2;
86. Um papel colocado numa cadeira perto da mesa de jogo nº 2, no qual estavam escritas várias combinações de números.
(29)
Os objectos supra indicados eram o material, utensílios ou instrumentos de jogo utilizados pelos arguidos para criar o casino falso.
(30)
Efectuada a análise das várias combinações de números constantes do papel encontrado numa cadeira da mesa de jogo nº 2, verificou-se que se, numa jogada, as cartas sejam distribuídas segundo a ordem das combinações numéricas, o jogador vence ou empate a jogada, praticamente vence, se trocar a ordem da primeira carta com a segunda carta da combinação, o banqueiro vence. Depois, foi realizado o exame ao “shoe” na mesa de jogo nº 2 e verificou-se que o “shoe” foi adaptado, tendo um buraquinho na placa frontal, através do qual se pode ver os pontos das cartas. Além disso, por trás dessa placa existe uma fenda. Quando a pessoa encarregada da distribuição de cartas empurrar para cima a primeira carta até esta ficar dentro da fenda, a primeira e segunda cartas podem ser observadas pela abertura na placa, podendo a pessoa encarregada da distribuição de cartas escolher, entre as duas, a carta a distribuir. Tendo-se examinado as cartas de Poker colocadas no “shoe” da mesa de jogo nº 2 (onde ficaram os quatro ofendidos), verificou-se que as cartas foram colocadas em ordem correspondente às várias combinações numéricas constantes do papel. Assim, pela ordem das cartas de Poker especialmente programada e pelo “shoe” adaptado que permite a alteração da ordem das cartas, o resultado de jogadas é absolutamente controlado. (cfr. relatório a fls. 663 a 664 e auto de exame a fls. 665 a 674 dos autos)
(31)
Com o consentimento do arguido, A, o investigador revistou-o e encontrou na sua posse os seguintes objectos (cfr. fls. 289 a 290 dos autos):
1. O telemóvel branco de marca Samsung com um cartão telefónico SIM de 4G e um cartão Micro SD;
2. O telemóvel branco de marca Samsung com bateria e um cartão telefónico SIM;
3. Uma folha de papel com o seguinte teor: “Acordo sobre a permissão de utilização da unidade do mini armazém “XXX迷你倉””, na qual contendo ainda a assinatura de C;
4. Uma chave de cor prata; e
5. 264 notas de mil dólares de Hong Kong, com valor total de duzentos e sessenta e quatro mil de dólares de Hong Kong.
(32)
Os referidos telemóveis eram os instrumentos utilizados pelo arguido, A, para comunicar com os demais arguidos. O “acordo” é o documento comprovativo do aluguer do mini armazém por parte do arguido C e a quantia em dólar de Hong Kong foi o dinheiro obtido pelo arguido A através da prática do crime ou o dinheiro destinado à prática do delito.
(33)
` Com o consentimento do arguido B, o investigador revistou-o e encontrou na sua posse os seguintes objectos (cfr. fls. 308 a 309 dos autos):
1. Sete notas de mil dólares de Hong Kong, com valor total de sete mil dólares;
2. Cinco notas de cem dólares de Hong Kong, com valor total de quinhentos dólares; e
3. Um telemóvel de marca VIVO de cor dourada com um cartão telefónico SIM de 4G.
A quantia em dólar de Hong Kong foi o dinheiro destinado à prática do delito, e o telemóvel era o instrumento utilizado pelo arguido B para comunicar com os demais arguidos.
(34)
Com o consentimento do arguido D, o investigador revistou-o e encontrou na sua posse os seguintes objectos (cfr. fls. 345 a 346 dos autos):
1. Um telemóvel Iphone preto com um cartão SIM,
2. Um colete preto;
3. Uma camisa branca com mangas cumpridas;
4. Umas calças pretas;
O telemóvel era o instrumento utilizado pelo arguido D para comunicar com os demais arguidos. As roupas eram o uniforme que foi utilizado pelo arguido D para se disfarçar de croupier.
(35)
Com o consentimento da arguida G, o investigador revistou-a e encontrou na sua posse os seguintes objectos (cfr. fls. 362 a 363 dos autos):
1. Oito notas de mil dólares de Hong Kong, com valor total de oito mil dólares;
2. Três notas de quinhentos dólares de Hong Kong, com valor total de mil e quinhentos dólares;
3. Nove notas de cem dólares de Hong Kong, com valor total de novecentos dólares;
4. 96 notas de cem renminbis, com valor total de nove mil e seiscentos yuan;
5. Um telemóvel Iphone preto com um cartão SIM de 4G;
6. Um telemóvel Iphone cuja parte frontal é de cor branca e a parte traseira é de cor rosa, com um cartão telefónico 4G;
7. Dois cartões-chave do Hotel XXX2 Plaza Macau;
8. Um talão do Agricultural Bank of China datado de 2 de Março de 2017, o titular da conta: A, cartão de levantamento nº XXXXXXXXXX, o valor do levantamento: 10.000 renminbis.
9. Um talão do Agricultural Bank of China datado de 9 de Junho de 2017, o titular da conta: A, cartão de levantamento nº XXXXXXXXXX, o valor do levantamento: 60.000 renminbis.
(36)
Os referidos telemóveis eram os instrumentos utilizados pela arguida G para comunicar com os demais arguidos e os cartões-chave eram as chaves do quarto de hotel alugado para a prática do delito. E as quantias em numerário supra indicadas foram obtidas através da prática do crime.
(37º)
Com o consentimento da arguida G, o investigador verificou as mensagens nos seus telemóveis, descobrindo as fotos da página de dados pessoais dos passaportes dos dez arguidos nestes autos e as fotos das duas mesas de jogo apreendidas, bem como a foto da nota de entrega das fichas apreendidas. (cfr. auto de consulta de registos em telemóvel as fls. 365 a 371 dos autos)
(38)
Com o consentimento da arguida Q, o investigador revistou-a e encontrou na sua posse os seguintes objectos (cfr. autos de revista e de apreensão a fls. 383 a 386 dos autos):
1. Um telemóvel Iphone preto com um cartão telefónico;
2. Um colete preto;
3. Uma camisa branca;
4. Umas calças pretas.
(39)
O telemóvel referido era o instrumento utilizado pela arguida Q para comunicar com os demais arguidos. As roupas eram o uniforme que foi utilizado pela arguida Q, para se disfarçar de empregada de casino.
(40)
Com o consentimento da arguida R, o investigador revistou-a e encontrou na sua posse os seguintes objectos (cfr. autos de revista e de apreensão a fls. 400 a 404 dos autos):
1. Um telemóvel Apple de cores branca e dourada com um cartão telefónico SIM;
2. Um colete preto;
3. Uma camisa branca;
4. Umas calças pretas; e
5. Uma gravata preta.
(41)
O telemóvel referido era o instrumento utilizado pela arguida R para comunicar com os demais arguidos. As roupas e a gravata eram o uniforme que foi utilizado por ela, para se disfarçar de empregada de casino.
(42)
Com o consentimento do arguido C, o investigador revistou-o e encontrou na sua posse os seguintes objectos (cfr. autos de revista e de apreensão fls. 416 a 417 dos autos):
1. Um telemóvel branco (sem tampa traseira) com uma bateria e um cartão telefónico;
2. Um boné militar vermelho;
3. Um cinto;
4. Um par de sapatos de pele com atacadores;
5. Um conjunto de blusa preta com mangas cumpridas e calças;
6. Um aparelho walkie-talkie preto.
(43)
O telemóvel referido era o instrumento utilizado pelo arguido C para comunicar com os demais arguidos. O boné militar, cinto, as roupas eram o uniforme que foi utilizado pelo arguido C para se disfarçar de guarda de segurança de casino. E o walkie-talkie era o meio de comunicação na prática do delito.
(44)
Com o consentimento do arguido C, os investigadores efectuaram uma busca na arrecadação nº 649 no mini armazém “XXX迷你倉” no XXXXXX, tendo encontrado os seguintes objectos (cfr. autos de busca e de apreensão a fls. 418 a 423 dos autos):
1. Uma mala de viagem vazia;
2. Uma mala de mão de cor prata vazia;
3. Duas pás metálicas;
4. Um cadeado metálico de cor de prata.
(45)
A mala de viagem e a mala de mão supra indicadas destinavam-se a guardar os utensílios de jogo usados na prática do delito, as pás foram preparadas para serem mostradas ao responsável do armazém se este perguntasse pelos objectos guardados na arrecadação.
(46)
Com o consentimento do arguido F, o investigador revistou-o e encontrou na sua posse um telemóvel de marca HUAWEI de cores de ouro e cobre com um cartão telefónico SIM. O telemóvel referido era o instrumento utilizado pelo arguido F, para comunicar com os demais arguidos. (cfr. autos de revista e de apreensão a fls. 438 a 439 dos autos)
(47)
Com o consentimento do arguido H, o investigador revistou-o e encontrou na sua posse um telemóvel de marca Lenovo de cor de prata com um cartão telefónico SIM de 4G. O telemóvel era o instrumento utilizado pelo arguido H, para comunicar com os demais arguidos. (cfr. autos de revista e de apreensão a fls. 453 a 454 dos autos)
(48)
Com o consentimento do arguido L, o investigador revistou-o e encontrou na sua posse um telemóvel Iphone branco com um cartão telefónico SIM. O telemóvel era o instrumento utilizado pelo arguido L, para comunicar com os demais arguidos. (cfr. autos de revista e de apreensão a fls. 468 a 469 dos autos)
(49)
Com o consentimento do arguido I, o investigador revistou-o e encontrou na sua posse os seguintes objectos (cfr. autos de revista e de apreensão a fls. 487 a 488 dos autos):
1. Um telemóvel Iphone preto com um cartão telefónico SIM;
2. Um telemóvel Iphone de cor de prata com um cartão telefónico SIM;
3. Um colete preto;
4. Uma camisa branca com mangas cumpridas;
5. Umas calças pretas;
6. 11 notas de mil dólares de Hong Kong e duas notas de quinhentos dólares de Hong Kong, com valor total de doze mil dólares.
(50)
