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Proc. nº 89/2018
Relator: Cândido de Pinho
Data do acórdão: 14 de Fevereiro de 2019
Descritores:
- MARCAS
- “XXXXYYYY” e ZZ

SUMÁRIO:

Se, tal como foi já reconhecido judicialmente pelo TSI, os caracteres chineses ZZ não puderam formar uma marca a favor de determinada empresa de Hong Kong, com o argumento de que a sua significação geraria confusão e imitação do nome de um estabelecimento de Macau pertencente a uma outra empresa de Macau, e em cuja composição faz parte o vocábulo XXXXYYYY, iguais razões devem levar a negar o registo do mesmo par de caracteres como marca a favor da empresa de Macau, por colidir com o sinal XXXXYYYY que a empresa de Hong Kong, aqui recorrente, dispõe nas suas marcas (acima referidas), registadas em Macau.

Proc. nº 89/2018

Acordam no Tribunal de Segunda Instância da RAEM

I – Relatório
“B Company, Limited”, sociedade comercial e industrial constituída segundo as leis de Hong Kong, com sede no ...th floor, “...... Square”, Central, Hong Kong, SAR China, aqui designada por Recorrente, ----
Apresentou no TJB recurso judicial (Proc. nº CV2-17-0015-CRJ) -----
Do despacho de 13/02/2017, da Exmo. Senhor Chefe do Departamento de Propriedade Intelectual dos Serviços de Economia, -----
Que concedeu à “C - Sociedade Gestora, Limitada”, sociedade comercial e industrial constituída em conformidade com as leis da RAEM, com sede na Av. da ......, n.º ..., Edifício “......”, ....º andar, Macau, ---
O registo da marca nominativa ZZ que tomou o n.º N/9****, para assinalar serviços da classe 43ª.
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Naqueles autos foi proferida sentença, que julgou improcedente o recurso e manteve a decisão recorrida.
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É contra essa sentença que ora vem interposto o presente recurso jurisdicional, em cujas alegações a recorrente apresentou as seguintes conclusões:
«1.ª Pretende a Recorrente, através do presente recurso judicial, que o douto Tribunal revogue a douta sentença de 12 de Setembro de 2017, que, mantendo o despacho da DSE, concedeu à Parte Contrária, ora Recorrida, a marca nominativa, que consiste em ZZ (romanizando Z Z), que tomou o n.º N/9****, para assinalar serviços da classe 43.ª.
2.ª A Recorrente é titular da marca nominativa que consiste em XXXXYYYY, que se encontra registada em Macau, sob o n.ºs N/****3, para a classe 36.ª e N/****4, para a classe 35.ª, desde 16 de Dezembro de 2014.
3.ª Os sinais marcários XXXXYYYY e ZZ (Z Z) são indissociáveis, entendimento que não foi subscrito pela DSE e o douto Tribunal recorrido acolheu o entendimento da DSE, em sentido contrário.
4.ª Para o consumidor (e público em geral) de Macau falar-se em XXXXYYYY é falar-se em ZZ (Z Z).
5.ª Assim, entende, também, a mais Alta Instância da RAEM, que vem decidindo que, para o público consumidor de Macau, a expressão chinesa ZZ (Z Z) corresponde à expressão inglesa XXXXYYYY, tal como fez verter, por exemplo, no seu douto Ac. de 24 de Outubro de 2011, explicitado no processo que correu termos pelo TUI sob o n.º 38/2011.
6.ª Na verdade, pode ler-se do mencionado aresto que “(...) A parte característica do nome de estabelecimento registado com o n.º E/XY – 澳門ZZ廣場 [Ou Mun Z Z Kuong Cheong], que em inglês corresponde a Macau XXXXYYYY Plaza - a que lhe dá eficácia distintiva, é ZZ [Z Z], ou seja, XXXXYYYY. Não é, nem 澳門 [Ou Mun], ou seja, Macau, nem [Kuong Cheong], ou seja, Plaza (...)”,
7.ª Também, são afirmações do Venerando Tribunal de Última Instância as seguintes: “(...) No Acórdão de 21 de Outubro de 2009, no Processo n.º 21/2009 dissemos que se discorda da tese, segundo a qual os caracteres 香港que significam Hong Kong, juntos aos caracteres ZZ [Z Z] (que são a expressão utilizada em chinês para significar XXXXYYYY), ou seja, Hong Kong XXXXYYYY, permitam ao consumidor médio distinguir claramente a marca da recorrida particular 香港ZZ [Hong Kong Z Z], ou seja, Hong Kong XXXXYYYY, do nome de estabelecimento - 澳門ZZ廣場 [Ou Mun Z Z Kuong Cheong], ou seja, Macau XXXXYYYY Plaza. (...) Manifestamente, na marca香港ZZ [Hong Kong Z Z], que corresponde a Hong Kong XXXXYYYY, não é a designação “Hong Kong” que tem eficácia distintiva. É antes ZZ [Z Z], ou seja, “XXXXYYYY” (...)” e ““(...)Entende-se, portanto, haver susceptibilidade de erro ou confusão por parte do consumidor relativamente à composição da marca N/XXXXX, para a classe 37.ª, com a parte característica (XXXXYYYY) das firmas [Recorrente (3)] e [Recorrente (4)] e com o nome de estabelecimento澳門ZZ廣場 [Ou Mun Z Z Kuong Cheong], que corresponde a XXXXYYYY Plaza Macau”.
