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Processo n.º 102/2018
Recurso jurisdicional em matéria administrativa
Recorrente: Companhia de Investimento Polaris, Limitada
Recorrido: Chefe do Executivo
Data da conferência: 20 de Fevereiro de 2019
Juízes: Song Man Lei (Relatora), Sam Hou Fai e Viriato Manuel Pinheiro de Lima

Assuntos: - Caducidade da concessão
- Falta de aproveitamento do terreno
- Caducidade-preclusão
- Acto vinculado
- Lei Básica da RAEM

SUMÁRIO
1. Conforme os preceitos contidos no ponto XIV do Anexo I da Declaração Conjunta Luso-Chinesa e nos art.ºs 120.º e 145.º da Lei Básica da RAEM, os contratos de concessão de terras celebrados antes de 20 de Dezembro de 1999 são reconhecidos e protegidos pela RAEM, bem como os direitos deles emergentes. Quanto às renovações das concessões que ocorressem após aquela data aplicavam-se as leis que, entretanto, vigorassem, sendo que, nas matérias não prevista nos contratos, a lei nova poderia afastar-se do regime prevista na lei antiga, então vigente.
2. A protecção legal desses contratos e direitos dos concessionários para além do prazo inicial de arrendamento depende sempre da renovação das respectivas concessões, efectuada em conformidade com as leis vigentes na altura de renovação.
3. A regra de não renovação das concessões provisórias expressamente estabelecida no n.º 1 do art.º 48.º da Lei de Terras nova (Lei n.º 10/2013) não é inovadora. Embora na anterior Lei de Terras não se contenha uma norma expressa que estabeleça a regra, a mesma intenção legislativa resulta da interpretação conjunta dos art.ºs 49.º, 54.º e 55.º desta Lei.
4. Tanto na vigência da anterior Lei de Terras como da Lei nova, o não aproveitamento do terreno concedido nos prazos e termos contratuais implica a caducidade da concessão do mesmo terreno.
5. Nos termos da al. 3) do art.º 215.º da Lei de Terras nova e na matéria respeitante à caducidade das concessões provisórias anteriores à sua entrada em vigor, aplica-se o disposto no art.º 166.º desta nova lei.
6. A caducidade da concessão provisória por decurso do prazo de arrendamento constitui um caso de caducidade-preclusão, pelo que, decorrido o prazo de 25 anos da concessão provisória (se outro prazo não estiver fixado no contrato), o Chefe do Executivo deve declarar a caducidade do contrato se considerar que, no mencionado prazo, não foram cumpridas as cláusulas de aproveitamento previamente estabelecidas, não tendo que apurar se este incumprimento se deve ter por motivo não imputável ao concessionário.
7. O acto do Chefe do Executivo que declare a caducidade da concessão por falta de aproveitamento, nos termos do art.º 166.º da Lei de Terras de 2013, é um acto vinculado.
8. Face à Lei de Terras vigente, o Chefe do Executivo não tem margem para declarar ou deixar de declarar a caducidade da concessão, tendo que a declarar necessariamente, não valem aqui os vícios próprios de actos discricionários, como a violação de princípios gerais do Direito Administrativo (da boa-fé, da justiça e da imparcialidade).
9. Também não se releva a apreciação da violação do princípio da decisão imputada pela recorrente.

A Relatora,
Song Man Lei
ACORDAM NO TRIBUNAL DE ÚLTIMA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU:

1. Relatório
Companhia de Investimento Polaris, Limitada, melhor identificada nos autos, interpôs o recurso contencioso de anulação do despacho do Senhor Chefe do Executivo, de 21 de Março de 2016, que declarou a caducidade da concessão, por arrendamento, do terreno com a área de 19314 m2, situado na ilha da Taipa, na Baía do Pac On (Sul), pelo decurso do prazo de arrendamento.
Por acórdão proferido em 28 de Junho de 2018, o Tribunal de Segunda Instância julgou improcedente o recurso contencioso, confirmando o acto administrativo impugnado.
Inconformada com o acórdão, recorre a Companhia de Investimento Polaris, Limitada para o Tribunal de Última Instância, fundamentando o seu recurso:
- Na omissão de pronúncia do Tribunal recorrido quanto ao concreto caso que lhe foi colocado, o que configura a nulidade prevista na al. e) do n.º 1 do art.º 571.º do Código de Processo Civil (CPC), aplicável por força do art.º 1.º do Código do Processo Administrativo Contencioso (CPAC);
- No facto de os art.ºs 47.º n.º 1, 48.º n.º 1, 166.º e 215.º da Lei n.º 10/2013 violarem a Declaração Conjunta do Governo da República Portuguesa e do Governo da República Popular da China e violarem a Lei Básica da RAEM, designadamente os seus art.ºs 120.º e 145.º no que se refere aos contratos de concessão de terras celebrados antes de 1999;
- Na errada interpretação da lei quanto à irrelevância da apreciação da culpa no caso concreto;
- Na errada interpretação quanto à aplicação dos princípios da igualdade, da boa-fé, da justiça e da imparcialidade apenas aos actos discricionários, em violação do disposto no n.º 4 do art.º 2.º e nos art.ºs 5.º, 7.º, 8.º e 11.º, todos do Código do Procedimento Administrativo (CPA); e
- Na omissão de pronúncia relativamente à violação de cada um daqueles princípios ao caso concreto, o que viola a al. e) do n.º 1 do art.º 571.º do CPC, aplicável por força do art.º 1.º do CPAC.

Contra-alegou a entidade recorrida, entendendo que deve ser negado provimento ao recurso jurisdicional.
E o Digno Magistrado do Ministério Público emitiu o douto parecer, no sentido de não merecer censura o acórdão recorrido, que deve ser mantido, negando-se provimento ao recurso jurisdicional.
Foram corridos os vistos.
Cumpre decidir.

