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Processo n.º 1111/2018
(Autos de recurso de decisões jurisdicionais)

Relator: Fong Man Chong
Data: 07/Março/2019

Assuntos:
     
- Notificação de decisão administrativa sancionatória
- Recusa de receber notificação e consequência

SUMÁRIO:

I – Perante o insucesso de notificação por correio por ser incompleta a morada da destinatária (infractora, executada em matéria de execução fiscal), a Entidade Recorrida/Entidade Exequente optou por via de contactar com a destinatária para esta comparecer nos serviços para receber a notificação da decisão administrativa da aplicação de multa, não obstante a notificanda aparecer no local de serviços, recusou-se a receber a respectiva notificação, recusa esta que, em situações normais, não impede a decisão sancionatória de começar a produzir os seus efeitos.
II – O artigo 19º da Lei nº 3/2010 não estabelece um sistema fechado de comunicação de decisões, pelo contrário, ele manda recorrer aos termos fixados pelo CPA em matéria de notificação da decisão administrativa. O artigo 72º do CPA fala expressamente da possibilidade de notificação por contacto pessoal. Pelo que, a diligência realizada pela Entidade Exequente nesta forma não merece censura.
III – Perante a recusa da notificanda, a Entidade Exequente promoveu a notificação edital nos termos legalmente fixados, pela qual a Executada/Recorrente veio a tomar conhecimento da decisão administrativa da aplicação da multa, sendo de considerar que tal notificação edital, para além de redundante, não resulta de nenhuma imposição legal, nem, por isso, gera nulidade. Pelo que, é de julgar improcedente o recurso interposto pela Recorrente/Executada por não se verificar o alegado vício.
     
     
    O Relator,

________________
     Fong Man Chong












Processo n.º 1111/2018
(Recurso de Decisões Jurisdicionais)

Data : 7/Março/2019

Recorrente : A (A)

Entidade Recorrida : Direcção dos Serviços de Turismo (旅遊局)


*
    ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA RAEM:
    
