Processo n.º 1039/2018
(Recurso em matéria laboral)
Data: 24 de Janeiro de 2019
ASSUNTOS:
- Repetição de julgamento
- Novos quesitos deficientes
SUMÁRIO:
I – Quando o Tribunal ad quem, em sede da decisão do recurso, fixou os termos de “apurar os concretos dias de trabalho efectivamente prestado e a poder fixar-se a compensação relativa aos subsídios de alimentação, bem como as importâncias devidas a título de trabalho prestado em dias de descanso semanal, descanso compensatório, trabalho extraordinário e por turnos e feriados obrigatórios”, o Tribunal a quo deve cumprir o ordenado mediante o aditamento de factos necessários, pertinentes e aptos a solucionar as questões pendentes, seleccionando os factos segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito.
II – O Tribunal a quo, em sede de repetição do julgamento, formulou dois quesitos com o seguinte teor: (artigo 20º) Entre 08/05/1999 e 21/07/2003, o Autor prestou 1245 dias de trabalho efectivo junto da 1ª Ré? (artigo 21º ) Entre 22/07/2003 e 13/04/2007, o Autor prestou 1020 dias de trabalho efectivo junto da 2ª Ré? estes quesitos em causa, para além de conterem conteúdo deficiente, não têm aptidão para cumprir o ordenado do acórdão do TSI, razão pela qual é de anular o julgamento feito nestes termos.
III – Para a mesma finalidade e em sede da reclamação o Autor chegou a propôr 5 quesitos sob os números 22º a 27º com conteúdo pertinente e apto a cumprir o decidido no acórdão do TSI, deve admitir-se tais quesitos que constituirão objecto de novo julgamento a cargo do Tribunal a quo. É o que a este TSI compete decidir nestes autos em face da deficiência verificada.
O Relator,
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Fong Man Chong
Processo nº 1039/2018
(Autos de recurso laboral)
Data : 24 de Janeiro de 2019
Recorrente: B (Autor)
Recorridas: Xxxx Xxxx Xxxx Xxxx, S.A. (1.ª Ré)
Yyy Yyy Yyy, S.A. (2.ª Ré)
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Acordam os Juízes do Tribunal de Segunda Instância da RAEM:
I) RELATÓRIO
B, intentou, em 18/03/2016, junto do Tribunal Judicial de Base da RAEM, acção declarativa de processo comum do trabalho (LB1-16-0096-LAC), pedindo condenar a 1ª Ré a pagar a título de créditos laborais, a quantia global de MOP$258.550,00 e a 2ª Ré a pagar a título de créditos laborais, a quantia global de MOP$109.400,00.
Realizado o julgamento, foi proferida a PRIMEIRA sentença, datada de 29/05/2017 (fls. 195 a 205), contra esta foi interposto recurso para este TSI, tendo este proferido o acórdão constante de fls.282 a 299 (Proc. Nº 857/2017), pelo qual este TSI mandou repetir o julgamento nos termos fixados no aresto.
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Foi refeito o julgamento com o aditamento de 2 quesitos, tendo estes recebido uma resposta NEGATIVA.
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Depois, o Tribunal a quo veio a proferir a sentença constante de fls. 364 a 372, pela qual julgou improcedentes os pedidos formulados pelo Autor.
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Discordando desta nova decisão do Juízo Laboral (JL), veio o Autor recorrer NOVAMENTE para este TSI, com os fundamentos de fls. 384 a 406, em cujas alegações formulou as seguintes conclusões:
1. Versa o presente recurso sobre a Decisão proferida pelo Juízo Laboral do Tribunal Judicial de Base nos termos da qual foi julgada totalmente improcedente, por não provado, os pedidos formulados pelo Autor, ora Recorrente, contra a 1.ª Ré e relativos ao subsídio de alimentação, trabalho prestado em dia de feriado obrigatório, descanso semanal, descanso compensatório, trabalho extraordinário e por turnos, em sede de “repetição de julgamento” tal qual ordenado por este Venerando Tribunal de Recurso (Proc. n.º 857/2017, junto de fls..);
2. Salvo o devido respeito, está o Recorrente em crer que a Decisão Recorrida enferma de um conjunto de erros de facto (traduzida, desde logo numa notória insuficiência de matéria de facto com vista à “repetição do julgamento” tal qual ordenado pelo Tribunal de Segunda Instância), bem como de um notório erro de julgamento traduzido numa manifesta contradição entre a matéria de facto constante da Decisão Recorrida com matéria de facto anteriormente provada, o que em muito compromete a sua validade e justeza, razão pela qual deve a mesma ser julgada nula e substituída por outra que dê integral cumprimento à “repetição do julgamento” nos termos que haviam sido “anteriormente” ordenados pelo Tribunal de Recurso e, bem assim, que atenda aos pedidos reclamados pelo Autor na sua Petição Inicial;
Mais detalhadamente,
3. Importa começar por recordar que a Decisão de que ora se recorre surge na sequência do Acórdão deste Venerando Tribunal de Recurso (Ac. n.º 857/2017), nos termos do qual se retira que se impunha ao Tribunal a quo - em sede de “repetição do julgamento” - aditar à douta Base Instrutória, o(s) quesito(s) necessário(s) e referentes, nomeadamente: à concretização dos dias de trabalho efectivo - tendo em vista as ausências autorizadas, para além das férias gozadas - determinante para efeitos do cômputo da indemnização devida a título de subsídio de alimentação, trabalho por turnos e trabalho extraordinário trabalho prestado em dia de descanso semanal e descanso compensatório não gozados; à determinação de quais os dias em que o trabalho foi prestado para efeitos de apuramento da quantia devia pelos dias de feriados obrigatórios e ao ao apuramento dos dias das ausências autorizadas e das férias gozadas;
4. Lamentavelmente, porém, não foi este o entendimento do Tribunal a quo aquando da selecção da matéria de facto com vista à “repetição de julgamento”, porquanto o mesmo se limitou a aditar apenas dois simples quesitos à douta Base Instrutória, nos termos que resultam do Despacho de fls. 310, o que se revela manifestamente insuficiente com vista à ordem de “repetição do julgamento”, tal qual decidido pelo Tribunal de Recurso;
Da reclamação à selecção da matéria de facto (art. 430.º, n.º 3 do CPC): da sua manifesta insuficiência:
5. Notificado do aditamento do referido quesito à douta Base Instrutória, o Autor apresentou uma Reclamação, tendo a mesma sido integralmente indeferida pelo Tribunal a quo - nos termos que resultam do Despacho de fls. 329;
6. Salvo o devido respeito, está o ora Recorrente em crer que, contrariamente ao que terá sido concluído pelo Tribunal a quo, a “repetição do julgamento” ordenada pelo Tribunal de Recurso impunha não só que fosse aditado à douta Base Instrutória o(s) quesito(s) necessário(s) à “concretização” dos “dias de trabalho efectivamente prestados” mas, igualmente, que fosse aditado o(s) quesito(s) com vista à “concretização” dos “dias de falta” e/ou “dias de ausência” do Autor ao longo da relação de trabalho com a Ré, porquanto se trata de matéria essencial com vista ao apuramento de determinadas “rubricas”, como é o caso da compensação pelos dias de feriados obrigatórios, o que manifestamente não foi levado a cabo pelo Tribunal a quo;
7. O mesmo é dizer que mais do que a determinação de “quantos” dias de trabalho terá o Autor prestado, impunha-se ao Tribunal a quo a determinação de “quais” os dias em que o trabalho foi efectivamente prestado, contrariamente ao que terá sido a interpretação seguida pelo Tribunal de Primeira Instância;
8. Ora, os dois únicos quesitos aditados à Base Instrutória são, na sua formulação, meramente “quantitativos” e, como tal, em caso algum se mostram idóneos a obter a “concretização” dos (quais) dias de trabalho prestado e dos (quais) os dias de falta e de dispensa ao trabalho, conforme expressamente ordenado pelo Tribunal de Recurso;
Acresce que,
9. Contrariamente ao que resulta do Despacho de fls. 329 em caso algum se aceita que o aditamento de apenas dois novos quesitos fosse “abrangente o suficiente” para, entre outro, concretizar quais e quantos os dias considerados no cálculo efectuado na sentença final objecto do referido recurso, atendendo às diferentes rúbricas em presença e, bem assim, para especificar em que dias concretos o Autor foi dispensado do trabalho e terá gozado férias;
10. De onde, ao proceder ao aditamento de apenas dois novos quesitos à douta Base Instrutória - com vista tão-só ao “apuramento dos concretos dias de trabalho efectivamente prestado”, mas sem que nada tivesse sido aditado ao nível da concretização dos “dias de falta e/ ou “dias de ausência” - o Despacho de fls. 310 encontra-se manifestamente inquinado por uma insuficiência (leia-se, deficiência) ao nível da selecção da matéria de facto necessária à apreciação das várias questões a que o Tribunal a quo foi chamado a pronunciar-se e para as quais não ofereceu a respectiva e competente resposta;