2. Factos
O Tribunal de Segunda Instância considera provada a seguinte matéria de facto com pertinência para a decisão do recurso:
- A recorrente é uma sociedade comercial, com sede em Macau.
- Pelo Despacho n.º 159/SATOP/90, publicado no suplemento ao Boletim Oficial de Macau n.º 52, de 26 de Dezembro de 1990, sujeito a rectificação publicada no Boletim Oficial de Macau n.º 7, de 18 de Fevereiro de 1991, a recorrente obteve a concessão, por arrendamento e com dispensa de hasta pública, de um terreno sito na Ilha da Taipa, na Baía do Pac On (Sul), com a área de 27188m² (após revisão passou a ser de 19314m²).
- Esta concessão foi revista pelos Despachos n.ºs 59/SATOP/95, publicado no Boletim Oficial de Macau n.º 23, II Série, de 7 de Junho de 1995, e 32/SATOP/99, publicado no Boletim Oficial de Macau n.º 16, II Série, de 21 de Abril de 1999.
- A finalidade de tal concessão era a construção de um complexo de edifícios destinado a habitação, comércio, equipamento social e estacionamento.
- O arrendamento é válido pelo prazo de 25 anos, contados a partir de 26 de Dezembro de 1990, data da publicação no Boletim Oficial do Despacho n.º 159/SATOP/90 que autorizou o contrato de concessão.
- Conforme o estipulado no n.º 1 da cláusula quinta do contrato de concessão, o prazo global de aproveitamento terminaria em 26 de Dezembro de 2002.
- Até 25 de Dezembro de 2015, a recorrente não procedeu ao aproveitamento do terreno.
- Por ofício de 23.10.2014, a recorrente foi notificada, em sede de audiência de interessados, do projecto de decisão no sentido da provável declaração de caducidade da concessão do terreno.
- Em 27.10.2014, a recorrente apresentou a sua defesa por escrito à DSSOPT.
- Reunida em sessão de 7 de Janeiro de 2016, a Comissão de Terras emitiu o seguinte parecer:
“Proc. n.º 71/2013 – Respeitante à proposta da declaração de caducidade da concessão, por arrendamento e com dispensa de hasta pública, do terreno com a área de 27188m2 (após a revisão a área passou a ser de 19314m2), situado na ilha da Taipa, no Baía do Pac On (Sul), a favor da Companhia de Investimento Polaris, Limitada, pelo decurso do seu prazo de vigência, de 25 anos, que expirou em 25 de Dezembro de 2015. Não obstante, até esta data verificava também o incumprimento das disposições do contrato, nomeadamente a do aproveitamento do terreno nos prazos fixados, cuja concessão foi titulada pelo Despacho n.º 159/SATOP/90, sujeito a rectificação publicada no Boletim Oficial de Macau n.º 7, de 18 de Fevereiro de 1991, e revista pelos Despachos n.ºs 59/SATOP/95 e 32/SATOP/99. Declarada a caducidade da concessão, reverterão para a Região Administrativa Especial de Macau (RAEM) os prémios pagos e as benfeitorias por qualquer forma incorporadas no terreno, não tendo a concessionária direito a ser indemnizado ou compensado.
I
1. Pelo Despacho n.º 159/SATOP/90, publicado no suplemento ao Boletim Oficial de Macau n.º 52, de 26 de Dezembro de 1990, sujeito a rectificação publicada no Boletim Oficial de Macau n.º 7, de 18 de Fevereiro de 1991, foi concedido, por arrendamento e com dispensa de hasta pública, o terreno com a área de 27188m2 (após a revisão a área passou a ser de 19314m2), situado na ilha da Taipa, na Baía do Pac On (Sul), a favor da Companhia de Investimento Polaris, Limitada. Esta concessão foi revista pelos Despachos n.ºs 59/SATOP/95, publicado no Boletim Oficial de Macau n.º 23, II Série, de 7 de Junho de 1995, e 32/SATOP/99, publicado no Boletim Oficial de Macau n.º 16, II Série, de 21 de Abril de 1999.
2. Nos termos do n.º 2 da cláusula primeira do contrato de concessão titulado pelo Despacho n.º 32/SATOP/99: “em consequência da presente revisão, a concessão de terreno passa a reger-se pelas cláusulas constantes deste contrato”.
3. Segundo a cláusula segunda do contrato de concessão atrás referido, o arrendamento é válido pelo prazo de 25 anos, contados a partir de 26 de Dezembro de 1990, data da publicação no Boletim Oficial do Despacho n.º 159/SATOP/90 que autorizou o contrato de concessão, e até 25 de Dezembro de 2015.
4. De acordo com a cláusula terceira do referido contrato de concessão, o terreno é aproveitado com a construção de um complexo de edifícios destinado a habitação, comércio, equipamento social e estacionamento.
5. Conforme o estipulado no n.º 1 da cláusula quinta do referido contrato de concessão, o prazo global de aproveitamento terminaria em 26 de Dezembro de 2002. Nos termos do n.º 2 da mesma cláusula, o prazo acima referido inclui os prazos para elaboração, apresentação e aprovação, pelos Serviços competentes, dos respectivos anteprojectos (projectos de arquitectura) e projectos de obras (projectos de fundações, estruturas, águas, esgotos, electricidade e instalações especiais), dos projectos de infra-estruturas (arruamentos, redes de águas, esgotos, electricidade, muro de protecção e suporte de aterro), dos projectos relativos à execução de todas as obras que constituem os encargos previstos na cláusula sexta, assim como de todas as obras que constituem o pagamento em espécie a que se refere a cláusula oitava.
6. Nos termos da cláusula oitava do referido contrato, o prémio foi fixado no montante de $115.141.013,00 patacas, dos quais $39.491.640,00 patacas já tinham sido liquidados pela concessionária e o remanescente no valor de $75.649.373,00 patacas seriam pagos em prestações e através da dação em pagamento das obras. Conforme as informações da folha de acompanhamento financeiro, a concessionária pagou o prémio em numerário, mas as duas últimas prestações foram pagas em atraso, pagamento esse efectuado apenas em 30 de Junho de 2009. Relativamente ao prémio a pagar por dação em pagamento das obras, a concessionária não procedeu às respectivas obras.
7. Conforme a certidão do registo predial (até 21 de Outubro de 2011) da Conservatória do Registo Predial (CRP), o terreno encontra-se descrito sob o n.º 22349 a fls. 52 do livro B16K e os direitos resultantes da concessão estão inscritos a favor da Companhia de Investimentos Polaris, Limitada, sob o n.º 2551 a fls. 111 do livro F11K, onerados com hipoteca voluntária constituída em 2005 e registada com o n.º 64379C a favor do Banco Industrial e Comercial da China (Macau), S.A. (anteriormente com a firma Banco Seng Heng, S.A.), cujo crédito é de $206.000.000,00 patacas para efeitos de abertura de crédito em concessão de facilidades bancárias gerais à Companhia de Investimentos Polaris, Limitada.
II
8. Desde que foi concedida a concessão titulada pelo Despacho n.º 159/SATOP/90, de 26 de Dezembro de 1990, a concessionária submeteu, em 2 de Abril de 1992, um projecto de arquitectura a solicitar o arranjo interior da área de concessão, a redefinição da configuração da parcela, o acréscimo das áreas brutas de construção (ABC) das diversas finalidades, etc. O referido projecto foi aprovado pelo Secretário-Adjunto para os Transportes e Obras Públicas (SATOP) por despacho de 12 de Junho de 1992 e confirmado em 31 de Maio de 1993.
9. Em 20 de Julho de 1993, a concessionária apresentou ao Governador de Macau um pedido de revisão do contrato da concessão.
10. A Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes (DSSOPT) enviou em 27 de Novembro de 1993 a respectiva minuta de contrato à concessionária e a mesma através de resposta de 15 de Dezembro do mesmo ano dirigida ao SATOP manifestou a sua discordância com as condições estipuladas na minuta do contrato, especialmente no que se referia ao valor do prémio.
11. Após várias negociações entre ambas as partes, a DSSOPT enviou em 21 de Outubro de 1994 a nova minuta do contrato à concessionária e esta, através de resposta de 28 de Outubro de 1994, manifestou a sua concordância com a mesma.
12. Por força das condicionantes urbanísticas definidas para o local na planta de alinhamento oficial (PAO) emitida em 13 de Novembro de 1992, a concessionária foi obrigada a reverter as parcelas com as áreas de 6078m2 e 424m2 para o domínio público do Território, bem como a parcela com a área 1385m2 para o domínio privado do Território, ficando assim o terreno a conceder com uma área rectificada de 19314m2.
III
13. Esta revisão do contrato de concessão foi titulada pelo Despacho n.º 59/SATOP/95, publicado no Boletim Oficial de Macau n.º 23, II Série, de 7 de Junho de 1995.
14. No entanto, a concessionária não aproveitou o terreno nem pagou o prémio resultante da revisão do respectivo contrato de concessão.
15. Em 2 de Maio de 1997, a concessionária submeteu uma carta à DSSOPT a informar que estava a passar por uma profunda reorganização e redistribuição de quotas, mas que manifestava ainda o seu interesse pela conclusão do aproveitamento do terreno pelo que solicitava à Administração a concessão de um prazo de 120 dias por forma a permitir apresentar um novo estudo prévio e se proceder depois ao reajustamento dos prazos fixados no contrato, do montante global do prémio e do reescalonamento do seu pagamento.
16. Em 19 de Março de 1998, o SATOP exarou o seu despacho na informação n.º 63/DSODEP/98, de 10 de Março de 1998, a autorizar o novo escalonamento de pagamento do prémio, a manutenção do seu valor total, a actualização do valor da renda e a prorrogação do prazo de aproveitamento do terreno até 26 de Junho de 2001.
IV
17. A revisão do contrato de concessão decorrentes destas alterações foi titulada pelo Despacho n.º 32/SATOP/99, publicado no Boletim Oficial de Macau n.º 16, II Série, de 21 de Abril de 1999.
18. A concessionária não procedeu ao aproveitamento do terreno em conformidade com o contrato de concessão.
19. A concessionária submeteu apenas em 29 de Outubro de 2004 um pedido ao Gabinete do Secretário para os Transportes e Obras Públicas (STOP) a solicitar autorização para a transmissão dos direitos resultantes da concessão, por arrendamento, a favor da Companhia de Investimento Imobiliário Hop Sea, Limitada, ao qual juntou em anexo um termo de compromisso, no qual a Companhia de Investimento Imobiliário Hop Sea, Limitada se comprometia a pagar à RAEM, em uma só prestação, os prémios e a renda em dívida, bem como concluir o projecto de aproveitamento do terreno previsto no respectivo contrato de revisão da concessão, no prazo de 48 meses contados a partir da data da publicação do respectivo despacho.
20. Em 28 de Fevereiro de 2006, a concessionária apresentou à DSSOPT um estudo prévio.
21. Por despacho de 12 de Maio de 2006, exarado na informação n.º 153/DPU/2006, de 11 de Abril de 2006, o então STOP concordou com o parecer favorável emitido sobre o estudo prévio acima mencionado. O referido estudo prévio propunha a construção de um complexo de edifícios, em regime de propriedade horizontal, passando a altura máxima de 82,5m NMM (Nível Médio do Mar) para 153,76m NMM. (As finalidades e ABC’s eram as seguintes: habitação: 308117m2; estacionamento: 68680m2 e equipamento social: 4880m2).
22. Através do ofício datado de 27 de Junho de 2006, a DSSOPT comunicou à concessionária que o referido estudo prévio tinha merecido parecer favorável, condicionado à alteração do mesmo para cumprimento dos pareceres emitidos pelos serviços competentes.
23. Em 4 de Janeiro de 2007, a concessionária apresentou um anteprojecto de obra e em 23 de Abril de 2007, a DSSOPT em resposta notificou a requerente que devia proceder a alteração do projecto em virtude da volumetria da construção não obedecer às condições exigidas.
24. Posteriormente, a concessionária apresentou um novo anteprojecto de obra em 16 de Maio de 2007.
25. Segundo o Acórdão de 22 de Abril de 2009 do Tribunal de Última Instância relativo ao processo n.º 53/2008, ficou provado que o procedimento respeitante ao empreendimento da construção a executar no terreno situado na ilha da Taipa, na Baía do Pac On (Sul), envolveu a prática de um crime de corrupção passiva para acto ilícito por parte do então STOP.
26. Por despacho de 19 de Junho de 2009, exarado na informação n.º 96/DSODEP/2009, de 5 de Junho de 2009, o então Chefe do Executivo concordou que nos termos das disposições da alínea c) do n.º 2 do artigo 122º e do n.º 2 do artigo 123º do Código do Procedimento Administrativo (CPA):
26.1 A declaração da nulidade do despacho favorável do então STOP, de 12 de Maio de 2006, sobre o estudo prévio apresentado em 28 de Fevereiro de 2006 (com o número de entrada 0965 do Gabinete do STOP), mantendo-se a concessão do terreno situado na ilha da Taipa, na Baía do Pac On (Sul), titulada pelos Despachos n.ºs 159/SATOP/90, 59/SATOP/95 e 32/SATOP/99;
26.2 A declaração da nulidade dos despachos favoráveis emitidos aos planos de aproveitamento do terreno, aos projectos de obras e a todos os outros projectos relativos ao terreno situado na ilha da Taipa, na Baía do Pac On (Sul).
27. Em 26 de Junho de 2009, a DSSOPT comunicou à concessionária que os despachos emitidos sobre o projecto de aproveitamento e o projecto de arquitectura, bem como todos os despachos favoráveis todos eles tinham sido declarados nulos.
28. Em 18 de Junho de 2010, a concessionária apresentou à DSSOPT um novo projecto de arquitectura. De acordo com a ficha técnica do respectivo projecto, a concessionária propunha as seguintes ABC’s: habitação: 253063m2; comércio: 1766m2; estacionamento: 74896m2 e equipamento Social: 8972m2.
29. A DSSOPT não concluiu ainda a apreciação do projecto de arquitectura acima referido.
V
30. A fim de reforçar a fiscalização da situação do aproveitamento dos terrenos concedidos e optimizar a gestão dos recursos dos solos, o STOP emitiu o despacho n.º 07/SOPT/2010, de 8 de Março de 2010, a ordenar à DSSOPT para notificar as concessionárias dos terrenos não aproveitados para a apresentação de uma justificação por escrito pelo incumprimento dos contratos no prazo de um mês contado a partir da data da recepção do ofício, e que a DSSOPT procedesse, após a recepção das justificações, à análise e elaboração de um plano de tratamento e à respectiva ordem de prioridade.
31. Após várias discussões e análises com o Gabinete do STOP sobre o tratamento dos terrenos não aproveitados, o Departamento de Gestão de Solos (DSODEP) da DSSOPT submeteu à consideração superior, através da informação n.º 095/DSODEP/2010, de 12 de Maio de 2010, o mapa da situação dos terrenos não aproveitados, os critérios de classificação do grau de gravidade dos mesmos e as situações de incumprimento dos contratos, bem como os princípios de tratamento dos processos, tudo no intuito de permitir estabelecer orientações claras e precisas para o tratamento dessas situações. O STOP concordou com os respectivos critérios de classificação do grau de gravidade e os princípios de tratamento definidos na informação atrás referida, os quais foram também autorizados por despacho do Chefe do Executivo, de 31 de Maio do mesmo ano.
32. Em consequência disto, a DSSOPT através do ofício datado de 23 de Março de 2010, solicitou à Companhia de Investimentos Polaris, Limitada a apresentação, no prazo de 30 dias contados a partir da data de recepção da notificação, de uma justificação pelo incumprimento do aproveitamento do terreno e de todas as informações consideradas relevantes.
33. A Companhia de Investimentos Polaris, Limitada submeteu, em 23 de Abril de 2010, uma resposta, cujo teor consta das páginas 251 a 252 do Processo, que aqui se dá por integralmente reproduzido, a expor principalmente o seguinte:
33.1 Fez uma descrição sumária dos trabalhos da companhia no período entre 2004 e 2009, nomeadamente o que diz respeito aos pedidos apresentados à DSSOPT e as respectivas respostas;
33.2 A partir de 1992, devido à política de “constrangimento marco-económico”, a economia de Macau foi afectada durante um período de 10 anos, e só a partir de 2004 se iniciou a retoma, pelo que foi só a partir deste ano que a concessionária conseguiu encontrar parceiros com capacidade e experiência para que antes do termo do prazo de arrendamento da concessão pudesse cumprir plenamente as responsabilidades assumidas no contrato de concessão;
33.3 A concessionária comprometeu-se a apresentar no prazo de 60 dias um novo projecto elaborado de acordo com a Circular n.º 01/DSSOPT/2009;
33.4 O prémio, os respectivos juros de mora e a renda já tinham sido pagos e os elementos comprovativos entregues.
34. Posteriormente, em 2 de Agosto de 2011, a Companhia de Investimentos Polaris, Limitada dirigiu um pedido ao Chefe do Executivo a justificar novamente o motivo pelo não aproveitamento do terreno, cujo teor consta das páginas 271 a 285 do Processo, que aqui se dá por integralmente reproduzido, a expor principalmente o seguinte:
34.1 O terreno não foi aproveitado no prazo estabelecido devido à recessão económica e à política de reajustamento marco-económico adoptada pela China durante o período entre 1990 e 2004 que afectou negativamente o sector da construção de Macau;
34.2 Os sócios da companhia contraíram dívidas significativas;
34.3 Naquela altura, o sócio maioritário da companhia desconhecia os procedimentos administrativos do Governo de Macau, pelo que não apresentou qualquer pedido para a prorrogação do prazo de aproveitamento;
34.4 Os prémios, a renda e os respectivos juros encontram-se totalmente liquidados;
34.5 O acto ilícito praticado pelo então STOP não tem nada a ver com os actuais sócios e o Sr. A já não é sócio da nossa companhia;
34.6 A nossa companhia colaborou desde sempre com a DSSOPT no respeitante à apresentação de projectos elaborados de acordo com as instruções da DSSOPT;
34.7 Neste momento, a nossa companhia está a aguardar a emissão da nova PAO da DSSOPT, bem como a apreciação do projecto apresentado em 18 de Junho de 2010;
34.8 Por fim, solicitava ao Chefe do Executivo o seguinte:
34.8.1 Considerar justificado o incumprimento das obrigações contratuais previstas no Despacho n.º 32/SATOP/99 referente ao aproveitamento do terreno;
34.8.2 Mandar proceder à apreciação e aprovação do projecto de aproveitamento apresentado pela nossa companhia em 18 de Junho de 2010, o qual foi elaborado de acordo com a Circular n.º 01/DSSOPT/2009;
34.8.3 Autorizar a revisão do respectivo contrato de concessão caso fosse autorizado o projecto de aproveitamento acima referido; ou
34.8.4 Autorizar a apresentação de um novo projecto de aproveitamento elaborado de acordo com as cláusulas previstas no Despacho n.º 32/SATOP/99;
34.8.5 Por fim, esta companhia comprometia-se a concluir o aproveitamento total do terreno no prazo de 48 meses contados a partir da data da aprovação de qualquer dos casos previstos nos pontos 34.8.2, 34.8.3 ou 34.8.4 ou no prazo de 36 meses contados a partir da data da emissão da respectiva licença de obras.
35. O DSODEP procedeu à análise do processo e elaborou a informação n.º 266/DSODEP/2011, de 20 de Outubro de 2011, cujo teor consta das páginas 24 a 34 do Processo, que aqui se dá por integralmente reproduzido, a expor principalmente o seguinte:
35.1 De acordo com os critérios de classificação do grau de gravidade definidos na informação n.º 95/DSODEP/2010, o presente processo era considerado como um caso de terreno não aproveitado pertencente a uma situação “muito grave”, isto é, “prazo restante da concessão do terreno com menos de 5 anos”, e duas situações “graves”, ou seja, “prazo de aproveitamento de terreno tinha expirado e carecia de apresentação de pedido de prorrogação do prazo” e “apenas solicitou a alteração do aproveitamento e/ou da finalidade do terreno, mas carecia de apresentação de projecto de aproveitamento conforme estipulado no contrato de concessão do terreno”;
35.2 Relativamente à não conclusão do aproveitamento do terreno dentro do prazo previsto no contrato de concessão, a concessionária apresentou em 23 de Abril de 2010 e 3 de Agosto de 2011 duas cartas a justificar o seu incumprimento, nas quais considerava que a culpa se devia à política de reajustamento marco-económico adoptada pela China que fez com que a economia de Macau atravessasse um período de recessão, afectando directamente o sector imobiliário, pelo que não se considerou adequado desenvolver o terreno em conformidade com as condições previstas no respectivo contrato de concessão. No entanto, de acordo com a seguinte análise, a culpa pela não conclusão do aproveitamento do terreno devia ser imputada inteiramente à concessionária;
35.2.1 Em primeiro lugar, após a publicação do Despacho n.º 159/SATOP/90 em Dezembro de 1990 que titulou o respectivo contrato de concessão, embora a economia de Macau tivesse sido afectada negativamente pela política de reajustamento marco-económica adoptada pela China (a partir dos meados de 1993), pela crise financeira asiática (de 1997 a 1998) e pela síndrome respiratória aguda severa (a partir dos meados de 2002 até princípios de 2003), contudo, após o retorno de Macau à pátria e antes da ocorrência da crise financeira asiática, excepto o período em que foi afectada pela síndrome respiratória aguda severa, com a liberalização da indústria do jogo e a política de vistos individuais, a economia de Macau registou um período de crescimento, pelo que, não faltaram oportunidades para o aproveitamento do terreno;
35.2.2 Mas não, após decorrido o prazo de aproveitamento do terreno (26 de Dezembro de 2002), a concessionária apenas solicitou a alteração do aproveitamento do terreno, nunca solicitou à Administração a prorrogação do prazo de aproveitamento do terreno devido aos impactos resultantes do ambiente económico de Macau e que estavam a afectar a concretização do seu empreendimento. Caso a concessionária tivesse aproveitado o terreno de acordo com o estipulado no Despacho n.º 32/SATOP/99, a obra já teria ficado concluída, independentemente dos impactos negativos resultantes da crise financeira asiática, da síndrome respiratória aguda severa ou do tsunami financeiro;
35.2.3 Assim, o não aproveitamento do terreno deve ser imputado à concessionária, nada tem a ver directamente com os impactos provocados pelo ambiente económico, pelo que a mesma não pode, de modo algum, alegar a recessão económica de Macau que afectou negativamente o mercado imobiliário como pretexto para o não aproveitamento do terreno;
35.2.4 Comparação entre as ABC’s do novo projecto de arquitectura apresentado pela concessionária em 18 de Junho de 2010 e as previstas na cláusula terceira do Despacho n.º 32/SATOP/99:

