Processo n.º 1128/2018
(Recurso em matéria laboral)
Data: 28 de Fevereiro de 2019
ASSUNTOS:
- Repetição de julgamento
- Novos quesitos deficientes e repetição do julgamento já repetido
SUMÁRIO:
I – Quando o Tribunal ad quem, em sede da decisão do recurso, fixou os termos de “apurar os concretos dias de trabalho efectivamente prestado e a poder fixar-se a compensação relativa aos subsídios de alimentação, bem como as importâncias devidas a título de trabalho prestado em dias de descanso semanal, descanso compensatório, trabalho extraordinário e por turnos e feriados obrigatórios”, o Tribunal a quo deve cumprir o ordenado mediante o aditamento de factos necessários, pertinentes e aptos a solucionar as questões pendentes, seleccionando os factos segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito.
II – O Tribunal a quo, em sede de repetição do julgamento, formulou dois quesitos com o seguinte teor: (artigo 23º) Entre 18/10/1996 e 21/07/2003, o Autor prestou 2258 dias de trabalho efectivo junto da 1ª Ré? (artigo 24º ) Entre 22/07/2003 e 05/09/2005 o Autor prestou 625 ds de trabalho efectivo junto da 2ª Ré? estes quesitos em causa, para além de conterem conteúdo deficiente, não têm aptidão para cumprir o ordenado do acórdão do TSI, razão pela qual é de anular o julgamento feito nestes termos.
III – Para a mesma finalidade e em sede da reclamação o Autor chegou a propor 7 quesitos sob os números 25º a 31º com conteúdo pertinente e apto a cumprir o decidido no acórdão do TSI, é de admitir tais quesitos que constituirão objecto de novo julgamento a cargo do Tribunal a quo. É o que a este TSI compete decidir nestes autos.
O Relator,
________________
Fong Man Chong
Processo nº 1128/2018
(Autos de recurso em matéria laboral)
Data : 28 de Fevereiro de 2019
Recorrente: A (Autor)
Recorridas : B (1.ª Ré)
C (2.ª Ré)
*
Acordam os Juízes do Tribunal de Segunda Instância da RAEM:
I ‒ RELATÓRIO
A, intentou, em 20/11/2015, junto do Tribunal Judicial de Base da RAEM, acção declarativa de processo comum do trabalho (LB1-15-0152-LAC), pedindo condenar a 1ª Ré a pagar a título de créditos laborais, a quantia global de MOP$465.710,00 e a 2ª Ré a pagar a título de créditos laborais, a quantia global de MOP$72.500,00.
Realizado o julgamento, foi proferida a sentença com o seguinte teor na parte decisiva:
Pelo exposto, julga-se a acção improcedente, por não provada, e em consequência absolver as Rés do pedido, sem prejuízo dos outros que já foram decididos pelo presente Tribunal e foram confirmados pelo douto acórdão do Venerando Tribunal de Segunda da Instância, nomeadamente a condenação relativamente aos subsídios de efectividade e de comparticipação no alojamento.
*
Discordando da decisão, veio o Autor recorrer para este TSI, com os fundamentos de fls. 552 a 572, em cujas alegações formulou as seguintes conclusões:
1. Versa o presente recurso sobre a Decisão proferida pelo Juízo Laboral do Tribunal Judicial de Base nos termos da qual foi julgada totalmente improcedente, por não provado, os pedidos formulados pelo Autor, ora Recorrente, contra a Ré e relativos ao subsídio de alimentação, trabalho prestado em dia de feriado obrigatório, descanso semanal, descanso compensatório, trabalho extraordinário e por turnos, em sede de “repetição de julgamento” tal qual ordenado por este Venerando Tribunal de Recurso (Proc. n.º 710/2017, junto de fls...);
2. Salvo o devido respeito, está o Recorrente em crer que a Decisão Recorrida enferma de um conjunto de erros de facto (traduzido, desde logo, numa notória insuficiência de matéria de facto com vista à “repetição do julgamento” tal qual ordenado pelo Tribunal de Segunda Instância), bem como de um notório erro de julgamento traduzido numa manifesta contradição entre a matéria de facto constante da Decisão Recorrida e a matéria de facto anteriormente provada, o que em muito compromete a sua validade e justeza, razão pela qual deve a mesma ser julgada nula e substituída por outra que dê integral cumprimento à “repetição do julgamento” nos termos que haviam sido “anteriormente” ordenados pelo Tribunal de Recurso e, bem assim, que atenda aos pedidos reclamados pelo Autor na sua Petição Inicial;
Mais detalhadamente,
3. A Decisão de que ora se recorre surge na sequência do Recurso apresentado pelas Recorridas, no qual, tendo as mesmas obtido ganho de causa, foi, em sequência, lavrado por este Venerando Tribunal de Recurso o Ac. n.º 710/2017, nos termos do qual se deixou sublinhado, para o que mais importa, o seguinte: “(...) Sucede, porém, que foi alegada matéria concernente aos dias de trabalho a que o autor terá faltado e que não foi quesitada, e que deverá constituir assim factualidade a que o tribunal “a quo” terá que voltar em sede de repetição de julgamento após a necessária quesitação (neste sentido, v.g. Acs. de 29/06/2017, Processos nºs 341/2017, 313/2017)”.
4. Daqui resulta que se impunha ao Tribunal a quo - em sede de “repetição do julgamento” - aditar à douta Base Instrutória, o(s) quesito(s) necessário(s) e referentes, nomeadamente: à concretização dos dias de trabalho efectivo - tendo em vista as ausências autorizadas, para além das férias gozadas - determinante para efeitos do cômputo da indemnização devida a título de subsídio de alimentação, trabalho por turnos e trabalho extraordinário trabalho prestado em dia de descanso semanal e descanso compensatório não gozados e à concretização dos dias de trabalho a que o Autor terá faltado.