Os telemóveis referidos eram os instrumentos utilizados pelo arguido I para comunicar com os demais arguidos. As roupas eram o uniforme que foi utilizado pelo arguido I, para se disfarçar de funcionário de tesouraria e a quantia em numerário foi obtida através da prática do crime.
(51)
Com o consentimento do arguido M, o investigador revistou-o e encontrou na sua posse os seguintes objectos (cfr. autos de revista e de apreensão a fls. 506 a 507 dos autos):
1. Um telemóvel Iphone de cor dourada com um cartão telefónico SIM;
2. Duas notas de mil dólares de Hong Kong;
3. Três notas de quinhentos dólares de Hong Kong;
4. Dez notas de cem dólares de Hong Kong;
5. Oito notas de cinquenta dólares de Hong Kong.
(52)
O telemóvel referido era o instrumento utilizado pelo arguido M para comunicar com os demais arguidos e a quantia em dólar de Hong Kong foi obtida através da prática do crime.
(53)
Com o consentimento do arguido O, o investigador revistou-o e encontrou na sua posse um telemóvel branco OPPO com um cartão telefónico SIM de 4G. O telemóvel era o instrumento utilizado por ele na comunicação com os demais arguidos. (cfr. autos de revista e de apreensão a fls. 524 a 525 dos autos)
(54)
Com o consentimento do arguido N, o investigador revistou-o e encontrou na sua posse um telemóvel Iphone branco com um cartão telefónico SIM. O telemóvel era o instrumento utilizado por ele na comunicação com os demais arguidos. (cfr. autos de revista e de apreensão a fls. 540 a 541 dos autos)
(55)
Com o consentimento do arguido J, o investigador revistou-o e encontrou na sua posse os seguintes objectos (cfr. autos de revista e de apreensão fls. 4556 (sic) a 557 dos autos):
1. Um telemóvel OPPO de cor-de-rosa, com um cartão telefónico SIM de 4G;
2. Um boné militar vermelho;
3. Um cinto;
4. Um par de sapatos de pele com atacadores;
5. Um conjunto de blusa preta com mangas cumpridas e calças.
(56)
O telemóvel referido era o instrumento utilizado pelo arguido J para comunicar com os demais arguidos. O boné militar, cinto, as roupas eram o uniforme que foi utilizado pelo arguido J, para se disfarçar de guarda de segurança de casino.
(57)
Com o consentimento do arguido P, o investigador revistou-o e encontrou na sua posse os seguintes objectos (cfr. autos de revista e de apreensão a fls. 572 a 573 dos autos):
1. Um telemóvel de cor de prata com dois cartões telefónicos SIM;
2. Três notas de mil dólares de Hong Kong.
(58)
O telemóvel referido era o instrumento utilizado pelo arguido P para comunicar com os demais arguidos e a quantia em dólares de Hong Kong foi obtida através da prática do crime.
(59)
Com o consentimento do arguido K, o investigador revistou-o e encontrou na sua posse os seguintes objectos (cfr. autos de revista e de apreensão a fls. 586 a 587 dos autos):
1. Um telemóvel Iphone de cor dourada com um cartão telefónico SIM de 4G;
2. Um colete preto com número XXXXXX;
3. Umas calças pretas;
4. Uma camisa branca;
5. Uma gravata preta.
(60)
O telemóvel referido era o instrumento utilizado pelo arguido K para comunicar com os demais arguidos. As roupas e a gravata eram o uniforme que foi utilizado por ele, para se disfarçar de croupier.
(61)
Com o consentimento do arguido E, o investigador revistou-o e encontrou na sua posse os seguintes objectos (cfr. autos de revista e de apreensão a fls. 603 a 604 dos autos):
1. Um cartão-chave branco, com um papel autocolante branco no qual está escrito “64g”;
2. Cinco notas de mil dólares de Hong Kong, com valor total de cinco mil dólares;
3. Três notas de quinhentos dólares de Hong Kong, com valor total de mil e quinhentos dólares;
4. Um telemóvel Iphone de cor dourada com um cartão telefónico;
5. Um par de sapatos de pele;
6. Uma gravata preta;
7. Um colete preto;
8. Umas calças pretas;
9. Uma camisa branca;
(62)
A quantia em dólar de Hong Kong foi obtida pelo arguido E através da prática do crime e o telemóvel era o instrumento utilizado por ele para comunicar com os demais arguidos. Os sapatos de pele, gravata, roupas eram o uniforme usado por ele para se disfarçar de croupier.
(63)
Com o consentimento do arguido E, o investigador verificou os registos telefónicos do seu telemóvel, descobrindo que a arguida, G, tinha-o mandado comprar o material destinado à prática dos delitos. (cfr. auto de consulta de registos telefónicos de telemóvel a fls. 606 a 609 dos autos)
(64)
Excepto a 7ª arguida, os arguidos A, B, C, D, E, F, G, H, I, J, K, L, M, N, O, P, Q e R agiram de comum acordo e intento, tendo actuado em conjugação de esforços, com intenção de alcançar um benefício patrimonial para si ou para terceiro, fazendo, deliberadamente, a exploração de jogo de fortuna ou azar fora dos locais legalmente autorizados ou encarregando-se da direcção do jogo ou exercendo qualquer actividade ligada à exploração.
A 7ª arguida G sabia bem que o 1º arguido praticava os actos ilícitos supra descritos, mas ainda forneceu-lhe apoio material, com a intenção de obter para terceiro e para si enriquecimento ilegítimo.
(65)
Os arguidos supra referidos, excepto a 7ª arguida, fraudulentamente, exploraram ou praticaram o jogo de fortuna e azar no local não autorizado, além disso, trapacearam nos jogos e utilizaram os instrumentos que foram reaparelhados (tais como fichas falsas e distribuidor de cartas), de modo a controlar o resultado das jogadas para assegurar a sorte.
A 7ª arguida G sabia bem que o 1º arguido praticava os actos ilícitos supra descritos, mas ainda forneceu-lhe apoio material, com a intenção de obter para terceiro e para si enriquecimento ilegítimo.
(66)
Os referidos arguidos, excepto a 7ª arguida, agiram com a intenção de obter para si ou terceiro enriquecimento ilegítimo, fazendo batotas para que as pessoas acreditassem que estavam a jogar numa verdadeira sala de jogo VIP, o que levou a essas pessoas a fazerem o acto que lhes causou prejuízo patrimonial de valor elevado. E, por causa da intervenção oportuna da autoridade policial, os arguidos não lograram concretizar o delito de trapaça que envolveu os quatro ofendidos Y, Z, Z1, Z2, estes não sofrendo concretamente prejuízos pelo “empréstimo solidário”.
Ademais, a 7ª arguida G sabia bem que o 1º arguido praticava os actos ilícitos supra descritos, mas ainda forneceu-lhe apoio material, com a intenção de obter para terceiro e para si enriquecimento ilegítimo.
(67)
Os arguidos agiram voluntária, livre e conscientemente, praticando deliberadamente os actos supra mencionados. Sabiam ainda que a sua conduta era proibida e punida por lei.
*
Além disso, foram apurados na audiência os seguintes factos:
Dos respectivos registos criminais, resultou que os 18 arguidos são delinquentes primários em Macau.
O 1º arguido era comerciante antes de ser preso preventivamente, auferindo mensalmente RMB10.000 a RMB20.000, tendo a seu cargo um/a filho/a menor e tendo. Tem o 9º ano de escolaridade.
O 2º arguido trabalhava na área de gestão hoteleira antes de ser preso preventivamente, auferindo mensalmente RMB8.000 a RMB10.000, tendo a seu cargo os pais e dois filhos menores. Tem o 9º ano de escolaridade.
O 3º arguido era trabalhador de carga e descarga de mercadorias antes de ser preso preventivamente, auferindo mensalmente RMB4.000, tendo a seu cargo um/a filho/a menor. Tem o 12º ano de escolaridade.
O 4º arguido era condutor antes de ser preso preventivamente, auferindo mensalmente RMB3.500, tendo a seu cargo os pais e dois filhos menores. Tem o 12º ano de escolaridade.
O 5º arguido era condutor de táxi on-line antes de ser preso preventivamente, auferindo mensalmente RMB3.000 a RMB5.000, tendo a seu cargo os pais e dois filhos menores. Tem o 9º ano de escolaridade.
O 6º arguido era condutor antes de ser preso preventivamente, auferindo mensalmente RMB7.000 a RMB8.000, tendo a seu cargo os pais e irmão mais velho. Tem o 6º ano de escolaridade.
A 7ª arguida era empregada de balcão antes de ser presa preventivamente, auferindo mensalmente RMB3.000 a RMB5.000, tendo a seu cargo. Tem o 5º ano de escolaridade.
O 8º arguido era camponês antes de ser preso preventivamente, auferindo mensalmente RMB2.000, tendo a seu cargo os pais e dois filhos menores. Tem o 4º ano de escolaridade.
O 9º arguido prestava serviço relativo a “Wechat business software” antes de ser preso preventivamente, auferindo mensalmente RMB3.000 a RMB5.000, tendo a seu cargo a mãe e um/a filho/a menor. Tem o 9º ano de escolaridade.
O 10º arguido era guarda de segurança antes de ser preso preventivamente, auferindo mensalmente RMB3.000, tendo a seu cargo a mãe e um/a filho/a menor. Tem o 9º ano de escolaridade.
O 11º arguido era trabalhador de serviço de entrega rápida antes de ser preso preventivamente, auferindo mensalmente RMB3.000 a RMB4.000, tendo a seu cargo a mãe e um/a filho/a menor. Tem o 9º ano de escolaridade.
O 12º arguido era trabalhador de entrega de mercadorias antes de ser preso preventivamente, auferindo mensalmente RMB3.000 a RMB4.000, tendo a seu cargo a mãe e a avó. Tem o 4º ano de escolaridade.
O 13º arguido era electrocanalizador antes de ser preso preventivamente, auferindo mensalmente RMB3.000, tendo a seu cargo a mãe. Tem o 9º ano de escolaridade.
O 14º arguido era camponês antes de ser preso preventivamente, auferindo mensalmente RMB3.000 a RMB3.500, tendo a seu cargo os pais e um/a filho/a menor. Tem o 12º ano de escolaridade.
O 15º arguido era vendedor ambulante antes de ser preso preventivamente, auferindo mensalmente RMB5.000 a RMB6.000, tendo a seu cargo a sogra, os pais e dois filhos menores. Tem o 8º ano de escolaridade”; (cfr., fls. 1513-v a 1525-v e 2132 a 2172).