Projecto da concessionária

Despacho n.º
32/SATOP/99


Habitação
253063m2
-
107757m2
=
+ 145306m2
Comércio
1766m2
-
7525m2
=
- 5759m2
Estacionamento
74896m2
-
22934m2
=
+ 51962m2
Equipamento social
8972m2
-
4556m2
=
+ 4461m2
35.2.5 A cota altimétrica do edifício previsto no novo projecto de arquitectura varia entre 98,2m NMM e 153,4m NMM, no entanto, a cota altimétrica prevista na PAO (aprovada pela DSSOPT em 12 de Fevereiro de 1999) varia entre 34,5m NMM e 82,5m NMM;
35.2.6 De acordo com a comparação acima referida, constata-se que tanto na área como na altura do edifício, o novo projecto de arquitectura não obedece às condições previstas no contrato de concessão e no âmbito do planeamento desta Direcção de Serviços;
Por fim, o DSODEP referiu na parte da conclusão o seguinte:
35.3 Relativamente ao facto da concessionária ter apenas solicitado a alteração do aproveitamento do terreno e o prazo de aproveitamento do terreno já ter terminado, é à concessionária que deve ser imputada a culpa. Em virtude do prazo de aproveitamento do terreno previsto no contrato de concessão já ter terminado, o Chefe do Executivo poderia declarar a caducidade da concessão do terreno ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 1 da cláusula décima terceira (caducidade) da respectiva concessão e no n.º 2 do artigo 166º e no artigo 167º da Lei n.º 6/80/M de 5 de Julho (Lei de Terras). Dada a complexidade do presente processo e à possibilidade de interposição por parte da concessionária de uma reclamação/recurso à eventual declaração de caducidade da concessão, propôs-se o envio do processo ao Departamento Jurídico (DJUDEP) para emissão de parecer.
36. O DJUDEP através da informação n.º 70/DJUDEP/2011, de 9 de Dezembro de 2011, emitiu o seu parecer, o qual consta das páginas 35 a 43 do Processo, que aqui se dá por integralmente reproduzido e cujo teor principal é o seguinte:
36.1 Convém, desde logo, realçar que sobre a Administração apenas impende o dever de analisar a justificação apresentada pela concessionária através do T-4273, de 23 de Abril de 2010, já não tendo o dever de se pronunciar sobre a carta posteriormente apresentada em 3 de Agosto de 2011 (nota: deve ser 2 de Agosto de 2011), mais de um ano depois, a qual é manifestamente intempestiva. No entanto, atendendo ao princípio da boa-fé e transparência da actuação da Administração sempre se terá em atenção esta última;
36.2 Principalmente, como resulta com toda a evidência dos factos constantes do historial deste processo, desde o seu início até ao projecto de arquitectura submetido por último em 18 de Junho de 2010, constata-se que a concessionária nunca apresentou qualquer estudo prévio e/ou projecto de arquitectura que cumprisse na íntegra o aproveitamento estabelecido no contrato de concessão e suas sucessivas revisões, o que demonstra que a mesma nunca teve intenção de aproveitar o terreno conforme o estipulado nas cláusulas contratuais, senão vejamos:
- Despacho n.º 159/SATOP/90 – prazo de aproveitamento até Junho de 1995;
- Passado pouco mais de um ano, em Abril de 1992 veio apresentar um projecto de arquitectura com alterações à configuração dos lotes e acréscimo de ABC;
- Despacho n.º 59/SATOP/95 – prazo de aproveitamento até 26 de Junho de 1998;
- Em 5 de Maio de 1997 – submeteu um pedido de prorrogação do prazo de apresentação de novo plano (estudo prévio);
- Despacho n.º 32/SATOP/99 – prazo de aproveitamento até 26 de Dezembro de 2002;
- Em 28 de Fevereiro de 2006 – apresentou um novo estudo com acréscimo brutal de ABC e que não cumpre em termos de volumetria;
- Em 19 de Junho de 2009 – foi declarado nulo o despacho que aprova o estudo prévio anterior;
- Em 18 de Junho de 2010 – apresentou novo projecto de arquitectura que não cumpre o estipulado no contrato;
36.3 Por outro lado, verifica-se que:
- A concessionária apenas executou obras de aterro e de momento o terreno está a ser utilizado para depósito de materiais de construção;
- Além das obras de aterro, a concessionária não entregou à DSSOPT qualquer projecto relacionado com as obras previstas na alínea ii) da cláusula sexta e alínea b) do n.º 1 da cláusula oitava do contrato de concessão (infra-estruturas e equipamento social) nos termos do estipulado no contrato titulado pelo Despacho n.º 32/SATOP/99;
- O prazo de aproveitamento do terreno já terminou em 26 de Dezembro de 2002, não tendo a concessionária solicitado a sua prorrogação;
- O prazo da concessão termina em 25 de Dezembro de 2015;
36.4 Assim, vir invocar que foi devido à estagnação económica que afectou Macau durante a década de 1990 e os primeiros anos depois de 1999 que levou a concessionária a apresentar sucessivos planos de aproveitamento sem nunca os concretizar, não justifica o incumprimento das obrigações contratuais que livremente assumiu; tanto mais que se limita a concessionária a alegar genericamente as crises económicas, não demonstrando nem consubstanciando com os factos concretos em medida as mesmas impediram a concretização do empreendimento;
36.5 De facto, muito embora a primeira grande crise financeira asiática tenha ocorrido em 1994, verificando-se depois uma nova crise em 1997/1998, a verdade é que entre os períodos de crise, existem períodos de retoma económica, mas nem por isso, a concessionária mostrou interesse em realizar o aproveitamento do terreno durante mais de vinte anos;
36.6 Ora, como é consabido, logo após a transferência de soberania, com a liberalização da indústria do jogo e da política de liberalização do turismo de visto individual, Macau atravessou um longo período de crescimento económico excepcional e sem precedentes;
36.7 Por conseguinte, não pode a concessionária vir invocar que a situação económica de Macau não esteve bem durante os anos que se seguiram à concessão do terreno, porquanto após o Despacho n.º 32/SATOP/99, não faltaram à mesma excelentes oportunidades para proceder ao aproveitamento do terreno;
36.8 Além disso, quem formula um pedido de concessão de terreno para a realização de determinado aproveitamento, deve estar ciente dos riscos que podem advir duma crise financeira, tendo assim, que possuir capacidade económica para concretizar o empreendimento pretendido; e a concessionária bem sabia, quando requereu a concessão por ajuste directo para executar um empreendimento de tal envergadura, que teria de garantir os meios de financiamento necessários e antecipar eventuais dificuldades, tanto mais que decorre das regras de experiência comum que a actividade económica envolve sempre um risco e está sujeita a factores imponderáveis;
36.9 Mesmo assim, a Administração reconhecendo em 1998 o momento menos favorável que a conjuntura económica do Território atravessava, entendeu conceder uma nova oportunidade à concessionária autorizando, uma vez mais, o reescalonamento pagamento do prémio e prorrogação do prazo de aproveitamento até Dezembro de 2002, através do Despacho n.º 32/SATOP/99;
36.10 Todavia, a concessionária em vez de usar da diligência que, em face das circunstâncias do caso, empregaria um bom pai de família e apresentar rapidamente um projecto que permitisse realizar o aproveitamento do terreno e consequentemente concretizar a revisão do contrato, vem ao invés, e apenas em Fevereiro de 2006, passados mais de 6 anos da publicação daquele despacho e já depois de ter terminado o prazo de aproveitamento em Dezembro de 2002, submeter um novo estudo prévio com alterações que, uma vez mais, não cumpria as condições do aproveitamento estipuladas no contrato;
36.11 Ora, se efectivamente a concessionária teve dificuldade financeiras até 2004 como afirma, porque é que não o veio demonstrar na fase prevista para a execução da obra, solicitando à DSSOPT, por esse motivo, a prorrogação do prazo de aproveitamento?
36.12 Não é pois de aceitar a justificação apresentada (cfr. n.º 3 do ponto 32) pela requerente quanto ao desconhecimento dos procedimentos administrativos vigentes em Macau por parte da empresa incumbida da gestão dos negócios pela sócia maioritária da concessionária, porquanto a ignorância da lei não justifica a falta do seu cumprimento (cfr. artigo 5º do Código Civil);
36.13 Da mesma forma também não é relevante o argumento de que as sócias da concessionária contraíram dívidas avultadas, porquanto é este um facto espúrio à concessão, nada tendo que ver com o aproveitamento do terreno ou com as cláusulas contratuais;
36.14 Por outro lado, não é despiciendo realçar que as últimas prestações do prémio em numerário apenas foram liquidadas em 30 de Junho de 2009 (quando deveriam ter sido pagas em 2000), poucos dias após ter sido comunicado à concessionária, em 26 de Junho de 2009, o despacho que declarou a nulidade do projecto apresentado em Fevereiro de 2006;
36.15 O que demonstra que não é verdadeira a afirmação da concessionária de que procedeu à liquidação total do prémio, renda e juros na sequência de ter sido notificada em 27 de Junho de 2006 do despacho favorável emitido relativamente àquele projecto, já que apenas se apressou a liquidar o remanescente do prémio quando se deu conta da referida declaração de nulidade;
36.16 Relativamente ao argumento aduzido de que a concessionária continua a aguardar resposta quanto ao estudo prévio submetido em 18 de Junho de 2010, mais uma vez se constata que este não cumpre o aproveitamento estipulado nas cláusulas contratuais;
36.17 Por sua vez, o facto de a concessionária ter submetido, em Junho de 2010, já muito depois de ter expirado o prazo de aproveitamento do terreno, um estudo prévio e de a DSSOPT ter respondido que deveria requerer uma nova PAO, não pode ser encarado como um consentimento por parte da Administração, relativamente ao incumprimento do contrato de concessão, porquanto, uma coisa são os procedimentos inerentes ao licenciamento da obra – processo de licenciamento de obras, analisado pelo DURDEP, e outra, é o processo de terras, que é analisado pelo DSODEP;
36.18 Pois que, o departamento competente para o licenciamento de obras apenas analisa se os projectos submetidos a apreciação estão de acordo com o disposto no RGCU e demais legislação aplicável, enquanto é ao DSODEP que cabe averiguar, nomeadamente as irregularidades relativas aos contratos de concessão de terrenos;
36.19 Face ao exposto, parece-nos que nenhum dos argumentos aduzidos pela concessionária, pode ser considerado caso de força maior ou facto relevante que estivesse, comprovadamente, fora do seu controlo, pelo que os factos alegados pela concessionária não podem ser aceites pela DSSOPT como justificação para a não realização do aproveitamento do terreno;
36.20 Deste modo, dúvidas não restam que toda e qualquer responsabilidade pelo incumprimento do aproveitamento do terreno, bem como pela não execução dos encargos especiais e do incumprimento do prémio em espécie (previsto na subalínea ii) da alínea b) do n.º 1 da cláusula oitava) prestado pela em dação em pagamento de execução de obras, são exclusivamente imputadas à concessionária;
36.21 Com efeito, estamos perante uma situação grave de incumprimento contratual, que perdura há mais de 20 anos, tendo sido ultrapassados todos os prazos contratualmente estipulados, mesmo os de multa agravada previstos na cláusula sétima do contrato, por razões que são inteiramente imputáveis à concessionária;
36.22 Nestes termos foi violado o dever de aproveitamento impostos pelo artigo 103º da Lei n.º 6/80/M, de 5 de Julho (Lei de terras), o qual prevê que “Durante o período da concessão provisória, o concessionário deve cumprir as prescrições legais e contratuais concernentes ao aproveitamento do terreno”;
36.23 A este propósito, importa realçar que a Lei de Terras procura garantir a execução célere do aproveitamento dos terrenos concedidos, por forma a que a disposição e a utilização de terrenos vagos contribuam para o crescimento económico da RAEM, para o progresso social e para a melhoria das condições de vida da população, e por isso, não se pode permitir violações reiteradas das cláusulas contratuais, em especial das cláusulas relacionadas com o aproveitamento a dar aos terrenos e respectivos prazos;
36.24 Por todo o exposto, consideramos que não são de aceitar os motivos invocados pela concessionária para justificar o incumprimento do prazo de aproveitamento do terreno, devendo esta ser considerada responsável por esse não cumprimento;
36.25 A sanção prevista para o incumprimento do aproveitamento é a caducidade da concessão, nos termos do disposto na alínea a) do n.º 1 da cláusula décima terceira do contrato e da alínea a) do n.º 1 ex vi do n.º 2 do artigo 166º da Lei de Terras, enquanto a sanção para o incumprimento das obrigações previstas na cláusula sexta (encargos especiais) e das obrigações estabelecidas na cláusula oitava (pagamento do prémio em espécie – subalínea ii) da alínea b) do n.º 1) é a rescisão, nos termos das disposições da alínea d) do n.º 1 da cláusula décima quarta e alínea c) do n.º 1 do artigo 169º da Lei de Terras;
36.26 Assim, perante o incumprimento das obrigações contratuais, à entidade concedente não resta outra alternativa que não seja extinguir a presente concessão, e fazer reverter o terreno à sua posse, quer através da declaração de caducidade da concessão, por verificação de uma das causas previstas na cláusula da caducidade – findo o prazo da multa agravada previsto na cláusula sétima – (cfr. alínea a) do n.º 1 da cláusula décima terceira) e por falta de aproveitamento do terreno nos prazos e termos contratuais (cfr. alínea a) do n.º 1 ex vi do n.º 2 do artigo 166º da Lei de Terras), ou da rescisão do contrato, por incumprimento das obrigações de execução dos encargos especiais e do pagamento do prémio em espécie (cfr. alínea d) do n.º 1 da cláusula décima quarta e alínea c) do n.º 1 do artigo 169º da Lei de Terras);
36.27 Sendo que a Administração, em processos desta natureza, goza de uma certa discricionariedade, na medida em que a escolha por uma ou outra das formas de extinção da concessão fica ao critério da entidade concedente, sendo as duas opções igualmente válidas perante o direito, já que, simultaneamente, se verificam os pressupostos da caducidade e da rescisão;
36.28 Neste pressuposto consideramos que, dada a verificação de uma das condições previstas na cláusula da caducidade, a Administração, enquanto entidade concedente, ao abrigo das disposições da alínea a) do n.º 1 da cláusula décima terceira do contrato e da alínea a) do n.º 1 ex vi do n.º 2 do artigo 166º da Lei de Terras, deve prosseguir com o procedimento de declaração de caducidade da presente concessão, já iniciado com o pedido de justificação enviado à concessionária, seguindo os trâmites previstos nos n.ºs 2 e 3 daquela mesma cláusula e nos artigos 167º e 168º da Lei de Terras, bem como, antes da tomada de decisão final, realizar a audiência dos interessados, formalidade prevista no artigo 93º do CPA;
36.29 Por sua vez, a caducidade da concessão determina a reversão do terreno à posse da RAEM com todas as benfeitorias nele introduzidas, sem direito a qualquer indemnização (cfr. n.º 3 da cláusula décima terceira do contrato de concessão);
36.30 Por último, acresce referir que o prémio em numerário relativo a esta concessão encontra-se integralmente liquidado e, nos termos do artigo 13º do Regulamento Administrativo n.º 16/2004, não há direito à restituição do prémio já pago: “No caso de ser declarada a caducidade da concessão, o concessionário perde, a favor da Região Administrativa Especial de Macau, a totalidade das prestações do prémio já pagas”.
37. A chefe do DJUDEP concordou com a análise e conclusão da informação em causa, uma vez que o incumprimento da obrigação principal do contrato, a realização do aproveitamento nos prazos e nos termos nele fixados, bem como da obrigação de realizar os encargos especiais e do pagamento do prémio em espécie são imputáveis à concessionária e são causa de caducidade da concessão e de rescisão do contrato.
38. Por despacho do Chefe do Executivo, de 23 de Novembro de 2011, foi criado o Grupo de Trabalho Jurídico (GTJ) para acompanhamento dos casos relativos a terrenos não aproveitados. O Grupo de Trabalho analisou o presente processo e elaborou a informação n.º 7/GTJ/2012, de 29 de Fevereiro de 2012, cujo teor consta das páginas 44 a 47 do Processo e que agora se reproduz:
38.1 Por despacho do Chefe do Executivo, de 23 de Novembro de 2011, foi criado o GTJ para acompanhamento dos casos relativos a terrenos não aproveitados, nos quais foi incluído o processo identificado em epígrafe;
38.2 De acordo com o n.º 1 da cláusula segunda do contrato de revisão da concessão titulado pelo Despacho n.º 32/SATOP/99, publicado no Boletim Oficial de Macau n.º 16, II, Série, de 21 de Abril, o prazo de validade da concessão termina em 25 de Dezembro de 2015;
38.3 Segundo a cláusula quinta do sobredito contrato, o aproveitamento do terreno, incluindo a execução de todas as obras de aterro e infra-estruturas a que se refere a cláusula sexta do contrato, deve operar-se até 26 de Dezembro de 2002;
38.4 Todavia, conforme se relata na informação n.º 266/DSODEP/2011, de 20 de Outubro, a concessionária não realizou o aproveitamento definido no contrato nem as obras de urbanização (infra-estruturas) indicadas na cláusula sexta, com excepção da execução do respectivo aterro (cfr. Licença de obra n.º 551/91, de 26 de Outubro de 1991);
38.5 Por outro lado, a concessionária não solicitou a prorrogação do prazo de aproveitamento antes do seu termo, nem apresentou qualquer justificação do não cumprimento das obrigações contratuais, a não ser quando, através do ofício n.º 201/6179.03/DSODEP/2010, de 23 de Março de 2010, foi notificada para o efeito pela DSSOPT, na sequência do Despacho do STOP n.º 07/SOPT/2010, de 8 de Março;
38.6 Além disso, a concessionária apresentou em 28 de Fevereiro (deu entrada naquela Direcção dos Serviços em 3 de Março de 2006) um novo estudo prévio de aproveitamento que em relação à volumetria das edificações projectadas não cumpre as disposições regulamentares em vigor;