5. Lamentavelmente, porém, não terá sido este o caminho seguido pelo Tribunal a quo aquando da selecção da matéria de facto com vista à “repetição do julgamento”, porquanto o mesmo se limitou apenas e tão-só a aditar à douta Base Instrutória um único quesito, nos termos que resultam do Despacho de fls. 502, o que se revela manifestamente insuficiente com vista à ordem de “repetição do julgamento”, tal qual decidido pelo Tribunal de Recurso;
Da reclamação à selecção da matéria de facto (art. 430.º, n.º 3 do CPC): da sua manifesta insuficiência:
6. Notificado do aditamento do referido quesito à douta Base Instrutória, o Autor apresentou uma Reclamação, tendo a mesma sido integralmente indeferida pelo Tribunal a quo - nos termos que resultam do Despacho de fls. 517;
7. Salvo o devido respeito, está o ora Recorrente em crer que, contrariamente ao que terá sido concluído pelo Tribunal a quo, a “repetição do julgamento” ordenada pelo Tribunal de Recurso impunha não só que fosse aditado à douta Base Instrutória o(s) quesito(s) necessário(s) à “concretização” dos “dias de trabalho efectivamente prestados” mas, igualmente, que fosse aditado o(s) quesito(s) com vista à “concretização” dos “dias de falta” e/ou “dias de ausência” do Autor ao longo da relação de trabalho com a Ré, porquanto se trata de matéria essencial com vista ao apuramento de determinadas “rúbricas”, como é o caso da compensação pelos dias de feriados obrigatórios, o que manifestamente não foi levado a cabo pelo Tribunal a quo;
8. O mesmo é dizer que mais do que a determinação de “quantos” dias de trabalho terá o Autor prestado, impunha-se ao Tribunal a quo a determinação de “quais” os dias em que o trabalho foi efectivamente prestado, contrariamente ao que terá sido a interpretação seguida pelo Tribunal de Primeira Instância;
9. Ora, o(s) único(s) quesito(s) aditado(s) à Base Instrutória são, na sua formulação, meramente “quantitativos” e, como tal, em caso algum se mostram idóneos a obter a “concretização” dos (quais) dias de trabalho prestado e dos (quais) dias de falta e de dispensa ao trabalho, conforme expressamente ordenado pelo Tribunal de Segunda Instância;
Acresce que,
10. Contrariamente ao que resulta do Despacho de fls. 517, em caso algum se aceita que o aditamento de apenas dois novos quesitos fosse “abrangente o suficiente” para, entre outro, concretizar quais e quantos os dias considerados no cálculo efectuado na sentença final objecto do referido recurso, atendendo às diferentes rúbricas em presença e, bem assim, para especificar em que dias concretos o Autor foi dispensado do trabalho e terá gozado férias;
11. De onde, ao proceder ao aditamento de apenas dois novos quesitos à douta Base Instrutória - com vista tão-só ao “apuramento dos concretos dias de trabalho efectivamente prestado”, mas sem que nada tivesse sido aditado ao nível da concretização dos “dias de falta e/ou “dias de ausência” - o Despacho de fls. 502 encontra-se manifestamente inquinado por uma insuficiência (leia-se, deficiência) ao nível da selecção da matéria de facto necessária à apreciação das várias questões a que o Tribunal a quo foi chamado a pronunciar-se e para as quais não ofereceu a respectiva e competente resposta;
12. Em conformidade, deve o Despacho de fls. 502 - que ordena o aditamento de dois singelos quesitos à Base Instrutória - ser julgado nulo e de nenhum efeito e, nos termos do art. 430.° do CPC, ser o mesmo substituído por outro que, v.g., defira o pedido de aditamento à douta Base Instrutória dos quesitos 25.º a 31.º nos termos anteriormente formulados pelo Autor, devendo ser ordenada a devolução dos autos ao Tribunal de Primeira Instância com vista à “repetição do julgamento” para que sobre os referidos quesitos se possa produzir a respectiva prova;
Sem prescindir,
13. Para a eventualidade de o douto Tribunal de Recurso concluir pela suficiência da matéria de facto constante da douta Base Instrutória com vista à “repetição do julgamento” conforme ordenado, está o ora Recorrente em crer que a matéria fáctica constante da Decisão Recorrida terá sido, com o devido respeito, incorrectamente julgada pelo Tribunal a quo e, bem assim, que a mesma enferma de uma manifesta falta de fundamentação traduzida numa clara contradição com a matéria de facto anteriormente julgada, razão pela qual se verifica um claro e manifesto erro de julgamento o que desde já e para os efeitos se invoca e requer;
14. Em concreto, a Decisão recorrida enferma de um manifesto vício de falta de fundamentação traduzido, desde logo, no facto de o Tribunal a quo não ter determinado - como lhe competia e havia sido ordenado pelo Tribunal de Recurso - quantos foram os dias de ausência e, bem assim, quantos foram os dias de faltas justificadas, porquanto tal concretização se mostra(va) essencial para o apuramento das várias quantias reclamadas pelo Autor na sua Petição Inicial;
Acresce que,
15. Da prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento a resposta aos quesitos 23 e 24 aditados à douta Base Instrutória (como “não provado”) e a sua concreta fundamentação teriam necessariamente de ser diferentes, visto conduzirem a um resultado decisório completamente díspar daquele em que assentou toda a “linha de pensamento” seguido pelo douto Tribunal de Recurso;
16. Ou melhor, a resposta oferecida pelo Tribunal a quo aos dois quesitos aditados à douta Base Instrutória (como “não provado”) mostra-se em total contradição com a matéria de facto anteriormente provada (e, de resto, já confirmada pelo douto Tribunal de Recurso) o que, por si só, se revela totalmente incompreensível e desrazoável e, nesta medida, incapaz de produzir qualquer tipo de efeitos;
Por último,
17. Sem perder de vista o Princípio da imediação e da livre apreciação da prova conferido ao julgador, está o ora Recorrente em crer que não deixa de se revelar “bizarra” a razão de ciência avançada pelo Tribunal a quo a respeito da falta de credibilidade da única testemunha ouvida em sede de “repetição de julgamento” - por sinal ou mera coincidência - a mesma testemunha que havia sido ouvida anteriormente aquando do primeiro julgamento e cuja “credibilidade” e “conhecimento directo dos factos” foi, de resto, já expressamente confirmada nos presentes autos pelo Tribunal de Recurso;
18. A este particular, vislumbra-se uma notória (e quiçá injustificada) disparidade ao nível da valoração do testemunho prestado pela mesma testemunha (ainda que em sede de “repetição do julgamento”), levando o ora Recorrente a concluir que: o que aos olhos do Tribunal de Segunda Instância se revelou ser um depoimento sério e imparcial, no olhar do Tribunal a quo se terá convalidado num depoimento não credível e inacreditável..., o que em caso algum se pode aceitar, pelo que também aqui se impõe uma reapreciação da matéria de facto, nos termos que resultam do disposto no art. 629.° co CPC, o que desde já e para os legais efeitos se invoca e requer.