Do direito

3. Vem os (1° a 9° e 11° a 15°) arguidos A, B, C, D, E, F, G, H, I, K, L, M, N e O recorrer do Acórdão do T.J.B. que os condenou nos termos atrás já referidos.

Certo sendo que são as “conclusões” apresentadas a final da motivação de recurso que delimitam as questões a decidir pelo Tribunal, e identificadas que atrás ficaram as (“questões”) pelos recorrentes colocadas, é momento para delas conhecer.

Verificando-se que para além de questões quanto à “decisão da matéria de facto”, vem também colocadas questões relacionadas com o seu posterior “enquadramento jurídico-penal” e “medida da pena”, adequado é que nesta mesma ordem se deva passar a apreciar.

Nesta conformidade, (e inexistindo outras questões de conhecimento oficioso), a tanto se passa.

–– Das “questões relacionadas com a decisão da matéria de facto”.

Antes de mais, cabe referir que da reflexão que sobre as mesmas questões nos foi possível efectuar, e atento o entendimento que este T.S.I. vem assumindo em relação ao sentido e alcance dos “vícios da decisão da matéria de facto”, consigna-se desde já que nos identificamos com as doutas considerações em sede de vista pelo Exmo. Representante do Ministério Público tecidas no seu Parecer, pelo que aqui se dão as mesmas como reproduzidas para efeitos de fundamentação da solução que adiante se irá consignar.

Seja como for, sempre se mostra de referir e acentuar o que segue.

Repetidamente temos afirmado que o vício de “insuficiência da matéria de facto provada para a decisão” apenas ocorre “quando o Tribunal não se pronuncia sobre toda a matéria objecto do processo”; (cfr., v.g., os recentes Acs. deste T.S.I. de 25.01.2018, Proc. n.° 1149/2017, de 14.06.2018, Proc. n.° 451/2018 e de 06.09.2018, Proc. n.° 677/2018, podendo-se também sobre o dito vício em questão e seu alcance, ver o Ac. do Vdo T.U.I. de 24.03.2017, Proc. n.° 6/2017).

Como decidiu o T.R. de Coimbra:

“O vício da insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, existe quando da factualidade vertida na decisão se colhe faltarem dados e elementos para a decisão de direito, considerando as várias soluções plausíveis, como sejam a condenação (e a medida desta) ou a absolvição (existência de causas de exclusão da ilicitude ou da culpa), admitindo-se, num juízo de prognose, que os factos que ficaram por apurar, se viessem a ser averiguados pelo tribunal a quo através dos meios de prova disponíveis, poderiam ser dados como provados, determinando uma alteração de direito.
A insuficiência para a decisão da matéria de facto existe se houver omissão de pronúncia pelo tribunal sobre factos relevantes e os factos provados não permitem a aplicação do direito ao caso submetido a julgamento, com a segurança necessária a proferir-se uma decisão justa”; (cfr., Ac. de 17.05.2017, Proc. n.° 116/13, in “www.dgsi.pt”).

E, como igualmente também considerou o T.R. de Évora:

“A insuficiência da matéria de facto para a decisão não tem a ver, e não se confunde, com as provas que suportam ou devam suportar a matéria de facto, antes, com o elenco desta, que poderá ser insuficiente, não por assentar em provas nulas ou deficientes, antes, por não encerrar o imprescindível núcleo de factos que o concreto objecto do processo reclama face à equação jurídica a resolver no caso”; (cfr., o Ac. de 26.09.2017, Proc. n.° 447/13).

“Só existe tal insuficiência quando se faz a “formulação incorreta de um juízo” em que “a conclusão extravasa as premissas” ou quando há “omissão de pronúncia, pelo tribunal, sobre factos alegados ou resultantes da discussão da causa que sejam relevantes para a decisão, ou seja, a que decorre da circunstância de o tribunal não ter dado como provados ou como não provados todos os factos que, sendo relevantes para a decisão, tenham sido alegados pela acusação e pela defesa ou resultado da discussão”; (cfr., o Ac. da Rel. de Évora de 21.12.2017, Proc. n.° 165/16).

“O vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada traduzir-se-á, afinal, na falta de elementos fácticos que permitam a integração na previsão típica criminal, seja por falência de matéria integrante do seu tipo objectivo ou do subjectivo ou, até, de uma qualquer circunstância modificativa agravante ou atenuante, considerada no caso. Em termos sintéticos, este vício ocorre quando, com a matéria de facto dada como assente na sentença, aquela condenação não poderia ter lugar ou, então, não poderia ter lugar naqueles termos”; (cfr., o Ac. da Rel. de Coimbra de 24.01.2018, Proc. n.° 647/14).

Aliás, como no recente Ac. da Rel. de Coimbra de 12.09.2018, Proc. n.° 28/16, se decidiu, inexiste insuficiência da matéria de facto provada para a decisão “quando os factos dados como provados permitem a aplicação segura do direito ao caso submetido a julgamento”, sendo, como se verá, este o caso dos autos.

No caso dos autos, certo sendo que o Colectivo a quo investigou e emitiu (expressa) pronúncia sobre toda a matéria de facto objecto do processo, elencando a que do julgamento resultou provada, consignando que nenhuma fico por provar, claro se apresenta que não existe o imputado vício de “insuficiência”.

Aliás, como se observa no douto Parecer do Ministério Público, os arguidos recorrentes não se conformam é com a “matéria dada como provada”, o que, como é bom de ver, não constitui o imputado vício de “insuficiência”.

No que toca à também assacada “contradição insanável da fundamentação”, vejamos.

O dito vício tem sido definido como aquele que ocorre quando “se constata incompatibilidade, não ultrapassável, entre os factos provados, entre estes e os não provados ou entre a fundamentação probatória e a decisão”; (cfr., v.g. os recentes Acs. deste T.S.I. de 04.04.2018, Proc. n.° 127/2018, de 19.04.2018, Proc. n.° 66/2018 e de 28.06.2018, Proc. n.° 459/2018).

Em síntese, quando analisada a decisão recorrida através de um raciocínio lógico se verifique que a mesma contém posições antagónicas ou inconciliáveis, que mutuamente se excluem e que não podem ser ultrapassadas.

E, como se tem igualmente decidido:

“Há contradição insanável da fundamentação quando, fazendo um raciocínio lógico, for de concluir que a fundamentação leva precisamente a uma decisão contrária àquela que foi tomada ou quando, de harmonia com o mesmo raciocínio, se concluir que a decisão não é esclarecedora, face à colisão entre os fundamentos invocados; há contradição entre os fundamentos e a decisão quando haja oposição entre o que ficou provado e o que é referido como fundamento da decisão tomada; e há contradição entre os factos quando os provados e os não provados se contradigam entre si ou por forma a excluírem-se mutuamente”; (cfr., o Ac. da Rel. de Évora de 21.12.2017, Proc. n.° 165/16).

Nesta conformidade, e tal como em relação ao anterior vício da “insuficiência”, também aqui nenhuma “contradição”, (muito menos insanável), existe.