11. Em conformidade, deve o Despacho de fls. 310 - que ordena o aditamento de dois únicos quesito à Base Instrutória - ser julgado nulo e de nenhum efeito e, nos termos do art. 430.º do CPC, ser o mesmo substituído por outro que defira o pedido de aditamento à douta Base Instrutória dos quesitos 22 a 27.º nos termos anteriormente formulados pelo Autor, devendo ser ordenada a devolução dos autos ao Tribunal de Primeira Instância com vista à “repetição do julgamento” para sobre os referidos quesitos se produzir a respectiva prova, o que desde já e para os legais efeitos se invoca e requer;
Sem prescindir,
12. Para a eventualidade de o douto Tribunal de Recurso concluir pela suficiência da matéria de facto constante da douta Base Instrutória com vista à “repetição do julgamento” conforme ordenado, está o ora Recorrente em crer que a matéria fáctica constante da Decisão Recorrida terá sido, com o devido respeito, incorrectamente julgada pelo Tribunal a quo e, bem assim, que a mesma enferma de uma manifesta falta de fundamentação traduzida numa clara contradição com a matéria de facto anteriormente julgada, razão pela qual se verifica um claro e manifesto erro de julgamento o que desde já e para os efeitos se invoca e requer;
13. Em concreto, a Decisão recorrida enferma de um manifesto vício de falta de fundamentação traduzido, desde logo, no facto de o Tribunal a quo não ter determinado - como lhe competia e havia sido ordenado pelo Tribunal de Recurso - quantos foram os dias de ausência e, bem assim, quantos foram os dias de faltas justificadas porquanto, tal concretização se mostra(va) essencial para o apuramento das várias quantias reclamadas pelo Autor na sua Petição Inicial;
Acresce que,
14. Da prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento a resposta aos quesitos 20 e 21 aditados à douta Base Instrutória (como “não provados”) e a sua concreta fundamentação teriam necessariamente de ser diferentes, visto conduzirem a um resultado decisório completamente díspar daquele em que assentou toda a “linha de pensamento” seguido pelo douto Tribunal de Recurso;
15. Ou melhor, a resposta oferecida pelo Tribunal a quo aos dois únicos quesitos aditados à douta Base Instrutória (como “não provado”) mostra-se em total contradição com a matéria de facto anteriormente provada (e, de resto, já confirmada pelo douto Tribunal de Recurso) o que, por si só, se revela totalmente incompreensível e desrazoável e, nesta medida, incapaz de produzir qualquer tipo de efeitos;
Sem prescindir,
16. Contrariamente ao concluído pelo Tribunal a quo, em caso algum se aceita que “não valem muito os registos de saída e entrada da fronteira de Macau dos autos porque com eles só consegue provar negativamente os referidos períodos em que o Autor gozou férias anuais ou dispensas e ausentou de Macau”;
17. Bem pelo contrário, sabido que a ordem de “repetição de julgamento” se destinava, entre outro, a “concretizar” os períodos de férias, de dispensas e/ou de ausências do Autor ao longo da relação de trabalho com a Ré, o Tribunal a quo tinha na sua posse todos os elementos de prova para o efeito;
18. Ou melhor, resultando dos referidos registos de entrada e saída o número de dias de férias anuais e/ou de faltas e/ou de dispensas autorizadas do Autor ao longo do período da relação de trabalho com a Ré - e, sabido que para além destas o Autor não deu mais nenhuma falta não autorizada e/ou injustificada - o Tribunal a quo tinha em seu poder todos os elementos necessários para determinar com elevado grau de certeza o número de dias de trabalho efectivo prestado pelo Autor - tal qual ordenado pelo Tribunal de Recurso - o que manifestamente não fez;
19. De onde se impunha concluir que, em vez de “prova negativa”, os referidos Registos de entrada e saída por fronteira do Autor deveriam antes valer como “prova positiva” e, neste sentido, demonstrar os concretos períodos de férias, de dispensas e de ausências do Autor ao longo da relação de trabalho que dos mesmos (Registos) se extrai, o que desde já e aqui se requer que seja levado a cabo pelo douto Tribunal de Recurso, em sede de reapreciação de prova, nos termos do disposto no art. 629.º do CPC;
Por último,
20. Sem nunca perder de vista o Princípio da imediação e da livre apreciação da prova conferido ao julgador, está o ora Recorrente em crer que não deixa de se revelar “bizarra” a razão de ciência avançada pelo Tribunal a quo a respeito da falta de credibilidade da única testemunha ouvida em sede de “repetição de julgamento” - por sinal ou mera coincidência - a mesma testemunha que havia sido ouvida anteriormente aquando do primeiro julgamento e cuja “credibilidade” e “conhecimento directo dos factos” foi, de resto, já expressamente confirmada nos presentes autos pelo Tribunal de Recurso;
21. A este particular, vislumbra-se uma notória (e quiçá injustificada) disparidade ao nível da valoração do testemunho prestado pela mesma testemunha (ainda que em sede de “repetição de julgamento”), levando a que o ora Recorrente seja levado a concluir que: o que aos olhos do Tribunal de Segunda Instância se revelou ser um depoimento sério e imparcial; no olhar do Tribunal a quo se terá convalidado num depoimento não credível e inacreditável..., o que em caso algum se pode aceitar, pelo que também aqui se impõe uma reapreciação de prova, o que desde já e para os devidos e legais efeitos se requer.
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A Xxxx Xxxx Xxxx Xxxx, S.A. (XXXX) e a Yyy Yyy Yyy, S.A. (YYY), Rés, ora Recorridas, notificadas do recurso interposto pelo Autor, vieram a apresentar a sua resposta (fls. 435 a 454), tendo formulado as seguintes conclusões:
I. Vem o recurso a que ora se responde interposto da douta decisão proferida a final pelo Juízo Laboral do Tribunal Judicial de Base da RAEM e pela qual a acção foi julgada improcedente, por não provada, e em consequência absolvidas as Rés, XXXX e YYY e aqui Recorridas, do pedido.
II. As teses do Recorrente carecem de qualquer fundamento, devendo o recurso a que ora se responde improceder.
III. O Despacho de fls. 310 não padece de qualquer nulidade, como também não poderia o Autor vir impugná-lo em sede de recurso.
IV. O recurso contra este Despacho de fls. 310 - Despacho que selecciona a matéria de facto - não encontra acolhimento legal.
V. O Recorrente não impugnou o Despacho que decide a reclamação de fls. 329.
VI. O Recorrente insurge-se apenas contra o Despacho de fls. 310, ou seja, do Despacho que selecciona a matéria de facto, decisão que não é recorrível.
VII. O Recurso a que ora se responde não poderá senão improceder nesta parte.
VIII. Andou bem o Tribunal a quo na selecção da matéria levada a julgamento.
IX. A factualidade que o Recorrente pretendia ver incluída na Base Instrutória não contribui para a aludida “concretização” dos dias de trabalho e ausência.
X. A matéria cuja inclusão no questionário foi requerida não resulta nenhuma outra concretização dos dias em que o mesmo foi dispensado de trabalhar ou gozar férias.
XI. O Recorrente não alegou concretamente quais foram os dias em que trabalhou e quais foram os dias em que foi dispensado de trabalhar, tendo antes optado por, de forma vaga e imprecisa, alegar que trabalhou todos os dias do ano menos uma média de 30 dias, pelo que não pode agora conceber uma concretização que não resulta dos autos.
XII. XII. O Tribunal a quo nos quesitos 20º e 21º leva em conta a média dos 30 dias que o Autor terá sido dispensado de trabalhar para as Recorridas, pelo que não é necessário aditar os sete novos factos ao questionário.
XIII. O Recorrente ao alegar que “terá prestado” 1245 dias de trabalho para a 1ª Recorrida e 1020 dias de trabalho para a 2ª Recorrida - e não que “prestou” esses dias de trabalho – e que “terá sido” dispensado - e não que “foi” dispensado - bem denuncia que não tem noção de quantos e quais os dias em que trabalhou, pelo que não pode querer uma concretização de dias que nunca alegou.
XIV. Os quesitos levados a julgamento reflectem cabalmente o que foi alegado pelo Recorrente, tendo o douto Tribunal a quo cumprido na íntegra o que havia sido ordenado por esse Venerando Tribunal de Segunda Instância.
XV. Procurou o Meritíssimo Juiz a quo apurar os concretos dias de trabalho efectivamente prestados pelo Autor, sem que isso, no entanto, não tenha sido possível em virtude da falta de prova.
XVI. O Recorrente não poderá apontar qualquer vício à selecção da matéria de facto feita pelo Tribunal a quo, a qual foi efectuada em rigoroso cumprimento do que foi superiormente decidido.
XVII. A decisão ora proferida encontra-se devidamente fundamentada.
XVIII. Foi levada à discussão da causa o número de dias de trabalho que terão efectivamente sido prestados pelo Autor, estando os dias de “ausência” e/ou “faltas justificadas” reflectidos nos quesitos 20º e 21º.
XIX. O Tribunal a quo ao quesitar se o Autor prestou 1245 dias de trabalho para a Recorrida XXXX e 1020 dias de trabalho efectivo para a Recorrida YYY, teve em consideração “a média de 30 dias por cada ano civil correspondente ao número de dias de dispensa remunerados e/ou não remunerados nos quais o Autor terá sido dispensado da prestação de trabalho.”