38.7 Igualmente, os anteprojectos de arquitectura submetidos em 4 de Janeiro e 16 de Maio de 2007 continuam a não cumprir aquelas disposições regulamentares;
38.8 Todavia, o despacho proferido pelo então STOP, em 12 de Maio de 2006, sobre o aludido estudo prévio, bem como todos os despachos ou pareceres favoráveis emitidos, relacionados com os planos de aproveitamento ou com os projectos de construção foram declarados nulos por despacho do Chefe do Executivo, de 19 de Junho de 2009, exarado sobre a informação n.º 096/DSODEP/2009, de 5 de Junho, no seguimento do acórdão do Tribunal de Última Instância, proferido em 22 de Abril de 2009, no âmbito do processo n.º 53/2008;
38.9 Devido ao sobredito processo judicial este e outros procedimentos de concessão e de licenciamento de obras pararam;
38.10 Em 18 de Junho de 2010 (T-5651), a concessionária apresenta um novo estudo prévio de aproveitamento que encerra uma proposta desconforme com os parâmetros urbanísticos definidos na (PAO), aprovada em 12 de Fevereiro de 1999;
38.11 Com efeito, as alturas das edificações previstas neste estudo situam-se entre os 98,2 e os 153,4m NMM, enquanto que as admitidas pela referida planta de alinhamento variam entre 34,5 e 82,5m NMM;
38.12 Ora, ainda que os representantes da concessionária não tenham conhecimentos técnicos especializados no domínio da construção civil, será difícil aceitar que não saibam que o novo esquema de aproveitamento plasmado no estudo prévio de 2010 está desconforme com a planta de alinhamento e o contrato em vigor;
38.13 Do mesmo modo, não pode admitir-se que o técnico (arquitecto) que elaborou e subscreveu o estudo prévio desconheça a legislação e regulamentação sobre construção em vigor e que não saiba aplica-la na prática;
38.14 Qualquer projecto de especialidade submetido à apreciação e aprovação da DSSOPT deve ser acompanhado de declaração do técnico responsável pela sua elaboração referindo que nele foram observadas todas as disposições regulamentares em vigor ou, nos casos em que tal não suceda, deve ser apresentada justificação técnica fundamentada para o seu não cumprimento (cfr. n.º 8 do artigo 19º do Decreto-Lei n.º 79/85/M, de 21 de Agosto);
38.15 Assim, o grupo de trabalho considera que a situação de facto descrita na informação n.º 266/DSODEP/2011, de 20 de Outubro, mormente a apresentação em 2006 e 2010 dos novos estudo prévios de aproveitamento, indicia claramente que a concessionária não pretende aproveitar o terreno de acordo com o contrato e a legislação em vigor;
38.16 Em face do exposto, o grupo de trabalho concorda com o parecer jurídico constante da informação n.º 70/DJUDEP/2011, de 9 de Dezembro e o proposto na citada informação n.º 266/DSODEP/2011.
39. Tendo em conta as análises e os pareceres constantes na informação n.º 70/DJUDEP/2011 do DJUDEP e na informação n.º 7/GTJ/2012 do GTJ, o DSODEP elaborou a informação n.º 88/DSODEP/2012, de 13 de Abril de 2012, no intuito de efectuar uma análise mais aprofundada. Ao mesmo tempo, propôs ao abrigo das disposições da alínea a) do n.º 1 da cláusula décima terceira do contrato e dos artigos 166º e 167º da Lei de Terras, que se prosseguisse com o procedimento de declaração de caducidade da concessão do terreno, referindo que nos termos do artigo 13º do Regulamento Administrativo n.º 16/2004, a concessionária perderia, a favor da RAEM, a totalidade do prémio e dos juros já pagos, sem direito a qualquer indemnização. O DSODEP propôs também que a caução prestada revertesse a favor da RAEM, se realizasse a audiência dos interessados e se prosseguissem com as tramitações ulteriores.
40. A subdirectora e o director da DSSOPT concordaram com o parecer do DSODEP, o STOP em 18 de Abril de 2012 exarou o seu parecer concordante e o Chefe do Executivo exarou igualmente o seu despacho concordante em 8 de Maio de 2012.
41. Em seguida, a DSSOPT, através de ofício de 22 de Maio de 2012, notificou a concessionária do respectivo projecto de decisão, e para no prazo de 10 dias contados a partir da data de recepção da notificação apresentar, querendo, resposta escrita sobre a respectiva intenção da Administração.
42. A concessionária apresentou a sua resposta em 4 de Junho de 2012, cujo teor consta das páginas 58 a 67 do Processo e que agora se reproduz:
“I – DA POLÍTICA DE COOPERAÇÃO CONTRATUAL: ACEITAÇÃO DAS MOTIVOS ESPEICIAS IMPEDITIVOS DO APROVEITAMENTO ATÉ 1999
Resulta do processo administrativo, a que o presente caso se refere, a seguinte importante factualidade:
1. Conforme é expressamente referido no Despacho n.º 159/SATOP/90, publicado em 26 de Dezembro de 1990 (“1º Despacho”), o projecto contemplado no contrato assinado entre o Território de Macau (…) e a requerente tinha grande interesse para ambas as partes, porquanto:
a) o investimento aí previsto era muito elevado, o qual incluía obras de aterro de uma vasta zona; e
b) a entrega para o Território do terreno, com a área de 27188m2, conquistado ao mar (cuja obra já se encontra concluída), a expensas da concessionária, além de um conjunto de infra-estruturas na ordem de 7537m2 e, ainda, uma área na ordem de 4680m2 para equipamento social.
2. Até ao termo da Administração Portuguesa, ambas as partes contratantes reconheceram e aceitaram que, por razões a elas não imputáveis, o aproveitamento do terreno não se tornou possível dentro do prazo fixado no contrato de 1990.
3. As principais causas impeditivas da construção de edifícios (que correspondem aos “motivos especiais” justificativos da mora no cumprimento) prenderam-se com a conhecida estagnação económica, realidade que se revelou grave e excessivamente prolongada (até 2002/03), jamais enfrentada em Macau e que atingiu horizontalmente todos os investidores na área da construção e fomento imobiliário.
10. Os “motivos especiais” previstos e autorizados contratualmente têm uma amplitude ou dimensão diferente da dos simples “casos de força maior” ou de “fora do controlo do homem”, porquanto naquele primeiro conceito se incluem diversas outras situações, que têm por base razões de equidade, razoabilidade ou de sentido de justiça.
11. Certamente, as duas revisões contratuais ocorridas em 1995 (“2º Despacho”) e 1999 (“3º Despacho”), ao aceitarem os motivos especiais invocados, ão estiveram longe do que, em direito civil, se chama “Modificação do contrato por alteração das circunstâncias”, cujo assente legal está no artigo 431º do Código Civil, cujo n.º 1 determina: “1. Se as circunstâncias em que as partes fundaram a decisão de contratar tiverem sofrido uma alteração anormal, tem a parte lesada direito à resolução do contrato, ou à modificação dele segundo juízos de equidade, desde que a exigência das obrigações por ela assumidas afecte gravemente os princípios da boa-fé e não esteja coberta pelos riscos próprios do contrato.”
II – DO ESTABELECIMENTO DA RAEM
13. O estabelecimento da RAEM permitiu abrir uma porta de esperança para o futuro de Macau.
14. As causas impeditivas e justificativas da falta de aproveitamento do terreno não desapareceram, depois de 20 de Dezembro de 1999, de um dia para o outro.
15. Houve um período relativamente longo para que as condições de relançamento das bases da economia de Macau fossem definidas e aprovadas.
16. Em finais de 2001 deram-se os primeiros passos para a implementação da nova era económica de Macau, tendo como “cabeça de dragão” a indústria de turismo e lazer, aliada à liberalização do jogo, determinando em anos subsequentes uma forte entrada de capitais estrangeiros.
19. Saliente-se que, face à nova conjuntura económica iniciada anos depois de 1999, o Governo passou a autorizar construções em altura elevada, o que fez consolidar a percepção de que, dada a escassez de terrenos em Macau, o caminho mais indicado a seguir seria a construção em altura, em substituição do modelo de construção urbana adoptado na década de 1990.
21. Estas actualizações dos projectos não podem, nem devem ser vistas como fenómeno especulativo, mas sim como uma via para melhor aproveitar os recursos escassos de Macau: os solos.
22. Também era política usual apresentarem-se novos estudos prévios que, uma vez preenchidos os requisitos técnicos, seriam preparadas as respectivas minutas de contrato de revisão, contendo expressa e invariavelmente uma menção quanto ao novo prazo de aproveitamento, fixado de harmonia com as características do novo empreendimento.
23. Jamais se poderia ter imaginado, e sequer previsto, que o pedido formal de prorrogação do prazo de aproveitamento revestiria um carácter essencial e condicionante do próprio evoluir do processo de revisão da concessão.
III – DAS OBRAS DE ATERRO E DA BOA FÉ CONTRATUAL
24. É de inteira justiça salientar que, não obstante o reconhecimento pelo Governo das dificuldades por que passavam os projectos de execução de grandes empreendimentos privados, as obras de aterro foram integralmente realizadas pela Concessionária.
25. Ao longo de toda a vigência do contrato, o Concedente e a Concessionária adoptaram sempre uma atitude de boa-fé contratual, procurando, em conjunto, soluções para os problemas.
IV – DO SANEAMENTO FINANCEIRO NO RESCALDO DA CRISE ECONÓMICA (1993-2002)
27. Devido aos efeitos nefastos do controlo macroeconómico praticado no Continente Chinês, os sócios da Concessionária entraram em várias dificuldades de natureza financeira, tendo contraído dívidas que acabaram por a sujeitar a um processo de reestruturação.
28. Foi neste âmbito que os novos investidores da Concessionária injectaram capitais muito elevados para efectuar o saneamento financeiro, processo que durou algum tempo e só terminou em 2004.
V – DO PAGAMENTO DO PRÉMIO E OUTROS ENCARGOS
30. Entretanto, na plena convicção de que a referida política de gestão de solos se manteria inalterada, os investidores da concessionária procederam, e a Administração aceitou, sem reservas ou com condições, todos os prémios e rendas em atraso, tendo a Direcção dos Serviços de Finanças calculados e cobrados todos juros de mora devidos.
VI – DA POLÍTICA DE ACEITAÇÃO DE PEDIDOS DE NOVO APROVEITAMENTO: actualização dos projectos da década de 1990
33. A Administração e o concessionário não são partes antagónicas, antes têm interesses comuns e devem ambos agir de “boa-fé” e não defraudar as legítimas expectativas criadas na contra-parte, surgidas em virtude de actos e práticas enraizadas.
36. Ora, a Administração de Macau vinha, pelo menos, desde a década de 1980 sendo compreensiva, aceitando as justificações razoáveis que lhe eram apresentadas permitindo a actualização do aproveitamento dos terrenos, em face da nova dinâmica social e económica.
37. E sempre com a inerente prorrogação dos prazos de aproveitamento.
38. Esta prática era normal, comum e imparcialmente aplicada a todos, e ninguém imaginaria que, sem pré-aviso, tal prática pudesse ser alterada em substância.
39. No período da crise económica ao longo da década de 1990, a Administração auxiliou sempre as concessionárias a debelarem as suas dificuldades, concedendo-lhes prazos adicionais para o cumprimento das suas obrigações contratuais.
VII – DO APROVEITAMENTO DO TERRENO E PROPOSTA DE ACTUALIZAÇÃO DO PROJECTADO EMPREENDIMENTO
40. Dentro deste quadro do que é expectável da Administração, foi solicitada a transmissão da concessão, em 16 de Novembro de 2004, e o pedido de revisão do contrato, consubstanciado na entrega, em 28 de Fevereiro de 2006, do estudo preliminar que, caso aprovado, conduziria inerentemente à fixação de um novo prazo de aproveitamento.
41. O estudo prévio de 2004 não foi rejeitado liminarmente, com fundamento na sua desconformidade com os termos do contrato de concessão em vigor.
42. Posteriormente, novo estudo preliminar foi apresentado, em Junho de 2010, e o mesmo não foi, liminarmente ou em qualquer outro momento, rejeitado com o referido argumento de desconformidade com os termos do contrato de concessão em vigor.
VIII – DA NÃO REJEIÇÃO DAS PROPOSTAS DE ACTUALIZAÇÃO DO APROVEITAMENTO
43. Pelo contrário, a Administração induziu que aceitou as ideias novo projecto, precisamente no quadro da actualização do projecto, face às novas dinâmicas urbanísticas e de desenvolvimento de Macau (construção de um número relevante de fracções de pequenas dimensões).
44. Para o efeito, a entidade responsável, a DSSOPT solicitou, formal e expressamente, à concessionária, mediante Ofício que lhe foi dirigido em 10 de Setembro de 2010, para esta lhe apresentar uma PAO (actualizada ou nova), para se determinar quais os novos condicionalismos urbanísticos, em termos de altura dos edifícios e áreas de construção, designadamente.
45. Assim sendo, não é verdade o parecer técnico dos Serviços de Obras Públicas que considera ter havido da parte da concessionária desistência da concessão ou perda do seu interesse, por ter apresentado um novo estudo prévio, propondo a alteração e actualização do aproveitamento.
46. Não se trata de desistência ou perda de interesse, mas sim de uma proposta, sujeita obviamente à aceitação do Governo, visando o melhoramento do projecto, a qual normalmente é aceite mas com modificações.
IX – DA CLARIFICAÇÃO DA SITUAÇÃO CONTRATUAL: DESPACHO DO CHEFE DO EXECUTIVO
47. O Despacho de 19 de Junho de 2009 do Chefe do Executivo, que ordenou a anulação da aprovação dada ao estudo prévio apresentado em 2006, é claro ao determinar que se mantinha em vigor a concessão, nos termos da versão actualizada em 1999 (Despacho n.º 32/SATOP/99).
48. Todavia, não se estabeleceu, nem notificou a concessionária de que era obrigatório seguir, sem qualquer modificação daquele Despacho, nem para o efeito lhe foi fixado qualquer prazo para a conclusão do aproveitamento.
49. É ainda importante notar que o próprio Governo também não apresentou à concessionária as condições para se dar cumprimento às obras de construção dos encargos especiais, uma vez que lhe cabia informar as respectivas “especificações técnicas”, conforme o estipulado no n.º 2 da cláusula oitava do contrato de concessão.
50. Assim, dentro do que é usual e prática corrente, foi, de imediato, apresentado o estudo prévio para a construção de fracções de pequena dimensão, em 18 de Junho de 2010, bem como procedido ao pagamento das obrigações pecuniárias em mora.
X – DA LEGÍTIMA EXPECTATIVA
51. A aceitação do pagamento do prémio, com recebimento da totalidade dos juros de mora, e a não rejeição do estudo prévio, antes tendo sido reforçada a ideia da sua viabilidade (com o pedido de apresentação de uma PAO actualizada), são factores que criaram na concessionária a confiança na estabilidade da relação contratual existente.
XI – DA IRRAZOABILIDADE DO ARGUMENTO DE INSUFICIÊNCIA DE TEMPO PARA O APROVEITAMENTO
52. É alegado que faltam menos de 5 anos para o termo da conclusão e, daí, a insuficiência do prazo para concluir o aproveitamento.
55. Todavia, só em 22 de Maio de 2012 foi a Concessionária notificada do projecto de decisão de declaração de caducidade, o que quer dizer: perderam-se 19 meses, sem qualquer justificação.
56. Por outro lado, se o estudo prévio de 18 de Junho de 2010 tivesse sido liminarmente rejeitado, ou rejeitado em prazo curto, teria a sociedade concessionária tempo mais do que suficiente para concluir as obras de aproveitamento tal como o previsto na revisão de 1999.
XII – DA INVOCADA CADUCIDADE E MOTIVOS DE RESCISÃO
58. Não é verdade, nem é prática em Macau, que a caducidade é operada automaticamente com o mero decurso do prazo da multa agravada ou interrupção de aproveitamento por determinado prazo. A ser verdade, quais todos os contratos estariam caducados, ou poucos deles estariam na legalidade.
59. Não há discordância quanto à necessidade de cumprimento do “dever de aproveitamento” nos termos da Lei de Terras, mas, no caso vertente, também não pode ser omitido que não existe situação de incumprimento até, pelo menos, à data da vigência do Despacho n.º 32/SATOP/99, de 21 de Abril de 1999, porquanto os motivos especiais, impeditivos do imediato aproveitamento do terreno, foram integralmente aceites.
60. Concluindo: a haver irregularidade, ela foi sanada por mútuo acordo e deixou de existir mora ou violação do contrato.
61. A questão coloca-se relativamente ao período entre 26 de Dezembro de 2002 (termo do prazo de aproveitamento) e 16 de Novembro de 2004 (data do pedido de transmissão) ou de 26 de Dezembro de 2002 a 28 de Dezembro de 2006 (data do pedido de revisão contratual, com nova proposta de aproveitamento).
62. Aqui, foi o período em que se processou o saneamento financeiro da empresa, motivado pela crise atrás mencionada, o qual culminou com a entrada de novos investidores, todos locais, que injectaram fundos na ordem de $300.000.000,00 patacas.
63. Foram criadas as condições para poder aproveitar o ciclo económico favorável, que se iniciou aproximadamente em 2003, sendo prova deste facto a entrada de novos capitais, a apresentação de um novo projecto, que foi discutido e analisado pelos serviços competentes e o pagamento das obrigações pecuniárias em atraso.
64. Não existe, assim, violação repetida das obrigações.
65. O alegado período longo de 20 anos sem aproveitamento de ser analisado dentro do seu real contexto.
66. Não há investidor que gaste elevadas quantias, na ordem de $300.000.000,00 patacas, sem ser para uma causa séria.
67. Os encargos especiais não estão feitos pela razão natural e lógica de os mesmos serem em simultâneo com a obra de construção de globalidade do empreendimento.
68. Este ficou suspenso devido à falta de uma política geral e clara do Governo, de não aceitar mais pedidos de revisão dos contratos de concessão.
69. Se a tivesse, certamente, para segurança do investimento realizado de cerca de trezentos milhões, a que acresce o custo da obra de aterro, teria apresentado o projecto de obra dentro dos limites estabelecidos no contrato, revisto em 1999.
70. Quanto à falta de entrega do equipamento social ao Governo, a mora é da responsabilidade deste que não apresentou proposta concreta sobre o que pretende que seja construído e lhe seja entregue a título de equipamento social.