8. ª A Requerente da marca, ora Recorrida, embora de má fé - pois bem sabe que a Recorrente é titular da marca XXXXYYYY (em língua inglesa) e da sua marca chinesa (ZZ [Z Z]), que foi criada com recurso à palavra “XXXX” (em português, “TERRA”) e que está integrada na sua designação social “B, Company Limited ―, associa os dois sinais ― XXXXYYYY e ZZ [Z Z] ― de tal forma que, ao compor as marcas cujo registo logrou obter em Macau, usou as duas expressões como correspondentes, como se pode constatar das seguintes marcas e nome e insígnia de estabelecimento: n.º N/****1; n.º N/****5; n.º N/1**** e E/**, todos estes direitos de propriedade industrial referidos na douta sentença em impugnação por referência ao despacho da DSE, e registados em nome da Recorrida.
9.ª Dúvidas não se suscitam quanto ao requisito da prioridade, porque, efectivamente, a Recorrente, pese o facto de, apenas, lhe ter sido concedida a sua marca XXXXYYYY, com o n.ºs N****3 e N/****4, para as classes 36.ª e 35.ª, em 16 de Dezembro de 2014 (data do despacho da DSE), apresentou o respectivo pedido de registo em 18 de Setembro de 2003.
10.ª A Requerente, ora Recorrida, apresentou o pedido de registo da marca ZZ, em 30 de Março de 2015.
11.ª Feito o exame comparativo entre cada um dos serviços que são assinalados com a marca registada da Recorrente integrados nas classes 36.ª e 35.ª e os serviços para os quais a Recorrida pretende registar a marca aqui em apreciação, serviços esses integrados na classe 43.ª, é possível concluir-se que existe afinidade entre alguns desses serviços e uma relação de complementaridade, de onde resulta que se verifica o requisito da afinidade entre serviços das marcas em confronto.
12.ª Assim, no âmbito deste processo, a única questão que se suscita tem a ver com a indissociabilidade dos sinais aqui em confronto, certo sendo que é um facto notório e, portanto, não necessita de qualquer prova o de que o consumidor médio e o público em geral, na RAEM, associa a marca ZZ (Z Z) à marca XXXXYYYY, razão por que, em Macau, quem for a titular de uma marca que integre a palavra inglesa XXXXYYYY, tem o direito a opôr-se à concessão de uma marca que consiste em ZZ (Z Z), pelo menos, se se destinar a assinalar serviços integrados na mesma classe ou que sejam serviços afins, como é o presente caso.
13.ª Ainda que se possa dizer que a expressão ZZ romaniza Z Z e se traduz, para a língua inglesa, “XXXX”, e, portanto, ainda que não tenha uma grafia nem uma pronúncia semelhante à expressão XXXXYYYY - como se defende na douta sentença recorrida -, a verdade é que, em Macau, onde maioritariamente a população é falante da língua chinesa, à palavra inglesa XXXXYYYY corresponde a expressão chinesa ZZ, para o que terá contribuído a Parte Contrária, aqui Recorrida, uma, sociedade comercial por quotas, que, ao registar a sua firma, obrigatoriamente, teve que apresentar a correspondente versão chinesa, usurpando um sinal da Recorrida (ZZ) , fez corresponder a designação social, em português, “C - SOCIEDADE GESTORA, LIMITADA” (e, em inglês, “......XXXXYYYY Management Limited”), a versão chinesa ......ZZ管理有限公司.