XX. O Recorrente não logrou provar esse facto.
XXI. A falta de prova do número de dias de trabalho efectivo conduziu a acção ao seu único destino - a improcedência.
XXII. O Tribunal fundamentou cabalmente a sua convicção e decisão, e a sua fundamentação é suficiente, inequívoca, clara e esclarecedora.
XXIII. A decisão recorrida não está inquinada do vício de falta de fundamentação.
XXIV. A resposta aos quesitos 20º e 21º - não provado - oferecida pelo Tribunal a quo não se encontra em manifesta e notória contradição com a restante matéria constante da douta base instrutória e já anteriormente apreciada e confirmada nos autos.
XXV. Essa contradição - a existir, o que não se concede - deveria ter sido invocada em sede de reclamação ao despacho que decida a matéria de facto, ao abrigo do disposto no artigo 556.º, n.º 5 do CPC ex vi artigo 1.º do CPT, e não em sede de recurso.
XXVI. Em sede de recurso o Recorrente pode impugnar a matéria de facto, mas terá de o fazer nos termos que impõe os artigos 599.º e 629.º do CPC, especificando quais os concretos pontos da matéria de facto que considera incorrectamente julgados e quais os meios probatórios constantes do processo ou de registo nele realizado que impunham, sobre essa matéria decisão diversa, mais indicando as passagens da gravação em que se funda o erro.
XXVII. Não bastará ao Recorrente invocar que as respostas aos quesitos 20º e 21º devem ser declaradas nulas e de nenhum efeito por contraditória à restante matéria,
XXVIII. Não se vislumbra, nem o Recorrente indica, com que factos as respostas aos quesitos 20º e 21º colidem.
XXIX. O Tribunal de Segunda Instância pode alterar a matéria de facto, desde que, tendo havido gravação dos depoimentos prestados, a mesma tenha sido impugnada nos termos do artigo 599º o CPC, cfr. resulta da alínea a) do referido artigo 629º do CPC.
XXX. O Recorrente não especifica quais os pontos da matéria de facto que considera incorrectamente julgados pelo douto Tribunal a quo, nem indica qual a resposta que se imporia relativamente aos quesitos da Base Instrutória que alegadamente queria impugnar, nomeadamente os quesitos 20º e 21º.
XXXI. O Recorrente não especifica quais os meios probatórios, constantes dos autos, que impunham, sobre esses pontos da matéria de facto, decisão diversa da recorrida.
XXXII. Impunha-se ao Recorrente o ónus de indicar as passagens da gravação da prova em que se funda o alegado erro na apreciação da prova.
XXXIII. Outra não poderá ser a decisão do Tribunal ad quem senão a de rejeitar o presente recurso, por violação do disposto no artigo 599.º do CPC, o que desde já se requer.
XXXIV. Não resulta da prova testemunhal produzida em sede de repetição do julgamento nem da prova documental junta aos autos nada que pudesse levar à concretização de quantos e quais os dias o Recorrente trabalhou efectivamente para as Recorridas, pelo que as respostas aos quesitos 20º e 21º nunca poderiam ter sido outras.
XXXV. A resposta aos quesitos 20º e 21º não merece, salvo devido respeito, qualquer censura por banda desse Venerando Tribunal.
XXXVI. Segundo o princípio da livre apreciação das provas, consagrado no artigo 558º, nº 1 do CPC, o tribunal aprecia livremente as provas, sem qualquer grau de hierarquização, nem preocupação quanto à natureza de qualquer delas, e fixa a matéria de facto em sintonia com a convicção que tenha firmado acerca de cada facto controvertido.
XXXVII. É jurisprudência uniforme que o princípio da livre apreciação das provas, ou do julgamento livre, não pode ser subvertido pela garantia do duplo grau de jurisdição, nem pode significar a desvalorização da sentença de 1ª instância, que passaria a ser uma espécie de “ensaio” do verdadeiro julgamento a efectuar pelo Tribunal de Segunda Instância.
XXXVIII. Na formação da convicção do julgador entram, necessariamente, elementos que não podem ser transpostos para a gravação da prova, e factores que não são racionalmente demonstráveis, de tal modo que a função do Tribunal de Segunda Instância deverá circunscrever-se a apurar da razoabilidade da convicção probatória do Tribunal a quo face aos elementos que lhe são apresentados.
XXXIX. A testemunha no primeiro julgamento não foi confrontada com a concretização do número de dias em que o Autor trabalhou, tendo apenas agora essa questão sido suscitada.
XL. O Tribunal a quo não julgou credível depoimento da testemunha.
XLI. O Tribunal de Segunda Instância não poderá, em face da prova produzida em novo julgamento, procurar uma nova convicção, nem pôr em causa a convicção feita por um julgador em detrimento da convicção de outro, apenas lhe restando apreciar se foi violado qualquer princípio ou regra de direito probatório no caminho que levou à formação da convicção.
XLII. Não existem quaisquer razões que permitam pôr em causa a razoabilidade da convicção do tribunal a quo.
XLIII. A decisão do julgamento da matéria de facto mostra-se, assim, inatacável, inexistindo qualquer fundamento para que a mesma seja alterada nos termos pretendidos pelo Recorrente.
XLIV. O julgador de primeira instância encontra-se muito melhor habilitado a apreciar a prova produzida, maxime a prova testemunhal, pelo que só em situações extremas de irrazoabilidade e desconformidade, perante as regras da experiência comum, poderá o Tribunal ad quem alterar a decisão sobre a matéria de facto, o que não se justifica na decisão impugnada.
XLV. O Recurso a que ora se responde não poderá senão improceder.
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Foram colhidos os vistos legais.
Cumpre analisar e decidir.
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II - PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
Este Tribunal é o competente em razão da nacionalidade, matéria e hierarquia.
O processo é o próprio e não há nulidades.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária e são dotadas de legitimidade “ad causam”.
Não há excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
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III – FACTOS ASSENTES:
A sentença recorrida deu por assente a seguinte factualidade:
Entre 08 de Maio de 1999 e 21 de Julho de 2003, o Autor esteve ao serviço da 1.ª Ré (XXXX), prestando funções de “guarda de segurança”, enquanto trabalhador não residente (cfr. doc. 1). (A)
O Autor foi recrutado pela Sociedade Z - Serviço de Apoio e Gestão Empresarial Cia, Lda. - e exerceu a sua prestação de trabalho ao abrigo do Contrato de Prestação de Serviços n.º 1/99 (Cfr. doc. 2 e 3). (B)
Por força do Despacho n.º 01949/IMO/SEF/2003, do Senhor Secretário para a Economia e Finanças da RAEM, de 17/07/2003, foi autorizada a transferência das autorizações concedidas para a contratação do Autor (e dos demais 280 trabalhadores não residentes) por parte da 1.ª Ré (XXXX) para a 2.a Ré (YYY), com efeitos a partir de 21/07/2003 (Cfr. Doc. 4). (C)
Entre 22/07/2003 e 13/04/2007, o Autor esteve ao serviço da 2.a Ré (YYY), prestando funções de “guarda de segurança”, enquanto trabalhador não residente. (D)
Durante todo o tempo que prestou trabalho, o Autor sempre prestou a sua actividade nos locais (postos de trabalho) indicados pelas Rés. (E)
Durante o período que prestou trabalho, as Rés pagaram ao Autor a quantia de HKD$7,500.00, a título de salário de base mensal. (F)
Durante todo o período da relação de trabalho com as Rés, o Autor prestou a sua actividade num regime de turnos rotativos. (G)
Durante todo o período da relação de trabalho, o Autor exerceu a sua actividade para a 1.ª Ré (XXXX) num regime de 3 turnos rotativos de 8 horas por dia:
Turno A: (das 08h às 16h)
Turno B: (das 16h às 00h)
Turno C: (das 00h às 08h) (H)
Resulta do ponto 3.1. do Contrato de Prestação de Serviços n.º 1/99, ser devido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes com ele contratados) a quantia de “(...) $20,00 patacas diárias por pessoa, a título de subsídio de alimentação”. (1.º)
Entre 08/05/1999 e 21/07/2003, a 1.ª Ré nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de alimentação ou nunca entregou ao Autor qualquer tipo de alimentos e/ou géneros. (2.º)
Entre 22/07/2003 e 13/0412007, a 2.ª Ré (YYY) nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de alimentação. (3.º)
Resulta do ponto 3.3. do Contrato de Prestação de Serviços n.º 1/99, que “(...) decorridos os primeiros 30 dias de prestação de trabalho por parte do trabalhador (leia-se o Autor), este terá direito, para além da remuneração supra referida, às bonificações ou remunerações adicionais que a 1.º outorgante (leia-se, a Rés) paga aos operários residentes no Território”. (4.º)
Entre 08/05/1999 e 21/07/2003, a 1.ª Ré (XXXX) nunca pagou ao Autor quaisquer bonificações ou remunerações adicionais, incluindo gorjetas. (5.º)
Resulta do ponto 3.4. do Contrato de Prestação de Serviços n.º 1/99, ser devido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes com ele contratados) “ (...) um subsídio mensal de efectividade igual ao salário de 4 dias, sempre que no mês anterior não tenha dado qualquer falta ao serviço”. (6.º)
Durante todo o período em que o Autor prestou trabalho, o Autor nunca deu qualquer falta ao trabalho sem conhecimento e autorização prévia por parte das Rés. (7.º)
Entre 08/05/1999 e 21/07/2003, a 1.ª Ré (XXXX) nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de efectividade. (8.º)
Entre 22/07/2003 e 13/04/2007, a 2.ª Ré (YYY) nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de efectividade. (9.º)
Entre 08/05/1999 e 31/12/2002, a 1.ª Ré (XXXX) nunca fixou ao Autor, em cada período de sete dias, um período de descanso de vinte e quatro horas consecutivas, sem prejuízo da correspondente retribuição. (10.º)
A 1.ª Ré nunca concedeu ao Autor um período de descanso consecutivo de quatro dias por cada conjunto de quatro semanas ou fracção, sem prejuízo da correspondente retribuição. (11.º)
A 1.ª Ré nunca fixou ao Autor um outro dia de descanso compensatório em consequência do trabalho prestado em dia de descanso semanal. (12.º)
A 1.ª Ré (XXXX) nunca conferiu ao Autor um qualquer outro dia de descanso compensatório. (13.º)
Entre 08/05/1999 e 21/07/2003 o Autor prestou a sua actividade durante feriados obrigatórios para a 1.ª Ré. (14.º)
A 1.ª Ré (XXXX) nunca pagou ao Autor uma qualquer quantia adicional (leia-se, um qualquer acréscimo salarial) pelo trabalho prestado nos referidos dias de feriado obrigatórios. (15.º)
Entre 22/07/2003 e 13/0412007 o Autor prestou a sua actividade durante feriados obrigatórios para a 2.ª Ré. (16.º)
A 2.ª Ré (YYY) nunca pagou ao Autor qualquer quantia adicional (leia-se, qualquer acréscimo salarial) pelo trabalho prestado nos referidos dias de feriado obrigatórios. (17.º)
Durante o período em que o Autor prestou trabalho, as Rés procederam a uma dedução no valor de HKD750,00 sobre o salário mensal do Autor, a título de “comparticipação nos custos de alojamento”. (18.º)
As Rés nunca pagaram ao Autor qualquer quantia (em singelo e/ou adicional) pelo trabalho prestado pelo Autor durante os dois períodos de 8 horas cada prestado num período de 24 horas, em cada ciclo de 21 dias de trabalho contínuo e consecutivo. (19.º)
Aquando da contratação do Autor no Nepal, foi garantido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes ele origem Nepalesa) alojamento gratuito em Macau.