O Acórdão recorrido apresenta-se-nos claro e lógico, nele não se vislumbrando nenhuma incompatibilidade (ou obscuridade), sendo de notar que a dita contradição, não passa de uma tentativa de controverter a decisão recorrida com base em apreciações e opiniões tão só dos recorrentes, necessariamente, pessoais e subjectivas, o que, como é óbvio, não colhe.

Por fim, quanto ao “erro notório”.

Temos (repetidamente) entendido que o mesmo apenas existe quando “se dão como provados factos incompatíveis entre si, isto é, que o que se teve como provado ou não provado está em desconformidade com o que realmente se provou, ou que se retirou de um facto tido como provado uma conclusão logicamente inaceitável. O erro existe também quando se violam as regras sobre o valor da prova vinculada, as regras de experiência ou as legis artis. Tem de ser um erro ostensivo, de tal modo evidente que não passa despercebido ao comum dos observadores”.
De facto, “É na audiência de julgamento que se produzem e avaliam todas as provas (cfr. artº 336º do C.P.P.M.), e é do seu conjunto, no uso dos seus poderes de livre apreciação da prova conjugados com as regras da experiência (cfr. artº 114º do mesmo código), que os julgadores adquirem a convicção sobre os factos objecto do processo.
Assim, sendo que o erro notório na apreciação da prova nada tem a ver com a eventual desconformidade entre a decisão de facto do Tribunal e aquela que entende adequada o Recorrente, irrelevante é, em sede de recurso, alegar-se como fundamento do dito vício, que devia o Tribunal ter dado relevância a determinado meio probatório para formar a sua convicção e assim dar como assente determinados factos, visto que, desta forma, mais não se faz do que pôr em causa a regra da livre convicção do Tribunal”; (cfr., v.g., os recentes Acs. deste T.S.I. de 04.04.2018, Proc. n.° 912/2017, de 17.05.2018, Proc. n.° 236/2018 e de 19.07.2018, Proc. n.° 538/2018).

Como também já tivemos oportunidade de afirmar:

“Erro” é toda a ignorância ou falsa representação de uma realidade. Daí que já não seja “erro” aquele que possa traduzir-se numa “leitura possível, aceitável ou razoável, da prova produzida”.
Sempre que a convicção do Tribunal recorrido se mostre ser uma convicção razoavelmente possível e explicável pelas regras da experiência comum, deve a mesma ser acolhida e respeitada pelo Tribunal de recurso.
O princípio da livre apreciação da prova, significa, basicamente, uma ausência de critérios legais que pré-determinam ou hierarquizam o valor dos diversos meios de apreciação da prova, pressupondo o apelo às “regras de experiência” que funcionam como argumentos que ajudam a explicar o caso particular com base no que é “normal” acontecer.
Com o mesmo, consagra-se um modo não estritamente vinculado na apreciação da prova, orientado no sentido da descoberta da verdade processualmente relevante pautado pela razão, pela lógica e pelos ensinamentos que se colhem da experiência comum, e limitado pelas excepções decorrentes da “prova vinculada”, (v.g., caso julgado, prova pericial, documentos autênticos e autenticados), estando sujeita aos princípios estruturantes do processo penal, entre os quais se destaca o da legalidade da prova e o do “in dubio pro reo”.
Enformado por estes limites, o julgador perante o qual a prova é produzida – e que se encontra em posição privilegiada para dela colher todos os elementos relevantes para a sua apreciação crítica – dispõe de ampla liberdade para eleger os meios de que se serve para formar a sua convicção e, de acordo com ela, determinar os factos que considera provados e não provados.
E, por ser assim, nada impede que dê prevalência a um determinado conjunto de provas em detrimento de outras, às quais não reconheça, nomeadamente, suporte de credibilidade.
O acto de julgar é do Tribunal, e tal acto tem a sua essência na operação intelectual da formação da convicção.
Tal operação não é pura e simplesmente lógico-dedutiva, mas, nos próprios termos da lei, parte de dados objectivos para uma formação lógico-intuitiva.
Esta operação intelectual não é uma mera opção voluntarista sobre a certeza de um facto, e contra a dúvida, nem uma previsão com base na verosimilhança ou probabilidade, mas a conformação intelectual do conhecimento do facto (dado objectivo) com a certeza da verdade alcançada (dados não objectiváveis).
Para a operação intelectual contribuem regras, impostas por lei, como sejam as da experiência, a percepção da personalidade do depoente (impondo-se por tal a imediação e a oralidade), a da dúvida inultrapassável, (conduzindo ao princípio in dubio pro reo).
A lei impõe princípios instrumentais e princípios estruturais para formar a convicção. O princípio da oralidade, com os seus corolários da imediação e publicidade da audiência, é instrumental relativamente ao modo de assunção das provas, mas com estreita ligação com o dever de investigação da verdade jurídico-prática e com o da liberdade de convicção; com efeito, só a partir da oralidade e imediação pode o juiz perceber os dados não objectiváveis atinentes com a valoração da prova.
A oralidade da audiência, (que não significa que não se passem a escrito os autos, mas que os intervenientes estejam fisicamente perante o Tribunal), permite ao Tribunal aperceber-se dos traços do depoimento, denunciadores da isenção, imparcialidade e certeza que se revelam, v.g., por gestos, comoções e emoções, da voz.
A imediação que vem definida como a relação de proximidade comunicante entre o tribunal e os participantes no processo, de tal modo que, em conjugação com a oralidade, se obtenha uma percepção própria dos dados que haverão de ser a base da decisão.
É pela imediação, também chamado de princípio subjectivo, que se vincula o juiz à percepção à utilização à valoração e credibilidade da prova.
Não basta uma “dúvida pessoal” ou uma mera “possibilidade ou probabilidade” para se poder dizer que incorreu o Tribunal no vício de erro notório na apreciação da prova; (cfr., v.g., os recentes Acs. deste T.S.I. de 04.04.2018, Proc. n.° 151/2018, de 07.06.2018, Proc. n.° 376/2018 e de 11.10.2018, Proc. n.° 772/2018).

Com efeito, importa ter em conta que “Quando a atribuição de credibilidade ou falta de credibilidade a uma fonte de prova pelo julgador se basear em opção assente na imediação e na oralidade, o tribunal de recurso só a poderá criticar se ficar demonstrado que essa opção não tem uma justificação lógica e é inadmissível face às regras da experiência comum”; (cfr., o Ac. da Rel. de Coimbra de 13.09.2017, Proc. n.° 390/14).

E como se consignou no Ac. da Rel. de Évora de 21.12.2017, Proc. n.° 165/16, “A censura quanto à forma de formação da convicção do Tribunal não pode consequentemente assentar de forma simplista no ataque da fase final da formação dessa convicção, isto é, na valoração da prova; tal censura terá de assentar na violação de qualquer dos passos para a formação de tal convicção, designadamente porque não existem os dados objectivos que se apontam na motivação ou porque se violaram os princípios para a aquisição desses dados objectivos ou porque não houve liberdade na formação da convicção.
Doutra forma, seria uma inversão da posição dos personagens do processo, como seja a de substituir a convicção de quem tem de julgar, pela convicção dos que esperam a decisão”.

E, ponderados os argumentos pelos recorrentes apresentados, impõem-se concluir que se limitam a manifestar (uma vez mais) a sua discordância com a forma como o Tribunal apreciou e valorou a prova, dando como provada a matéria que atrás se deixou retratada.

E, como é evidente, tal nada tem a ver o “vício” em questão, pois que, em momento algum, violou o Colectivo a quo qualquer regra sobre o valor da prova tarifada, regras de experiência ou legis artis.

Aliás, o Tribunal, não se poupou a esforços, e em sede de fundamentação, não deixou de explicitar, (minuciosa e generosamente), o motivo da sua decisão, nenhuma censura ou reparo merecendo.

Vale a pena atentar na fundamentação exposta e que tem o teor seguinte.

