打印全文
Processo nº 5/2019 Data: 21.02.2019
(Autos de recurso penal)

Assuntos : Crime de “tráfico de estupefacientes”.
Pena.



SUMÁRIO

1. Na determinação da medida da pena, adoptou o Código Penal de Macau no seu art.º 65.º, a “Teoria da margem da liberdade”, segundo a qual, a pena concreta é fixada entre um limite mínimo e um limite máximo, determinados em função da culpa, intervindo os outros fins das penas dentro destes limites.

2. Com os recursos não se visa eliminar a margem de livre apreciação reconhecida ao Tribunal de 1ª Instância em matéria de determinação da pena, e que esta deve ser confirmada se verificado estiver que no seu doseamento foram observados os critérios legais atendíveis.

O relator,

______________________
José Maria Dias Azedo



Processo nº 5/2019
(Autos de recurso penal)






ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:





Relatório

1. A e B, (1° e 2°) arguidos com os restantes sinais dos autos, responderam no T.J.B., vindo a ser condenados como co-autores materiais da prática de 1 crime de “tráfico de estupefacientes”, p. e p. pelo art. 8°, n.° 1 da Lei n.° 17/2009, (com as alterações introduzidas pela Lei n.° 10/2016), na pena individual de 8 anos de prisão; (cfr., fls. 314 a 327 que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).

*

Inconformados, vêm os arguidos recorrer para afirmar (apenas) que “excessiva” é a pena que devia ser reduzida para uma outra de 7 anos de prisão; (cfr., fls. 348 a 356 e 357 a 365).

*

Respondendo, diz o Ministério Público que os recursos não merecem provimento; (cfr., fls. 367 a 368-v e 369 a 370-v).

*

Neste T.S.I., e em sede de vista, juntou o Exmo. Representante do Ministério Público o seguinte douto Parecer:

“A e B recorrem do acórdão exarado a fls. 314 e seguintes dos autos, que condenou cada um deles na pena de 8 anos de prisão, como co-autores materiais de um crime de tráfico de droga, previsto e punível pelo artigo 8.°, n.° 1, da Lei 17/2009, na redacção que lhe foi dada pela Lei 10/2016.
Nas motivações dos recursos insurgem-se contra a medida das penas, que consideram excessiva.
Em resposta, o Ministério Público na primeira instância pronuncia-se pela improcedência dos recursos.
Também nós temos por insubsistentes os fundamentos em que os recorrentes se louvam para defenderem o abaixamento das penas.
Contrariamente ao que alegam, a pena não se situou no meio da moldura abstracta, que coincide com os 10 anos, mas sensivelmente abaixo, sendo certo que não apresenta desfasamento relevante com a bitola habitualmente usada nos tribunais da Região Administrativa Especial de Macau. Por isso, tendo presentes as finalidades de prevenção que presidem à determinação das penas, e considerando que, no campo do tráfico, a finalidade de prevenção geral tem especial acuidade em Macau, não se pode considerar que se esteja face a um excesso injustificado das penas.
É de notar que as circunstâncias que os recorrentes pretendem que sejam tomadas em conta para o pretendido abaixamento das penas já foram devidamente ponderadas na decisão de primeira instância, onde nomeadamente foi enfatizada a falta de antecedentes criminais. Para além disso, cabe também lembrar que a acção dos recorrentes ocorre no campo do tráfico transfronteiriço, que é aquele que verdadeiramente permite a afluência e disseminação de droga pelo mercado de Macau.
Enfim, ponderadas que se mostram, pelo acórdão recorrido, todas as circunstâncias que podiam influir na determinação das penas, crê-se que elas não padecem do excesso que lhes vem atribuído.
De resto, e como temos dito e repetido, os parâmetros em que se move a determinação das penas, adentro da chamada teoria da margem de liberdade, não são matemáticos, devendo aceitar-se a solução encontrada pelo tribunal do julgamento, a menos que o resultado se apresente ostensivamente intolerável, por desajustado aos fins das penas e à culpa que as delimita, o que não é o caso.
Ante quanto se deixa dito, improcedem manifestamente as motivações dos recursos, não havendo reparos a apontar ao acórdão recorrido, pelo que o nosso parecer vai no sentido da rejeição dos recursos ou, quando assim se não entenda, no sentido de lhes ser negado provimento”; (cfr., fls. 455 a 456).