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IV - FUNDAMENTAÇÃO
Como o recurso tem por objecto a sentença proferida pelo Tribunal de 1ª instância, na sequência de repetição do julgamento, importa ver o que o Tribunal a quo decidiu desta vez. Este afirmou na sua douta decisão:
I – RELATÓRIO
B (cuja identificação consta dos autos), veio intentar a presente Acção de Processo Comum do Trabalho contra 1ª Ré-XXXX XXXX XXXX XXXX, SARL, (adiante, XXXX) e 2ª Ré-YYY YYY YYY, S.A., (adiante, YYY) (cuja identificação consta dos autos), concluiu pedindo que seja julgada procedente por provada a presente acção e, em consequência ser a 1ª Ré condenada a pagar ao Autor:
a) MOP$24.900,00, a título de subsídio de alimentação, acrescido de juros legais até integral e efectivo pagamento;
b) MOP$20.400,00, a título de subsídio de efectividade, acrescido de juros legais até integral e efectivo pagamento;
c) MOP$89.000,00, pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal, nos termos da al. a) do n.º 6 do art. 17.º do DL n.º 24/89/M, acrescida de juros até efectivo e integral pagamento;
d) MOP$44.500,00, por falta de marcação e gozo de um dia de descanso compensatório pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal, nos termos do n.º 4 do art. 17.º do DL n.º 24/89/M, acrescida de juros até efectivo e integral pagamento;
e) MOP$18.000,00 a título de trabalho prestado em dia de feriado obrigatório remunerado, nos termos do n.º 3 do art. 18.º do DL n.º 24/89/M, acrescida de juros até efectivo e integral pagamento;
f) O montante correspondente às bonificações ou remunerações adicionais incluindo as gorjetas que a Ré pagou aos operários residentes, a determinar nos termos do artigo 392.º, n.º 1, alínea c) ou alínea b) a liquidar em execução de sentença, por força do disposto no artigo 564.º, n.º 2 do Código de Processo Civil, ex vi art. 1.º do CPT;
g) MOP$38.250.00 a título de devolução das quantias de comparticipação no alojamento descontadas pela 1.ª Ré (SDTM);
h) MOP$23.500,00, pelas 16 horas de trabalho prestadas para além do período normal de trabalho em cada ciclo de 21 dias de trabalho;
i) Em custas e procuradoria condigna.
E, em consequência ser a 2ª Ré condenada a pagar ao Autor:
a) MOP$20.400,00, a título de subsídio de alimentação, acrescido de juros legais até integral e efectivo pagamento;
b) MOP$18.000,00, a título de subsídio de efectividade, acrescido de juros legais até integral e efectivo pagamento;
c) MOP$17.250,00 a título de trabalho prestado em dia de feriado obrigatório remunerado, nos termos do n.º 3 do art. 18.º do DL n.º 24/89/M, acrescida de juros até efectivo e integral pagamento;
d) MOP$33.750,00, a título de devolução das quantias de comparticipação no alojamento descontadas pela 2.ª Ré (YYY);
e) MOP$20.000,00, pelas 16 horas de trabalho prestadas para além do período normal diário em cada ciclo de 21 dias de trabalho;
f) Em custas e procuradoria condigna.
Juntou os documentos constantes de fls. 31 a 44.
*
Realizada a tentativa de conciliação pelo MP, não chegou a acordo entre as partes.
*
As Rés contestaram a acção com os fundamentos constantes de fls. 80 a 106 dos autos.
*
Realiza-se a audiência de discussão e de julgamento com observação de todo o formalismo legal, proferindo o presente Tribunal a sentença constante das fls. 196 a 205.
*
Tendo interposto o recurso, veio o Venerando Tribunal de Segunda da Instância proferiu o douto acórdão das fls. 282 a 299, decidindo, entre outros, anular parcialmente o julgamento de forma a apurar os concretos dias de trabalho efectivamente prestado para fixar-se a compensação relativa aos subsídios de alimentação e às importâncias devidas a título de trabalho prestado em dias de feriados obrigatórios, de descanso semanal (nos termos definidos nesse aresto), descanso compensatório e trabalho extraordinário por turnos.
*
Para cumprir o douto acórdão, aditam-se os novos quesitos e realiza-se a repetição do julgamento a eles referente.
*
Observando de todo o formalismo legal, cumpre decidir.
*
II – PRESSSPOSTOS PROCESSUAIS
O Tribunal é competente em razão da matéria, hierarquia e internacional.
O processo é próprio.
As partes gozam de personalidade e capacidade jurídicas e são legítimas.
Não existem excepções, nulidades ou outras questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
*
III – FACTO
(…)
*
IV – FUNDAMENTO DE DIREITO
No douto acórdão do Venerando Tribunal de Segunda da Instância dos presentes autos, acordam-se em:
“…1 - Rejeitar, por inadmissibilidade, o recurso interlocutório interposto pelas Rés XXXX e YYY.
Custas pelas recorrentes, com taxa de justiça em 2 UCs cada uma.
*
2 - Conceder provimento parcial ao recurso da sentença interposto pelas rés e, em consequência:
a) Anular parcialmente a sentença de forma a apurar os concretos dias de trabalho efectivamente prestado e a poder fixar-se a compensação relativa aos subsídios de alimentação, bem como as importâncias devidas a título de trabalho prestado em dias de descanso semanal, descanso compensatório, trabalho extraordinário e por turnos e feriados obrigatórios;
b) Revogar o decidido quanto ao pedido relativo a bonificações adicionais, incluindo gorjetas e, consequentemente, absolver a Ré da instância nessa parte;
2.1- Julgar não provido o recurso na parte restante, em consequência do que se mantém a sentença recorrida, nomeadamente na parte concernente à liquidação a que já procedeu quanto ao subsídio de efectividade e à comparticipação no alojamento.
*
3 - Conceder provimento ao recurso do autor e, em consequência, revogar a sentença na parte respectiva e condenar a 1ª ré A no pagamento dos períodos de trabalho prestado em dias de descanso semanal e aos feriados obrigatórios de acordo com as fórmulas acima referidas, cujo “quantum” concreto, porém, será apurado em conformidade com o que vier a ser decidido após a repetição parcial do julgamento, nos termos acima definidos….”
Essa repetição do julgamento compreende o apuramento os concretos dias de trabalho efectivamente prestado, destinando-se a fixar a compensação relativa aos subsídios de alimentação e às importâncias devidas a título de trabalho prestado em dias de feriados obrigatórios, de descanso semanal, descanso compensatório e trabalho extraordinário por turnos.