*
A B (B) e a C (C), Rés, ora Recorridas, notificadas do recurso interposto pelo Autor, vieram a apresentar a sua resposta (fls. 575 a 602), tendo formulado as seguintes conclusões:
1 - Vem o recurso a que ora se responde interposto da douta decisão proferida a final pelo Juízo laboral do Tribunal Judicial de Base e pela qual a acção foi julgada improcedente por não provada e em consequencia absolvidas as Rés, B e C e aqui Recorridas, do pedido “sem prejuízo dos outros que já foram decididos pelo presente Tribunal e foram confirmados pelo douto Acórdão do Tribunal de Segunda Instância, nomeadamente a condenação relativa aos subsídios de efectividade e de comparticipação no alojamento.”.
2 - Estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões do Recorrente e não sendo lícito ao tribunal de recurso conhecer de matérias nelas não incluídas, salvo as de conhecimento oficioso, as questões a decidir são (i) a Nulidade do despacho de fls. 502; (ii) o Erro de julgamento por falta de fundamentação da decisão; (iii) o Erro de Julgamento por contradição com a matéria de facto julgada, e (iv) a Reapreciação da matéria de facto, mas como se verificará ao longo da presente resposta, as teses do Recorrente carecem de qualquer fundamento, devendo o recurso a que ora se responde improceder.
3 - O primeiro fundamento do recurso do Autor prende-se com a nulidade do despacho de fls. 502, alegando o Recorrente que o aludido despacho se encontra “[...] inquinado por uma insuficiência (leia-se deficiência) ao nível da selecção da matéria de facto necessária à apreciação das várias questões a que o Tribunal a quo foi chamado a pronunciar-se e para as quais não ofereceu a respectiva e competente resposta” (cfr. conclusão 11), e acrescentando que “em conformidade, deve o Despacho de fls. 502 - que ordena o aditamento de dois singelos quesitos à Base Instrutória - ser julgado nulo e de nenhum efeito [...]” (cfr. conclusão 12).
4 - Ora, não só o dito despacho não padece de qualquer nulidade, como também não poderia o Autor vir impugná-lo em sede de recurso., já que do teor do dito despacho consta que: “Vi o douto acórdão. Para o cumprir, procederá à repetição do julgamento apenas relativamente ao facto relativos aos concretos dias de trabalho efectivamente prestado pelo Autor, sem prejuízo da parte da decisão que não esteja viciada (o art. 629º n° 4 do CPC).Para esses efeitos, manda-se a ampliação da base instrutória da causa com os quesitos novos seguintes:
23º
Entre 18/10/1996 e 21/07/2003, o Autor prestou 2258 dias do trabalho efectivo junto da 1ª Ré?
24º
Entre 22/07/2003 e 05/09/2005, o Autor prestou 625 dias do trabalho efectivo junto da 2ª Ré?
Em reclamação ou ofereça provas ou diligencias probatórias.”.
5 - Salvo o devido respeito, o recurso contra este despacho de fls. 502 - despacho que selecciona a matéria de facto - não encontra acolhimento legal, pois conforme resulta do preceituado no artigo 430º do CPC, seleccionada a matéria de facto - o que o Tribunal a quo fez a tis. 502 dos autos - as partes podem reclamar, podendo recorrer apenas do despacho que decide a reclamação sendo in casu, o que se encontra a fls. 517 e tanto quanto resulta dos pontos 5 a 12 das conclusões de recurso, o Recorrente não o impugnou, insurgindo-se apenas contra o despacho de fls. 502, ou seja, do despacho que selecciona a matéria de facto, decisão que não é recorrível. Pelo que, o Recurso a que ora se responde não poderá senão improceder nesta parte.
6 - Mas ainda que assim se entenda que o Recorrente não recorre do despacho que selecciona a matéria de facto - ou seja, do despacho de fls. 502 - mas sim do despacho que decidiu a reclamação por si apresentada - ou seja do despacho de fls. 517 - o que não se concede - ainda assim o recurso não poderá proceder por falta de fundamento, isto porque entende o Recorrente que a matéria seleccionada pelo Tribunal a quo não se mostra suficiente para a decisão da causa, nomeadamente, para determinar “quais” os dias em que o trabalho foi prestado, e que por isso o Tribunal a quo não deu cabal cumprimento ao decidido por esse Venerando Tribunal de Segunda Instância, requerendo que sejam aditados à Base Instrutória sete novos factos.