` “Na audiência de julgamento, o 1º arguido A confessou maior parte dos factos, ele admite a prática de 2 crimes de exploração ilícita de jogo imputados nos autos, mas nega, da primeira vez, ter praticado no jogo acto fraudulento para enganar o ofendido S; da primeira vez a “Sapata” era comum e normal. Apenas da segunda vez praticou no jogo acto fraudulento para enganar os 4 ofendidos; a “Sapata” da segunda vez foi adquirida na RPC e tinha sido reaparelhada para “trapacear”. O 1º arguido explicou por que razão da primeira vez não pensou em trapacear o cliente e da segunda vez sim. Mais disse o 1º arguido que sobre o equipamento de trapaça, ele nunca falou isso com os 2º a 18º arguidos, incluindo a substituição da “Sapata”, tudo foi feito secretamente.
- O 1º arguido referiu que a partir do ano de 2015, começou a recrutar um grupo de pessoal e tinha planos para através de colaboração esforços e distribuição de tarefas arrendar quarto suíte de hotel, transformando-o em sala VIP para jogo, cada uma dessas pessoas tinha o seu papel, designadamente, dono da sala VIP, pessoal das relações públicas, empregados da sala, crupiê, guarda de segurança, empregado de mesa etc., posteriormente, iam à procura de pessoas da RPC com interesse no jogo, mas que nunca tinham vindo a Macau ou que não conheciam concretamente a situação das salas VIP para jogar nesse casino falso. O 1º arguido sucessivamente recrutou C (3º arguido), D (4º arguido), E (5º arguido), F (6º arguido), G (7ª arguida, namorada do 1º arguido), H (8º arguido), I (9º arguido), J (10º arguido), K (11º arguido), L (12º arguido), M (13º arguido), N (14º arguido), O (15º arguido), P (16º arguido), Q (17º arguido), R (18ª arguida) e W (suspeito) para desempenhar os papéis supracitados, fazendo com que os diversos ofendidos pensassem que estavam realmente numa sala VIP.
- Além disso, o 1º arguido identificou respectivamente, os 3º a 18º arguidos, descreveu o papel desempenhado por cada um deles e explicou a situação de distribuição de tarefas dos mesmos nessas duas actividades ilícitas. Mais disse que nunca referiu o plano de casino falso à sua namorada, ou seja, a 7ª arguida, ela não participou na actividade criminosa, entretanto, pediu-a para arrendar quartos, bem como, da última vez, ela foi à sala VIP para lhe ajudar a comprar tabaco, o telemóvel encontrado na posse da 7ª arguida pertence ao arguido, foi ele que mandou a arguida guardar.
- Mais ainda, em relação aos 3 arguidos julgados em revelia, o 1º arguido referiu que o 16º arguido auxiliou na decoração e demolição dos equipamentos do quarto. O 17º arguido e a 18ª arguida eram empregados de serviços e foi pago remuneração aos 16º a 18º arguidos.
Na audiência de julgamento, o 2º arguido B confessou parcialmente os factos, disse que apenas participou na actividade de jogo da segunda vez, ele contou como conheceu o 1º arguido e como negociou sobre tal colaboração, ele encarregou-se de arranjar clientes da RPC para vir a Macau e levá-los ao casino falso do 1º arguido para jogo, em seguida sacar a dívida aos clientes, por tal tarefa, o arguido B podia obter 20% do dinheiro sacado. Além disso, disse o 2º arguido que Z3 era sua professora de um curso a curto prazo, os 4 ofendidos eram alunos da aludida professora, foi através da apresentação dessa professora que conheceu Y e outros ofendidos deste processo, que por sua vez levaram-nos ao casino falso para jogo. Porém referiu o 2º arguido que o 1º arguido apenas lhe disse que abriu um “casino falso”, mas não revelou que era para “trapacear” os clientes.
- Dado haver discrepâncias entre as suas declarações prestadas na audiência julgamento e no TIC, pelo que o Colectivo procedeu a leitura das declarações do 2º arguido constante na parte final das fls. 761 dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, no qual afirmou o 2º arguido que não sabia como era feita a “trapaça” no casino falso, nem sabia como fez perder dinheiro aos 4 ofendidos, mas sabia que o casino era falso e o 1º arguido chegou-lhe dizer que basta trazer os clientes à sala VIP, que ele tem meios de lhes fazer perder dinheiro.
Na audiência de julgamento, o 3º arguido C negou os factos imputados, ele afirmou que o 1º arguido recrutou-o na China para trabalhar em Macau, chegado a Macau foi-lhe dito para desempenhar o cargo de “guarda de segurança”, não sabia que tal casino era falso, ele chegou a fazer verificação de segurança aos clientes. O arguido disse que veio cá duas vezes, da primeira vez foi em 08 de Junho e da segunda vez foi 18 de Julho, cuja remuneração por cada vez foi no montante entre 1000 a 1500. Referiu o arguido que da primeira vez não foi com os outros ao mini armazém para buscar ou depositar os objectos, nem participou na decoração e demolição dos equipamentos do casino. Da segunda vez, foi por indicação do 16º arguido que ajudou a decorar e demolir os equipamentos do casino.
- Dado haver discrepâncias entre as suas declarações prestadas na audiência de julgamento e no TIC, pelo que o Colectivo procedeu a leitura das declarações do 3º arguido constante nos 6º, 7º e 12º parágrafos das fls. 765 e 1º parágrafo de fls. 406 dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido. No qual afirmou o 3º arguido que o 4º arguido D participou na burla dessas duas vezes, mais disse que dessas duas vezes foram os mesmos distribuidores de cartas, isto é o 4º arguido D e o 5º arguido E. Nas declarações prestadas pelo 3º arguido na PJ, ele descreveu detalhadamente as tarefas desempenhadas por cada um dos arguidos no acto de burla dessas duas vezes.
Na audiência do julgamento, o 4º arguido D exerceu o seu direito ao silêncio.
Na audiência do julgamento, o 5º arguido E exerceu o seu direito ao silêncio.
Na audiência de julgamento, o 6º arguido C negou os factos imputados, ele afirmou que o 1º arguido recrutou-o na China para trabalhar em Macau, chegado a Macau foi-lhe dito para desempenhar o cargo de “crupiê”. O arguido disse que veio cá duas vezes, da primeira vez foi em 08 de Junho e da segunda vez foi em 18 de Julho, cuja remuneração por cada vez foi no montante entre 1000 a 1500. Mais disse o arguido que foi com os outros arguidos ao mini armazém para buscar ou depositar os objectos, mas apenas transportou-os até à porta, não auxiliou na decoração e demolição dos equipamentos do casino.
- Dado haver discrepâncias entre as suas declarações prestadas na audiência de julgamento e no TIC, pelo que o Colectivo procedeu a leitura das declarações do 6º arguido constante no 9º parágrafo das fls. 789, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido. No qual afirmou o 6º arguido que foi por indicação do 1º arguido que fingiu assumir a tarefa de bate-fichas.
Na audiência de julgamento, a 7ª arguida G negou os factos imputados, ela disse que é namorada do 1º arguido e vive à custa dele, ela não participou na actividade criminosa, nem tinha conhecimento do facto. Quanto aos registos constantes no seu telemóvel, por que razão havia fotos da página com dados e foto dos passaportes da RPC dos dez arguidos, duas fotos das mesas de jogo, factura das fichas apreendidas nos autos, explicou a arguida que o telemóvel era do arguido, ela apenas ajudou-o guardar, embora chegou perguntar ao arguido qual a utilidade de tais fotos, mas o 1º arguido recusou de revelar. A 7ª arguida referiu que da primeira vez não esteve no quarto ou no casino, da segunda vez (ou seja, última vez), foi a pedido do 1º arguido para comprar tabaco, ela foi lá entregá-lo que permaneceu cerca de 10 minutos, apareceu a polícia no local.
Na audiência de julgamento, o 8º arguido H confessou parcialmente os factos, ele afirmou que o 1º arguido recrutou-o na China para trabalhar em Macau, o qual disse que empreitou uma sala VIP para exercer a actividade de exploração do jogo. O arguido depois de chegado a Macau é que soube desempenhar o papel de cliente e jogar falsamente. O arguido declarou que veio cá duas vezes, da primeira vez foi em 08 de Junho e da segunda vez foi 18 de Julho, cuja remuneração por cada vez foi no montante entre 1000 a 1500. Mais disse o arguido que embora tinha ido com os outros ao mini armazém para buscar ou depositar os objectos, mas não auxiliou na decoração e demolição dos equipamentos do casino.
Na audiência do julgamento, o 9º arguido I exerceu o seu direito ao silêncio.
Na audiência de julgamento, o 10º arguido J negou os factos imputados, ele afirmou que o 1º arguido recrutou-o na China para trabalhar em Macau, chegado a Macau foi-lhe dito para desempenhar o cargo de “guarda de segurança”. O arguido referiu que veio uma única vez a Macau, isto é no dia 18 de Julho, cuja remuneração dessa foi no montante entre 1000 a 1500. Mais disse o arguido que nunca foi com os outros ao mini armazém para buscar ou depositar os objectos, nem auxiliou na decoração e demolição dos equipamentos do casino. Ele referiu ainda que não sabia o papel desempenhado pelo 11º arguido (seu irmão biológico).
- Dado haver discrepâncias entre as suas declarações prestadas na audiência de julgamento e no TIC, pelo que o Colectivo procedeu a leitura das declarações do 10º arguido constante no 6º a 10º parágrafo das fls. 798, 6º a 8º parágrafo de fls. 545v e 3º de fls 546, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido. No qual afirmou o 10º arguido que sabia se tratava de sala VIP falsa, ele desempenhou o papel de empregado de serviços, o 4º e 5º arguido desempenharam o papel de crupiê, ele calcula que os clientes perderam dinheiro por meio de trapaça, mas não sabia como isso se operava.
Na audiência do julgamento, o 11º arguido K exerceu o seu direito ao silêncio.
Na audiência de julgamento, o 12º arguido L negou os factos imputados, ele afirmou que o 1º arguido recrutou-o na China para trabalhar em Macau. Chegado a Macau é que soube desempenhar o papel de cliente e jogar falsamente, não tinha conhecimento da trapaça. O arguido disse que veio cá duas vezes, da primeira vez foi em 08 de Junho e da segunda vez foi 18 de Julho, cuja remuneração por cada vez foi no montante entre 1000 a 1500. Referiu o arguido que embora tinha ido com os outros ao mini armazém para buscar ou depositar os objectos, mas apenas transportou-os até à porta, não auxiliou na decoração e demolição dos equipamentos do casino.