14.ª Atendendo a que, como ensinam os Mestres em matéria de Direito Industrial, para o exame comparativo de sinais marcários, deve tomar-se em consideração o consumidor médio, é incontornável o facto de que, em Macau, para o consumidor dos serviços assinalados com o sinal XXXXYYYY, corresponde, na sua língua materna, o sinal ZZ, razão pela qual, esse mesmo consumidor vai associar ambas as marcas ou vai associar os serviços à mesma origem empresarial ou, ainda, vai ser induzido a pensar que, entre as empresas titulares das marcas, existe uma relação de parceria, o que não corresponde, de todo, à verdade.
15.ª Nestas circunstâncias, tendo sido concedida à Recorrente a marca XXXXYYYY, que tomou os n.ºs N/****3 (classe 36.ª) e N/****4 (classe 35.ª), portanto, para assinalar serviços que são afins - ou com os quais existe uma relação de complementariedade ― dos serviços para os quais a Requerente, aqui Recorrida, pretende a marca registanda (classe 43.ª),
que consiste em ZZ (Z Z), tomou o n.º N/9****, não pode deixar de alegar que, no caso, se verifica o fundamento de recusa a que alude o art.º 214.º, n.º 2, alínea b), que tem por base a protecção de marca registada.
V -PEDIDO
NESTES TERMOS e contando com o douto suprimento de Vossas Excelências, Venerandos Juízes, requer-se seja considerado procedente o presente recurso jurisdicional e, em consequência, seja revogada a douta Sentença de 12 de Setembro de 2017, que manteve o despacho da DSE de 13 de Fevereiro de 2017, e, em consequência, porque se está perante um recurso de ampla jurisdição, seja explicitada uma decisão no sentido de recusar a marca nominativa que consiste em ZZ (que romaniza Z Z), que tomou o nº. N/9****, para assinalar serviços da classe 43.ª, partindo sempre do pressuposto de facto de que, em Macau, os sinais XXXXYYYY ZZ são indissociáveis, pois o consumidor médio os associa, incontornavelmente.
Assim procedendo, será feita uma sã JUSTIÇA!»
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Em resposta, a entidade recorrida limitou-se a oferecer o merecimento dos autos.
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Cumpre decidir.
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II - Os Factos
A sentença deu por assente a seguinte factualidade:
“A) Em 20 de Março de 2015, a contraparte apresentou à Direcção dos Serviços de Economia o pedido de registo de marca n.º N/9****, para a classe 43, com produtos/serviços de “serviços de acomodação e de catering; provisão de acomodação em casas, hotéis e quartos (outros que não o aluguer de apartamento e casas); serviços prestados por hotéis, motéis, pensões, campos de férias, provisão de quartos de acomodação, alimentos e bebidas, serviços de “catering”; serviços de cuidados de crianças, serviços de dia para crianças e facilidades de creche; serviços de restaurantes e de jantar; serviços de bar; serviços de “cocktail lounge”; serviços de bar de vinhos; serviços prestados por restaurante, cafetarias, cafés, “snack bars”, “sandwich bars”, cantinas, “coffee bars”, “coffee shops” e salões de chá; serviços de reservas para marcação de acomodação e de refeições; provisão de facilidades para conferências; provisão de facilidades para hospedar exibições; provisão de facilidades para exibições”, em modelo de: “Z Z” (vide a fls. 1 do processo administrativo, cujo teor se dá por integralmente reproduzido) (imagem)
B) Em 3 de Agosto de 2015, a recorrente apresentou a reclamação e os respectivos documentos sobre o referido pedido de registo de marca. (vide as fls. 3 a 22 do processo administrativo, cujo teor se dá por integralmente reproduzido)
C) Em 28 de Agosto de 2015, a contraparte entregou a contestação sobre a referida reclamação. (vide as fls. 24 a 29 do processo administrativo, cujo teor se dá por integralmente reproduzido)
D) Em 13 de Fevereiro de 2017, por despacho, o Chefe do Departamento da Propriedade Intelectual da Direcção dos Serviços de Economia concordou com a informação n.º 041/DPI e concedeu o registo da marca n.º N/9****. (vide as fls. 31 a 36 do processo administrativo, cujo teor se dá por integralmente reproduzido)
E) O referido despacho de concessão do registo foi publicado no B.O. n.º 9, II série, de 1 de Março de 2017. (vide a fls. 37 do processo administrativo)
F) Em 31 de Março de 2017, a recorrente recorreu para este Tribunal.
G) A contraparte é titular das marcas n.º N/****1 “MACAU XXXXYYYY” (imagem) e n.º N/****5 “MACAU XXXXYYYY” (imagem), respectivamente para as classes 36 e 43.
H) Desde Março de 2004, a contraparte é titular do nome do estabelecimento n.º E/** (“澳門ZZ廣場 Ou Mun Z Z Kuong Cheong (c.c.) L/Macau XXXXYYYY”).