    I – RELATÓRIO
A (A), Recorrente, devidamente identificada nos autos, não se conformando com a decisão proferida pelo Tribunal Administrativo, datada de 19/09/2018, que julgou improcedente o argumento da nulidade de notificação em matéria de execução fiscal (execução de uma multa aplicada no valor de MOP$200,000.00 por infracção à Lei nº 3/2010 (proibição de prestação ilegal de alojamento), de 2 de Agosto), veio, em 04/10/2018, interpor o presente recurso jurisdicional para este TSI, com os fundamentos constantes de fls. 52 a 58, tendo formulado as seguintes conclusões:
1. A Recorrente foi notificada da decisão sancionatória por via da publicação de editais.
2. Previamente à notificação edital, a Direcção dos Serviços de Turismo enviou uma notificação postal que não foi entregue à Recorrente porque, alegadamente, a morada era incompleta.
3. A Direcção dos Serviços de Turismo optou por contactar pessoalmente a Recorrente, para a notificar da decisão sancionatória, tendo a Recorrente recusado a notificação.
4. A Lei n.º 3/2010 não prevê a possibilidade de a notificação ser feita por via de contacto pessoal mas tão só a notificação por via postal, por carta registada.
5. Mesmo que o contacto pessoal fosse admitido, as regras subsidiariamente aplicáveis impunham outro cuidado na notificação, conforme resulta do n.º 3 do artigo 185.º do CPC, o que não se verificou.
6. A notificação pessoal, quer porque não é permitida, quer porque não foi antecedida de uma tentativa séria de notificação por via postal, quer porque não foi acompanhada das cautelas que o n.º 3 do artigo 185.º do CPC impõe, é nula.
7. A Lei n.º 3/2010 não prevê também a possibilidade de a notificação ser feita por via edital, salvo para os casos previstos no n.º 4 do artigo 19.º da Lei n.º 3/2010, com aplicação apenas para assegurar a colaboração do notificando, conforme resulta do n.º 3 do artigo 4.º da mesma lei.
8. A notificação edital, quer porque não é permitida, quer porque não foi antecedida de uma tentativa séria de notificação por via postal, é nula.
* * *
Citada a Entidade Recorrida, a Senhora Directora dos Serviços de Turismo veio contestar o recurso com os fundamentos constantes de fls. 63 a 70, tendo formulado as seguintes conclusões:
I. Não se vislumbra na sentença recorrida qualquer vício que leve à anulação da mesma;
II. A executada-oponente foi devida e atempadamente notificada, nos termos e prazos legais, tendo essa notificação sido feita tanto quando foi desencadeado contra si o procedimento sancionatório como quando da decisão punitiva;
III. A executada-oponente teve conhecimento e consciência plena do processo sancionatório que pendia sobre si quando aos 17 de Agosto de 2016, vem à sede da executada receber a respectiva notificação e apresenta a sua defesa escrita, mostrando assim que de facto sabia defender-se das acusações que sobre si pendiam;
IV. E, embora a executada-oponente se tenha recusado a receber a notificação que lhe foi entregue, em mão, na sede da exequente aos 8 de Setembro de 2017, conforme os autos, depois de se ver frustrada a notificação postal, ainda assim e como é sabido, essa recusa não impediu que a decisão entrasse na sua esfera de conhecimento e fosse cognoscível;
V. Parece-nos que é exactamente por compreender perfeitamente as consequências dos seus actos que se recusou a receber a notificação com a aplicação da sanção;
VI. Quanto à aplicação subsidiária das normas constantes no CPC e no CPP relativamente ás notificações, e tal como defendido na douta sentença do tribunal a quo, não se percebe porque razão teria a exequente de lançar mão daquelas normas quando, tanto o artigo 19.º do lei n.º 3/2010, quanto o CPA, diploma que nesta matéria lhe é subsidiário, enumeram de forma clara e precisa as formas e modos de notificação no âmbito das competências da exequente no combate ao alojamento ilegal;
VII. E, tal como entendido, e bem, pelo tribunal a quo na douta sentença, não existe qualquer lacuna na lei para ter de ser feita a sua integração recorrendo a normas contidas noutros ramos de direito;
VIII. Esteve bem a sentença do TAM de 19 de Setembro, ao não dar provimento à oposição à execução fiscal apresentada pela oponente-executada não lhe devendo ser apontado qualquer vício que leve à sua anulação;
IX. E, tal como defendido pelo tribunal a quo na douta sentença, a exequente fez o que devia ser feito e dentro do que lhe é exigido, também não lhe podendo ser apontada qualquer falha que leve à nulidade da notificação e consequente inexequibilidade do título executivo, pelo que deve prosseguir a execução fiscal;
* * *
O Digno. Magistrado do Ministério Público junto do TSI emitiu o seguinte douto parecer (fls. 87):
No processo de execução fiscal n.º 2018/93/009688/50, movido contra A através da Repartição das Execuções Fiscais, deduziu a executada oposição com fundamento na inexequibilidade do título executivo, a qual veio a ser julgada improcedente por sentença de 19 de Setembro de 2018, do Tribunal Administrativo.
Recorre a oponente, pondo em causa o juízo que levou o tribunal a concluir pela validade da notificação do acto e pela sequente exequibilidade do título.
Não creio que lhe assista razão.