Termina com o seguinte pedido:
a) atender aos motivos e razões expostos e não declarar a caducidade ou a rescisão do contrato;
b) autorizar a apresentação de um plano de aproveitamento tendo por base os requisitos constantes do Despacho n.º 32/SATOP/99;
c) autorizar um prazo de aproveitamento consentâneo e dentro dos limites do actual quadro contratual, e se necessário com a inclusão dos prazos despendidos com o processo iniciado a 23 de Abril de 2010, após a apresentação dos motivos da falta de aproveitamento”.
43. O DSODEP analisou a resposta da audiência acima referida através da informação n.º 230/DSODEP/2012, de 4 de Outubro de 2012, cujo teor consta das páginas 68 a 73 do Processo e que é agora reproduzido. Na parte conclusiva da respectiva informação refere-se que a resposta da concessionária não irá alterar a decisão de caducidade da concessão em análise. A chefe do DSODEP concordou com o informado e propôs o envio da mesma ao DJUDEP para efeitos de análise complementar. Neste contexto, o director da mesma Direcção de Serviços manifestou o seu parecer concordante em 8 de Outubro de 2012.
44. O DJUDEP através da informação n.º 52/DJUDEP/2013, de 21 de Agosto de 2013 (já analisada pelo GTJ) manifestou o seu parecer, cujo teor é transcrito em seguida:
44.1 A concessionária começa por alegar que até ao termo da Administração Portuguesa, ambas as partes contratantes reconheceram e aceitaram que, por razões a elas não imputáveis, o aproveitamento do terreno não se tornou possível dentro do prazo fixado no contrato de 1990 e que as principais causas impeditivas da construção de edifícios (que correspondem aos “motivos especiais” justificativos da mora no cumprimento) prenderam-se com a conhecida estagnação económica, realidade que se revelou grave e excessivamente prolongada (até 2002/03);
44.2 Tal afirmação não corresponde à verdade, tendo já ficado plenamente demonstrado que a concessionária não cumpriu por motivos exclusivamente a si imputáveis com os deveres estipulados no contrato de concessão titulado pelo Despacho n.º 159/SATOP/90 (cujo aproveitamento deveria operar-se até Junho de 1995);
44.3 Porquanto apenas em Abril de 1992, veio submeter um projecto de arquitectura que não cumpria as cláusulas contratuais relativas ao aproveitamento, o qual consistia na apresentação de uma nova proposta de arranjo interior da área de concessão e no acréscimo de ABC;
44.4 Projecto este que veio a ser aprovado por despacho de Junho de 1992 do SATOP, condicionado todavia à aplicação de multas por incumprimento dos prazos contratuais;
44.5 De realçar que a concessionária teve oportunidade de proceder ao aproveitamento atempado do terreno, mas optou por submeter, tardiamente, um projecto que não cumpria o estipulado no contrato em termos de volumetria, não restando quaisquer dúvidas que impende sobre si a responsabilidade pelo incumprimento do aproveitamento do terreno;
44.6 A revisão do contrato de concessão foi titulada pelo Despacho n.º 59/SATOP/95, de 30 de Maio, tendo sido estabelecido o prazo global de aproveitamento até 26 de Junho de 1998;
44.7 No entanto, a concessionária não aproveitou o terreno, nem pagou o prémio adicional devido pela revisão do contrato de concessão e através de carta de Maio de 1997, veio solicitar um prazo de 120 dias para apresentação do novo plano (estudo prévio);
44.8 Ora, apenas relativamente a esta revisão é que se poderá falar que a Administração, reconhecendo em 1998 o momento menos favorável que a conjuntura económica do Território atravessava, entendeu conceder uma nova oportunidade à concessionária autorizando, uma vez mais, o reescalonamento do pagamento do prémio e prorrogação do prazo de aproveitamento até Dezembro de 2002, através do Despacho n.º 32/SATOP/99;
44.9 Porém importa recordar que se a concessionária tivesse cumprido o prazo de aproveitamento estipulado no contrato de concessão a obra já estaria concluída quando se começararm a fazer sentir os primeiros efeitos da recessão económica, isto é, se tivesse cumprido em tempo a principal obrigação do contrato de concessão, como era seu dever, e se tivesse realizado as obras nos prazos contratualmente estipulados, o aproveitamento estaria concluído até Junho de 1995, antes do impacto negativo causado pela crise não havendo sequer necessidade de proceder à revisão do contrato em 1998;
44.10 Por outro lado a concessionária vem reconhecer que após o estabelecimento da RAEM se criaram as condições de retoma económica, e que em finais de 2001 se deram os primeiros passos para a implementação da nova era económica de Macau;
44.11 Perante este reconhecimento e sendo consabido que logo após a transferência de soberania, com a liberalização da indústria do jogo e da política de liberalização do turismo de visto individual, Macau atravessou um longo período de crescimento económico não faltaram à concessionária excelentes oportunidades para proceder ao aproveitamento do terreno após o Despacho n.º 32/SATOP/99;
44.12 É então caso para perguntar porque é que a concessionária demorou mais de 6 anos para apresentar um novo estudo prévio (Fevereiro de 2006), o qual mais uma vez não cumpre em termos de volumetria apresentando um acréscimo brutal de ABC?
44.13 Relativamente ao argumento de que os efeitos nefastos do controlo macro-económico praticado no Continente Chinês levou a que as sócias da concessionária entrassem em várias dificuldades de natureza financeira, não é o mesmo relevante porquanto quando a concessionária aceitou os termos da revisão do contrato titulado pelo Despacho n.º 32/SATOP/99, já o mercado imobiliário se encontrava em crise e, apesar disso, se aceitou aquela revisão é porque já detinha capacidade financeira para avançar com o projecto de aproveitamento fixado no contrato, caso contrário, dada a conjuntura económica/financeira desfavorável, não se teria proposto à realização de tal empreendimento;
44.14 Por outro lado, a ser verdade que a concessionária não apresentou os projectos e não iniciou as obras por dificuldades financeiras, porque é que não o veio demonstrar na fase prevista para a execução das mesmas, solicitando à DSSOPT, por esse motivo, a prorrogação do prazo de aproveitamento?
44.15 É que de uma forma geral e em casos devidamente justificados pelos concessionários podem ser prorrogados os prazos de aproveitamento estabelecidos nos contratos de concessão;
44.16 Assim sendo, não vemos quaisquer razões que possam excluir ou atenuar a culpa da concessionária pelo incumprimento do prazo de aproveitamento do terreno estipulado no contrato de concessão;
44.17 Da mesma forma também não é relevante o argumento de que a concessionária procedeu, e a Administração aceitou, sem quaisquer reservas ou com condições, todos os prémios e rendas em atraso, gerando a legítima expectativa de que o contrato de concessão se manteria;
44.18 E a este respeito, diremos, desde logo, que a concessionária mais não fez do que cumprir com uma das suas obrigações contratuais, pois como bem sabe, o prémio é devido pela concessão ou revisão da concessão do terreno, independentemente de aquela vir ou não a realizar o respectivo aproveitamento;
44.19 Se a concessionária não aproveitou o terreno e não retirou mais-valias, foi porque não quis, ou pelo menos, não deixou de o aproveitar por facto imputável à Administração, daí que faça todo o sentido que, mesmo sendo declarada a caducidade da concessão, seja devido o prémio do contrato;
44.20 De outro modo, haveria uma retenção especulativa do terreno pelo concessionário pouco eficiente, ficando a RAEM privada de obter qualquer proveito económico. Com a outorga da concessão ao concessionário faltoso a RAEM deixou de poder dispor do terreno, nomeadamente de o poder conceder a outrem que ofereceria vantagens porventura equivalentes ou aproximadas e deixou de ver efectivado em tempo oportuno o aproveitamento do terreno, preocupação dominante no regime jurídico das concessões de terrenos, com os prejuízos inerentes ainda que não patrimoniais;
44.21 Além do mais, em nada nos surpreende o facto de a concessionária vir, agora, tentar utilizar a seu favor o facto de ter efectuado o pagamento do prémio, pois é evidente que só procedeu ao seu pagamento (em 30 de Junho de 2009) em desespero de causa, quando se deparou com o despacho que declarou a nulidade do projecto apresentado em Fevereiro de 2006, notificado em 26 de Junho de 2009, pelo que bem se denota que não houve o intuito de cumprir uma das suas obrigações contratuais;
44.22 Por outro lado, não existe fundamento legal para a Administração se recusar a receber as prestações do prémio em dívida, acrescidas dos respectivos juros de mora, sendo que o pagamento do prémio e juros de mora não impede que seja declarada a caducidade concessão no caso de se verificar qualquer facto originador dessa caducidade;
44.23 Alega ainda a concessionária que apresentou um estudo preliminar em Junho de 2010, e o mesmo não foi rejeitado com o argumento de desconformidade com os termos do contrato de concessão em vigor, considerando que a administração induziu que aceitou as ideias do novo projecto ao solicitar a apresentação de uma nova PAO;
44.24 Ora, quando foi apresentado o referido estudo prévio já a requerente tinha sido notificada através do ofício n.º 201/6179.03/DSODEP/2010, de 23 de Março de 2010, para se pronunciar sobre a situação de incumprimento em que a mesma se encontrava;
44.25 Por sua vez, conforme já foi elucidado anteriormente, o facto de a concessionária ter submetido, em Junho de 2010, já muito depois de ter expirado o prazo de aproveitamento do terreno, um estudo prévio e de a DSSOPT ter respondido que deveria requerer uma nova PAO, não pode ser encarado como uma exclusão da culpa, porquanto a apresentação de um estudo prévio implica a sua análise do ponto de vista urbanístico e ainda que seja objecto de parecer favorável tal não garante que seja autorizado o desenvolvimento do terreno de acordo com o mesmo, nem afasta as sanções previstas no contrato;
44.26 Pois que, o departamento competente para o licenciamento de obras apenas analisa se os projectos submetidos a apreciação estão de acordo com o disposto no RGCU e demais legislação aplicável, enquanto é ao Departamento de Solos que cabe averiguar, nomeadamente as irregularidades relativas aos contratos de concessão de terrenos;
44.27 Por outro lado, torna-se necessário reter que a avaliação do comportamento da concessionária que agora efectuamos compreende o período de tempo entre a celebração do contrato (publicado no Boletim Oficial de Macau em 17 de Dezembro de 1990) e a data da recepção do ofício da DSSOPT n.º 201/6179.03/DSODEP/2010, de 23 de Março de 2010, não se apreciando a sua conduta após a recepção daquele ofício;
44.28 Alega ainda a requerente que o despacho do Chefe do Executivo que declarou a nulidade do projecto apresentado em Fevereiro de 2006 determinou que se mantinha em vigor a concessão nos termos do Despacho n.º 32/SATOP/99, mas não informou a concessionária de que era obrigatório seguir sem qualquer modificação aquele despacho, nem para o efeito lhe foi fixado qualquer prazo para a conclusão do aproveitamento;
44.29 Este argumento também não releva, já que nem do contrato, nem da Lei de Terras, ou de outra lei aplicável, decorre a obrigação da DSSOPT avisar ou informar dos termos do cumprimento contratual da concessionária, ou que a falta de notificação constitui uma causa de exclusão ou atenuante da responsabilidade da concessionária por esse incumprimento;
44.30 Refere a requerente que se o estudo prévio apresentado em 18 de Junho de 2010, “tivesse sido liminarmente rejeitado, ou rejeitado em prazo curto, teria a concessionária tempo mais do que suficiente para concluir as obras de aproveitamento tal como o previsto na revisão de 1999”;
44.31 Porém esquece que quando foi apresentado o referido estudo já a requerente se encontrava em incumprimento contratual há longos anos, pelo que também não é de aceitar esta justificação;
44.32 Nestes termos, verificado o incumprimento contratual e não sendo afastada a conduta culposa da concessionária, à Administração não assiste outra opção senão extinguir a concessão, fazendo reverter o terreno à sua posse através da declaração de caducidade da concessão;
44.33 Face ao exposto consideramos que os contributos trazidos ao processo pela requerente em sede de audiência prévia não contribuíram para uma alteração do projecto de decisão e como tal impõe-se à Administração declarar a caducidade;
44.34 Nestes termos, resultando do procedimento que o incumprimento do contrato, consubstanciado na inexecução da obra que constitui o aproveitamento do terreno objecto da concessão, é imputável á concessionária deve a Administração manter o sentido da sua decisão de declarar a caducidade da concessão.
45. Posteriormente, o DJUDEP, através da comunicação de serviço interno n.º 285/DJUDEP/2013, de 6 de Novembro de 2013, comunicou ao DSODEP que a referida informação já foi analisada pelo GTJ e solicitou ao mesmo a dar seguimento ao procedimento mediante a elaboração de proposta, a submeter superiormente, de envio do processo à Comissão de Terras para parecer.
46. O DSODEP, através da proposta n.º 324/DSODEP/2013, de 26 de Novembro de 2013, propôs autorização superior para que o processo fosse enviado à Comissão de Terras para emissão de parecer e prosseguimento dos procedimentos posteriores. O director da DSSOPT em 27 de Novembro de 2013 exarou na respectiva proposta o seu despacho concordante.
47. Esta Comissão realizou reunião em 7 de Agosto de 2014, e através do parecer n.º 74/2014, foi de opinião que o não cumprimento do aproveitamento do terreno é imputável à concessionária. Segundo a cláusula quinta do contrato de concessão, o aproveitamento do terreno, incluindo a execução de todas as obras de aterro e infra-estruturas a que se refere a cláusula sexta do contrato, deve operar-se até 26 de Dezembro de 2002. Todavia, a concessionária não realizou o aproveitamento do terreno definido no contrato nem as obras de urbanização (infra-estruturas) indicadas na cláusula sexta, com excepção da execução do respectivo aterro. Caso contrário, apresentação em 2006 e 2010 de novos estudos prévios de aproveitamento indicia claramente que a concessionária não pretende aproveitar o terreno de acordo com o contrato e a legislação em vigor. Deste modo, esta Comissão considera que o não cumprimento do aproveitamento do terreno é imputável à concessionária, pelo que concordou com a proposta da DSSOPT, ou seja, a Administração deve declarar a caducidade da concessão do terreno referido em epígrafe.
48. Em seguida, tendo em conta que o terreno encontra-se onerado com uma hipoteca voluntária inscrita a favor do Banco Industrial e Comercial da China (Macau), S.A. (adiante designado por ICBC), no sentido de proporcionar a abertura de crédito em concessão de facilidades bancárias gerais a favor da concessionária, propôs-se então a realização de audiência escrita ao credor hipotecário acima referido.
49. Nestes circunstâncias, através do ofício n.º 741/6179.05/DSODEP/2014, de 23 de Outubro de 2014, o DSODEP notificou o credor hipotecário do projecto de decisão de declarar a caducidade da concessão, nos termos do artigo 93º do CPA, para sobre ele se pronunciar, por escrito, querendo, no prazo de 10 dias após a recepção da notificação.
50. Após receber o ofício em 27 de Outubro de 2014, o ICBC enviou em 6 de Novembro do mesmo ano uma resposta quanto ao projecto de decisão de declaração de caducidade. À data da concessão do mútuo (26 de Setembro de 2005), a Administração não havia aplicado, nem tão pouco anunciado, qualquer sanção à concessionária por eventual violação do contrato de concessão do terreno, nem havia indícios de que a Administração se preparasse para aplicar qualquer sanção que pudesse pôr em causa a plena validade do contrato de concessão. Pelo que, o mútuo só foi concedido tendo por base alguns pressupostos, quer quanto ao histórico do comportamento da Administração na execução dos próprios contratos de concessão, quer quanto ao ambiente geral do cumprimento dos contratos de concessão em Macau.
Na sua resposta, o Banco afirmou que a Administração sabe sempre reconhecer os factores exteriores negativos que afectam a economia de Macau e que têm reflexo direito nos prazos de aproveitamento das concessões e que aceitou em 30 de Junho de 2009 as duas últimas prestações do prémio pagas pela concessionária, por isso, o Banco nunca pensou que a Administração de um momento para o outro avançasse com a declaração de caducidade de concessão. Face ao acima exposto, o Banco requereu à Administração, tendo em conta os elevados princípios de ponderação, proporcionalidade e sentido de justiça que devem estar subjacentes às decisões administrativas, se dignasse relevar a situação descrita.
51. Relativamente à justificação do credor hipotecário, o DSODEP elaborou a proposta n.º 106/DSODEP/2015, de 22 de Abril de 2015, nela propondo autorização superior para o envio da respectiva resposta escrita ao DJUDEP para a emissão de parecer, tendo merecido a concordância do director da DSSOPT por despacho de 27 de Abril de 2015.
52. Nestas circunstâncias, o DJUDEP, através da proposta n.º 135/DJUDEP/2015, de 21 de Setembro de 2015, emitiu o seguinte parecer:
52.1 Recorde-se que nos termos do n.º 1 da cláusula quinta do contrato de concessão titulado pelo aludido Despacho n.º 32/SATOP/99, o aproveitamento do terreno, incluindo a execução de todas as obras de infra-estruturas a que se refere a cláusula sexta, deve operar-se até 26 de Dezembro de 2002. Portanto, aquando da concessão do referido mútuo, em 26 de Setembro de 2005, à concessionária, a mesma já se encontrava em largo incumprimento contratual, pelo que devia o ICBC procurar se inteirar da situação global da concessão antes de atribuir o crédito;