*

Cumpre decidir.

Fundamentação

Dos factos

2. Estão “provados” e “não provados” os factos como tal elencados no Acórdão recorrido a fls. 318 a 321-v, e que aqui se dão como integralmente reproduzidos.

Do direito

3. Vem os arguidos recorrer do Acórdão que os condenou como co-autores materiais da prática de 1 crime de “tráfico de estupefacientes”, p. e p. pelo art. 8°, n.° 1 da Lei n.° 17/2009, (com as alterações introduzidas pela Lei n.° 10/2016), na pena individual de 8 anos de prisão.

Pedem (apenas) a redução da pena que lhe foi aplicada, não impugnando a decisão da matéria de facto e sua qualificação jurídico-criminal que, por não merecer qualquer censura, se tem aqui como definitivamente fixada.

E perante a peticionada redução da pena de 8 anos de prisão para uma outra de 7 anos de prisão, mostra-se de consignar que inviável é o assim pretendido, sendo antes de se sufragar o entendimento pelo Ministério Público assumido na Resposta e douto Parecer que aqui se mostra de dar como reproduzido como solução a adoptar para a decisão do presente recurso.

Seja como for, não se deixa de consignar o que segue.

Pois bem, ao crime de “tráfico” pelo arguido cometido, cabe a pena de 5 a 15 anos de prisão; (cfr., art. 8°, n.° 1 da Lei n.° 17/2009, alterada pela Lei n.° 10/2016).

Como sabido é, a “determinação da medida concreta da pena”, é tarefa que implica a ponderação de vários aspectos.

Nos termos do art. 40° do C.P.M.:

“1. A aplicação de penas e medidas de segurança visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade.
2. A pena não pode ultrapassar em caso algum a medida da culpa.
3. A medida de segurança só pode ser aplicada se for proporcionada à gravidade do facto e à perigosidade do agente”.

Por sua vez, e atento o teor art. 65° do mesmo código, onde se fixam os “critérios para a determinação da pena”, tem este T.S.I. entendido que “Na determinação da medida da pena, adoptou o Código Penal de Macau no seu art.º 65.º, a “Teoria da margem da liberdade”, segundo a qual, a pena concreta é fixada entre um limite mínimo e um limite máximo, determinados em função da culpa, intervindo os outros fins das penas dentro destes limites”; (cfr., v.g., os recentes Acs. deste T.S.I. de 24.05.2018, Proc. n.° 301/2018, de 13.09.2018, Proc. n.° 626/2018 e de 17.01.2019, Proc. n.° 1077/2018).

É também sabido que com os recursos não se visa eliminar a margem de livre apreciação reconhecida ao Tribunal de 1ª Instância em matéria de determinação da pena, e que esta deve ser confirmada se verificado estiver que no seu doseamento foram observados os critérios legais atendíveis; (cfr., v.g., os Acs. do Vdo T.U.I. de 03.12.2014, Proc. n.° 119/2014 e de 04.03.2015, Proc. n.° 9/2015).

Acompanhando o Tribunal da Relação de Évora temos igualmente considerado:

“I - Também em matéria de pena o recurso mantém o arquétipo de remédio jurídico, pelo que o tribunal de recurso deve intervir na pena (alterando-a) apenas e só quando detectar incorrecções ou distorções no processo de determinação da sanção.
II - Por isso, o recurso não visa nem pretende eliminar alguma margem de apreciação livre reconhecida ao tribunal de 1ª instância nesse âmbito.
III - Revelando-se, pela sentença, a selecção dos elementos factuais elegíveis, a identificação das normas aplicáveis, o cumprimento dos passos a seguir no iter aplicativo e a ponderação devida dos critérios legalmente atendíveis, justifica-se a confirmação da pena proferida”; (cfr., o Ac. de 22.04.2014, Proc. n.° 291/13, in “www.dgsi.pt”, aqui citado como mera referência, e Acórdão do ora relator de 12.07.2018, Proc. n.° 534/2018, de 25.10.2018, Proc. n.° 570/2018 e de 17.01.2019, Proc. n.° 1138/2018).