Como a sentença recorrida lembrou, o artigo 19.° da lei n.º 3/2010 e o diploma para o qual remete, Código do Procedimento Administrativo, regulam suficientemente a matéria de notificações a operar nos procedimentos relativos a infracções por prestação ilegal de alojamento, tornando-se, pois, desnecessário recorrer a outros diplomas legais, nomeadamente ao Código de Processo Civil.
E constata-se, tal como a sentença recorrida também concluiu, que a Administração realizou a notificação em consonância com o previsto nos pertinentes normativos. Começou por utilizar a carta registada, enviando-a para o local de residência indicado pela própria notificanda no procedimento de infracção administrativa, em estrita observância daquele artigo 19.°. Como a carta veio devolvida, devido a endereço insuficiente, pois a notificanda esquecera-se de mencionar o nome da artéria onde residia, avançou-se para uma forma de notificação mediante contacto pessoal e presencial, permitida pelo artigo 72.° do Código do Procedimento Administrativo. Assim, a recorrente foi convocada telefonicamente, para comparecer nos Serviços da Administração, aonde se deslocou e onde foi notificada do acto que se pretendia levar ao seu conhecimento. A circunstância de recusar receber cópia do acto notificando e de assinar a notificação não invalida evidentemente o acto de notificação. E a notificação edital a que se recorreu posteriormente acaba por ser um acto redundante, que releva essencialmente dos esforços sérios assinalados na sentença, mas que em nada interfere com a validade da notificação antes efectuada.
Improcedem os fundamentos do recurso, pelo que se lhe deve negar provimento.
* * *
Foram colhidos os vistos legais.
Cumpre analisar e decidir.
* * *
    II – PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
Este Tribunal é o competente em razão da nacionalidade, matéria e hierarquia.
O processo é o próprio e não há nulidades.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária e são dotadas de legitimidade “ad causam”.
Não há excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
* * *
    III – FACTOS
São os seguintes elementos considerados assentes, extraídos do processo principal e do processo administrativo com interesse para a decisão da causa:
‐ Pelo despacho de 12 de Julho de 2017, exarado no relatório n.º 459/DI/2017, foi determinada à executada a aplicação da multa de MOP200,000.00 (cfr. fls. 362 a 373 do processo administrativo).
‐ Em 21 de Julho de 2017, foi expedido o mandado de notificação da referida decisão, por via da carta registada, para a moradia declarada pela executada “…第三期8樓O座”. A referida carta foi devolvida em 29 de Agosto de 2017, por ser incompleto o endereço do destinatário (cfr. fls.238, 329, 357 e verso, 361 do processo administrativo).
‐ Em 7 de Setembro de 2017, a entidade exequente telefonou à executada para vir a receber o referido mandado de notificação na sede da Direcção dos Serviços de Turismo (cfr. fls. 378 do processo administrativo).
‐ Em 8 de Setembro de 2017, a executada compareceu e recusou-se a receber os referidos documentos (cfr. ibidem).
‐ De seguida, a entidade exequente procedeu-se à notificação edital da referida decisão (cfr. fls.383 a 384, 391 a 392 do processo administrativo).
‐ Em 27 de Fevereiro de 2018, foi emitida a certidão de relaxe n.º 87/DI-AI/2018 da quantia exequenda, no valor de MOP200,000.00 (vide. fls. 3 do processo n.º 2018-93-009688-50).
‐ Em 7 de Março de 2018, foi autuado o processo executivo n.º 2018-93-009688-50.
‐ Em 12 de Junho de 2018, a executada apresentou a oposição perante a Repartição das Execuções Fiscais.
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    IV - FUNDAMENTOS
Como o presente recurso tem por objecto a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo, importa ver o que este decidiu. Este afirmou:
I. Relatório
A (A), ora executada, melhor identificada nos autos, deduziu a presente oposição à execução fiscal movida pela
Direcção dos Serviços de Turismo, ora entidade exequente, para o pagamento da quantia de MOP200,000.00, a que acresce selo de verba, juros, receitas do cofre, proveniente da multa aplicada.
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Alegou a executada, com os fundamentos de fls. 3 a 7 dos autos, em síntese,
- a inexequibilidade do título executivo pela nulidade da notificação da decisão sancionatória,
Concluindo, pedindo que se julgue procedente a oposição e se declare extinta a presente execução fiscal.
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A entidade exequente apresentou a resposta com fundamentos de fls. 21 a 26 dos autos, em que concluiu que a oposição deve ser liminarmente indeferida ou a mesma considerada improcedente.
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A Digna Delegada do Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de improcedência da oposição, com os fundamentos a fls. 28 a 30v dos autos.
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Este Tribunal é o competente em razão da matéria e da hierarquia.
As partes são dotadas de personalidade e capacidade judiciária e de legitimidade “ad causam”.
O processo é o próprio.
Inexistem nulidades, ou questões prévias que obstem a apreciação “de meritis”.
***
II. Fundamentação