Para os efeitos, definem-se nos fundamentos do mesmo acórdão os termos seguintes:
“…B – Do recurso da sentença interposto pelo autor
1 – Do trabalho prestado em dias de descanso semanal
Insurge-se o recorrente contra a fórmula de cálculo que o tribunal “a quo” utilizou para a compensação devida pelo serviço prestado pelo autor nos dias que deveriam ser de descanso semanal. O tribunal apenas conferiu ao autor um valor de salário em singelo, quando na opinião deste deveriam ser dois.
Tem razão o recorrente.
Sobre este assunto, tem este TSI vindo a decidir de forma insistente (v.g., ver os Acs. TSI de 15/05/2014, Proc. nº 61/2014, de 15/05/2014, Proc. nº 89/2014, de 29/05/2014, Proc. nº 627/2014; 29/01/2015, Proc. nº 713/2014; 4/02/2015, Proc. nº 956/2015; de 8/06/2016, Proc. nº 301/2016; de 6/07/2017, Proc. nº 405/2017) que a fórmula utilizada pelo TJB não é mais correcta.
Com efeito, no que a este assunto concerne, vale o disposto no art. 17º, nºs 1, 4 e 6, al. a), do DL nº 24/89/M.
Nº1: Tem o trabalhador direito a gozar um dia de descanso semanal, sem perda da correspondente remuneração (“sem prejuízo da correspondente remuneração”).
Nº4: Mas, se trabalhar nesse dia, fica com direito a gozar outro dia de descanso compensatório e, ainda,
Nº6: Receberá em dobro da retribuição normal o serviço que prestar em dia de descanso semanal.
Portanto, como o trabalhador trabalhou o dia de descanso semanal terá direito ao dobro do que receberia, mesmo sem trabalhar (n.º 6, al. a)).
Como remunerar, então, este dia de trabalho prestado em dia que seria de descanso semanal?
Ora bem. Numa 1ª perspectiva, se o empregador pagou o valor devido (pagou o dia de descanso que sempre teria que ser pago), falta pagar o trabalho prestado. E como o prestado é pago em dobro, tem o empregador que pagar duas vezes a “retribuição normal” (o diploma não diz o que seja retribuição normal, mas entende-se que se refira ao valor remuneratório correspondente a cada dia de descanso, que por sua vez corresponde a um trinta avos do salário mensal).
Numa 2ª perspectiva, se se entender que o empregador pagou um dia de salário pelo serviço prestado, continuam em falta:
- Um dia de salário (por conta do dobro fixado na lei), e ainda,
- O devido (o valor de cada dia de descanso, que não podia ser descontado, face ao art. 26º, n.º 1);
E, em qualquer caso, sem prejuízo da remuneração correspondente ao dia de “descanso compensatório” a que se refere o art. 17º, nº4 - desde que peticionada, como foi o caso, - quando nele se tenha prestado serviço (neste sentido, v.g., Ac. TSI, de 15/05/2014, Proc. nº 89/2014).
Quanto à remuneração pelo dia de descanso semanal, temos, portanto, que a fórmula a utilizar será sempre AxBx2.
Não faria, aliás, sentido que fosse de outra maneira. Na verdade, se o trabalhador, mesmo sem prestar serviço nesse dia de descanso (v.g., domingo), sempre auferiria o correspondente valor (a entidade patronal não lho poderia descontar, visto que o salário é mensal), não faria sentido que, indo trabalhar nesse dia, apenas passasse a receber em singelo o trabalho efectivamente prestado. Seria injusto que apenas se pagasse ao trabalhador esse dia de serviço, que deveria ser de folga e descanso. Que vantagem teria então o trabalhador por prestar serviço a um domingo, se, além do que receberia mesmo sem trabalhar, apenas lhe fosse pago o valor do trabalho efectivamente prestado nesse dia de folga como se tratasse de uma dia normal de trabalho?!
Por isso é que o legislador previu que o trabalho efectivamente prestado nesses dias pelo trabalhador, além do valor que já lhes seria devido em qualquer caso, fosse compensado em dobro pelo valor da retribuição normal diária. Quando a lei fala em dobro refere-se, obviamente, à forma de remunerar esse serviço efectivamente prestado nesses dias de descanso, sem prejuízo, como é bom de ver, do valor da remuneração a que sempre teria direito correspondente a cada um desses dias de descanso e que já recebeu.
Significa isto, assim, que a 1ª instância não poderia ter descontado o valor em singelo já recebido pelo recorrente.
Mas, por outro lado, não temos a certeza de que este seja o valor correcto, tendo em atenção de que ele não terá em conta os dias de falta ao serviço, conforme facto provado nº 15 (art. 7º da BI).
Assim, e sem deixar de considerar a fórmula de cálculo acima definida, será caso para apuramento em sede própria quanto ao quantum compensatório, face à anulação parcial da sentença com vista à ampliação da matéria de facto e repetição de julgamento nessa parte (neste sentido, v.g. Acs. de 29/06/2017, Processos nºs 341/2017, 313/2017).
*
2 – Do trabalho em dias de feriado obrigatório
A sentença, neste passo, considerou que o autor tinha direito a receber por cada dia de feriado obrigatório não gozado um acréscimo salarial nunca inferior ao dobro, a que haveria que deduzir-se o montante em singelo já pago por cada dia de serviço efectivamente prestado.
Simplesmente, por não se ter apurado quais os dias de feriado obrigatório em que prestou trabalho, relegou a sua liquidação para execução de sentença.
O autor, ora recorrente, não se insurge contra a circunstância de ter sido relegada a liquidação do valor indemnizatório a este título para execução de sentença, mas sim, e apenas, contra a parte em que o tribunal decidiu que a prestação do trabalho deveria ser compensada apenas com mais um salário diário por cada dia de feriado não gozado.
Repare-se no que foi dito, por exemplo, no acórdão proferido no Proc. deste TSI nº 824/2012, em 15/12/2012:
“Esta lei trouxe inovações: introduziu uma indemnização especial, chamemos-lhe assim, que a lei anterior não previa e alargou o leque dos dias feriados remunerados, pois aos previstos na lei anterior, somaram-se agora os três dias do Ano Novo Chinês (cfr. art. 19º, n.3). Portanto, o gozo desses dias é feito, não apenas sem perda de remuneração (já era assim na lei anterior), como ainda deve ser extraordinariamente compensado.
Se o trabalhador prestar serviço nesses dias, diz o diploma, além da remuneração normal, receberá ainda um acréscimo salarial não inferior ao dobro da retribuição normal (art. 20º, n. 1). O que quer dizer “não inferior”? Quer dizer que pode ser igual, mas não descer desse limite. E até pode ser superior, mas nesse caso só o empregador poderá fixar o valor, singularmente ou por acordo com o empregado. O que não pode é o tribunal, arbitrariamente subir acima dessa barreira.
Aqui chegados, de novo pensemos nas duas perspectivas acima avançadas: a de o trabalhador ter sido pago pelo valor do devido e a de ter sido remunerado pelo valor do serviço prestado. É bom que se equacionem estas duas acepções para se ver até que ponto a solução pode diferir.
1ª Perspectiva (pagamento do devido)
O empregador pagou ao trabalhador o valor remuneratório que, pela lei, sempre lhe seria devido (ou seja, pagou a “remuneração correspondente aos feriados…”: art. 19º, n.3, até porque não lhos podia descontar: art.26º, n.1).
Sendo assim, falta pagar ao trabalhador o seguinte: a remuneração do trabalho efectivamente prestado (um dia de salário), mais um acréscimo em dobro, nos termos do art. 20º, n. 1(mais dois dias). Tudo perfaz 3 (três) dias de valor pecuniário.
2ª Perspectiva (pagamento do prestado)
Nesta óptica, o empregador o que fez foi pagar ao trabalhador em singelo o valor do serviço prestado.
Todavia, falta pagar o acréscimo em dobro (2 x salário) e ainda o valor do devido (um dia). Tudo perfaz 3 (três) dias de valor pecuniário.
Como se vê, qualquer que seja o prisma por que se encare a situação, o resultado é o mesmo. A fórmula é, em ambas, salário diário x 3”.
Como se vê, a fórmula obriga a ter em consideração 3 dias de remuneração.
Dito de outra maneira, terá que ser pago o dia de trabalho efectivamente prestado (singelo) acrescido do dobro do valor salarial diário.
Procede, pois, o recurso nesta parte.
Simplesmente, o quantum compensatório a este título deverá ser apurado nos termos que mais abaixo se dirão, face à anulação parcial da sentença para apuramento da pertinente matéria de facto (neste sentido, v.g. Acs. de 29/06/2017, Processos nºs 341/2017, 313/2017).
*
C – Do recurso da sentença interposto pelas rés da acção
…
2 – Do subsídio de alimentação
Acham as recorrentes que pelo facto de terem pago um valor salarial superior ao que resulta dos mínimos estabelecidos no contrato de prestação de serviços nº 1/99 não teria que cumprir os valores definidos neste contrato a outros títulos, nomeadamente de subsídio de alimentação e outros.
Sem razão, tal como já foi decidido neste TSI, no Ac. de 25/07/2013, Proc. nº 322/2013, e aqui reiteramos: “Nada obsta que da relação entre o promitente e o terceiro (agência prestadora de serviços e mão de obra), para além do assumido nesse contrato entre o promitente e o promissário, nasçam outras obrigações como decorrentes de um outro contrato que seja celebrado entre o promitente (Ré, empregadora) e o terceiro (A., trabalhador)”.