7 - Argumenta o Recorrente que tais factos permitiriam não só concretizar o número de dias de trabalho efectivamente prestado mas também concretizar os dias de falta e/ou dias de ausência do Autor ao longo da relação laboral com as Rés, no entanto, as oras Recorridas discordam do entendimento do Recorrente, estando em crer que andou bem o Tribunal a quo na selecção da matéria levada a julgamento, já que conforme notou bem o Tribunal a fls. 517 dos autos “[...] o(s) novo(s) quesito(s) aditado(s) pelo Tribunal é(são) abrangente(s) e já é(são) suficiente(s) para a concretização de quais e quantos os dias [...]” em que o Recorrente trabalhou, ao que acresce que a matéria cuja inclusão no questionário foi requerida não resulta nenhuma outra concretização dos dias em que o mesmo foi dispensado de trabalhar ou gozar férias.
8 - O Recorrente não alegou concretamente quais foram os dias em que trabalhou e quais foram os dias em que foi dispensado de trabalhar, tendo antes optado por, de forma vaga e imprecisa, alegar que trabalhou todos os dias do ano menos uma média de 30 dias, pelo que não pode agora conceber uma concretização que não resulta dos autos, sendo ainda que, três dos quesitos que o Recorrente pretendia ver aditados à base instrutória já constavam do douto despacho saneador de fls. 165 a 169 verso - quer porque um foi dado por assente sob a alínea D) e os outros dois sob os artigos 17° e 19° da base instrutória.
9 - Por outro lado, não pode deixar de se notar que o Tribunal a quo ao quesitar se “Entre 18/10/1996 e 21/07/2003, o Autor prestou 2258 dias do trabalho efectivo junto da 1ª Ré” e se “Entre 22/07/2003 e 05/09/2005, o Autor prestou 625 dias do trabalho efectivo junto da 2ª Ré” mais não fez do que levar em conta a média dos 30 dias e dos 76 dias que o Autor terá sido dispensado de trabalhar para as Recorridas, sendo por isso desnecessário aditar tais factos ao questionário uma vez que o número de dias de trabalho efectivo - 2258 e 625 dias - resultam do alegado pelo Recorrente nos artigos 38° e 42° da Petição Inicial e os quesitos levados a julgamento reflectem cabalmente o que foi alegado pelo Recorrente, tendo o douto Tribunal a quo cumprido na íntegra o que havia sido ordenado por esse Venerando Tribunal de Segunda Instância.
10 - O Meritíssimo Juiz a quo procurou apurar os concretos dias de trabalho efectivamente prestados pelo Autor, sem que isso, no entanto, tenha sido possível em virtude da falta de prova em audiência de discussão e julgamento, pelo que o Recorrente não poderá apontar qualquer vício à selecção da matéria de facto feita pelo Tribunal a quo, a qual foi efectuada em rigoroso cumprimento do que foi superiormente decidido, pelo que o Recurso a que ora se responde não poderá senão improceder.
11 - Por outro lado, na óptica do Recorrente a «Decisão recorrida enferma por um manifesto vício de falta de fundamentação - nos termos em que o mesmo foi apontado pelas Recorridas (então Recorrentes) a Decisão originariamente proferida pelo Tribunal a quo e que justificou, como se sabe, a “repetição do julgamento” [...]» no entanto, tal alegação apenas pode resultar da incompreensão do Recorrente em face do que foi alegado pelas aqui Recorridas em relação à decisão originariamente proferia pelo Tribunal, e que não tem qualquer paralelismo nem pode ser usado para atacar a decisão ora proferida já que na sentença inicialmente proferida nos autos, não obstante não se ter trazido para a discussão da causa o número de dias de trabalho prestado pelo Autor, foram as Rés condenadas a pagar diversas verbas com base nesse número de dias sem que se tivesse ao certo percebido como chegou o Tribunal a essa conclusão e o mesmo não se aplica à decisão ora posta em crise, isto porque foi levada à discussão da causa o número de dias de trabalho que terão efectivamente sido prestados pelo Autor.
12 - E estando os dias de “ausência” e/ou “faltas justificadas” reflectidos nos quesitos 23° e 24° da base instrutória porquanto, tal como se disse, o Tribunal a quo ao quesitar se o Autor prestou 2258 dias de trabalho para a Recorrida B e 625 dias de trabalho efectivo para a Recorrida C, teve em consideração “a média de 30 dias e 76 dias por cada ano civil correspondente ao número de dias de dispensa remunerados e/ou não remunerados nos quais o Autor terá sido dispensado da prestação de trabalho.” tal como tinha sido alegado pelo Autor no seu petitório, o Recorrente, no entanto, não logrou provar esse facto.
13 - Pois foi a falta de prova do número de dias de trabalho efectivo que conduziu a acção à sua improcedência, já que no âmbito da matéria vertida nos quesitos 23° e 24° o Tribunal a quo inquiriu a testemunha de forma exaustiva quanto aos descansos semanais, feriados obrigatórios e férias anuais que foram gozados pelo Autor e sobre esta matéria foi a testemunha incapaz de concretizar esses dias, impedindo o Tribunal de formar uma convicção positiva e assim dar procedência ao pedido, sendo que na decisão sobre a matéria de facto e no fundamento sobre a convicção, o Tribunal a quo refere que “Muito embora a testemunha diga que o Autor não pôde dar qualquer falta ao trabalho, não leva ao Tribunal acreditar essa parte do depoimento, tendo em conta que, pelas instancias do Tribunal, a mesma não tem certeza até nem sabia em que dias ou período o Autor tenha prestado trabalho, nomeadamente nos dias de feriado obrigatório ao longo dos anos, e em que dias ou período o mesmo tenha dado faltas ou tenha gozado férias anuais ou descansos semanais.”.