1. Matéria de facto provada

Considera-se provada por documento a seguinte factualidade pertinente:
(…)
***


2. O direito aplicável

Como se vê, a oposição assenta, como seu único fundamento, na inexequibilidade do título executivo, proveniente da nulidade da notificação da decisão sancionatória.
Entende a entidade exequente que a oposição tem como fundamento que não consta dos artigos 169.º e 176.º do Código das Execuções Fiscais, de 12 de Dezembro de 1950 (doravante designado por CEF), e que a mesma deve ser rejeitada nos termos do art.º 165.º do mesmo Código.
O seu argumento não se pode colher.
Como é sabido, a inexigibilidade da dívida constitui fundamento de oposição à execução fiscal, ainda que não o próprio CEF não o tenha expressamente previsto – Neste sentido, acórdão TSI, de 18 de Março de 2003, recurso n.º 171/2003, acórdão TSI, de 18 de Março de 2003, recurso n.º 170/2003, acórdão TSI, de 30 de Novembro de 2006, recurso n.º 527/2006, acórdão TSI, de 7 de Dezembro de 2017, recurso n.º 587/2017.
Passemos a ver então se procede ou não, no caso concreto, o mesmo fundamento da oposição, ou seja, se foi regularmente efectuada a notificação da decisão da entidade exequente que fixou a sanção pecuniária em causa.
Como se sabe, a notificação dos actos que afectem direitos e interesses legítimos é condição da sua eficácia em relação aos notificados.
Cumpre referir desde logo que a respeito da notificação no âmbito das actividades administrativas concernentes à proibição ilegal de alojamento, não se vê a margem da aplicação subsidiária das normas do CPC nem do CPP, visto que nesta matéria têm prefeita aplicação a norma especial do disposto do art.º 19.º da Lei n.º 3/2010, e bem como as normas legais do Código do Procedimento Administrativo, pela remissão do n.º 1 do mesmo preceito.
Com isto quer dizer que, não havendo a alegada lacuna na regulamentação da matéria em causa, não seria necessário recorrer às normas contidas noutros ramos de direito para a sua integração.
Tal como foi pronunciado pelo Tribunal de Última Instância na sua jurisprudência uniformizada:
“Existe uma lacuna quando a lei (dentro dos limites de uma interpretação ainda possível) e o direito consuetudinário não contêm uma regulamentação exigida ou postulada pela ordem jurídica global, não contêm a resposta a uma questão jurídica” (cfr. Acórdão do TUI n.º 57/2012).
Ora o referido art.º 19.º da Lei n.º 3/2010 dispõe o seguinte:
“Artigo 19.º
Formas de notificação
1. Sem prejuízo das disposições especiais previstas nos números seguintes, todas as notificações são efectuadas nos termos do Código do Procedimento Administrativo.
2. As notificações são feitas por carta registada sem aviso de recepção e presumem-se realizadas no terceiro dia posterior ao do registo, ou no primeiro dia útil seguinte nos casos em que o referido terceiro dia não seja dia útil, quando efectuadas para:
1) A última residência constante do arquivo da DSI, se o notificando for residente da RAEM;
2) A última sede constante dos arquivos da DSI e da Conservatória dos Registos Comercial e de Bens Móveis, se o notificando for pessoa colectiva, cuja sede ou representação permanente se situe na RAEM;
3) O último endereço de contacto ou a morada constantes do arquivo do IPIM, se o notificando tiver obtido a autorização de residência temporária nos termos das disposições relativas à fixação de residência temporária de investidores, quadros dirigentes e técnicos especializados;
4) O endereço constante do contrato de compra e venda ou do contrato de arrendamento do prédio ou fracção autónoma sob investigação, se o notificando for proprietário, arrendatário ou subarrendatário;
5) O último endereço constante do arquivo do CPSP, se o notificando for titular do documento de identificação por este emitido;
6) O endereço de contacto ou a morada indicados no procedimento de infracção administrativa referido na presente lei pelo próprio notificando.
3. Se o endereço do notificando referido no número anterior se localizar fora da RAEM, o prazo indicado no número anterior somente se inicia depois de decorridos os prazos de dilação previstos no artigo 75.º do Código do Procedimento Administrativo.
4. A presunção prevista no n.º 2 só pode ser ilidida pelo notificando quando a recepção da notificação ocorra em data posterior à presumida, por razões imputáveis aos serviços postais.