- Dado haver discrepâncias entre as suas declarações prestadas na audiência de julgamento e no TIC, pelo que o Colectivo procedeu a leitura das declarações do 12º arguido constante no 6º, 8º a 10º parágrafo das fls. 805, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido. No qual afirmou o 12º arguido que desempenhava o papel de jogador, o 4º arguido desempenhava o papel de crupiê, ele auxiliou a montagem da mesa de jogo e abrir as bagagens, mas não soube quem montou a “Sapata”.
Na audiência de julgamento, o 13º arguido M confessou parcialmente os factos, ele afirmou que o 1º arguido recrutou-o na China para trabalhar em Macau. Chegado a Macau é que soube desempenhar o papel de bate-fichas, não tinha conhecimento da trapaça. O arguido disse que veio cá duas vezes, da primeira vez foi em 08 de Junho e da segunda vez foi 18 de Julho, cuja remuneração por cada vez foi no montante entre 1000 a 1500. Referiu o arguido que não foi com os outros ao mini armazém buscar ou depositar os objectos, nem auxiliou na decoração e demolição dos equipamentos do casino.
Na audiência do julgamento, o 14º arguido N exerceu o seu direito ao silêncio.
Na audiência de julgamento, o 15º arguido O exerceu o seu direito ao silêncio.
Na audiência de julgamento, o Tribunal procedeu a leitura do auto de interrogatório prestado pelo 16º arguido P no TIC (fls. 812 a 813 dos autos), que se dá aqui por integralmente reproduzido. Este arguido nas suas declarações prestadas na PJ, descreveu detalhadamente as tarefas desempenhadas por cada um dos arguidos no acto de burla dessas duas vezes. Por outro lado, referiu que no acto de burla da segunda vez, ele encarregou de abrir a porta aos clientes. O 1º arguido contou-lhe o plano da sala VIP falsa e trapacear o dinheiro dos jogadores através do casino reaparelhado, basta os clientes jogar para perder dinheiro, porém o 1º arguido não revelou pormenores.
Na audiência de julgamento, o Tribunal procedeu a leitura do auto de interrogatório do 17º arguido Q prestado no TIC (fls. 767v a 816 a 817 dos autos), que se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos. Este arguido nas suas declarações prestadas na PJ, descreveu detalhadamente as tarefas desempenhadas por cada um dos arguidos no acto de burla dessas duas vezes, bem como, antes de vir, dessa segunda vez, a Macau, o 1º arguido combinou encontro com os demais dez arguidos deste processo, num restaurante chinês em Taishan, China, o qual explicou a criação de casino falso para burlar o dinheiro dos clientes (mas o 1º arguido não falou em pormenores sobre a forma da trapaça).
Na audiência de julgamento ouviu as declarações da testemunha S, o qual disse que através do seu amigo “T”, conheceu, em Macau, U (suspeito) que é bate-fichas. U convidou o ofendido para vir a Macau jogar, este lhe informou que basta entregar primeiro quatrocentas mil reminbis para poder trazer o ofendido a Macau jogar e que podia ajudar a assinar quatro milhões HK dólares em fichas para jogo (o ofendido conforme o acordo depositou quatrocentas mil reminbis na conta indicada). Posteriormente, o ofendido veio a Macau e foi à ala do Hotel XXX2 para encontrar com o suspeito U, “T” e o arguido A, foram levados pelos indivíduos envolvidos no processo à sala VIP do 20º andar do XXX2 para jogo, durante o jogo, o ofendido S perdia mais do que ganhava, ele chegou a exigir para fazer o corte do baralho, mas o arguido A rejeitou com o pretexto de que o novo regulamento do casino não admite fazer corte das cartas, após duas horas, o ofendido “perdeu todas as fichas”. Depois da derrota, o suspeito U pediu ao Z4 para devolver três milhões e quinhentas mil HK dólares. Posteriormente, o ofendido descobriu que no 20º andar não existia sala VIP ou casino, pelo que suspeitou de ter sido burlado, tendo assim participado o caso à polícia. Finalmente o ofendido deseja procedimento criminal e civil contra os agentes do crime.
Na audiência de julgamento, nos termos legais, o Tribunal procedeu a leitura das declarações para memória futura do ofendido Y (fls. 847 a 848 dos autos), o qual descreveu detalhadamente a ocorrência dos factos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzidos para todos os efeitos. Afirmou a testemunha que ele próprio e os ofendidos Z, Z1, Z2 são colegas da Universidade de Magistratura de Jie Jiang e Z3 é sua professora. Pouco antes do incidente, Z1 referiu que tinha coisas a tratar em Hong Kong e convidou-os para ir juntos, fazer uma viagem em Macau. Devido ao facto, disse a professora que o seu aluno de Macau podia os hospedar, pelo que, foram todos juntos a Hong Kong e Macau. No dia 18/07/2017, por volta das 18H00, o 2º arguido B organizou viatura para buscá-los do Terminal Marítimo da Taipa e levá-los para jantar num restaurante perto do Hotel XXX1, durante o qual o 2º arguido B referiu-lhes que trabalhava no casino XXX1, que podia assinar fichas para os ofendidos jogar e assim convidou-os para lá ir. Os 4 ofendidos agradeceram pela hospitalidade do arguido B e aceitaram ir jogar. Depois do jantar, o grupo foi à sala envolvida jogar, Z3 referiu que não sabia jogar, pelo que ficou num lado a descansar, os 4 ofendidos Y, Z, Z1 e Z2 foram organizados para jogar na mesa de jogo afastada do bar. O ofendido Y sacou vinte mil HK dólares para o arguido B trocar em fichas, o arguido B referiu que o montante de vinte mil era pouco, e que podia conceder aos 4 ofendidos duzentas mil reminbis para jogo, bem como podiam devolver depois, os 4 ofendidos concordaram assumir juntos o empréstimo, pelo que o arguido B trocou o valor de trezentas mil HK dólares em fichas e entregou as fichas aos 4 ofendidos, os 4 ofendidos jogaram rotativamente tais fichas, porém os 4, praticamente, perdiam em todas as apostas. Finalmente, a polícia apareceu repentinamente no local, daí as pessoas souberam que se tratava de sala VIP falsa.
Na audiência de julgamento, nos termos legais, o Tribunal procedeu a leitura das declarações para memória futura do ofendido Z (fls. 849 a 850 dos autos), ele descreveu detalhadamente a ocorrência dos factos, as declarações desta testemunha são mais ou menos idênticas às das declarações do 1º ofendido Y, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos.
Na audiência de julgamento, nos termos legais, o Tribunal procedeu a leitura das declarações para memória futura do ofendido Z2 (fls. 851 a 852 dos autos), ele descreveu detalhadamente a ocorrência dos factos, as declarações desta testemunha são mais ou menos idênticas às das declarações do 1º ofendido Y, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos.
Na audiência de julgamento, nos termos legais, o Tribunal procedeu a leitura das declarações para memória futura do ofendido Z1 (fls. 853 a 854 dos autos), ele descreveu detalhadamente a ocorrência dos factos, as declarações desta testemunha são mais ou menos idênticas às das declarações do 1º ofendido Y, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos.
Na audiência de julgamento foram ouvidas as declarações dos 4 investigadores da PJ, Z5, Z6, Z7, os quais descreveram a ocorrência do facto e a sua participação na investigação do caso:
- Agente Z8 descreveu as diligências que participou, disse a testemunha que recebeu a queixa do 1º ofendido, que por sua vez iniciou a investigação. Seguidamente, a polícia através do vídeo do Hotel XXX2, do mini armazém e do posto fronteiriço, identificou maior parte dos arguidos deste processo. E aquando tais indivíduos tornaram a entrar em Macau, (dia 18/07/2017) o posto fronteiriço comunicou à polícia a entrada desses indivíduos, tendo assim iniciado a perseguição através do sistema de monitoramento “olho do céu”. Seguindo a pista, os 18 arguidos alojaram no Hotel XXX3, pelo que montou aí vigilância, posteriormente verificou-se que uma parte do grupo foi ao mini armazém buscar as bagagens, e a outra parte (1º e 2º arguidos) foi ao quarto suíte presidencial do Hotel XXX1. Em seguida, viu-os trazer as bagagens ao quarto suíte presidencial do Hotel XXX1, nesse momento, o policial ficou a aguardar a próxima actuação deles. Pouco mais das 22H00, viu o 2º arguido B levar Z3 e os 4 ofendidos ao quarto suíte presidencial nº 2101 do Hotel XXX1, acto contínuo, a polícia achou que era altura propícia para actuar, pelo que procedeu operação de detenção. Refere a testemunha que antes e depois da chegada dos clientes, o quarto suíte presidencial nº 2101 estava fechado. Aquando o policial bateu à porta, veio o 3º arguido abrir a porta, tal suíte já tinha sido reaparelhada pelo grupo do arguido A para uma sala VIP com duas mesas de bacará, na entrada do quarto havia equipamento de segurança e pessoal de “verificação de segurança”. A polícia deteve os 18 arguidos. Na altura, havia alguns arguidos vestidos de uniforme de segurança, outros vestidos de uniforme de crupiê, uns vestidos de uniforme de empregado de serviço, o 7º e 12º arguidos fingindo-se clientes a jogar nas mesas de jogo. Quanto aos verdadeiros jogadores eram os 4 ofendidos e sua professora. Por outro lado, afirma a testemunha que encontrou uma “Sapata” suspeita da prática da trapaça.
- Agente Z5 descreveu as diligências que participou, disse a testemunha que procedeu operação de detenção no dia 18/07/2017, também responsabilizou pela apreensão e recolha dos objectos suspeitos dos arguidos, bem como, foi ao mini armazém proceder operação de apreensão e levantamentos dos objectos. Além disso, foi apreendido e examinado o aparelho de distribuição de cartas ou seja a “Sapata” encontrada na sala VIP falsa, na parte lateral interior do tal aparelho existe um buraquinho que permite ver o número das cartas e na parte lateral interior junto à saída das cartas existe uma fenda para poder trocar a ordem das cartas, portanto através de ordenamento específico e troca da ordem das cartas, podia controlar absolutamente o resultado do jogo.