14 - Tendo o Tribunal fundamentado cabalmente a sua convicção e decisão, evidenciando a sentença que: «[...] tendo-se realizado a repetição do julgamento nos termos definidos no douto acórdão, não se provam em que datas concretas, incluindo os dias concretos de feriado obrigatório, é que o Autor prestou trabalho, nem os concretos dias de trabalho efectivamente prestado pelo Autor (...). Isto quer dizer que, uma vez que não se provam nem se apuram os concretos dias de trabalho efectivamente prestado pelo Autor, não deixa de ser julgado improcedente, em vez de relegar a liquidação para a execução da sentença, a acção intentada pelo Autor [...]» retirando-se daqui que a decisão recorrida está devidamente fundamentada e a sua fundamentação é suficiente, inequívoca, clara e esclarecedora, não estando inquinada do vício de falta de fundamento, pelo que, também nesta parte o recurso a que ora se responde terá de improceder.
15 - Alega ainda o Recorrente que a resposta aos quesitos 23° e 24° - não provado - oferecida pelo Tribunal a quo ao deverá ser declarada nula e de nenhum efeito, porquanto a mesma se encontra em manifesta e notória contradição com a restante matéria constante da douta base instrutória e já anteriormente apreciada e confirmada nos autos, no entanto, estão as Recorridas em crer que essa contradição - a existir, o que não se concede - deveria ter sido invocada em sede de reclamação ao despacho que decida a matéria de facto ao abrigo do disposto no artigo 556°, nº 5 do CPC ex vi artigo 1° do CPT, e não em sede de recurso, já que em sede de recurso o Recorrente pode impugnar a matéria de facto mas terá de o fazer nos termos que impõe os artigos 599° e 629° do CPC, especificando quais os concretos pontos da matéria de facto que considera incorrectamente julgados e quais os meios probatórios constantes do processo ou de registo nele realizado que impunham, sobre essa matéria decisão diversa, mais indicando as passagens da gravação em que se funda o erro, não bastando ao Recorrente invocar que as respostas aos quesitos 23° e 24° devem ser declaradas nulas e de nenhum efeito por contraditória à restante matéria, já que não demonstrou o Recorrente com que factos as respostas aos quesitos 23° e 24° colidem, pelo que nesta parte o Recurso terá também de improceder.
16 - Veio ainda o Recorrente requerer a reapreciação da prova produzida; documental e testemunhal, considerando, na sua óptica, que o Douto Tribunal a quo deveria ter dado resposta diferente aos quesitos 23° e 24° da douta base instrutória, colocando em crise a decisão do Tribunal quanto ao julgamento da matéria de facto, e requer a reapreciação da prova nos termos do artigo 629° do CPC.
17 - É manifesto que o Recorrente faz afirmações vagas, mas não impugnatórias e não especifica quais os pontos da matéria de facto que considera incorrectamente julgados pelo douto Tribunal a quo, nem indica qual a resposta que se imporia relativamente aos quesitos da Base Instrutória que alegadamente queria impugnar, nomeadamente os quesitos 23° e 24° nem para tanto especifica quais os meios probatórios, constantes dos autos, que impunha, sobre esses pontos da matéria de facto, decisão diversa da recorrida, nem indica, tal como está obrigado, as passagens da gravação da prova em que se funda o alegado erro na apreciação da prova.
18 - Aliás neste sentido vão vários arestos deste Venerando Tribunal de Segunda Instancia tais como o Acórdão de 07/07/2016, proferido no âmbito do processo n.º 988/2015 e o Acórdão 23/06/2016 no âmbito do processo n.º 794/2015, sendo que face ao supra exposto, não tendo o Recorrente cumprido com o ónus que se lhe impunha, outra não poderá ser a decisão do Tribunal as quem senão a de rejeitar o presente recurso, por violação do disposto no artigo 599.° do CPC, o que desde já se requer.
19 - Não resulta da prova testemunhal produzida em sede de repetição do julgamento nem da prova documental junta aos autos nada que pudesse levar à concretização de quantos e quais os dias o Recorrente trabalhou efectivamente para as Recorridas pelo que as respostas aos quesitos 23° e 24° nunca poderiam ter sido outras, pelo que as mesmas respostas não merecem qualquer censura, importando não perder de vista o que se preceitua no artigo 558°, nº 1 do CPC, o qual vem consagrar o princípio da livre apreciação das provas: “O tribunal aprecia livremente as provas, decidindo os juízes segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto.”, já que segundo este princípio o tribunal aprecia livremente as provas, sem qualquer grau de hierarquização, nem preocupação quanto à natureza de qualquer delas, e fixa a matéria de facto em sintonia com a convicção que tenha firmado acerca de cada facto controvertido e no que respeita ao julgamento da matéria de facto em Segunda Instância, há que ter ainda em atenção que é jurisprudência uniforme que o princípio da livre apreciação das provas, ou do julgamento livre, não pode ser subvertido pela garantia do duplo grau de jurisdição, nem pode significar a desvalorização da sentença de 1ª instância, que passaria a ser uma espécie de “ensaio” do verdadeiro julgamento a efectuar pelo Tribunal de Segunda Instância, e a este respeito, veja-se o que foi decidido no Acórdão proferido pelo Venerando Tribunal de Segunda Instância no processo nº 870/2017 de 11/01/2018.