5. Para efeitos do n.º 3 do artigo 4.º, se, após a notificação ao proprietário nos termos do n.º 2, este não entrar em contacto com a DST, no prazo de 15 dias a contar da data em que se presume realizada a notificação, a DST deve proceder, imediatamente, à publicação da notificação nos dois jornais mais lidos da RAEM, um em língua chinesa e outro em língua portuguesa, durante dois dias consecutivos, sem prejuízo da contagem do prazo referido no n.º 3 do artigo 4.º”
Do preceito acima transcrito resulta sem equívoco, que a notificação efectuada por carta registada, desde que remetida para qualquer dos endereços indicados nas alíneas do n.º 2, presume-se realizada no terceiro dia posterior ao do registo, ou no primeiro dia útil seguinte nos casos em que o referido terceiro dia não seja dia útil.
No entanto, a referida presunção só pode funcionar nos casos em que a carta não seja devolvida, e apenas se admite a possibilidade de ilidir a presunção, demonstrando que a notificação ocorreu em data posterior à presumida.
Dito por outros termos, a presunção apenas existe quanto à data da recepção da carta registada, já não quanto à sua recepção.
No caso em apreço, a presunção é naturalmente ilidida, e não se deve considerar que teve efectivamente lugar a notificação postal da decisão sancionatória. Pois, como resultou dos factos dados como provados, o dito mandado da notificação expedido em 21 de Julho de 2017, foi devolvido em 29 de Agosto de 2017, por ser incompleto o endereço do destinatário.
Mais resulta dos factos dados como provados que vendo devolvida a carta de notificação, a entidade exequente contactou com a executada por telefone, para que esta possa receber em pessoa o dito mandado de notificação nos serviços.
Como a executada recusou-se a receber a notificação, procedeu-se de seguida à notificação edital.
São factos que foram também reconhecidos pela própria executada nas alegações nos artigos 7.º a 9.º da p.i..
Como se sabe, a notificação é uma das formas de publicação do acto administrativo, é uma operação mediante a qual é levado ao conhecimento dos interessados determinado acto administrativo – tornando assim o acto ou conhecido pelo seu destinatário (por via da notificação pessoal) ou cognoscível (por via da notificação edital).
Não obstante quando foi recusado o recebimento da notificação, a executada não teve conhecimento efectivo da decisão sancionatória, é verdade que a recusa não conseguiu impedir o acto de entrar na sua esfera de conhecimento, o qual passou a ser cognoscível a ela.
A partir deste momento, a notificação nem deixa de por isso produzir os seus efeitos.
Acompanhando este raciocínio, sabendo quem é o seu destinatário e que esta recusou-se expressamente a receber a notificação, não se afigura necessária a forma de notificação edital que veio a ser empregada de seguida, e que também visava tonar o acto cognoscível. Muito embora não se deixe de perceber os esforços sérios da entidade exequente no sentido de levar a decisão ao conhecimento do destinatário.
Ou seja, bem como defendido por esta na sua resposta: a exequente fez o que devia ser feito e dentro do que lhe é exigido.
Assim, é manifestamente irrazoável a exigência da executada para uma segunda notificação postal na sequência da recusa do recebimento da carta, nem a mesma exigência tem seu suporte legal.
A nulidade da notificação não se verifica no caso.
Deve, pois, improceder a presente oposição.
***
IV. Decisão
Por tudo o que fica expendido e justificado, o Tribunal julga improcedente a presente oposição à execução fiscal.
*
Custas pela executada, com taxa de justiça em 5 UC.
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Registe e notifique.
    Quid Juris?
Neste recurso a Recorrente veio suscitar essencialmente as seguintes questões:
- Nulidade resultante da notificação postal que não foi entregue à Recorrente por ser incompleta a morada;
- Nulidade resultante da notificação por contacto pessoal, que não está prevista na Lei nº 3/2010;
- Nulidade resultante da notificação por via edital que não está prevista na referida Lei;
Está em causa a nulidade da notificação do acto sancionatório aplicado à Recorrente.
Sobre a matéria em causa, o artigo 19.º da Lei n.º 3/2010, 2 de Agosto, dispõe:
“Artigo 19.º
Formas de notificação
1. Sem prejuízo das disposições especiais previstas nos números seguintes, todas as notificações são efectuadas nos termos do Código do Procedimento Administrativo.