Defendem, por outro lado, as recorrentes que o tribunal não podia proceder à sua condenação no pagamento do subsídio de alimentação, pela simples razão de que se não sabe quantos dias ele terá faltado ao serviço.
Têm razão, quanto a este aspecto.
Sobre o assunto foi dito no Ac. do TSI, de 14/06/2012, Proc. nº 376/2012:
“Ora, este subsídio tem uma função social radicada numa despesa alimentar efectuada por causa da prestação de trabalho efectiva. E embora tenha havido por parte da jurisprudência alguma tendência para o considerar prestação retributiva, a verdade é que nem por isso outra a associava, mesmo assim, à noção de trabalho efectivo, tal como, por exemplo, foi asseverado no Ac. da Relação de Lisboa de 29/06/1994, Proc. nº 092324 “ Quer a Jurisprudência, quer a Doutrina têm vindo a entender que o subsídio de alimentação, sendo pago regularmente, integra o conceito de retribuição .... Porém, estando ligada essa componente salarial à prestação de facto do trabalho, só será devida quando o trabalhador presta serviço efectivo à entidade patronal…”.
Com o art. 260º do Código do Trabalho Português, o panorama mudou de figura, pois o nº2, do art. 260º deixou claro que esse subsídio não devia ser considerado remuneração, salvo nos casos em que o seu valor excede o montante da despesa alimentar. E assim, terá ficado mais claro que ele só é assumido pelo empregador por causa da prestação efectiva de trabalho. Ele “visa compensar uma despesa diariamente suportada pelos trabalhadores quando realiza a sua actividade. Ou “…visa compensar uma despesa na qual o trabalhador incorre diariamente, sempre que vai trabalhar…” (destaque nosso).
Em Macau, não está regulada a atribuição destes subsídios, mas não cremos que o sentido da sua natureza que melhor se adequa à geografia local é aquele que atrás descrevemos. Por conseguinte, por não estar regulada na lei (DL nº 24/89/M), nem no referido contrato de prestação de serviços nº 45/94 (fls. 137 e sgs. dos autos), deveremos considerá-lo como compensação pela prestação de serviço efectivo.
Logo, da mesma maneira que deverá descontar-se o subsídio nos períodos de férias ou naqueles em que a pessoa está de licença de maternidade, também ele deve ser subtraído quando o trabalhador não prestou serviço por outra qualquer razão.”
A ré/recorrente manifesta-se contra a sentença, por considerar que o autor, conforme a matéria de facto provada, chegou a faltar alguns dias ao serviço, mesmo com justificação ou autorização.
Mas, o acórdão deste TSI de 29/05/2014 (Proc. nº 627/2013) deu a resposta para esta questão:
«Contrariamente ao sustentado, não será de afirmar que se retira necessariamente do facto de o autor não faltar sem ser autorizado o facto implícito de ter faltado…. Esse facto pode ser compatibilizado … se dele se retirar que aí se enuncia uma regra que não deixou de ser observada: o trabalhador não podia faltar sem autorização; o trabalhador não faltou sem autorização; se faltasse tinha que ser autorizado. Daqui não se pode concluir que faltou autorizadamente, ou seja, que alguma vez tenha usado essa faculdade». Foi uma solução que seguida foi também no Ac. de 19/06/2014, no Proc. nº 189/2014, e no Ac. de 29/05/2014, Proc. nº 627/2013.
Sucede, contudo, que tal solução não dá resposta segura às situações em que tenha havido gozo efectivo dos dias de descanso anual e de feriados obrigatórios. Por outro lado, estamos em crer que uma leitura mais objectiva da resposta ao art. 7º da BI permite concluir que o trabalhador terá dado algumas faltas ao serviço, ainda que com autorização.
Assim, a melhor solução é aquela que propende para remeter a fixação da indemnização a este título para execução de sentença(assim foi decidido, por exemplo, nos Acs. de Ac. de 13/03/2014, Proc. nº 414/2012, 24/04/2014, Proc. nº 687/2013, 29/05/2014, Proc. nº 168/2014, 24/07/2014, Proc. nº 128/2014)”.
Não seguiremos, neste caso, porém, a tese de relegar a liquidação em execução de sentença, visto que há matéria que deverá ser de novo quesitada, tal como melhor se dirá mais adiante (neste sentido,v.g. Acs. de 29/06/2017, Processos nºs 341/2017, 313/2017).
…
4 – Do trabalho prestado em dias de descanso semanal, descanso compensatório e feriado obrigatório
Vem as recorrentes manifestar-se contra a atribuição do valor liquidado a título de trabalho nos dias de descanso semanal, descanso compensatório e nos feriados obrigatórios (quanto a este item, ambas as rés recorrem).
Em sua opinião, uma vez que ficou provado que o autor teve faltas, ainda que justificadas, não seria possível especificar o número de dias devidos e não gozados por ele, ao contrário do que fez a sentença recorrida.
Têm, pois, razão, tal como se decidiu no TSI, de 27/04/2017, Proc. nº 167/2017, cujos termos aqui fazemos nossos.
Sucede, porém, que foi alegada matéria concernente aos dias de trabalho a que o autor terá faltado e que não foi quesitada, e que deverá constituir assim factualidade a que o tribunal “a quo” terá que voltar em sede de repetição de julgamento após a necessária quesitação (neste sentido, v.g. Acs. de 29/06/2017, Processos nºs 341/2017, 313/2017).
*
5 – Do trabalho extraordinário
As recorrentes reiteram a ideia de que o autor da acção deu faltas ao serviço, além de ter gozado férias anuais. Com base nisso, defendem que não podia o tribunal apurar os dias em que ele teria efectuado serviço extraordinário nos turnos.
Tem razão.
Contudo, e ao contrário do que se tem decidido quanto a esta questão (em que se tem relegado a liquidação do valor indemnizatório a este título para execução de sentença, conforme, v.g., Ac. deste TSI, de 27/04/2017, Proc. nº 167/2017), haverá que ampliar a matéria de facto para o que o processo deverá baixar à 1ª instância, nos termos que mais adiante se dirão.…”1
E mantém-se a sentença recorrida na parte referente à liquidação já procedida quanto ao subsídio de efectividade, bem como ao comparticipação no alojamento.
No entanto, tendo-se realizado a repetição do julgamento nos termos definidos no douto acórdão, não se provam em que datas concretas, incluindo os dias concretos de feriado obrigatório, é que o Autor prestou trabalho, nem os concretos dias de trabalho efectivamente prestado pelo Autor.
Assim, deverá relegar a liquidação dos referidos créditos para a execução da sentença ou julgar improcedente o pedido a eles referentes?
Salvo melhor entendimento, entende o Tribunal que não deixa de ser a segunda opção solução do presente caso.
De facto, no nosso modesto entendimento, verifica-se no presente caso a antecipação da apreciação da liquidação dos créditos.
Como se refere, e bem, o douto acórdão do Venerando Tribunal de Segunda da Instância no processo n. 341/2017 (jurisprudência que foi também adoptada nos outros arestos do mesmo Tribunal relativamente aos casos paralelos ao presente):
“…A questão que ora se coloca vinha já sendo anunciada, quando, em passos vários, tivemos necessidade de dizer que a liquidação se faria em sede própria, perspectivando-se uma anulação de sentença com repetição do julgado na parte respectiva ou uma liquidação de execução de sentença.
Invoca-se uma insuficiente fundamentação e afigura-se-nos que a Ré, ora recorrente, tem razão, na medida em que o Mmo Juiz se terá baseado num cômputo de dias que vêm alegados pelo A., não se alcançando em que bases se louvou para o seu cálculo.
…
Embora se acolha a linha jurisprudencial mais permissiva, no sentido de que sempre que o tribunal verificar o dano ou a prestação devida, mas não tiver elementos para fixar o seu valor, quer se tenha pedido um montante determinado ou formulado um pedido genérico, lhe cumpre relegar a fixação do montante indemnizatório para liquidação em execução de sentença, ao abrigo do disposto no art. 564º/2 do CPC11 - mesmo que se possa afirmar que se está a conceder uma nova oportunidade ao autor que tenha deduzido pedido líquido de provar o quantitativo devido, não se vislumbra qualquer ofensa do caso julgado, material ou formal, na medida em que a existência de danos já está provada e apenas não está determinado o seu exacto valor e só no caso de se não ter provado a existência de prestação devida é que se forma caso julgado material sobre tal objecto, impedindo nova prova do facto no posterior incidente de liquidação, estando subjacente a esta jurisprudência a ideia de que razões de justiça e de equidade impedem que se absolva a demandada uma vez demonstrada a sua obrigação -, a situação presente não consentirá essa via, na exacta medida em que houve já uma liquidação e o apuramento de uma base de cálculo, não se tendo o Mmo Juiz limitado a uma enunciação genérica de trabalho prestado não apurado.