I) A recorrente é titular da marca n.º N/****3, para a classe 36, com produtos/serviços de: “Aluguer e gestão predial; avaliação predial; financiamento predial; investimento predial; corretagem predial; serviços de corretagem predial; serviços de agência predial; gestão predial relacionada com terrenos, estradas, pontes, “power stations”, edifícios de escritórios, prédios e construções e infraestruturas; serviços de agência de habitação; agentes de habitação; serviços de actuário; recebimento de rendas; aluguer de acomodação; agência de aluguer e de leasing; serviços de gestão de acomodação; aluguer de apartamentos; aluguer de andares; aluguer de escritórios; leasing predial; avaliação predial e evolução financeira predial; provisão de informação financeira via internet; serviços de segurança, depósito e emissão de “travel vouchers”, em modelo de “XXXXYYYY” (imagem).
J) A recorrente é titular da marca n.º N/****4, para a classe 35, com produtos/serviços de: “Gestão de hotel e negócios, serviços de promoção e marketing; serviços de consultadoria organizativa e negócios; administração de hotel e negócios; serviços de avaliação, aconselhamento e inspecção; serviços contabilísticos; serviços publicitários; aluguer de “hoardings” e “billboards” publicitários; vendas por grosso e retalho de tintas, vernizes e lacas, produtos de higiene pessoal, sabões, perfumaria, cosméticos, loções para o corpo e para o cabelo, óleos essenciais, preparações para limpar e para lixiviar, velas, preparações sanitárias e farmacêuticas, ferragens e pequenas peças de quinquilharia em metal, cutelaria, laminas e ferramentas manuais, computadores, máquinas calculadoras, aparelhos e instrumentos eléctricos, ópticos, fotográficos e cinematográficos, aparelhos para a gravação, transmissão ou reprodução de som ou imagem, óculos e óculos de sol, aparelhos para iluminação, aquecimento, geração de vapor, cozinhar, refrigerar, secar, ventilar, fornecer água e para fins sanitários, joalharia, pratas, pedras preciosas, instrumentos de relojoaria e cronométricos, instrumentos musicais, revistas, livros e matérias impressas, cartões, papel e produtos de cartão, fotografia, papelaria, máquinas de escrever e artigos de escritório, couro e imitação de couro e produtos feitos nestes materiais, malas, bolsas, carteiras, “holders” em couro, sacos, bagagem, chapéus-de-chuva, vestuário, calçado, chapelaria, espelhos, molduras para fotografias, cabides para vestuário, tapetes, mobiliário, utensílios para a cozinha e para a casa, têxteis, artigos de costura, carpetes e coberturas, coberturas de mesa e de cama, jogos, brinquedos e artigos de desporto, géneros alimentícios e bebidas, carne, peixe, aves e caça, frutos e vegetais cozidos, secos e preservados, geleias, molhos de frutos, ovos, leite e produtos lácteos, óleos alimentares e gorduras, café, chá, cacau, açúcar, arroz, farinha, pão e bolos, condimentos, frutos e vegetais frescos, cerveja, água mineral, sumos de frutos e outras bebidas não alcoólicas, bebidas alcoólicas, produtos florais, tabaco, artigos para fumadores e fósforos; serviços de supermercado; retalho de alimentos e de produtos para a casa; arranjo e condução de convenções ou conferências de negócios ou comerciais; providenciar de informação para educação, treino, entretenimento, fins culturais e sociais via internet; demonstração de produtos para fins promocionais ou publicitários; distribuição de amostras e lembranças, arranjo, condução e organização de exibições para fins de negócios e comerciais, organização de exibições para fins de publicidade comercial, organização de shows de moda, shows de produtos e feiras para fins publicitários comerciais; serviços publicitários no exterior, relações públicas, aluguer de espaços publicitários, pesquisa negocial, promoção de vendas para outros, disseminação de material publicitário, arranjo de montras; aluguer de “billboards”; publicidade; serviços de centro comercial”, em modelo de “XXXXYYYY” (imagem).
K) A recorrente tinha apresentado à DSE os pedidos de registo das marcas n.º N/1***0, n.º N/1***1 e n.º N/1***2, todas em modelo “Z Z (imagem)”, respectivamente para as classes 35, 36 e 42, porém, foram recusados pela DSE. (vide a fls. 35 do processo administrativo)”.