20 - Fazendo uso das palavras escritas num dos vários Acórdãos produzidos sobre esta matéria por este Venerando Tribunal uma coisa é não agradar ao Autor o resultado que o tribunal a quo fez da prova; outra, bem diferente, é detectarem-se erros no processo de formação da convicção do julgador, e esses, de facto, não se encontram e se é certo que o Tribunal de Segunda Instância julgou já credível o depoimento da testemunha “sobre a matéria que lhe foi questionada” no primeiro julgamento, não é menos certo que nesse mesmo julgamento nunca a mesma havia sido confrontada com a concretização do número de dias em que o Autor aqui Recorrente trabalhou.
21 - Apenas agora essa questão foi suscitada e sobre isso entendeu o Tribunal a quo não julgar credível o seu depoimento porquanto “(...) como é que um guarda de segurança normal conseguirá saber e relembrar tudo, nomeadamente conseguirá saber e relembrar os trabalhos quotidianos da cada um dos seus colegas (cerca de centenas de pessoas!) ao longo dos anos?? É completamente impossível e, pois, inacreditável. Isto só leva a ter, conforme a regra de experiência da vida, uma conclusão de que a testemunha só acredita e acha subjectivamente o referido “facto” mas não depõe objectivamente o mesmo com a sua memória e com o que ela presenciou. (...)” tudo conforme melhor consta da decisão da matéria de facto na parte relativa à convicção do Tribunal.
22 - A verdade é que, está a Recorrida em crer que o Tribunal de Segunda Instância não poderá, em face da prova produzida em novo julgamento, procurar uma nova convicção, nem pôr em causa a convicção feita por um julgador em detrimento da convicção de outro, apenas lhe restando apreciar se foi violado qualquer princípio ou regra de direito probatório no caminho que levou à formação da convicção e, in casu, a resposta só pode ser negativa, pois que não existem quaisquer razões que permitam pôr em causa a razoabilidade da convicção do tribunal a quo, pelo que a decisão do julgamento da matéria de facto se mostra assim inatacável, inexistindo qualquer fundamento para que a mesma seja alterada nos termos pretendidos pelo Recorrente, pelo que também nesta parte não poderá o recurso proceder.
*
Foram colhidos os vistos legais.
Cumpre analisar e decidir
* * *
II – PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
Este Tribunal é o competente em razão da nacionalidade, matéria e hierarquia.
O processo é o próprio e não há nulidades.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária e são dotadas de legitimidade “ad causam”.
Não há excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
* * *
III – FACTOS ASSENTES:
A sentença recorrida deu por assente a seguinte factualidade:
Entre 18 de Outubro de 1996 e 21 de Julho de 2003, o Autor esteve ao serviço da 1.ª Ré (B), prestando funções de “guarda de segurança”,enquanto trabalhador não residente (Cfr. doc. 2). (A)
O Autor foi recrutado pela Sociedade D – Serviço de Apoio e Gestão Empresarial Cia, Lda - Serviço de Apoio e Gestão Empresarial Cia, Lda. - e exerceu a sua prestação de trabalho ao abrigo do Contrato de Prestação de Serviços n.º 2/96, aprovado pelo Despacho n.º 687/IMO/SAEF/96, de 25/03/96 (Cfr. doc. 3 e 4). (B)
Entre 22/07/2003 a 05/09/2005, o Autor esteve ao serviço da 2.a Ré(C), prestando funções de “guarda de segurança”, enquanto trabalhador não residente. (C)
Ao longo do período que prestou trabalho, o Autor gozou de vários períodos de dispensa ao trabalho remunerados e/ou não remunerados.(D)
Durante o período que prestou trabalho, as Rés pagaram ao Autor aquantia de HKD$7,500.00, a título de salário de base mensal. (E)
Durante todo o período da relação de trabalho com as Rés, o Autor prestou a sua actividade num regime de turnos rotativos. (F)
Durante todo o período da relação de trabalho, o Autor exerceu a sua actividade para a l.ª Ré (B) num regime de 3 turnos rotativos de 8horas por dia:
Turno A: (das 08h às 16h)
Turno B: (das 16h às 00h)
Turno C: (das 00h às 08h) (G)
Por força do Despacho n.º 01949/IMO/SEF/2003, do Senhor Secretário para a Economia e Finanças da RAEM, de 17/07/2003, foi autorizada a transferência das autorizações concedidas para a contratação do Autor (e dos demais 280 trabalhadores não residentes) por parte da 1.ª Ré (B)para a 2.ª Ré (C), com efeitos a partir de 21/07/2003 (Cfr. Doc. 5). (1.º)
Resulta do ponto 3.1. do Contrato de Prestação de Serviços n.º 2/96,ser devido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes com ele contratados) a quantia de “ (…) $20,00 patacas diárias por pessoa, a título de subsídio de alimentação”. (2.º)
Entre 18/10/1996 e 21/07/2003, a 1.ª Ré (B) nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de alimentação ou nunca entregou ao Autor qualquer tipo de alimentos e/ou géneros. (3.º)
Entre 22/07/2003 a 05/09/2005, a 2.a Ré (C) nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de alimentação. (4.º)
Resulta do ponto 3.3. do Contrato de Prestação de Serviços n.º 2/96,que “ (...) decorridos os primeiros 30 dias de prestação de trabalho por parte do trabalhador (leia-se o Autor), este terá direito, para além da remuneração supra referida, às bonificações ou remunerações adicionais que a 1.º outorgante (leia-se, as Rés) paga aos operários residentes no Território”. (5.º)
Entre 18/10/1996 a 21/07/2003, a 1.ª Ré (B) nunca pagou ao Autor quaisquer bonificações ou remunerações adicionais, incluindo gorjetas. (6.º)