Ainda que que não se enjeite essa possibilidade, numa recondução a um completamento de matéria de facto, estamos em crer que a presente solução aponta para uma necessidade de exigência e de rigor, desde logo, para as próprias partes - muitas nem sequer aqui permanecendo, porventura desinteressando-se dos seus direitos aquando da cessação dos contratos, visto até o tempo entretanto decorrido -, não podendo elas facilitar na concretização e prova das prestações que dizem estar em dívida. Quanto se diz não retira de forma nenhuma o reconhecimento à tutela dos direitos dos trabalhadores que tenham sido violados, apenas se pretendendo a sua cooperação e responsabilização na realização da Justiça. …”
Com a mesma doutrina, o Venerando Tribunal de Segunda da Instância acordaram em repetir, e só, o julgamento de forma a apurar os concretos dias de trabalho efectivamente prestado pelo Autor, confirmando os créditos, só na sua qualidade mas não na sua quantidade, relativos aos subsídios de alimentação e às importâncias devidas a título de trabalho prestado em dias de feriados obrigatórios, de descanso semanal, descanso compensatório e trabalho extraordinário por turnos.
Assim, salvo melhor entendimento, a repetição do julgamento no presente caso não deixa de ser entendida como uma liquidação ad hoc, cuja decisão fará caso julgado material nos termos e para efeitos do art. 574º do CPC, abstendo-se de repetir e discutir a liquidação no futuro, nomeadamente no momento da execução da sentença.
Isto quer dizer que, uma vez que não se provam nem se apuram os concretos dias de trabalho efectivamente prestado pelo Autor, não deixa de ser julgada improcedente, em vez de relegar a liquidação para a execução da sentença, a acção intentada pelo Autor relativamente aos subsídios de alimentação, às compensações devidas a título de trabalho prestado em dias de feriados obrigatórios, de descanso semanal, descanso compensatório e trabalho extraordinário por turnos.
*
V - DECISÃO
Pelo exposto, julga-se a acção improcedente, por não provada, e em consequência absolver as Rés do pedido, sem prejuízo dos outros que já foram decididos pelo presente Tribunal e foram confirmados pelo douto acórdão do Venerando Tribunal de Segunda da Instância, nomeadamente a condenação relativamente aos subsídios de efectividade e de comparticipação no alojamento.
Custas pelo Autor.
Registe e notifique.
* * *
Questões a resolver:
O Recorrente/Autor invocou os seguintes vícios:
- Erro de facto;
- Erro de julgamento;
- Falta de fundamentação da decisão.
No fundo importa resolver neste recurso as seguintes questões:
1) – Âmbito fixado pelo acórdão do TSI para efeitos de repetição do julgamento; e
2) - (In)Suficiência de 2 quesitos aditados e “reclamação” contra a decisão de facto oportunamente apresentada pelo Autor.
*
Passemos a conhecer das questões suscitadas, começando pela primeira.
1ª questão: Âmbito fixado pelo acórdão do TSI para efeitos de repetição do julgamento
Importa recordar os termos fixados pelo Acórdão deste TSI (Ac. n.º 857/2017), em sede de repetição do julgamento:
Aditar à Base Instrutória, o(s) quesito(s) necessário(s) e referentes, nomeadamente: à concretização dos dias de trabalho efectivo - tendo em vista as ausências autorizadas, para além das férias gozadas - determinante para efeitos do cômputo da indemnização devida a título de subsídio de alimentação, trabalho por turnos e trabalho extraordinário trabalho prestado em dia de descanso semanal e descanso compensatório não gozados; à determinação de quais os dias em que o trabalho foi prestado para efeitos de apuramento da quantia devia pelos dias de feriados obrigatórios e ao ao apuramento dos dias das ausências autorizadas e das férias gozadas;
Ou seja, a parte decisiva constante do acórdão do TSI que requer a densificação por parte do JL (Juízo Laboral) é a seguinte:
a) Anular parcialmente a sentença de forma a apurar os concretos dias de trabalho efectivamente prestado e a poder fixar-se a compensação relativa aos subsídios de alimentação, bem como as importâncias devidas a título de trabalho prestado em dias de descanso semanal, descanso compensatório, trabalho extraordinário e por turnos e feriados obrigatórios;
(…)
Repare-se, o que o TSI decidiu no acórdão do processo nº857/2017 é apurar os concretos dias de trabalho efectivo, prestado pelo Autor, não é o número total dos dias concreto de trabalho efectivo. São duas coisas distintas!
Como? É uma tarefa incumbida ao Tribunal a quo no cumprimento das normais aplicáveis e do decidido, e, os termos acima expendidos são muito claros, que não devem suscitar dúvidas!
Veremos com detalhe esta questão a seguir, em conjugação com o que foi feito pelo Tribunal a quo.
*
2ª questão: (In)Suficiência de 2 quesitos aditados e “reclamação” contra a decisão de facto oportunamente apresentada pelo Autor.
Na sequência da baixa dos autos, veio o JL aditar 2 artigos com o seguinte teor (fls. 310):
Facto 20º
Entre 08/05/1999 e 21/07/2003, o Autor prestou 1245 dias de trabalho efectivo junto da 1ª Ré?
Facto 21º
Entre 22/07/2003 e 13/04/2007, o Autor prestou 1020 dias de trabalho efectivo junto da 2ª Ré?
Repetido o julgamento, tais factos ficaram NÃO PROVADOS.
Se conjugarmos o facto 20º acima citado com o conteúdo dos outros factos já considerado assentes, nomeadamente o da A), dos quesitos 2º, 10º a 12º, todos considerados assentes na primeira sentença, é fácil verificar-se alguma incoerência entre eles, pois:
- Por um lado, com estes 2 novos factos aditados, ficamos no mesmo, eles não têm aptidão para se tirar de nada, nem acrescentar também nada! Porque não esclarece quando é que foram tais dias de trabalho, ele coincidiam ou não com os dias de feriados obrigatórios? Eles foram todos seguidos? Ou entre eles houve alguma “pausa”? Perante este quadro, não se tem condições para dar cumprimento ao acórdão em causa.
- Por outro lado, é quase irrelevante o número total de dias concretos de trabalho efectivo prestado pelo Autor (aliás, este resultado poderá ser obtido mediante um juízo matemático), não é esta matéria em causa conforme os termos fixados no acórdão deste TSI acima citado.
A forma de redigir os factos inseridos nos artigos 20º e 21º solicita apenas um juízo matemático, e não valorativo!
Há quem diga que a própria forma de dizer as coisas também se dizem as coisas.
À luz da forma como os 2 quesitos foram formulados pelo Tribunal a quo, sem dúvida que o seu conteúdo foi buscar aos quesitos 2º e 3º da BI (constante da 1ª sentença, fls. 199), e depois contam-se o número de dias a que se refere o período em que o Autor prestava serviços junto da 1ª Ré e da 2ª Ré, respectivamente.
Mas isso não basta! Porque:
Em primeiro lugar, em sede de julgamento, realça-se, o Tribunal a quo tem de cingir-se aos factos alegados pelas Partes, salvo as situações previstas no artigo 434º do CPC.
No caso, em lado nenhum o Autor invocou simplesmente o número total de dias em que ele prestava serviços à 1ª Ré e à 2ª Ré. Ou seja, o Tribunal não deve substituir-se às partes em sede de alegação de factos!
Em segundo lugar, mesmo que tais 2 novos factos ficassem provados, o Tribunal a quo continuava a não ter condições para cumprir o ordenado no acórdão do TSI acima citado, pois este mandou esclarecer os seguintes aspectos: apurar os dias concretos de trabalho prestado em dias de descanso semanal, descanso compensatório, trabalho extraordinário e por turnos e feriados obrigatórios. Para satisfazer estas exigências, não há outra solução senão fraccionar os períodos por mês e semanas, porque são por estas unidades que se calculam as indemnizações reclamadas pelo Autor.
Aqui, é de recordar o que o legislador manda no artigo 430º (Selecção da matéria de facto) do CPC que tem o seguinte teor:
1. Se o processo tiver de prosseguir e a acção tiver sido contestada, o juiz, no próprio despacho a que se refere o artigo anterior ou, não havendo a ele lugar, no prazo fixado para o proferir, selecciona a matéria de facto relevante, segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito, indicando:
a) Os factos que considera assentes;
b) Os factos que, por serem controvertidos, integram a base instrutória.
2. As partes podem reclamar contra a selecção da matéria de facto considerada assente ou integrada na base instrutória, com fundamento em deficiência, excesso ou obscuridade.
3. O despacho proferido sobre as reclamações apenas pode ser impugnado no recurso interposto da decisão final.
Ou seja, deve seleccionar-se os factos segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito!
Em terceiro lugar, na sequência do dito, os 2 factos padecem de obscuridade e deficiência, pois não permitem dar cumprimento cabal ao ordenado pelo TSI. Admitindo-se que ficassem provados estes 2 factos, como é o Tribunal iria fixar as indemnizações a título de a título de trabalho prestado em dias de descanso semanal, descanso compensatório, trabalho extraordinário e por turnos e feriados obrigatórios? Quase impossível com este conteúdo!