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Por conhecimento directo, em razão do exercício da nossa função, consignamos ainda os seguintes factos, que temos por provados:
- Por acórdão deste TSI, de 6/03/2014, Proc. nº 305/2010, foi confirmada a sentença do TJB que tinha julgado improcedente o recurso judicial interposto pela ora recorrente “B Company, Limited” contra o registo nº E/** do Nome do Estabelecimento concedido à ora recorrida “C – Sociedade Gestora, Limitada”.
- “B Company, Limited” é titular da marca registada em Macau N/****3, “XXXXYYYY” para assinalar produtos da classe 36ª.
- Por acórdão deste TSI, de 17/11/2016, Proc. nº 656/2016, foi negado provimento ao recurso jurisdicional e confirmada a sentença que tinha julgado improcedente o recurso judicial interposto pela aqui recorrida “C – Sociedade Gestora, Limitada” contra o registo que tinha sido concedido a favor da recorrente “B Company, Limited” da marca N/****4, “XXXXYYYY” destinada a assinalar produtos da classe 35.
- Este registo da marca N/****4 tinha ocorrido por despacho de 12/01/2015, publicado na II Série do Boletim Oficial nº5, de 4 de Fevereiro.
- À empresa ora recorrente “B Company, Limited” havia sido concedido o registo da marca “XXXXYYYY”, N/1***5, mas por acórdão deste TSI, de 22/05/2014, no Proc. nº 39/2014, foi confirmada a sentença do TJB, que havia declarado a caducidade dessa marca pelo não uso.
- Por acórdão deste TSI, de 24/11/2016, Proc. nº 663/2016, foi concedido parcial provimento ao recurso jurisdicional interposto pela “C – Sociedade Gestora, Limitada”da sentença do TJB, que tinha julgado improcedente o recurso judicial ali por si interposto contra a recusa de registo da sua marca N/6****, “XXXXYYYY” para assinalar produtos da classe 43ª por se ter considerado que reproduz a marca registada N/****3, “XXXXYYYY” para produtos da classe 36ª concedida à ora recorrente “B Company, Limited”.
- Neste aresto (Proc. nº 663/2016) foi decidido revogar a sentença do TJB e determinar à DSE que procedesse ao registo da marca N/6**** “XXXXYYYY” em favor da aqui recorrida “C – Sociedade Gestora, Limitada”para alguns determinados produtos da classe 43, em relação aos quais não havia risco de confusão e afinidade.
- Na mesma data, 24/11/2016, este TSI, no Processo nº 704/2016 negou provimento ao recurso jurisdicional interposto contra a sentença por “B Company, Limited” que tinha julgado improcedente o recurso judicial por si interposto contra a decisão da DSE de recusar-lhe o registo da marca N/1***2, consistente em ZZ, para produtos da classe 42ª, por considerar haver risco de reprodução e imitação da marca com a marca da aqui recorrida particular “C – Sociedade Gestora, Limitada”
- Por acórdão de 26/04/2018, proferido no Processo nº 45/2018 deste TSI, foi concedido provimento ao recurso jurisdicional, revogando-se a sentença recorrida e anulando-se o despacho da DSE de 13/02/2017, determinando-se a sua substituição por outro que negue à interessada “C-Sociedade Gestora, limitada” o registo da marca ZZ com o número N/9***4, para assinalar serviços da classe 36.
- Este aresto foi confirmado por acórdão do TUI datado de 7/11/2018, no Proc. nº 85/2018.
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III – O Direito
O caso em apreço nos presentes autos (Proc. nº 89/2018), alusivo à marca ZZ que tomou o n.º N/9****, para produtos da classe 43ª, é praticamente igual ao que foi tratado no acórdão proferido por este TSI, em 26/04/2018, no Processo nº 45/2018, relativo às mesmas partes e com referência à marca ZZ que tomou o n.º N/9***4, para produtos da classe 36. Mas também é igual ao que foi tratado no âmbito do Proc. nº 15/2018, decidido por este TSI no dia 14/06/2018, concernente aos mesmos litigantes e com referência à marca ZZ que tomou o n.º N/9***6, para produtos da classe 43ª.
Os conflitos judiciais marcários entre estas duas interessadas “C – Sociedade Gestora, Limitada” e B Company, Limited” são insistentes, têm andado sempre à volta das mesmas questões e não têm merecido unanimidade de decisões.
Cremos, porém, que não há razão para alterar os fundamentos e o sentido decisório vazados no acórdão de 26/04/2018, proferido no Processo nº 45/2018 deste TSI, confirmado, aliás, pelo acórdão do TUI de 7/11/2018, no Proc. nº 85/2018.