2. As notificações são feitas por carta registada sem aviso de recepção e presumem-se realizadas no terceiro dia posterior ao do registo, ou no primeiro dia útil seguinte nos casos em que o referido terceiro dia não seja dia útil, quando efectuadas para:
1) A última residência constante do arquivo da DSI, se o notificando for residente da RAEM;
2) A última sede constante dos arquivos da DSI e da Conservatória dos Registos Comercial e de Bens Móveis, se o notificando for pessoa colectiva, cuja sede ou representação permanente se situe na RAEM;
3) O último endereço de contacto ou a morada constantes do arquivo do IPIM, se o notificando tiver obtido a autorização de residência temporária nos termos das disposições relativas à fixação de residência temporária de investidores, quadros dirigentes e técnicos especializados;
4) O endereço constante do contrato de compra e venda ou do contrato de arrendamento do prédio ou fracção autónoma sob investigação, se o notificando for proprietário, arrendatário ou subarrendatário;
5) O último endereço constante do arquivo do CPSP, se o notificando for titular do documento de identificação por este emitido;
6) O endereço de contacto ou a morada indicados no procedimento de infracção administrativa referido na presente lei pelo próprio notificando.
3. Se o endereço do notificando referido no número anterior se localizar fora da RAEM, o prazo indicado no número anterior somente se inicia depois de decorridos os prazos de dilação previstos no artigo 75.º do Código do Procedimento Administrativo.
4. A presunção prevista no n.º 2 só pode ser ilidida pelo notificando quando a recepção da notificação ocorra em data posterior à presumida, por razões imputáveis aos serviços postais.
5. Para efeitos do n.º 3 do artigo 4.º, se, após a notificação ao proprietário nos termos do n.º 2, este não entrar em contacto com a DST, no prazo de 15 dias a contar da data em que se presume realizada a notificação, a DST deve proceder, imediatamente, à publicação da notificação nos dois jornais mais lidos da RAEM, um em língua chinesa e outro em língua portuguesa, durante dois dias consecutivos, sem prejuízo da contagem do prazo referido no n.º 3 do artigo 4.º”
Ora, nos termos do nº 2 do artigo acima citado, a notificação efectuada por carta registada, desde que remetida para qualquer dos endereços indicados nas alíneas do n.º 2, presume-se realizada no terceiro dia posterior ao do registo, ou no primeiro dia útil seguinte nos casos em que o referido terceiro dia não seja dia útil.
Ao abrigo do disposto nº 4 do mesmo normativo, a referida presunção só pode funcionar nos casos em que a carta não seja devolvida, e apenas se admite a possibilidade de ilidir a presunção, demonstrando que a notificação ocorreu em data posterior à presumida, obviamente pode discutir se esta norma está a impor restrições de mais, porque parece que afaste outras hipóteses de a carta não ser enviada ao seu destinatário.
Mas como no presente caso não se encontram elementos que justifiquem uma análise mais profunda sobre esta matéria, nem a Recorrente veio a colocar algumas questões sobre este ponto, ficamos dispensados de tecer mais considerações nesta ordem.
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Voltando ao caso em apreço, a presunção é naturalmente ilidida, e como tal mão se deve considerar que teve efectivamente lugar a notificação postal da decisão sancionatória. Pois, como resultou dos factos dados como provados, o dito mandado da notificação expedido em 21 de Julho de 2017, foi devolvido em 29 de Agosto de 2017, por ser incompleto o endereço da destinatária.
Mais resulta dos factos dados como provados que, vendo devolvida a carta de notificação, a Entidade Exequente mandou funcionário para contactar a executada por telefone, para que esta possa receber pessoalmente o dito mandado de notificação nos serviços.
Nesta ordem ficaram provados os seguintes factos:
‐ Em 7 de Setembro de 2017, a entidade exequente telefonou à executada para vir a receber o referido mandado de notificação na sede da Direcção dos Serviços de Turismo (cfr. fls. 378 do processo administrativo).
‐ Em 8 de Setembro de 2017, a executada compareceu e recusou-se a receber os referidos documentos (cfr. ibidem).
‐ De seguida, a entidade exequente procedeu-se à notificação edital da referida decisão (cfr. fls.383 a 384, 391 a 392 do processo administrativo).