Resulta do ponto 3.4. do Contrato de Prestação de Serviços n.º 2/96,ser devido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes com ele contratados) “ (...) um subsídio mensal de efectividade igual ao salário de4 dias, sempre que 110 mês anterior não tenha dado qualquer falta ao serviço”. (7.º)
Durante todo o período em que o Autor prestou trabalho, o Autor nunca deu qualquer falta ao trabalho sem conhecimento e autorização prévia por parte das Rés. (8.º)
Entre 18/10/1996 a 21/07/2003, a 1.ª Ré (B) nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de efectividade. (9.º)
Entre 22/07/2003 a 05/09/2005, a 2.a Ré (C) nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de efectividade. (10.º)
Entre 18/10/1996 e 31/12/2002, a 1.ª Ré (B) nunca fixou ao Autor, em cada período de sete dias, um período de descanso de vinte e quatro horas consecutivas, sem prejuízo da correspondente retribuição. (11.º)
A 1.ª Ré (B) nunca concedeu ao Autor um período de descanso consecutivo de quatro dias por cada conjunto de quatro semanas ou fracção, sem prejuízo da correspondente retribuição. (12.º)
A 1.ª Ré (B) nunca fixou ao Autor um outro dia de descanso compensatório em consequência do trabalho prestado em dia de descanso semanal. (13.º)
A 1.ª Ré (B) nunca conferiu ao Autor um qualquer outro dia de descanso compensatório. (14.º)
Durante o período em que o Autor prestou trabalho, as Rés procederam a uma dedução no valor de HKD750,00.00 sobre o salário mensal do Autor, a título de “comparticipação nos custos de alojamento”.(15.º)
Aquando da contratação do Autor no Nepal, foi garantido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes de origem Nepalesa) alojamento gratuito em Macau. (15.º-A)
A referida dedução (de HK$750.00) no salário do Autor era operada de forma automática, e independentemente de o trabalhador (leia-se, do Autor) residir ou não na habitação que lhe era providenciada pelas Rés e/ou pela agência de emprego. (l5.º-B)
As Rés nunca pagaram ao Autor qualquer quantia (em singelo e/ou adicional) pelo trabalho prestado pelo Autor durante os dois períodos de 8 horas cada prestado num período de 24 horas, em cada ciclo de 21 dias de trabalho contínuo e consecutivo. (16.º)
Entre 18/10/1996 e 21/07/2003 o Autor prestou a sua actividade durante feriados obrigatórios para a 1.ª Ré. (17.º)
A 1.ª Ré (B) nunca pagou ao Autor uma qualquer quantia adicional (leia-se, um qualquer acréscimo salarial) pelo trabalho prestado nos referidos dias de feriado obrigatórios. (18.º)
Entre 22/07/2003 e 05/09/2005 o Autor prestou a sua actividade durante feriados obrigatórios para a 2.a Ré. (19.º)
A 2.ª Ré (C) nunca pagou ao Autor qualquer quantia adicional(leia-se, qualquer acréscimo salarial) pelo trabalho prestado nos referidos dias de feriado obrigatórios. (20.º)
Por ordem das Rés, o Autor estava obrigado a comparecer no seu local de trabalho devidamente uniformizado com, pelo menos, 30 minutos de antecedência relativamente ao início de cada turno. (21.º)
Durante todo o período da relação de trabalho, o Autor nunca se ausentou do trabalho (isto é, dos locais de reunião) que antecediam em, pelo menos, o início de cada turno. (22.º).
*
IV ‒ FUNDAMENTAÇÃO
Como o recurso tem por objecto a sentença proferida pelo Tribunal de 1ª instância, importa ver o que o Tribunal a quo decidiu. Este afirmou na sua douta decisão:
I – RELATÓRIO
A (cuja identificação consta dos autos), veio intentar a presente Acção de Processo Comum do Trabalho contra 1ª Ré-B, SARL, (adiante, B) e 2ª Ré-C, (adiante, C) (cuja identificação consta dos autos), concluiu pedindo que seja julgada procedente por provada a presente acção e, em consequência ser a 1ª Ré condenada a pagar ao Autor:
a) MOP$45.160,00, a título de subsídio de alimentação, acrescido de juros legais até integral e efectivo pagamento;
b) MOP$32.800,00, a título de subsídio de efectividade, acrescido de juros legais até integral e efectivo pagamento;
c) MOP$150.000,00, pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal, nos termos da al. a) do n.º 6 do art. 17.º do DL n.º 24/89/M, acrescida de juros até efectivo e integral pagamento;
d) MOP$75.000,00, por falta de marcação e gozo de um dia de descanso compensatório pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal, nos termos do n.º 4 do art. 17.º do DL n.º 24/89/M, acrescida de juros até efectivo e integral pagamento;
e) MOP$26.250,00 a título de trabalho prestado em dia de feriado obrigatório remunerado, nos termos do n.º 3 do art. 18.º do DL n.º 24/89/M, acrescida de juros até efectivo e integral pagamento;
f) O montante correspondente às bonificações ou remunerações adicionais incluindo as gorjetas que a Ré pagou aos operários residentes, a determinar nos termos do artigo 392.º, n.º 1, alínea c) ou alínea b) a liquidar em execução de sentença, por força do disposto no artigo 564.º, n.º 2 do Código de Processo Civil, ex vi art. 1.º do CPT;
g) MOP$61.500,00 a título de devolução das quantias de comparticipação no alojamento descontadas pela 1.ª Ré (SDTM);
h) MOP$37.500,00, pelas 16 horas de trabalho prestadas para além do período normal de trabalho em cada ciclo de 21 dias de trabalho;
i) MOP$37.500,00, pela prestação de 30 minutos de trabalho para além do período normal diário por cada dia de trabalho efectivo;
j) Em custas e procuradoria condigna.