Reiteramos, pois, a nossa posição ali manifestada e que ora reproduzimos:
«É seguro que a empresa de Macau “C – Sociedade Gestora, Limitada” tem registadas em Macau marcas com o sinal marcário XXXXYYYY, assim como é detentora do estabelecimento com o número de registo E/**, com aquela mesma designação e com a aposição dos caracteres ZZ no nome e insígnia.
Seguro é, por outro lado, também que a recorrente “B Company, Limited” é titular em Macau da marca registada sob o nº N/****4, para produtos da classe 35ª “XXXXYYYY”, bem como a marca com o registo N/****3, “XXXXYYYY” para assinalar produtos da classe 36ª.
E, por fim, igualmente é consensual - e isso mesmo até resulta das posições das partes nos presentes autos - ,que os ditos caracteres ZZ, romanizados “Z Z”, conduzem ao estabelecimento sito na Av. da ......, onde se situa o edifício “XXXXYYYY”, onde se situa um hotel com o mesmo nome e um casino no seu interior.
Tem este TSI tido contacto com conflitos marcários desencadeados entre estas duas pessoas colectivas, recorrente e recorrida a propósito de marcas que levem no nome os sinais marcários “XXXXYYYY” e ZZ (Z Z).
Mas frequentemente, esse conflito instalou-se a propósito do mesmo sinal disputado “XXXXYYYY”, outras vezes entre “XXXXYYYY” e outros sinais que incluam este sinal ou o outro ZZ (Z Z), ora relativamente aos produtos da mesma classe, ora com referência a produtos de classes diferentes.
Discute-se nos presentes autos se a referida marca registada ZZ em nome da “C – Sociedade Gestora, Limitada” é capaz ou não de gerar risco de confusão e imitação da marca XXXXYYYY.
A sentença, concedendo embora que “XXXXYYYY” e ZZ (Z Z) são associáveis, acabou por concluir que essa semelhança não empresta à situação o risco de imitação/reprodução. Isto porque cada um das marcas em presença “XXXXYYYY” e ZZ, para produtos da classe 36, dispõe de capacidade distintiva própria.
Em nossa opinião, porém, o processo que por este tribunal passou, e que mais se aproxima da matéria controvertida nos presentes autos, é o Recurso Jurisdicional nº 704/2018. Estava nele em debate o registo da marca N/1***2, que consistia no sinal ZZ a favor da recorrente “B Company, Limited”, para produtos da classe 42ª, em confronto com a marca da recorrida “C – Sociedade Gestora, Limitada” .
Bem certo que também a recorrente tem registadas em Macau marcas com o sinal “XXXXYYYY”, e nesse aspecto ambas as sociedades estão em igualdade de posição jurídica.
Mas, aqui o que está em controvérsia é o sinal composto pelos dois caracteres ZZ.
Ora bem. Assim como o TSI considerou no Proc. nº 704/2016, que não podia ser concedido o registo à aqui recorrente “B Company, Limited” da marca ZZ por conflituar com o sinal XXXXYYYY constante do nome ou insígnia da aqui recorrida “C – Sociedade Gestora, Limitada “, assim também se não acha possível o registo desta vez da mesma marca concedida à recorrida.
Repare-se no seu conteúdo (que por seu turno transcreveu e fez seu o teor da sentença ali impugnada), que aqui transcrevemos e fazemos nosso para os efeitos do presente aresto:
   «“...
   Cumpre decidir.
   A recorrente estriba o seu recurso no seguinte, e único, argumento: os sinais XXXXYYYY e são indissociáveis para o conjunto dos consumidores de Macau e de Hong-Kong, pelo que quando estiverem em causa produtos ou serviços integrados na mesma classe, ou estejam em causa produtos e/ou serviços afins, o titular do primeiro sinal terá de ser necessariamente o titular do segundo, que corresponde ao da marca registanda. E, segundo defende a recorrente, essa indissociabilidade decorre do facto da expressão ZZ, cuja romanização é Z Z ou Z1 Z1, constituírem os dois caracteres que designam em Chinês a sua marca inglesa.
   Vejamos.
   Em primeiro lugar, de acordo com a factualidade supra exposta, verifica-se, desde logo, que o fundamento da indissociabilidade, utilizado pela recorrente, já perdeu actualidade dado que a sua marca N/1***5, para a classe 42.ª, XXXXYYYY, caducou.
   De todo o modo, sempre se dirá que, apesar dos caracteres chineses ZZ significarem, em inglês, XXXXYYYY, a afirmação da recorrente, de que estamos perante dois sinais indissociáveis e que o titular de um terá de ser o titular do outro, não é, salvo o devido respeito, correcta.