- Agente Z6 descreveu as diligências que participou, disse a testemunha que recebeu a queixa do 1º ofendido, que por sua vez iniciou a investigação. Posteriormente, a polícia através do vídeo do Hotel XXX2, do mini armazém e do posto fronteiriço da Terminal, identificou maior parte dos arguidos deste processo. E aquando tais indivíduos tornaram a entrar em Macau, (dia 18/07/2017), o posto fronteiriço comunicou à polícia a entrada de tais indivíduos, tendo assim iniciado a perseguição através do sistema de monitoramento “olho do céu”. Referiu a testemunha que recebeu a queixa do 1º ofendido, que por sua vez iniciou a investigação. Seguindo a pista, os 18 arguidos alojaram no Hotel XXX3, pelo que montou aí vigilância. Na noite do dia 18 de Julho procedeu-se operação de detenção. Mais declarou a testemunha que a polícia procedeu escutas aos 1º e 2º arguidos, cujo conteúdo da conversa era sobre o plano do crime. Outra queixa do 1º ofendido que é sobre a transferência de quatrocentas mil reminbis, dado que ainda não foi detido outros suspeitos, pelo que não permite apurar se esta parte se trata de empréstimo, hipoteca ou de outra natureza, entretanto o 1º ofendido disse que alguém lhe exigiu o pagamento da dívida no valor de três milhões e seiscentas mil.
- Agente Z7 descreveu as diligências que participou, a testemunha disse que no dia 18 de Julho procedeu-se à monitorização dos 9 indivíduos, estes foram ao mini armazém buscar os objectos do crime, bem como, descreveu as circunstâncias decorridas no dia em que o policial foi ao quarto do hotel XXX1.
Nos autos constam grande quantidade de relatórios de visionamento e escutas, foram feitas investigações das entradas e saídas dos respectivos indivíduos nas fronteiras, bem como foram efectuadas diligências de reconhecimento de fotografias, tais dados correspondem com parte dos depoimentos prestados pelos arguidos em audiência, incluindo:
- Nos dias 7 e 8 de Junho de 2017, o 1º arguido A, 3º arguido C, 4º arguido D, 5º arguido E, 6º arguido F, 7ª arguida G, 8º arguido H, 9º arguido I, 11º arguido K, 12º arguido L, 13º arguido M, 14º arguido N, 15º arguido O, 16º arguido P, 17º arguido Q e 18ª arguida R entraram sucessivamente em Macau. A arguida G arrendou no dia 07/06/2017 respectivamente os quartos nºs 2007, 2008, 2010 e 2023 do hotel XXX3 para os diversos arguidos alojarem. (vide vídeo e registo do hotel)
- No dia 18/07/2017, o 4º arguido D, 5º arguido E, 6º arguido F, 9º arguido I, 11º arguido K, 12º arguido L, 14º arguido N, 15º arguido O, 16º arguido P, cada um trouxe bagagens com objectos de jogo, eles apanharam táxi e foram ao edifício industrial XXX, os quais depositaram as bagagens com objectos de jogo no “mini armazém” arrendado, a fim de serem utilizados para a prática do crime. Após, os diversos arguidos saíram de Macau através do posto fronteiriço das Portas do Cerco, chegados à RPC, eles receberam remuneração do arguido A no valor de mil a três mil HK dólares. (vide relatório de visionamento do VCD de fls. 79 a 122, 143 a 170 e 1024 a 1025 dos autos)
- Feito a comparação dos elementos supracitados, demonstra que a operação da primeira vez, o 2º e o 10º arguidos não estavam em Macau.
- No dia 18/07/2017, por volta das 12H26, o 3º arguido C, 4º arguido D, 5º arguido E, 6º arguido F, 9º arguido I, 11º arguido K, 12º arguido L, 14º arguido N, 15º arguido O foram sucessivamente ao “mini armazém” do 6º andar da 3ª fase do edf. Industrial XXX para levantar 9 bagagens com os objectos de jogo e as mesas de jogo montáveis aí colocados, em seguida levaram tais bagagens ao quarto suíte presidencial nº 2101 do hotel XXX1, os restantes arguidos chegaram sucessivamente ao respectivo quarto (vide relatório de visionamento do VCD de fls. 1026 a 1035 dos autos).
- Nos dias 17 e 18 de Julho de 2017, o 1º arguido A, 2º arguido B, 3º arguido C, 4º arguido D, 5º arguido E, 6º arguido F, 7ª arguida G, 8º arguido H, 9º arguido I, 10º arguido J, 11º arguido K, 12º arguido L, 13º arguido M, 14º arguido N, 15º arguido O, 16º arguido P, 17º arguido Q e 18ª arguida R entraram em Macau. A 7ª arguida G arrendou o quarto nº 1823 do hotel XXX3 para os diversos arguidos permanecerem e alojarem. (vide relatório de visionamento do VCD de fls. 1036 a 1050 dos autos) (estavam todos os 18 arguidos)
Nas fls. 1110-1132 dos autos, constam os registos de entradas e saídas dos 18 arguidos durante o período compreendido entre 2015 a Julho de 2017. Entre os quais, com excepção dos 2º e 10º arguidos que apenas entraram em Macau no dia 18/07/2017, na data dos dois factos, os restantes 16 arguidos estavam em Macau (08/06/2017 e 18/01/2017).
No relatório de fls. 663 a 664 e exame de fls. 665 a 674, referente à actividade da segunda vez (18/07/2017), foi encontrada na mesa de jogo nº 2, papel com uma série de grupos numéricos, feito a análise desses grupos numéricos, descobriu-se que caso procedesse a distribuição das cartas conforme a ordem desses grupos numéricos, resultaria aposta vencedora na mão do “jogador” ou empate com prioridade vencedora na mão do “jogador”, porém se trocar a ordem da primeira carta com a segunda carta desse grupo de baralho, resultaria aposta vencedora na mão do “banqueiro”; mais foi feito a análise da “Sapata” da mesa de jogo nº 2, descobriu-se que esta foi reaparelhada, sendo que por cima da placa da Sapata existe um buraquinho que permite ver o número das cartas, além disso, por trás dessa placa existe uma fenda que permite o distribuidor de cartas empurrar a primeira carta para cima, até a carta ficar dentro dessa fenda, as primeiras duas cartas na parte da saída da “Sapata” ficam expostas, o distribuidor das cartas pode escolher livremente tanto a primeira como a segunda carta da Sapata para ser distribuída. Feito a análise do baralho colocado na “Sapata”, verificou-se que a ordem do baralho correspondia com os grupos numéricos supracitados, nestes termos, conforme esta pré-organização da ordem do baralho, acrescidas da reaparelhação e substituição da ordem dessas cartas constantes na “Sapata”, o resultado das apostas era absolutamente controlado.
Nos autos constam o relatório de visionamento (vide anexos) e as escutas de certos arguidos (vide anexos), cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
Nos autos constam ainda as cartas escritas pelos arguidos que pedem benevolência, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
Face ao exposto, o Tribunal conforme as regras da experiência, analisou de forma lógica os meios de prova, designadamente as declarações dos 1º a 15 arguidos prestadas em audiência, leu os interrogatórios dos 16º a 18º arguidos prestados no MP, leu as declarações para memória futura dos 4 ofendidos, ouviu em audiência as declarações do ofendido Y, ouviu os 4 investigadores, bem como, ponderou os documentos constantes nos autos, especialmente, as fotos extraídas do vídeo do hotel, o relatório de visionamento do VCD, o auto de apreensão e os registos de entrada e saída dos arguidos, tendo o Tribunal considerado suficientes as provas produzidas em audiência para reconhecer provados os factos.
Neste caso em apreço, feito a análise de todas as provas constantes nos autos, pôde reconhecer que A, (1º arguido fingido proprietário da sala VIP) nessa segunda actividade criminosa, recrutou sucessivamente, C (3º arguido fingido de guarda de segurança), D (4º arguido fingido de crupiê), E (5º arguido fingido de crupiê), F (6º arguido fingido de bate-fichas), G (7ª arguida namorada do 1º arguido), H (8º arguido fingido de cliente), I (9º arguido fingido da caixa), J (10º arguido fingido de guarda de segurança), K (11º arguido fingido de empregado de serviços), L (12º arguido fingido de cliente), M (13º arguido gingido de fingido de ajudante), N (14º arguido fingido de cliente), O (15º arguido fingido de bate-fichas), P (16º arguido fingido de guarda segurança), Q (17º arguido fingido de empregado de serviços) e R (18ª arguida fingida de empregada de serviços) para desempenhar papéis diferentes. Além disso, foi apurado que a actividade da segunda vez, o 1º arguido e 2º arguido B actuaram em colaboração.
Neste processo, ouvidas as declarações dos diversos arguidos, foram suficientes para reconhecer que eles sempre souberam da situação e o papel que desempenhavam, eles sabiam que o quarto do hotel foi decorado para fingir-se de sala VIP, a fim de burlar o dinheiro dos clientes.
É de salientar que na actividade da segunda vez (18/07/2018), houve confissão do 1º arguido e cooperação dos diversos arguidos, sem dúvida que eles utilizaram uma “Sapata” (aparelho de distribuição de cartas) reaparelhada, cujo instrumento foi suficiente para trapacear e fazer perder o dinheiro aos clientes. Quanto à actividade da 1ª vez (08/06/2017), não obstante o 1º arguido ter negado o facto, contudo através das declarações dos 2º, 3º e 16º arguidos, soube que o 1º arguido referiu-lhes o plano de burla, isto é, através de casino reaparelhado trapacear o dinheiro dos clientes, basta os clientes jogar para perder dinheiro, só que o 1º arguido não disse os pormenores. Os factos demonstram que o 1º arguido despendeu grande quantidade de pessoal, material e dinheiro, investiu numerário avultoso para criar uma sala VIP falsa, usou remuneração alta para atrair os arguidos deste processo à prática dos factos, ele apenas em curto período de tempo criou e pôs em funcionamento esta sala VIP, caso esta sala funcionasse como um casino normal, pois era impossível de obter lucros. Os factos provam que dessas duas operações, quer seja o 1º ofendido, ou 2º a 5º ofendidos, nenhum deles ganhou dinheiro. Mesmo que aceitássemos a versão do 1º arguido (o banqueiro cobra comissão, pelo que obtém lucro), mas para que tal exploração produza efeito é preciso um prazo bastante longo, da forma como os arguidos procederam, este casino não possuía fichas verdadeiras ou dinheiro, eles de facto, nem tinham capital para pagar aos clientes se estes ganhassem, então, de que maneira podiam dizer que usaram meios normais para explorar um casino falso, assim sendo, as provas constantes nos autos foram suficientes para reconhecer que o caso do dia 08/06/2017, os arguidos usaram a mesma forma para trapacear os clientes, fazendo-os jogar e perder dinheiro, a fim de atingir o seu objectivo comum à prática do crime”, (cfr., fls. 1526 a 1532-v e 2172 a 2196).