52.2 Por isso, considera-se que o ICBC foi imprudente, ou seja, não usou de todas as cautelas e zelo que em face das circunstâncias do caso usaria um bom pai de família, ao tomar em consideração o ambiente geral do cumprimento dos contratos de concessão em Macau para conceder o respectivo mútuo à concessionária. Na verdade, cada caso é um caso e a Administração dispõe de alguma discricionariedade na verificação e avaliação dos pressupostos que preenchem o incumprimento, podendo, perante cada situação concreta, e fazendo um juízo de ponderação de interesses, aceitar ou não como válidos os argumentos apresentados;
52.3 Portanto, cabia ao ICBC o dever de acautelar objectivamente o risco de proporcionar a abertura de crédito em concessão de facilidades bancárias gerais a favor de uma concessionária que encontra-se em largo incumprimento de obrigações contratuais para com a entidade concedente (Administração);
52.4 Por outro lado, se é certo que existiram factores exteriores negativos, tais como a influência da crise económica e monetária do Sudeste da Ásia e o controlo macroeconómico pela China Continental, que durante algum período estagnaram a economia de Macau, contudo, para que tais circunstâncias sejam aceites como justificação, elas deveriam ter sido alegadas contemporaneamente à sua ocorrência e por algum meio provadas, o que não aconteceu;
52.5 Apesar disso, a Administração, reconhecendo em 1998 o momento menos favorável que a conjuntura económica do Território atravessava, entendeu conceder uma nova oportunidade à concessionária, autorizando a prorrogação do prazo de aproveitamento do terreno até 26 de Dezembro de 2002, através do Despacho n.º 32/STOP/99. Mesmo assim, a mesma não realizou o aproveitamento do terreno, tendo apenas executado as obras de aterro;
52.6 Porém, como se disse na informação n.º 52/DJUDEP/2013 (relatório respeitante `audiência prévia da concessionária), se a concessionária tivesse cumprido o prazo de aproveitamento estipulado no contrato de concessão, a obra já estaria concluída quando se começaram a fazer sentir os primeiros efeitos da recessão económica, isto é, se tivesse cumprido em tempo (pontualmente) a principal obrigação (aproveitamento do terreno) nos prazos contratualmente estipulados, o mesmo estaria concluído em Junho de 1995, antes do impacto negativo causado pela crise, não havendo sequer necessidade de proceder à revisão do contrato em 1999;
52.7 No caso presente, pode mesmo considerar-se que houve uma retenção especulativa do terreno pela concessionária, situação esta contrária ao interesse público subjacente à concessão, na medida em que esta não cumpriu a sua função social, transformando-se numa unidade socioeconómica produtiva, sendo que o terreno poderia ter sido devidamente aproveitado por outro particular interessado;
52.8 Na verdade, é difícil perceber que ao fim de todos esses anos de falta de realização de aproveitamento (pelo menos 20 anos, de 1999 a 2010, quando a Administração notificou a concessionária para justificar o não cumprimento do contrato) a concessionária ainda tivesse a expectativa de que seria aceite nova revisão da concessão;
52.9 Quanto ao que advoga o ICBC nos pontos 15 a 22 da resposta, relativa à percepção em 30 de Junho de 2009 das duas últimas prestações do prémio pela Administração, note-se que estas prestações só foram liquidadas em 30 de Junho de 2009, quando deveriam ter sido liquidadas em Julho de 2000, portanto, com um atraso de 9 anos;
52.10 Pou outro lado, não se vê em que medida tal facto representa impedimento à declaração de caducidade da concessão, pois, como se disse na aludida informação n.º 52/DJUDEP/2013, ao efectuar a respectiva liquidação a concessionária mais não fez do que cumprir uma das suas obrigações contratuais, a qual é independente da execução, ou não, do aproveitamento do terreno e de quaisquer vicissitudes que ocorram durante o período da concessão;
52.11 Com efeito, o prémio do contrato fundamenta-se num interesse público, qual seja o direito à comparticipação da RAEM na previsível riqueza (mais-valias) que, pela concessão, vai permitir ao concessionário;
52.12 No caso vertente, se a concessionária não obteve as mais-valias que o aproveitamento do terreno lhe proporcionaria, este facto é-lhe inteiramente imputável. Por isso é devido o seu pagamento mesmo que seja declarada a caducidade da concessão.
52.13 Ademais, o pagamento pontual do prémio constitui tão-só uma das obrigações contratuais cujo não cumprimento pode gerar a rescisão do contrato. A principal obrigação do contrato consiste na realização do aproveitamento do terreno que, no caso em apreço, não foi cumprida, o que constitui causa de caducidade da concessão;
52.14 Ora, não tendo a concessionária por razões que lhe são imputáveis realizado integralmente o aproveitamento do terreno, à entidade concedente não resta outra alternativa que não seja a de extinguir a concessão, através da declaração de caducidade e independentemente de ter sido aplicada ou não a multa, conforme o previso na alínea 1) do n.º 1 do artigo 166º da Lei n.º 10/2013 (Lei de terras), aplicável por força do disposto no artigo 212º e na alínea 3) do artigo 215º da mesma lei, e também conforme o regime decorrente da lei antiga, Lei n.º 6/80/M, de 5 de Julho;
52.15 Por isso, para o caso em apreço, pode dizer-se que a declaração de caducidade resultou do próprio regime da caducidade previsto na Lei de terras e no contrato (cfr. alínea c) do n.º 1 da cláusula décima terceira), assente na verificação dos respectivos pressupostos, ou seja, mediante prévia averiguação das verdadeiras causas do incumprimento e avaliação das razões justificativas apresentadas pela concessionária faltosa e, como tal, não se vê em que medida a Administração violou os princípios da proporcionalidade e da boa-fé, conforme alega o ICBC;
52.16 Face ao expendido, conclui-se que os argumentos trazidos ao processo pelo ICBC em sede de audiência prévia não contribuíram para uma alteração do projecto de decisão e, como tal, deve a Administração manter o sentido da sua decisão de declarar a caducidade da concessão do terreno.
53 A chefe do DJUDEP emitiu o seguinte parecer complementar sobre a proposta referida em 29 de Setembro de 2015:
53.1 Como se conclui na presente informação as razões invocadas pelo credor hipotecário na resposta em sede de audiência escrita não contribuem para alterar o sentido da decisão de declarar a caducidade da concessão por não cumprimento do respectivo contrato, traduzido na falta de realização integral do aproveitamento do terreno;
53.2 Na verdade, o credor hipotecário, ICBC, foi imprudente quando concedeu à concessionária um crédito de $206.000.000,00 patacas, na convicção errónea de que a Administração nunca aplicaria as sanções contratualmente estabelecidas para o incumprimento contratual, mormente a caducidade da concessão;
53.3 A conduta da Administração na sua relação com a concessionária, designadamente o facto de ter acórdão com esta a revisão do contrato de concessão e a fixação de um novo prazo de aproveitamento do terreno, através do Despacho n.º 32/SATOP/99, nunca poderia ser valorada no sentido de que aquela entidade, perante o incumprimento reiterado das condições contratuais, não faria extinguir a concessão, declarando a sua caducidade.
Por despacho do director da DSSOPT de 7 de Outubro de 2015, concordou com o envio da referida proposta e do parecer ao DSODEP para prosseguimento das tramitações ulteriores.
54. Ouvido o parecer do DJUDEP, o DSODEP elaborou a proposta n.º 314/DSODEP/2015, de 28 de Outubro de 2015, nela propondo o envio do processo à Comissão de Terras para efeito de parecer. Na sequência do parecer concordante do director da DSSOPT com o proposto, o STOP manifestou igualmente a sua concordância por despacho de 10 de Novembro de 2015.
55. Em face de todo o exposto, esta Comissão após efectuar uma análise global do processo, considera que o não cumprimento do aproveitamento do terreno é imputável à concessionária. Segundo a cláusula quinta do sobredito contrato de concessão, o aproveitamento do terreno, incluindo a execução de todas as obras de aterro e infra-estruturas a que se refere a cláusula sexta do contrato de concessão, deve operar-se até 26 de Dezembro de 2002. Todavia, a concessionária não realizou o aproveitamento do terreno definido no contrato nem as obras de urbanização (infra-estruturas) indicadas na cláusula sexta, com excepção da execução do respectivo aterro.
Após vários anos, a concessionária apresentou um novo estudo prévio de aproveitamento em 28 de Fevereiro de 2006. Todavia, o despacho proferido pelo então STOP, em 12 de Maio de 2006, sobre o aludido estudo prévio, bem como todos os despachos ou pareceres favoráveis emitidos, relacionados com os planos de aproveitamento ou com os projectos de construção foram declarados nulos por despacho do Chefe do Executivo, de 19 de Junho de 2009, exarado o sobre a informação n.º 096/DSODEP/2009, de 5 de Junho, no seguimento do acórdão do Tribunal de Última Instância, proferido em 22 de Abril de 2009, no âmbito do processo n.º 53/2008.
Posteriormente, em 18 de Junho de 2010, a concessionária apresentou um novo estudo prévio de aproveitamento, de acordo do qual as alturas das edificações previstas situam-se entre os 98,2 e os 153,4m NMM, enquanto que as admitidas pela referida planta de alinhamento oficial variam entre 34,5 e 82,5m, NMM. Ora, apresentação em 2006 e 2010 de novos estudos prévios de aproveitamento indicia claramente que a concessionária não pretende aproveitar o terreno de acordo com o contrato de concessão e a legislação em vigor.
As razões invocadas pelo credor hipotecário na resposta em sede de audiência escrita não contribuem para alterar o sentido da decisão de declarar a caducidade da concessão.
A não execução do aproveitamento nos termos e prazos contratuais por razões imputáveis ao concessionário, constitui violação grave do dever de aproveitamento [cfr. artigos 103º a 106º da Lei n.º 6/80/M (Lei de Terras) e artigos 103º, 104º e 106º da Lei n.º 10/2013 (Lei de terras)], obrigação principal do contrato de concessão e, por isso, facto gerador de caducidade em ambas as leis.
Muito embora o presente procedimento tenha sido iniciado para a Administração verificar e apreciar se o incumprimento do contrato de concessão, consubstanciado na falta de realização de aproveitamento do terreno nos prazos nele fixados, seria imputável à concessionária e, por conseguinte, causa de caducidade-sanção legal e contratualmente prevista, em 25 de Dezembro de 2015 expirou o prazo de vigência da concessão (prazo de arrendamento), de 25 anos, fixado na cláusula segunda do contrato de concessão, pelo que sendo esta concessão provisória não pode ser renovada, nos termos do n.º 1 do artigo 48º da Lei n.º 10/2013.
Assim, a concessão encontra-se caducada pelo decurso do respectivo prazo de arrendamento (caducidade preclusiva).
Com efeito, de acordo com o artigo 44º da Lei n.º 10/2013 (Lei de terras), aplicável ao caso vertente por força do disposto nos seus artigos 212º e 215º, a concessão por arrendamento é inicialmente dada a título provisório e só se converte em definitiva se, no decurso do prazo fixado, foram cumpridas as cláusulas de aproveitamento previamente estabelecidas e o terreno estiver demarcado definitivamente (vide ainda artigos 130º e 131º).
Findo o seu prazo de vigência, as concessões provisórias não podem ser renovadas a não ser no caso previsto no n.º 2 do artigo 48º da Lei de terras, conforme estabelece o n.º 1 do mesmo preceito legal, operando-se a caducidade por força da verificação daquele facto (decurso do prazo de arrendamento).
De igual modo, resultava da Lei n.º 6/80/M, de 5 de Julho (Lei de terras anterior), que no caso da concessão revestir natureza provisória em virtude do terreno não se encontrar aproveitado (cf. artigos 49º, 132º e 133º), não era possível operar a sua renovação por períodos sucessivos de dez anos porquanto a figura da renovação prevista no n.º 1 do artigo 55º era aplicável apenas às concessões definitivas.
Mesmo que não ocorresse a caducidade preclusiva, sempre se verificaria a caducidade-sanção pela inexecução do aproveitamento do terreno nos termos e prazos contratuais, por razões imputáveis à concessionária, de acordo quer com a alínea a) do n.º 1 do artigo 166º da Lei n.º 6/80/M, de 5 de Julho, quer com a alínea 1) do n.º 1 do artigo 166º da Lei n.º 10/2013.
Apesar da caducidade operar de forma automática e directa, para tomar a situação jurídica certa a incontestada e, portanto, eliminar a insegurança jurídica sobre a extinção ou não do direito resultante da concessão, deve a mesma (caducidade) ser declarada, conforme decorre do disposto no corpo do n.º 1 do artigo 166º e no artigo 167º da Lei n.º 10/2013.
Extinto o direito resultante da concessão, pelo decurso do prazo, a hipoteca que incide sobre este direito extingue-se, igualmente, por falta de objecto.
Nestas circunstâncias, esta Comissão nada tem a opor à declaração de caducidade da concessão do terreno em epígrafe pelo decurso do prazo de arrendamento, perdendo a concessionária a favor da RAEM todas as prestações do prémio e os respectivos juros já pagos, nos termos do disposto no artigo 13º do Regulamento Administrativo n.º 16/2004.
VI
Reunida em sessão de 7 de Janeiro de 2016, a Comissão de Terras, após ter analisado globalmente o processo e ter tido em consideração os pareceres e propostas constantes nas informações n.ºs 266/DSODEP/2011, de 20 de Outubro de 2011, 70/DJUDEP/2011, de 9 de Dezembro de 2011, 7/GTJ/2012, 29 de Fevereiro de 2012, 88/DSODEP/2012, de 13 de Abril de 2012, 230/DSODEP/2012, de 4 de Outubro de 2012, 52/DJUDEP/2013, de 21 de Agosto de 2013, nas propostas n.ºs 324/DSODEP/2013, de 26 de Novembro de 2013, 106/DSODEP/2015, de 22 de Abril de 2015, 135/DJUDEP/2015, de 21 de Setembro de 2015, 314/DSODEP/2015, de 28 de Outubro de 2015, bem como os despachos do STOP, de 18 de Abril de 2012 e 10 de Novembro de 2015, exarados na informação n.º 88/DSODEP/2012 e proposta n.º 314/DSODEP/2015, e o despacho o Chefe do Executivo, de 8 de Maio de 2012, exarado na informação n.º 88/DSODEP/2012, considera que verificada a caducidade de concessão pelo termos do prazo de arrendamento em 25 de Dezembro de 2015, deve esta caducidade ser declarada por despacho do Chefe do Executivo.”
- Posteriormente, o Exm.º Secretário para os Transportes e Obras Públicas emitiu, em 26 de Fevereiro de 2016, o seguinte parecer:
“Proc. n.º 71/2013 – Respeitante à proposta da declaração de caducidade da concessão, por arrendamento e com dispensa de hasta pública, do terreno com a área de 27188m2 (após a revisão a área passou a ser de 19314m2), situado na ilha da Taipa, na Baía do Pac On (Sul), a favor da Companhia de Investimento Polaris, Limitada, pelo decurso do seu prazo de vigência, de 25 anos, que expirou em 25 de Dezembro de 2015, cuja concessão foi titulada pelo Despacho n.º 159/SATOP/90, revista pelos Despachos n.ºs 59/SATOP/95 e 32/SATOP/99.
1. Pelo Despacho n.º 159/SATOP/90, publicado no suplemento ao Boletim Oficial de Macau n.º 52, de 26 de Dezembro de 1990, com as rectificações publicadas no Boletim Oficial de Macau n.º 7, de 18 de Fevereiro de 1991, foi autorizada a concessão, por arrendamento e com dispensa de hasta pública, do terreno com a área de 27188m2, situado na ilha da Taipa, na Baía do Pac On (Sul), a favor da Companhia de Investimento Polaris, Limitada, para ser aproveitado com a construção de um complexo de edifícios destinado a habitação, comércio, estacionamento e equipamento social.
2. Com a publicação da Lei n.º 8/91/M, de 29 de Julho, por força do disposto no seu artigo 4º, o sobredito despacho passou a titular a concessão.
3. Conforme a cláusula segunda do contrato de concessão, o arrendamento é válido pelo prazo de 25 anos, contados a partir da publicação do aludido despacho, ou seja até 25 de Dezembro de 2015.
4. Devido à alteração do loteamento do terreno e, em consequência, aos novos alinhamentos definidos, a concessão foi objecto de revisão, titulada pelo Despacho n.º 59/SATOP/95, publicado no Boletim Oficial de Macau n.º 23, II Série, de 7 de Junho de 1995, passando a área do terreno a ser de 19314m2.
5. Posteriormente, na sequência da apresentação de um novo estudo prévio foi alterada a distribuição das áreas brutas de construção por finalidade de utilização em relação ao loteamento autorizado, o que determinou a revisão da concessão, que veio a ser titulada pelo Despacho n.º 32/SATOP/99, publicado no Boletim Oficial de Macau n.º 16, II Série, de 21 de Abril de 1999.
6. O prazo de validade da concessão terminou em 25 de Dezembro de 2015 e o terreno não se mostrava aproveitado nessa data.
7. Nestas circunstâncias e não obstante estar em curso naquela data um procedimento de caducidade-sanção, por falta de realização do aproveitamento do terreno nos prazos contratualmente estipulados, a Comissão de Terras, reunida em sessão de 7 de Janeiro de 2016, após ter analisado o processo, considerou que tendo expirado, em 25 de Dezembro de 2015, o prazo de arrendamento de 25 anos fixado na cláusula segunda do contrato e que a concessão, de carácter provisório, não pode ser renovada, de acordo com o previsto no n.º 1 do artigo 48º da Lei n.º 10/2013, Lei de terras, aplicável por força dos seus artigos 212º e 215º, a concessão encontra-se caducada pelo termo do respectivo prazo de arrendamento (caducidade preclusiva), devendo esta caducidade ser declarada por despacho do Chefe do Executivo.
Consultado o processo supra mencionado e concordando com o que vem proposto, solicito a Sua Excelência o Chefe do Executivo que declare a caducidade da concessão do referido terreno.”
- O Exm.º Chefe do Executivo proferiu a seguinte decisão em 21 de Março de 2016: “Concordo, pelo que declaro a caducidade da concessão, por arrendamento e com dispensa de hasta pública, a que se refere o Processo n.º 71/2013 da Comissão de Terras, nos termos e com os fundamentos do Parecer do Secretário para os Transportes e Obras Públicas, de 26 de Fevereiro de 2016, os quais fazem parte integrante do presente despacho.”
- Houve crise económica em Macau entre 1997 e 2004.