   A ser válida a argumentação da recorrente também lhe deveria ser reconhecida a titularidade do correspondente sinal em português (que numa tradução literal será ponto de referência ou marco), ou em outra qualquer língua, nos termos permitidos pelo artigo 198.º do RJPI.
   A recorrente requereu o registo de uma marca nominativa, fantasiosa, escrita em língua inglesa – XXXXYYYY – e o sinal que agora pretende registar são dois caracteres chineses cuja transliteração corresponderá a Z Z ou Z1 Z1, sinais esses que terão de ser avaliados de forma autónoma para efeitos de atribuição de um título de propriedade industrial.
   O facto de os mencionados caracteres chineses que constituem a marca em questão - ZZ- significarem XXXXYYYY, como se afirmou, corresponde a um mero processo de tradução entre duas línguas, não sendo correcto afirmar-se que o público consumidor associa as duas marcas. O público consumidor que domine as duas línguas (inglesa e chinesa) associará as duas expressões como equivalentes, mas esta asserção não permite dar o passo seguinte, como pretende fazer a recorrente, que é a conclusão de que estamos face a marcas indissociáveis.
   Colocada a questão desta forma, e voltando às características do sinal que a recorrente pretende agora registar, constituída pelos caracteres ZZ (sendo certo que neste recurso não se cuida da expressão inglesa XXXXYYYY, marca sobre a qual, coo se disse, a requerente já não é titular do respectivo registo para a classe 42.ª atenta a respectiva declaração de caducidade), é incontornável que o mesmo vai efectivamente reproduzir o nome de um estabelecimento já registado em Macau a favor de outra sociedade (tal como decidiu o Tribunal de Segunda Instância no Acórdão de 21.10.2009 no processo 21/2009); vai reproduzir parcialmente o nome de um estabelecimento hoteleiro já registado em Macau (conforme decisão do TUI de 26/10/11 no processo 38/2011), e vai reproduzir parcialmente a marca n.º N/1****, que consiste em para assinalar serviços da classe 42.ª, e que está registada a favor da parte contrária Sociedade de Investimento Predial ...... SA.
   O artigo 213.º do RJPI estatui que o registo é concedido se não tiver sido revelado fundamento de recusa e as reclamações, se as houver, forem consideradas improcedentes.
   Como fundamentos específico de recusa prevê o artigo 214.º, n.º 2, alínea b) por referência ao artigo 215.º, n.º 1, alíneas a), b) e c) ambos do RJPI, a circunstância de a marca ou algum dos seus elementos conter reprodução ou imitação, no todo ou em parte, de marca anteriormente registada por outrem para produtos ou serviços idênticos ou afins, que possa induzir em erro ou confusão o consumidor, ou que compreenda o risco de associação com a marca registada.
   Por sua vez, o artigo 215.º, n.º 1 refere que a marca registada considera-se reproduzida ou imitada, no todo ou em parte, por outra, quando, cumulativamente: a) A marca registada tiver prioridade; b) Sejam ambas destinadas a assinalar produtos ou serviços idênticos ou afins; c) Tenham tal semelhança gráfica, nominativa, figurativa ou fonética com outra que induza facilmente o consumidor em erro ou confusão ou que compreenda um risco de associação com marca anteriormente registada, de forma que o consumidor não as possa distinguir senão depois de exame atento ou confronto.
   Luís Couto Gonçalves dá-nos conta que o facto de uma marca ser a reprodução ou imitação de outra já anteriormente registada se trata da proibição relativa mais importante ao registo de marcas, sob o ponto de vista prático, importância essa que advém do facto de ser o fundamento de recusa mais invocado.
   Como refere Américo da Silva Carvalho o risco de confusão que compreende o risco de associação com a marca anterior deve ser interpretado no sentido de que a mera associação entre duas marcas não basta para concluir pelo risco de confusão ou seja, exige-se que exista um risco de confusão quanto à origem do produto. Assim, uma marca poderá coexistir com outra idêntica se cada uma delas se reporta a ramos de actividade económica diferentes, devendo distinguir-se o conceito de semelhança do de afinidade de produtos.
   A semelhança dos produtos ou serviços serve para aquilatar se os produtos ou serviços provêm ou não da mesma origem e a afinidade para determinar se os produtos satisfazem ou não as mesmas necessidades, concluindo-se, pois, que:
   - são semelhantes os produtos que o público pode atribuir à mesma origem;
   - os meios ou locais de distribuição constituem um meio para determinar a semelhança ou dissemelhança dos produtos.