É de ver que a Recorrente/Executada apareceu nos Serviços, mas recusou-se a receber tal notificação.

Porém, a Entidade Recorrida não ficou por aí, veio fazer algo mais, procedendo à notificação edital da decisão sancionatória.
São factos que foram também reconhecidos pela própria executada nas alegações nos artigos 7.º a 9.º da p.i..
Como se sabe, a notificação é uma das formas de publicação do acto administrativo, é uma operação mediante a qual é levado ao conhecimento dos interessados determinado acto administrativo – tornando assim o acto ou conhecido pelo seu destinatário (por via da notificação pessoal) ou cognoscível (por via da notificação edital).
É do entendimento quase maioritário que a recusa por parte da Recorrente não tem virtualidade para impedir o acto de produzir os seus efeitos na esfera da destinatária, pois, a decisão passou a ser cognoscível por ela.
A partir deste momento, a notificação começou a produzir os seus plenos efeitos em todo o sentido.
Neste domínio, sabendo quem é o seu destinatário e que esta recusou-se expressamente a receber a notificação, não se afigura necessária a forma de notificação edital que veio a ser empregada de seguida, e que também visava tonar o acto cognoscível. Muito embora não se deixe de perceber os esforços sérios da Entidade Exequente, a fim de salvaguardar que a decisão fosse efectivamente levada ao conhecimento da destinatária.
Assim, é manifestamente irrazoável, para além de carecer de base legal, a exigência de uma segunda notificação postal na sequência da recusa do recebimento da carta pela Executada/Recorrente.
Ora, importa citar aqui os termos consagrados nos artigos 68º e 72º do CPA:
Artigo 68.º
(Dever de notificar)
Devem ser notificados aos interessados os actos administrativos que:
a) Decidam sobre quaisquer pretensões por eles formuladas;
b) Imponham deveres, sujeições ou sanções, ou causem prejuízos;
c) Criem, extingam, aumentem ou diminuam direitos ou interesses legalmente protegidos, ou afectem as condições do seu exercício.
Artigo 72º
(Forma das notificações)
1. As notificações devem ser feitas pessoalmente ou por ofício, telegrama, telex, telefax, ou por telefone, consoante as possibilidades e as conveniências.
2. Se qualquer das referidas formas de notificação pessoal se revelar impossível ou ainda se os interessados a notificar forem desconhecidos ou em número tal que inviabilize essas formas de notificação, é feita notificação edital, afixando-se editais nos locais de estilo e publicando-se anúncios em dois dos jornais mais lidos do Território, um em língua portuguesa, outro em língua chinesa.
3. Sempre que a notificação seja feita por telefone, é a mesma confirmada por uma das outras formas previstas no n.º 1, no dia útil imediato, sem prejuízo de a notificação se considerar feita na data da primeira comunicação.
É de ver que o CPA autoriza várias vias de notificação de decisões administrativas, mandando que esta matéria é regida pelo princípio de conveniência!