3. Direito
Suscita a recorrente as seguintes questões:
- Nulidade do acórdão recorrido por omissão de pronúncia prevista na al. e) do n.º 1 do art.º 571.º do CPC;
- Violação da Declaração Conjunta do Governo da República Portuguesa e do Governo da República Popular da China e da Lei Básica da RAEM, designadamente os seus art.ºs 120.º e 145.º;
- Interpretação errada da lei quanto à irrelevância da apreciação da culpa no caso concreto; e
- Interpretação errada quanto à aplicação dos princípios da igualdade, da boa-fé, da justiça e da imparcialidade apenas aos actos discricionários, em violação do disposto no n.º 4 do art.º 2.º e nos art.ºs 5.º, 7.º, 8.º e 11.º, todos do CPA.

3.1. Começamos pela questão de nulidade do acórdão, reparando que, em vez da al. e) do n.º 1 do art.º 571.º do CPC indicada pela recorrente, deve ser a al. d) do n.º 1 do art.º 571.º que está em causa.
Alega a recorrente que, ao não apreciar o caso concreto, ao não apreciar a questão de culpa no não aproveitamento do terreno em causa bem como a violação de cada um dos princípios da igualdade, da boa-fé, da justiça e da imparcialidade bem como da decisão, incorreu o Tribunal recorrido no vício de omissão de pronúncia, violando o disposto na al. d) do n.º 1 do art.º 571.º do CPC.
Ora, nos termos da al. d) do n.º 1 do art.º 571.º, é nula a sentença “quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento”.
O que interessa no presente caso é a omissão de pronúncia.
Quanto a questões a resolver na sentença, dispõe o art.º 563.º do CPC o seguinte:
“Artigo 563.º
(Questões a resolver e ordem do julgamento)
1. Sem prejuízo do disposto no n.º 3 do artigo 230.º, a sentença conhece, em primeiro lugar, das questões que possam conduzir à absolvição da instância, segundo a ordem imposta pela sua precedência lógica.
2. O juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras.
3. O juiz ocupa-se apenas das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras.”
Daí decorre que o juiz deve resolver todas as questões suscitadas pelas partes, devendo ocupar-se apenas dessas questões, salvo questões de conhecimento oficioso.
E só a omissão de pronúncia sobre questões, e não sobre os fundamentos, considerações ou razões deduzidas pelas partes, que o juiz tem a obrigação de conhecer determina a nulidade da sentença.
Também não está o tribunal obrigado a resolver questões suscitadas pelas partes “cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras”, tal como resulta claramente do n.º 2 do art.º 563.º.
No caso ora em escrutínio, constata-se no acórdão recorrido que, após a análise sobre o regime da concessão de terrenos e da caducidade da concessão aplicável bem como os elementos que considera relevantes do caso concreto vertido nos presentes autos, com citação do acórdão do Tribunal de Última Instância proferido no Processo n.º 7/2018, conclui o Tribunal recorrido que, sendo uma actividade legalmente vinculada da Administração, ao declarar a caducidade da concessão após decorrido o prazo máximo de 25 anos, a Administração está a cumprir rigorosamente os deveres impostos pela Lei de Terras, pelo que “não se vislumbra qualquer necessidade de ponderação dos princípios da igualdade, da justiça, da imparcialidade, da boa-fé e da decisão, os quais só se aplicam aos actos administrativos discricionários”.
“E quanto à culpa da concessionária por incumprimento do aproveitamento, entende-se na jurisprudência da RAEM que a questão não é relevante para situações de caducidade-preclusão, em que este depende apenas do decurso do prazo e da constatação objectiva da falta de apresentação da licença de utilização do prédio”.
Resumindo, o acórdão recorrido considera irrelevante a apreciação da questão de culpa e desnecessária a ponderação dos princípios invocados pela recorrente, face à solução dada na jurisprudência da RAEM sobre a caducidade da concessão de terrenos.
Assim, não se nos afigura que incorre o Tribunal recorrido no vício imputado de omissão de pronúncia, sendo de concluir pela improcedência da tese da recorrente sobre a nulidade do acórdão recorrido.

3.2. Imputa a recorrente a violação da Declaração Conjunta do Governo da República Portuguesa e do Governo da República Popular da China e da Lei Básica da RAEM.
Na óptica da recorrente, no que se refere aos contratos de concessão celebrados anteriormente a 1999, a Lei n.º 10/2013 (nova Lei de Terras), designadamente os seus art.ºs 47.º n.º 1, 48.º n.º 1, 166.º e 215.º violam a letra e o espírito da Declaração Conjunta do Governo da República Portuguesa e do Governo da República Popular da China e violam a Lei Básica da RAEM, nomeadamente os seus art.ºs 120.º e 145.º, na medida em que não reconhecem nem protegem os direitos de concessão adquiridos e decorrentes dos contratos de concessão celebrados antes de 1999 válidos à luz da lei aplicável e vigente, e na medida em que não fixou, no seu direito transitório, um prazo para o exercício do direito de concessão e para o cumprimento do dever de aproveitamento efectivo dos terrenos objecto daqueles contratos.
Alega ainda que o n.º 1 do art.º 48.º da nova Lei de Terras, que não permite a renovação das concessões provisórias, atinge os contratos celebrados anteriormente a 1999, enquanto em parte alguma da anterior Lei de Terras está prevista a não renovação das concessões provisórias pelo decurso do prazo inicial do contrato de concessão bem como a caducidade do direito de concessão pelo decurso desse prazo sem aproveitamento do terreno.
Ora, é de manifestar, desde logo, a nossa discordância da alegação da recorrente no sentido de que na anterior Lei de Terras era permitida a renovação das concessões provisórias.
É verdade que o n.º 1 do art.º 48.º da nova Lei de Terras dispõe expressamente que, “sem prejuízo do disposto no número seguinte, as concessões provisórias não podem ser renovadas”.
Tal regra, de não poderem ser renovadas as concessões provisórias, não é inovadora. Embora na anterior Lei de Terras não se contenha uma norma expressa que estabeleça a mesma regra, a intenção legislativa de não renovação das concessões provisórias resulta da interpretação conjunta dos art.ºs 49.º, 54.º e 55.º desta Lei.
Na realidade, decorre do art.º 49.º de Lei n.º 6/80/M que a concessão por arrendamento de terrenos é inicialmente dada a título provisório, por prazo a fixar em função das características da concessão, e só se converte em definitiva se, no decurso do prazo fixado, forem cumpridas as cláusulas de aproveitamento mínimo previamente estabelecidas.
O prazo de concessão por arrendamento deve ser fixado no respectivo despacho de concessão, não podendo exceder 25 anos (art.º 54.º n.º 1 de Lei n.º 6/80/M), preceito este é semelhante ao n.º 1 do art.º 47.º da nova Lei de Terras, segundo o qual “o prazo de concessão por arrendamento é fixado no respectivo contrato de concessão, não podendo exceder 25 anos”.
Mesmo que o n.o 2 do art.º 54.º da Lei n.º 6/80/M estatua que o prazo das renovações sucessivas não deve exceder, para cada uma, 10 anos, tal disposição refere-se certamente à renovação da concessão definitiva, uma vez que dispõe o n.º 1 do art.º 55.º do mesmo diploma que as concessões por arrendamento onerosas, quando definitivas, são renováveis por períodos de 10 anos, mediante declaração de qualquer titular ou contitular do direito à concessão, apresentada junto dos serviços públicos competentes.
A lei não prevê a renovação das concessões provisória, mas sim apenas a renovação das concessões definitivas.
Daí que é muito clara a intenção legislativa de não permitir a renovação das concessão provisória, que não podem ser renovadas, tal como expressamente prevista no n.º 1 do art.º 48.º da nova Lei de Terras.
Por outro lado e nos termos da al. a) do n.º 1 e n.º 2 do art.º 166.º da Lei n.º 6/80/M, quando ocorra a falta do aproveitamento, imputável ao concessionário, do terreno nos prazo e termos contratuais, os arrendamentos provisórios caducam, sendo a caducidade declarada por despacho do Chefe do Executivo, publicado no Boletim oficial (art.º 167.º da Lei n.º 6/80/M).
Resumindo, o não aproveitamento do terreno concedido nos prazo e termos contratuais implica a caducidade de concessão, que deve ser declarada pelo Chefe do Executivo.
Na nova Lei de Terras é estabelecido o regime semelhante, cujo art.º 166.º prevê o seguinte:
Artigo 166.º
Caducidade das concessões
1. Para além das situações previstas nos Capítulos VII e XI, as concessões provisórias ou as concessões definitivas em fase de reaproveitamento de terrenos urbanos ou de interesse urbano caducam, quando se verifique qualquer uma das seguintes situações:
1) Não conclusão do aproveitamento ou reaproveitamento do terreno nos prazos e termos contratuais ou, sendo o contrato omisso, decorrido o prazo de 150 dias previsto no n.º 3 do artigo 104.º, independentemente de ter sido aplicada ou não a multa;
2) Suspensão, consecutiva ou intercalada, do aproveitamento ou reaproveitamento pelo período fixado no contrato ou, no silêncio deste, por prazo superior a metade do previsto para a sua conclusão.
2. Para além das situações previstas nos Capítulos VII e XI, as concessões provisórias de terrenos rústicos caducam quando:
1) O aproveitamento não seja iniciado dentro de seis meses após a concessão ou no prazo contratual fixado;
2) O aproveitamento seja suspenso, consecutiva ou intercaladamente, por um período superior a 12 meses.
É de afirmar que, tanto na vigência da anterior Lei de Terras como da Lei nova, o não aproveitamento do terreno concedido nos prazos e termos contratuais, que é a matéria que nos interessa no presente caso, implica a caducidade da concessão do mesmo terreno.
“No que respeita às concessões provisórias, as alíneas 1) e 2) do n.º 1 do artigo 166.º da Lei nova prevalecem sobre as alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 166.º da Lei antiga. Em ambas as Leis as concessões provisórias caducam por falta de aproveitamento do terreno nos prazos e termos contratuais. Sendo o contrato omisso quanto aos prazos é que as condições da caducidade difeririam. No caso dos autos foi fixado no contrato um prazo de aproveitamento, pelo que o novo artigo 166.º no que à recorrente respeita, em nada inova.”1
E estatui o art.º 215.º da nova Lei de Terras o seguinte:
Artigo 215.º
Nas concessões provisórias
A presente lei aplica-se às concessões provisórias anteriores à sua entrada em vigor, com as seguintes ressalvas:
1) Quando esteja a correr um prazo fixado por legislação anterior e a presente lei o tiver modificado, é aplicado o prazo mais longo;
2) Os direitos e deveres dos concessionários são imediatamente regulados pela presente lei, sem prejuízo do convencionado nos respectivos contratos;
3) Quando tenha expirado o prazo anteriormente fixado para o aproveitamento do terreno e este não tenha sido realizado por culpa do concessionário, aplica-se o disposto no n.º 3 do artigo 104.º e no artigo 166.º
Daí decorre claramente a aplicação imediata das normas contidas na nova Lei de Terras às concessões provisórias anteriores à sua entrada em vigor, que é o caso dos presentes autos, com as ressalvas previstas nas al.s 1) a 3).
Reitere-se que, “no que respeita à alínea 2) do artigo 215.º da Lei nova quanto ao regime aplicável aos direitos e deveres dos concessionários das concessões provisórias de pretérito, dispõe-se que prevalece sempre o estipulado nos respectivos contratos, o que acautela totalmente os direitos adquiridos de todos os concessionários cujas concessões provisórias são anteriores à entrada em vigor da Lei, ou seja, 1 de Março de 2014. Quanto ao não convencionado, faz-se prevalecer a lei nova, que se passa a aplicar àqueles direitos e deveres dos concessionários”.2 (o sublinhado é nosso)

Há de ver se há violação da Declaração Conjunta do Governo da República Portuguesa e do Governo da República Popular da China e dos art.ºs 120.º e 145.º da Lei Básica da RAEM.
Invoca a recorrente o ponto XIV do Anexo I da Declaração Conjunta, cujo teor é integralmente reproduzido pelo art.º 120.º da Lei Básica.
E cita a al. b) do n.º 1 do Título II do Anexo II da Declaração Conjunta, que consigna que “a partir da entrada em vigor da Declaração Conjunta e até 19 de Dezembro de 1999, o Governo Português de Macau poderá celebrar, nos termos da legislação aplicável vigente, contratos de concessão de terras por prazos que não ultrapassem 19 de Dezembro de 2049, cobrando os respectivos prémios”.
As normas da Lei Básica cuja violação foi invocada pela recorrente têm o seguinte teor:
Artigo 120.º
A Região Administrativa Especial de Macau reconhece e protege, em conformidade com a lei, os contratos de concessão de terras legalmente celebrados ou aprovados antes do estabelecimento da Região Administrativa Especial de Macau que se prolonguem para além de 19 de Dezembro de 1999 e os direitos deles decorrentes.
As concessões de terras feitas ou renovadas após o estabelecimento da Região Administrativa Especial de Macau são tratadas em conformidade com as leis e políticas respeitantes a terras da Região Administrativa Especial de Macau.
Artigo 145.º
Ao estabelecer-se a Região Administrativa Especial de Macau, as leis anteriormente vigentes em Macau são adoptadas como leis da Região, salvo no que seja declarado pelo Comité Permanente da Assembleia Popular Nacional como contrário a esta Lei. Se alguma lei for posteriormente descoberta como contrária a esta Lei, pode ser alterada ou deixa de vigorar, em conformidade com as disposições desta Lei e com os procedimentos legais.
Os documentos, certidões e contratos, válidos ao abrigo das leis anteriormente vigentes em Macau, bem como os direitos e obrigações neles compreendidos, continuam a ser válidos e são reconhecidos e protegidos pela Região Administrativa Especial de Macau, desde que não contrariem esta Lei.
Os contratos firmados pelo Governo anterior de Macau, cujos prazos de validade se prolonguem para além de 19 de Dezembro de 1999, continuam válidos, exceptuando os publicamente declarados por representação com autoridade conferida pelo Governo Popular Central como discordantes do disposto nos «Arranjos relativos ao Período de Transição» da Declaração Conjunta Sino-Portuguesa, que necessitam duma nova apreciação por parte do Governo da Região Administrativa Especial de Macau.