   O critério a utilizar nessa distinção dever ser, em todo o caso, o ponto de vista da clientela, ou seja, o juiz deve colocar-se no lugar do público.
   Assim, para que haja possibilidade de confusão relativamente à origem empresarial dos produtos ou serviços, há que ter em atenção diversos factores, nomeadamente, a natureza e o tipo de necessidades que os produtos ou serviços visam satisfazer e os circuitos de distribuição desses produtos ou serviços, vindo a considerar-se que o público atribuirá a mesma origem a produtos ou serviços de natureza e utilidade próxima e que sejam habitualmente distribuídos através dos mesmos circuitos, sendo irrelevante, na emissão de tal juízo sobre a afinidade de produtos e serviços, a classe da tabela em que se integram, uma vez que a diferente inscrição ou classificação dos produtos e serviços não obsta, por si só, a que sejam considerados semelhantes.
   No vertente caso, a marca registanda e a marca registada a favor da parte contrária destina-se a assinalar produtos e serviços da classe 42.ª, ou seja, na mesma área de actuação económica da sociedade detentora da marca prioritária, pelo que, não podemos deixar de concordar com a DSE no sentido de que a ora recorrente não pode ver a sua marca registada, por força do estatuído nos artigos 214.º, n.º 2, alíneas b) e e) e 215.º, n.º 1 a), b) e c) todos do RJPI.
   Decisão:
   Pelo exposto, julga-se totalmente improcedente o recurso interposto por “B COMPANY, LIMITED”, e, em consequência, mantém-se o despacho recorrido.
   *
   Custas a cargo da recorrente.
   Registe e Notifique.
   ...”.
Trata-se de uma decisão que aponta para a boa solução do caso.
Assim, ao abrigo do disposto do nº 5 do artº 631º do CPCM, é de negar provimento ao recurso, com os fundamentos constantes na decisão impugnada.»
*
Pois bem. As razões são as mesmas. Isto é, se aqueles caracteres chineses não podiam formar uma marca a favor da empresa de Hong Kong, com o argumento de que a sua significação geraria confusão e imitação do nome de um estabelecimento de Macau pertencente à empresa de Macau, aqui recorrida, e em cuja composição faz parte o vocábulo XXXXYYYY, cremos, do mesmo modo, que iguais razões deveriam ter levado a negar o registo do mesmo par de caracteres como marca a favor da empresa de Macau, por colidir com o sinal XXXXYYYY que a empresa de Hong Kong, aqui recorrente, dispõe nas suas marcas (acima referidas), registadas em Macau.
Aliás, o próprio TUI, no seu acórdão de 24/10/2011, Proc. nº 38/2011, já chegou a concluir que, os sinais ZZ podem “confundir o nome de estabelecimento hoteleiro澳門ZZ廣場 [Ou Mun Z Z Kuong Cheong], que corresponde em inglês a Macau XXXXYYYY Plaza, com a marca香港ZZ [Hong Kong Z Z], que corresponde em inglês a Hong Kong XXXXYYYY, esta destinada à classe 37 de serviços (construção e reparações)”.
Por conseguinte, não é possível que a recorrida possa dispor desta marca ZZ, que indissociavelmente conduz a XXXXYYYY, na medida em que atenta contra a marca XXXXYYYY que a recorrente possui registadas em Macau.
Neste sentido, o recurso deve proceder.»
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Com o devido respeito, reiteramos e fazemos nosso o conteúdo acabado de transcrever, que vem ao encontro da posição do TUI, no citado Aresto de 7/11/2018 (Proc. nº 85/2018), quando afirma que “entre a população de Macau, que é maioritariamente chinesa, tal como os turistas que nos visitam, há uma evidente associação entre os caracteres ZZ e a expressão inglesa XXXXYYYY, até porque a grande maioria destes consumidores não lê inglês. Para a maioria dos consumidores de macau ao ler ZZ está a representar XXXXYYYY”.
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IV – Decidindo
Face ao exposto, acordam em conceder provimento ao recurso e, em consequência:
- Revogam a sentença recorrida;
- Anulam o despacho da DSE de 13/02/2017, que deve ser substituído por outro que negue o registo da marca nominativa ZZ, N/9****, para assinalar serviços da classe 43ª requerido pela aqui recorrida particular “C – Sociedade Gestora, Limitada” .
Custas em ambas as instâncias pela recorrida particular.
T.S.I., 14 de Fevereiro de 2019
(Relator)
José Cândido de Pinho

(Primeiro Juiz-Adjunto) Tong Hio Fong

(Segundo Juiz-Adjunto)
Lai Kin Hong



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