Depois, o artigo 3º (Regime aplicável) do DL nº 52/99/M, de 4 de Outubro (Regime geral das infracções administrativas e respectivo procedimento), consagra os termos idênticos, que prescreve:

1. Os regimes material e procedimental aplicáveis às infracções administrativas são fixados nas leis ou regulamentos que as prevêem e sancionam.
2. Os regimes referidos no número anterior devem conformar-se com as disposições do presente diploma.
3. Na ausência de regulamentação nas leis ou regulamentos previstos no n.º 1, aplicam-se subsidiária e sucessivamente as disposições do presente diploma e, com as necessárias adaptações, as adequadas do Código do Procedimento Administrativo e os princípios gerais do direito e do processo penal.
Pelo que, não têm base legal os argumentos invocados neste recurso, pois o artigo 19º acima citado fixa um regime próprio, e manda aplicar-se supletivamente o CPA, quer a notificação edital, quer a por via de correio, ou por contacto pessoal, são meios idóneio para levar ao conhecimento do destinatário de um determinado assunto, mormente de uma decisão jurídico-administrativa.
Nestes termos, as vias utilizadas pela Entidade Recorrida são todas legalmente permissíveis e como tal não geram nulidade nem anulabilidade, julgando-se, deste modo, improcedentes os argumentos invocados pela Recorrente neste recurso e mantendo-se a decisão recorrida
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Síntese conclusiva:
I – Perante o insucesso de notificação por correio por ser incompleta a morada da destinatária (infractora, executada em matéria de execução fiscal), a Entidade Recorrida/Entidade Exequente optou por via de contactar com a destinatária para esta comparecer nos serviços para receber a notificação da decisão administrativa da aplicação de multa, não obstante a notificanda aparecer no local de serviços, recusou-se a receber a respectiva notificação, recusa esta que, em situações normais, não impede a decisão sancionatória de começar a produzir os seus efeitos.
II – O artigo 19º da Lei nº 3/2010 não estabelece um sistema fechado de comunicação de decisões, pelo contrário, ele manda recorrer aos termos fixados pelo CPA em matéria de notificação da decisão administrativa. O artigo 72º do CPA fala expressamente da possibilidade de notificação por contacto pessoal. Pelo que, a diligência realizada pela Entidade Exequente nesta forma não merece censura.
III – Perante a recusa da notificanda, a Entidade Exequente promoveu a notificação edital nos termos legalmente fixados, pela qual a Executada/Recorrente veio a tomar conhecimento da decisão administrativa da aplicação da multa, sendo de considerar que tal notificação edital, para além de redundante, não resulta de nenhuma imposição legal, nem, por isso, gera nulidade. Pelo que, é de julgar improcedente o recurso interposto pela Recorrente/Executada por não se verificar o alegado vício.
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Tudo visto, resta decidir.

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    V - DECISÃO
Em face de todo o que fica exposto e justificado, os juízes do TSI acordam em negar provimento ao presente recurso jurisdicional, mantendo-se a decisão do Tribunal Administrativo ora recorrida.
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Custas pela Recorrente que se fixa em 7 UCs.
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Notifique e Registe.
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RAEM, 7 de Março de 2019.
Fong Man Chong
Ho Wai Neng
José Cândido de Pinho
Fui presente
Joaquim Teixeira de Sousa
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