Perante isto, há que dizer, onde está o vício ou “erro” pelos recorrentes apontado?

Apresenta-se-nos assim óbvio que os recorrentes tentam impor a sua “versão dos factos”, pretendendo anular a decisão da matéria de facto proferida (e adequadamente fundamentada) com base em apreciações pessoais e subjectivas, evidente se nos mostrando também a improcedência do recurso nesta parte.

Resolvidas que assim ficam as questões relativas à “decisão da matéria de facto”, continuemos.

–– Da (alegada errada) “qualificação jurídica”.

Como atrás se deixou relatado, entendem os (1°, 3° a 7ª, 9°, 11°, 12°, 14° e 15°) arguidos, A, C, D, E, F, G, I, K, L, N e O, ora recorrentes, que os crimes de “jogo fraudulento” e “burla” estão numa relação de “concurso aparente”, considerando, também, os (3°, 11° e 15°) arguidos C, K e O, que a “qualificação” da sua conduta quanto à prática dos crimes de “burla” se apresenta incorrecta.

Ora, como se viu, estes (3°, 11° e 15°) arguidos C, K e O foram condenados como co-autores da prática em concurso real de:
- 2 crimes de “jogo fraudulento”, p. e p. pelo art. 6°, n.° 1 da Lei n.° 8/96/M, na pena individual de 1 ano e 9 meses de prisão cada; e,
- 2 crimes de “burla (agravada)”, um deles, na forma tentada, p. e p. pelo art. 211°, n.° 4, al. a) e 196°, al. b) do C.P.M., nas penas parcelares e individuais de 2 anos e 9 meses e 1 ano de prisão.

E, quanto aos alegados “crimes de burla”, incorrem em manifesto equívoco.

Em essência, dizem que como em relação ao 2° crime de “burla” não houve “prejuízo”, verificada não está a “circunstância qualificativa” da al. a) do n.° 4 do art. 211° do C.P.M., devendo assim ser condenados por um crime de “burla simples”, na forma tentada.

Porém, não é por não ter havido (efectivo) prejuízo que “cai” a dita qualificativa.

A ser assim, e nos crimes contra o património, nunca haveria tentativas qualificadas pelo valor, o que, como se apresenta evidente, não corresponde à verdade.

No caso, a quantia em questão e que estava na “mira” dos arguidos era a de HKD$300.000,00, e o “golpe” apenas não se concretizou em virtude da (oportuna) intervenção dos agentes da Polícia Judiciária que com a sua presença no local onde os factos decorriam – um quarto, simulando uma “sala de jogo” autorizada – impediram a sua concretização, (consumação).

E, nesta conformidade, a “burla” em questão, ainda que (apenas) na forma “tentada”, não deixa de ser “qualificada” pelo dito montante.

Em relação ao alegado “concurso aparente” entre o crime de “burla” e “jogo fraudulento”, cabe dizer que também não se mostra de acolher a pretensão dos atrás identificados recorrentes, pois que a conduta nos autos dada como provada demonstra (diferentes) resoluções criminosas de ofender bens jurídicos também diversos concretizados através de diferentes acções, preenchendo-se requisitos de tipos ilícitos distintos.

Com efeito, para além de os “factos” se apresentarem com “autonomia”, com os crimes em questão tutelam-se “bens jurídicos distintos”.

Na “burla”, o património do(s) ofendido(s).

No “jogo fraudulento”, as regras que disciplinam a exploração da indústria do jogo e o próprio jogo, no que toca à (natural) possibilidade, (probabilidade), de qualquer jogador vir a ganhar com base na sua sorte, o que certamente não acontece se, como sucedeu, a própria exploração do jogo era ilegal porque não autorizada, e as ditas regras do jogo não eram respeitadas com o intuito de se obter “resultados provocados”.

E, assim sendo, (como temos vindo a entender), diferentes sendo os “bens jurídicos” tutelados, há que se considerar que os crimes em questão estão numa relação de “concurso real”, tal como decidido foi pelo T.J.B.; (cfr., v.g., o Ac. deste T.S.I. de 05.06.2003, Proc. n.° 76/2003, e o do Vdo T.U.I. de 06.12.2017, Proc. n.° 78/2017).

Aqui chegados, e acertada se apresentando a “qualificação jurídico-penal” pelo T.J.B. operada, continuemos.

–– Por fim, quanto às “penas”.

Ora, cremos que também aqui, justa e adequada se nos apresenta a decisão do T.J.B., pois que ponderadas as condutas dos arguidos ora recorrentes, as molduras penais aplicáveis aos crimes pelos mesmos cometidos, e as necessidades de prevenção criminal, cremos que as penas parcelares e únicas aplicadas não se apresentam inflaccionadas, respeitados estando os critérios dos art°s 40°, 65° e 71° do C.P.M..

Aliás, importa ter também em conta que para a pretendida “redução da pena” nada (de concreto) alegam os recorrentes, constituindo até um pedido (tão só) deduzido em consequência da almejada “alteração da qualificação jurídica” que, como se viu, não teve lugar.

Mantendo-se as penas parcelares e única, verifica-se que fica uma questão por resolver, e que tem a ver com o pedido de suspensão da execução da pena aplicada ao (2°) arguido B.

Com efeito, confirmando-se-lhe a pena única de 2 anos e 3 meses de prisão, verificado está o “pressuposto formal” do art. 48° do C.P.M..

Porém, não nos parece que verificado esteja o igualmente necessário “pressuposto material”, havendo que ter em conta que os arguidos dos autos agiram conluiados, com grande nível de organização e divisão de tarefas, fazendo incidir a sua conduta numa “realidade” de grande importância para a estabilidade económica e social da R.A.E.M., (a indústria do jogo), muito fortes sendo assim as necessidades de prevenção criminal, a impedir que se deicida por um suspensão da execução da pena ao referido (2°) arguido B aplicada.

Tudo visto, resta decidir.

Decisão

4. Nos termos e fundamentos expostos, em conferência, acordam negar provimento aos recursos.

Pagarão os (1°, 2°, 6° a 9° e 13°) arguidos A, B, F, G, H, I e M, a taxa de justiça (individual) de 5 UCs, suportando os (3° a 5°, 11°, 12°, 14° e 15°) arguidos C, D, E, K, L, N e O, a taxa de justiça (individual) de 10 UCs.

Honorários aos Exmos. Defensores oficiosos no montante de MOP$2.500,00.

Registe e notifique.

Nada vindo de novo, e após trânsito, remetam-se os autos ao T.J.B. com as baixas e averbamentos necessários.

Macau, aos 24 de Janeiro de 2019
José Maria Dias Azedo
Chan Kuong Seng
Tam Hio Wa
Proc. 905/2018 Pág. 78

Proc. 905/2018 Pág. 77