Em quarto lugar, temos de observar também o regime que o legislador estatuiu em matéria de repetição do julgamento, o qual está previsto no artigo 629º/4 (Modificabilidade da decisão de facto) do CPC, que consagra:
1. A decisão do tribunal de primeira instância sobre a matéria de facto pode ser alterada pelo Tribunal de Segunda Instância:
a) Se do processo constarem todos os elementos de prova que serviram de base à decisão sobre os pontos da matéria de facto em causa ou se, tendo ocorrido gravação dos depoimentos prestados, tiver sido impugnada, nos termos do artigo 599.º, a decisão com base neles proferida;
b) Se os elementos fornecidos pelo processo impuserem decisão diversa, insusceptível de ser destruída por quaisquer outras provas;
c) Se o recorrente apresentar documento novo superveniente e que, por si só, seja suficiente para destruir a prova em que a decisão assentou.
2. No caso a que se refere a segunda parte da alínea a) do número anterior, o Tribunal de Segunda Instância reaprecia as provas em que assentou a parte impugnada da decisão, tendo em atenção o conteúdo das alegações de recorrente e recorrido, sem prejuízo de oficiosamente atender a quaisquer outros elementos probatórios que tenham servido de fundamento à decisão de facto impugnada.
3. O Tribunal de Segunda Instância pode determinar a renovação dos meios de prova produzidos em primeira instância que se mostrem absolutamente indispensáveis ao apuramento da verdade, quanto à matéria de facto objecto da decisão impugnada, aplicando-se às diligências ordenadas, com as necessárias adaptações, o preceituado quanto à instrução, discussão e julgamento na primeira instância e podendo o relator determinar a comparência pessoal dos depoentes.
4. Se não constarem do processo todos os elementos probatórios que, nos termos da alínea a) do n.º 1, permitam a reapreciação da matéria de facto, pode o Tribunal de Segunda Instância anular, mesmo oficiosamente, a decisão proferida na primeira instância, quando repute deficiente, obscura ou contraditória a decisão sobre pontos determinados da matéria de facto ou quando considere indispensável a ampliação desta; a repetição do julgamento não abrange a parte da decisão que não esteja viciada, podendo, no entanto, o tribunal ampliar o julgamento de modo a apreciar outros pontos da matéria de facto, com o fim exclusivo de evitar contradições na decisão.
5. Se a decisão proferida sobre algum facto essencial para o julgamento da causa não estiver devidamente fundamentada, pode o Tribunal de Segunda Instância, a requerimento da parte, determinar que o tribunal de primeira instância a fundamente, tendo em conta os depoimentos gravados ou escritos ou repetindo a produção da prova, quando necessário; sendo impossível obter a fundamentação com os mesmos juízes ou repetir a produção da prova, o juiz da causa limita-se a justificar a razão da impossibilidade.
Repare-se, o nº 4 do normativo acima citado tem por destinatário também o Tribunal que vai repetir o julgamento, como tal ele deve ser observado e cumprido.
Em quinto lugar, como o Tribunal a quo deu uma resposta negativa a tais 2 factos, gera-se contradição neste aspecto: passa ser assente que o Autor só trabalhou durante os dias de feriado obrigatório para a 1ª Ré e 2ª Ré, quando fazemos leitura conjunta com os factos assentes (que não foram impugnados), nomeadamente os 15º e 16º (assentes)!! Porque são estes factos que sobram!
Eis uma incoerência e ilógica das coisas!
Nos termos do artigo 629º/4 do CPC acima citado, o Tribunal a quo, ao repetir o julgamento, tem de manter a coerência e lógica das coisas, nomeadamente fará tudo para evitar contradições entre os factos já assentes e os novos! Pela vista, não foi devidamente acautelado este ponto.
Em sexto lugar, e salvo outro entendimento e o merecido respeito que é muito, em face da evidente obscuridade e deficiência dos factos aditados, outra solução não há senão mandar baixar NOVAMENTE os autos ao JL para repetir o julgamento, de forma a apurar as matérias necessárias ao esclarecimento das questões em abordagem, ou seja, apurar os dias concretos em que o Autor laborou, nos termos expressamente fixados na alínea a) da parte decisiva do acórdão do Processo 857/2017, de acordo com o disposto no artigo 629º/4 do CPC.
Neste aspecto o Recorrente/Autor tem razão quando argumentou:
6. Salvo o devido respeito, está o ora Recorrente em crer que, contrariamente ao que terá sido concluído pelo Tribunal a quo, a “repetição do julgamento” ordenada pelo Tribunal de Recurso impunha não só que fosse aditado à douta Base Instrutória o(s) quesito(s) necessário(s) à “concretização” dos “dias de trabalho efectivamente prestados” mas, igualmente, que fosse aditado o(s) quesito(s) com vista à “concretização” dos “dias de falta” e/ou “dias de ausência” do Autor ao longo da relação de trabalho com a Ré, porquanto se trata de matéria essencial com vista ao apuramento de determinadas “rubricas”, como é o caso da compensação pelos dias de feriados obrigatórios, o que manifestamente não foi levado a cabo pelo Tribunal a quo;
7. O mesmo é dizer que mais do que a determinação de “quantos” dias de trabalho terá o Autor prestado, impunha-se ao Tribunal a quo a determinação de “quais” os dias em que o trabalho foi efectivamente prestado, contrariamente ao que terá sido a interpretação seguida pelo Tribunal de Primeira Instância;
8. Ora, os dois únicos quesitos aditados à Base Instrutória são, na sua formulação, meramente “quantitativos” e, como tal, em caso algum se mostram idóneos a obter a “concretização” dos (quais) dias de trabalho prestado e dos (quais) os dias de falta e de dispensa ao trabalho, conforme expressamente ordenado pelo Tribunal de Recurso; (…).
Nestes termos, é de reconhecer que as matérias inseridas nos quesitos 22º a 27º propostos pelo Autor são pertinentes e que permitirão cumprir o ordenado no acórdão acima citado. Pelo que, este Tribunal ordena que sejam eliminados os 2 artigos inicialmente aditados pelo Tribunal a quo e, em substituição, sejam admitidos os quesitos propostos pelo Autor, sob os números 22º a 27º, que constituirão objecto de julgamento em sede da repetição, sem prejuízo de outras matérias que o Tribunal a quo venha a considerar relevantes para este efeito.
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Síntese conclusiva:
I – Quando o Tribunal ad quem, em sede da decisão do recurso, fixou os termos de “apurar os concretos dias de trabalho efectivamente prestado e a poder fixar-se a compensação relativa aos subsídios de alimentação, bem como as importâncias devidas a título de trabalho prestado em dias de descanso semanal, descanso compensatório, trabalho extraordinário e por turnos e feriados obrigatórios”, o Tribunal a quo deve cumprir o ordenado mediante o aditamento de factos necessários, pertinentes e aptos a solucionar as questões pendentes, seleccionando os factos segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito.
II – O Tribunal a quo, em sede de repetição do julgamento, formulou dois quesitos com o seguinte teor: (artigo 20º) Entre 08/05/1999 e 21/07/2003, o Autor prestou 1245 dias de trabalho efectivo junto da 1ª Ré? (artigo 21º ) Entre 22/07/2003 e 13/04/2007, o Autor prestou 1020 dias de trabalho efectivo junto da 2ª Ré? estes quesitos em causa, para além de conterem conteúdo deficiente, não têm aptidão para cumprir o ordenado do acórdão do TSI, razão pela qual é de anular o julgamento feito nestes termos.
III – Para a mesma finalidade e em sede da reclamação o Autor chegou a propôr 5 quesitos sob os números 22º a 27º com conteúdo pertinente e apto a cumprir o decidido no acórdão do TSI, é de admitir tais quesitos que constituirão objecto de novo julgamento a cargo do Tribunal a quo. É o que a este TSI compete decidir nestes autos.
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Tudo visto, resta decidir.
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V - DECISÃO
Em face de todo o que fica exposto e justificado, os juízes do Tribunal de 2ª Instância acordam em conceder provimento ao recurso interposto pelo Autor, anulando o julgamento já repetido, mandando agora repetir o julgamento nos termos fixados no acórdão proferido no processo no 857/2017, com a admissão dos quesitos 22º a 27º propostos pelo Autor em substituição dos 2 quesitos anteriormente aditados pelo Tribunal a quo (sem prejuízo de outras matérias que o Tribunal a quo venha a considerar relevantes para este efeito), a fim de apurar os dias concretos de trabalho efectivo prestado pelo Recorrente/Autor, de forma a poder fixar-se a compensação relativa aos subsídios de alimentação, bem como as importâncias devidas a título de trabalho prestado em dias de descanso semanal, descanso compensatório, trabalho extraordinário e por turnos e feriados obrigatórios;
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Quanto ao demais, mantém-se o já decidido.
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Custas pelas Recorridas/Rés.
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Registe e Notifique.
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RAEM, 24 de Janeiro de 2019.
(Relator)
Fong Man Chong
(Primeiro Juiz-Adjunto)
Ho Wai Neng
(Segundo Juiz-Adjunto)
José Cândido de Pinho
1 Salvo o devido respeito, o Tribunal mantém a posição de que as compensações de trabalho em dia de descanso semanal e em dia de feriado obrigatório devem incluir o próprio salário daqueles dias. No entanto, esta posição nada impede o cumprimento do douto acórdão do Venerando TSI nos termos do art. 5º, n. 2º da LBOJ.
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