Não se vê como foi violada a al. b) do n.º 1 do Título II do Anexo II da Declaração Conjunta.
O Anexo II da Declaração Conjunta refere-se a “Arranjos relativos ao período de transição” e a al. b) do n.º 1 do seu Título II permite a celebração, no período de transição e pelo Governo de Macau, de contratos de concessão de terras por prazos que não ultrapassem 19 de Dezembro de 2049. Foi o que ocorreu no presente caso.
Conforme os preceitos contidos no ponto XIV do Anexo I da Declaração Conjunta e nos art.ºs 120.º e 145.º da Lei Básica, os contratos de concessão de terras celebrados antes de 20 de Dezembro de 1999 são reconhecidos e protegidos pela RAEM, bem como os direitos deles emergentes. Quanto às renovações das concessões que ocorressem após aquela data (que é o assunto que se interessa nos presentes autos) aplicavam-se as leis que, entretanto, vigorassem.
“Quer isto dizer que às concessões provisórias se teria de aplicar sempre a lei antiga, imunes às alterações eventualmente efectuadas?
Afigura-se-nos que não é este o sentido da norma. Os direitos dos concessionários de terras previstos nos contratos são reconhecidos e protegidos. Nas matérias não prevista nos contratos, a lei nova poderia afastar-se do regime prevista na lei antiga, então vigente.”3
E não é de aceitar que, com a protecção consagrada na lei Básica, os contratos de concessão, bem como os direitos deles decorrentes, continuem válidos para além do prazo de arrendamento dos terrenos, independentemente da renovação, ou não, das concessões, já que, como é lógico e legal, a protecção desses contratos e direitos dos concessionários para além do prazo inicial de arrendamento depende sempre da renovação dos respectivas concessões, efectuada em conformidade com as leis vigentes na altura de renovação, tal como prevê a segunda parte do art.º 120.º da Lei Básica, segundo a qual as concessões de terras renovadas após o estabelecimento da RAEM devem ser tratadas em conformidade com as leis e políticas respeitantes a terras da RAEM.
E contrariamente à pretensão da recorrente, afigura-se que a renovação do prazo do arrendamento mencionada no contrato de concessão, sobre a possibilidade de o mesmo ser renovado até 19 de Dezembro de 2049, não se refere à concessão provisória, como está em causa nos presentes autos, mas sim a concessões definitivas, sendo que, antes do estabelecimento da RAEM, a Administração de então fixa o mencionado prazo, por ser o limite até ao qual o Governo da República Popular da China se obrigou a respeitar os contratos de concessão de terras legalmente celebrados antes do Estabelecimento da RAEM e a propriedade privada, de acordo com a Declaração Conjunta, de 1987.4
Já vimos que o regime regulado nas normas indicadas pela recorrente, tais como os art.ºs 47.º n.º 1, 48.º n.º 1 e 166.º da nova Lei de Terras, sobre o prazo máximo de validade dos contratos de concessão, sobre a não renovação das concessões provisórias e sobre a consequência legal (de caducidade das concessões provisórias) do não aproveitamento do terreno concedido nos prazos e termos contratuais é idêntico ou semelhante ao regime previsto na Lei n.º 6/80/M, pelo que é de afastar a tese de que, com a aplicação da nova lei, nomeadamente das normas invocadas pela recorrente, fiquem afectados os direitos dos concessionários provisórios de pretérito.
Não se vislumbra nenhuma violação da Declaração Conjunta nem do disposto nos art.ºs 120.º e 145.º da Lei Básica.

3.3. Invoca ainda a recorrente que o acórdão recorrido interpretou erradamente a lei ao considerar irrelevante a apreciação sobre a questão de culpa no não aproveitamento do terreno.
Defende que o Tribunal recorrido errou ao aplicar a nova Lei de Terras ao caso concreto, e não apreciou as concretas razões de facto alegadas pela recorrente nos pontos 4-63 do seu Recurso Contencioso, por considerar irrelevante a apreciação da culpa perante uma caducidade-preclusão.
Sobre a aplicação da lei nova e a questão de culpa, este Tribunal de Última Instância tem entendido que, relativamente à declaração da caducidade, por decurso do prazo, da concessão do terreno, é aplicável a nova Lei de Terras (Lei n.º 10/2013), e não a antiga Lei (Lei n.º 6/80/M), como decorre dos art.ºs 212.º a 223.º da Lei n.º 10/2013, que contêm disposições finais e transitórias5, posição esta que é de manter no presente recurso.
Daí que, nos termos da al. 3) do art.º 215.º da nova Lei de Terras e na matéria respeitante à caducidade das concessões provisórias anteriores à sua entrada em vigor, aplica-se o disposto no art.º 166.º desta nova lei.
Por outro lado, nos seus acórdãos proferidos nos processos n.º 7/2018 e n.º 43/2018, de 23 de Maio de 2018 e 6 de Junho de 2018, respectivamente, este Tribunal de Última Instância chegou a pronunciar-se sobre a questão de caducidade-sanção ou caducidade-preclusão, tendo concluído que a caducidade da concessão provisória por decurso do prazo de arrendamento constitui um caso de caducidade-preclusão, pelo que, decorrido o prazo de 25 anos da concessão provisória (se outro prazo não estiver fixado no contrato), o Chefe do Executivo deve declarar a caducidade do contrato se considerar que, no mencionado prazo, não foram cumpridas as cláusulas de aproveitamento previamente estabelecidas, não tendo que apurar se este incumprimento se deve ter por motivo não imputável ao concessionário. “Isto é, não tem que apurar se a falta de aproveitamento se deveu a culpa do concessionário ou se, por exemplo, a Administração teve culpa, exclusiva ou não, em tal falta de aproveitamento.”
Constata-se nos autos que, segundo a cláusula segunda do contrato de concessão do terreno em causa, o arrendamento é válido pelo prazo de 25 anos, contados a partir de 26 de Dezembro de 1990, e até 25 de Dezembro de 2015.
E conforme o estipulado no n.º 1 da cláusula quinta do respectivo contrato de concessão, o prazo global de aproveitamento do terreno terminaria em 26 de Dezembro de 2002. Nos termos do n.º 2 da mesma cláusula, o prazo acima referido inclui os prazos para elaboração, apresentação e aprovação, pelos Serviços competentes, dos respectivos anteprojectos (projectos de arquitectura) e projectos de obras (projectos de fundações, estruturas, águas, esgotos, electricidade e instalações especiais), dos projectos de infra-estruturas (arruamentos, redes de águas, esgotos, electricidade, muro de protecção e suporte de aterro), dos projectos relativos à execução de todas as obras que constituem os encargos previstos na cláusula sexta, assim como de todas as obras que constituem o pagamento em espécie a que se refere a cláusula oitava.
Ocorreram várias vicissitudes relativas ao aproveitamento do terreno, entre as quais se contam:
- As revisões do contrato de concessão tituladas pelo Despacho n.º 59/SATOP/95, publicado no Boletim Oficial de Macau de 7 de Junho de 1995, e pelo Despacho n.º 32/SATOP/99, publicado no Boletim Oficial de Macau de 21 de Abril de 1999.
- Em 19 de Março de 1998 e por despacho do SATOP, foi autorizada a prorrogação do prazo de aproveitamento do terreno até 26 de Junho de 2001.
- A concessionária não procedeu, no entanto, ao aproveitamento do terreno em conformidade com o contrato de concessão.
- Até 28 de Fevereiro de 2006, a concessionária apresentou à DSSOPT um estudo prévio, que merecia parecer favorável da entidade competente, com o qual concordou o então STOP, por despacho de 12 de Maio de 2006. E posteriormente apresentou um novo anteprojecto de obra em 16 de Maio de 2007.
- Face ao Acórdão de 22 de Abril de 2009 do Tribunal de Última Instância relativo ao processo n.º 53/2008, segundo o qual o procedimento respeitante ao empreendimento da construção a executar no terreno em causa envolveu a prática de um crime de corrupção passiva para acto ilícito por parte do então STOP, e por despacho de 19 de Junho de 2009, o então Chefe do Executivo declarou a nulidade do despacho favorável do então STOP, de 12 de Maio de 2006, sobre o estudo prévio apresentado em 28 de Fevereiro de 2006 bem como a nulidade dos despachos favoráveis emitidos aos planos de aproveitamento do terreno, aos projectos de obras e a todos os outros projectos relativos ao terreno.
- Em 26 de Junho de 2009, a DSSOPT comunicou à concessionária que os despachos emitidos sobre o projecto de aproveitamento e o projecto de arquitectura bem como todos os despachos favoráveis tinham sido declarados nulos.
- Em 18 de Junho de 2010, a concessionária apresentou à DSSOPT um novo projecto de arquitectura, cuja apreciação não foi ainda concluída pela DSSOPT até que a Comissão de terras emitiu o parecer em 7 de Janeiro de 2016.
- O terreno não se encontrava aproveitado até 25 de Dezembro de 2015.
Ora, dado que a recorrente não concluiu o aproveitamento do terreno a si concedido no prazo fixado no respectivo contrato de concessão e face à posição que temos assumido quanto à natureza de caducidade-preclusão da concessão provisória, segundo a qual não há de apurar se a falta de aproveitamento se deveu a culpa do concessionário ou se a Administração teve culpa em tal falta de aproveitamento, é de concluir que não merece censura o acórdão ora recorrido que considera irrelevante a questão de culpa.
E também não se releva a apreciação das razões de facto alegadas pela recorrente nos pontos 4-63 do seu recurso contencioso.
Impocede o recurso, nesta parte.

3.4. Finalmente, imputa a recorrente a violação dos princípios da igualdade, da boa-fé, da justiça, da imparcialidade e da decisão, sustentando que tais princípios não se aplicam apenas aos actos discricionários, mas sim a toda a actividade administrativa, o que comporta os actos vinculados e os actos discricionários.
A questão ora colocada também já foi objecto da apreciação em vários acórdãos do Tribunal de Última Instância6, no sentido de, uma vez considerado que, face à Lei de Terras vigente, o Chefe do Executivo não tem margem para declarar ou deixar de declarar a caducidade da concessão, tendo que a declarar necessariamente, não valer aqui os vícios próprios de actos discricionários, como a violação de princípios gerais do Direito Administrativo, previstos nos artigos 5.º, 7.º e 8.º do Código do Procedimento Administrativo.
É pacífico que os princípios mencionados são considerados os limites internos dos actos discricionários ou dos momentos discricionários dos actos administrativos, pelo que não são operantes enquanto violações dos actos vinculados ou dos momentos vinculados dos actos administrativos. É abundante neste sentido a jurisprudência deste Tribunal de Última Instância.7
No caso ora em apreciação, afigura-se-nos evidente que, face à falta de aproveitamento do terreno por parte da recorrente no prazo de 25 anos, a Administração está vinculada a praticar o acto administrativo objecto de impugnação, cabendo ao Chefe do Executivo declarar a caducidade de concessão.
Ao contrário dum acto praticado no exercício do poder discricionário, o acto tem conteúdo vinculado quando o decisor não tem margem de livre decisão, tendo o acto um único sentido possível.8
E no âmbito da actividade vinculada, como no presente caso, não se releva a alegada violação dos princípios da igualdade, da boa-fé, da justiça e da imparcialidade.
Quanto ao princípio da decisão, alega a recorrente que a Administração está obrigada a emitir uma decisão, relativa ao anteprojecto por si apresentado em 18 de Junho de 2010 e, se a Administração tivesse tomado a decisão dentro do prazo legal previsto no CPA, a concessionária teria cumprido o aproveitamento do terreno.
Ora, é verdade que a Administração não tomou uma decisão expressa sobre o anteprojecto de arquitectura por si apresentado em 18 de Junho de 2010.
No entanto, mesmo admitindo, quanto muito, a alegada hipótese de que, se a Administração tivesse tomado a decisão dentro do prazo legal previsto no CPA, a concessionária teria cumprido o aproveitamento do terreno, certo é que, como já passou há muito tempo o prazo de aproveitamento e até o prazo de arrendamento do terreno, ambos fixados no contrato de concessão, a Administração está vinculada a praticar o acto que declara a caducidade da concessão do terreno, como já vimos, independentemente da culpa, ou não, da concessionária.
Daí que também é de afirmar a irrelevância da imputada violação do princípio da decisão no presente caso concreto.

4. Decisão
Face ao exposto, nega-se provimento ao recurso.
Custas pela recorrente, com taxa de justiça fixada em 12 UC.

                 Macau, 20 de Fevereiro de 2019
                 
   Juízes: Song Man Lei (Relatora) – Sam Hou Fai –
Viriato Manuel Pinheiro de Lima

O Magistrado do Ministério Público
presente na conferência: Joaquim Teixeira de Sousa
                 
1 Cfr. Ac. do Tribunal de Última Instância, de 23 de Maio de 2018, Proc. n.º 7/2018.
2 Cfr. Ac. do Tribunal de Última Instância, de 5 de Dezembro de 2018, Proc. n.º 88/2018.
3 Cfr. Ac. do Tribunal de Última Instância, de 5 de Dezembro de 2018, Proc. n.º 88/2018.
4 Cfr. Ac.s do Tribunal de Última Instância, de 23 de Maio de 2018, Proc. n.º 7/2018 e de 6 de Junho de 2018, Proc. n.º 43/2018.
5 Neste sentido, cfr. Ac.s do Tribunal de Última Instância, de 23 de Maio de 2018, Proc. n.º 7/2018 e de 6 de Junho de 2018, Proc. n.º 43/2018, para além dos outros.
6 Cfr. Ac.s do TUI, Proc. n.o 7/2018 e n.o 43/2018, entre outros.
7 Cfr. Ac. mais recente do TUI, Proc. n.º 88/2018.
8 Viriato Lima e Álvaro Dantas, Código de Processo Administrativo Contencioso Anotado, Centro de Formação Jurídica e Judiciária, 2015, p. 310.
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1
Processo n.º 102/2018