No mesmo sentido decidiu este T.S.I. que: “Não havendo injustiça notória na medida da pena achada pelo Tribunal a quo ao arguido recorrente, é de respeitar a respectiva decisão judicial ora recorrida”; (cfr., o Ac. de 24.11.2016, Proc. n.° 817/2016).

E, como se tem igualmente decidido:

“O recurso dirigido à medida da pena visa tão-só o controlo da desproporcionalidade da sua fixação ou a correcção dos critérios de determinação, atentos os parâmetros da culpa e as circunstâncias do caso.
A intervenção correctiva do Tribunal Superior, no que diz respeito à medida da pena aplicada só se justifica quando o processo da sua determinação revelar que foram violadas as regras da experiência ou a quantificação se mostrar desproporcionada”; (cfr., o Ac. da Rel. de Lisboa de 24.07.2017, Proc. n.° 17/16).

“O tribunal de recurso deve intervir na pena, alterando-a, apenas quando detectar incorrecções ou distorções no processo de aplicação da mesma, na interpretação e aplicação das normas legais e constitucionais que a regem. Nesta sede, o recurso não visa nem pretende eliminar alguma margem de actuação, de apreciação livre, reconhecida ao tribunal de primeira instância enquanto componente individual do ato de julgar.
A sindicabilidade da pena em via de recurso situa-se, pois, na detecção de um desrespeito dos princípios que norteiam a pena e das operações de determinação impostas por lei. E esta sindicância não abrange a determinação/fiscalização do quantum exacto da pena que, decorrendo duma correcta aplicação das regras legais e dos princípios legais e constitucionais, ainda se revele proporcionada”; (cfr., o Ac. da Rel. de Guimarães de 25.09.2017, Proc. n.° 275/16).

Aqui chegados, que dizer da pena de 8 anos de prisão fixada para o crime de “tráfico” pelos arguidos, ora recorrentes, cometido?

Ora, atento o que se deixou exposto, tendo presente a factualidade dada como provada, de onde resulta – essencialmente – que os arguidos, recorrentes, agindo de forma combinada e em conjugação de esforços, se vinham dedicando ao “tráfico” de estupefacientes em Macau, não constituindo uma “situação pontual”, ponderando também nas “quantidades” e “qualidade” do estupefaciente que lhes foi apreendido, (“Cocaína”), embalada em 38 pacotinhos, (doses), e tendo presente a moldura penal aplicável, (5 a 15 anos de prisão), e (muito) fortes sendo as necessidades de prevenção criminal, (face aos graves malefícios e prejuízos que o crime de “tráfico de estupefacientes” causa para a saúde pública), apresenta-se-nos que a decisão do Colectivo do T.J.B. não merece qualquer censura, sendo assim, de se confirmar, na íntegra, a pena aos arguidos ora recorrentes aplicada.

Tudo visto, resta decidir como segue.

Decisão

4. Nos termos e fundamentos expostos, em conferência, acordam negar provimento aos recursos.

Pagarão os arguidos a taxa de justiça individual de 6 UCs.

Honorários ao Exmo. Defensor dos (1° e 2°) arguidos no montante de MOP$2.500,00.

Registe e notifique.

Nada vindo de novo, e após trânsito, remetam-se os autos ao T.J.B. com as baixas e averbamentos necessários.

Macau, aos 21 de Fevereiro de 2019
José Maria Dias Azedo
Chan Kuong Seng
Tam Hio Wa
Proc. 5/2019 Pág. 14

Proc. 5/2019 Pág. 13