E, em consequência ser a 2ª Ré condenada a pagar ao Autor:
a) MOP$12.500,00, a título de subsídio de alimentação, acrescido de juros legais até integral e efectivo pagamento;
b) MOP$10.000,00, a título de subsídio de efectividade, acrescido de juros legais até integral e efectivo pagamento;
c) MOP$8.250,00 a título de trabalho prestado em dia de feriado obrigatório remunerado, nos termos do n.º 3 do art. 18.º do DL n.º 24/89/M, acrescida de juros até efectivo e integral pagamento;
d) MOP$18.750,00, a título de devolução das quantias de comparticipação no alojamento descontadas pela 2.ª Ré (C);
e) MOP$11.500,00, pelas 16 horas de trabalho prestadas para além do período normal diário em cada ciclo de 21 dias de trabalho;
f) MOP$11.500,00, pela prestação de 30 minutos de trabalho para além do período normal diário por cada dia de trabalho efectivo;
g) Em custas e procuradoria condigna.
Juntou os documentos constantes de fls. 31 a 45.
*
Realizada a tentativa de conciliação pelo MP, não chegou a acordo entre as partes.
*
As Rés contestaram a acção com os fundamentos constantes de fls. 88 a 122 dos autos.
*
Realiza-se a audiência de discussão e de julgamento com observação de todo o formalismo legal, proferindo o presente Tribunal a sentença constante das fls. 319 a 329.
*
Tendo interposto o recurso, veio o Venerando Tribunal de Segunda da Instância proferiu o douto acórdão das fls. 464 a 490, decidindo, entre outros, anular parcialmente o julgamento de forma a apurar os concretos dias de trabalho efectivamente prestado para fixar-se a compensação relativa aos subsídios de alimentação e às importâncias devidas a título de trabalho prestado em dias de feriados obrigatórios, de descanso semanal (nos termos definidos nesse aresto), descanso compensatório, trabalho extraordinário e por turnos.
*
Para cumprir o douto acórdão, aditam-se os novos quesitos e realiza-se a repetição do julgamento a eles referente.
*
Observando de todo o formalismo legal, cumpre decidir.
*
II – PRESSSPOSTOS PROCESSUAIS
O Tribunal é competente em razão da matéria, hierarquia e internacional.
O processo é próprio.
As partes gozam de personalidade e capacidade jurídicas e são legítimas.
Não existem excepções, nulidades ou outras questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
*
III – FACTO
(…)
*
IV – FUNDAMENTO DE DIREITO
No douto acórdão do Venerando Tribunal de Segunda da Instância dos presentes autos, acordam-se em:
“…1 – Negar provimento ao recurso interlocutório interposto pelas Rés.
2 – Conceder provimento parcial ao recurso interposto pelas rés e, em consequência:
a) Anular parcialmente a sentença de forma a apurar os concretos dias de trabalho efectivamente prestado e a poder fixar-se a compensação relativa aos subsídios de alimentação, bem como as importâncias devidas a título de trabalho prestado em dias de descanso semanal, descanso compensatório, trabalho extraordinário e por turnos e feriados obrigatórios;
b) Revogar o decidido quanto ao pedido relativo a bonificações adicionais, incluindo gorjetas e, consequentemente, absolver a Ré da instância nessa parte;
2.1 – Julgar não provido o recurso na parte restante, em consequência do que se mantém a sentença recorrida, nomeadamente na parte concernente à liquidação a que já procedeu quanto ao subsídio de efectividade e à comparticipação no alojamento.
3 – Conceder provimento ao recurso do autor e, em consequência, revogar a sentença na parte respectiva e condenar a 1ª ré B no pagamento dos períodos de trabalho prestado em dias de descanso semanal e aos feriados obrigatórios de acordo com as fórmulas acima referidas, bem como os períodos de 30 minutos antes de cada turno laboral, cujo “quantum” concreto, porém, será apurado em conformidade com o que vier a ser decidido após a repetição parcial do julgamento, nos termos acima definidos….”
Essa repetição do julgamento compreende o apuramento os concretos dias de trabalho efectivamente prestado, destinando-se a fixar a compensação relativa aos subsídios de alimentação e às importâncias devidas a título de trabalho prestado em dias de feriados obrigatórios, de descanso semanal, descanso compensatório, trabalho extraordinário e por turnos.
Para os efeitos, definem-se nos fundamentos do mesmo acórdão os termos seguintes:
“…B – Do recurso da sentença interposto pelo autor
1 – Do trabalho prestado em dias de descanso semanal
Insurge-se o recorrente contra a fórmula de cálculo que o tribunal “a quo” utilizou para a compensação devida pelo serviço prestado pelo autor nos dias que deveriam ser de descanso semanal. O tribunal apenas conferiu ao autor um valor de salário em singelo, quando na opinião deste deveriam ser dois.
Tem razão o recorrente.
Sobre este assunto, tem este TSI vindo a decidir de forma insistente (v.g., ver os Acs. TSI de 15/05/2014, Proc. nº 61/2014, de 15/05/2014, Proc. nº 89/2014, de 29/05/2014, Proc. nº 627/2014; 29/01/2015, Proc. nº 713/2014; 4/02/2015, Proc. nº 956/2015; de 8/06/2016, Proc. nº 301/2016; de 6/07/2017, Proc. nº 405/2017) que a fórmula utilizada pelo TJB não é mais correcta.
Com efeito, no que a este assunto concerne, vale o disposto no art. 17º, nºs 1, 4 e 6, al. a), do DL nº 24/89/M.
Nº1: Tem o trabalhador direito a gozar um dia de descanso semanal, sem perda da correspondente remuneração (“sem prejuízo da correspondente remuneração”).
Nº4: Mas, se trabalhar nesse dia, fica com direito a gozar outro dia de descanso compensatório e, ainda,
Nº6: Receberá em dobro da retribuição normal o serviço que prestar em dia de descanso semanal.
Portanto, como o trabalhador trabalhou o dia de descanso semanal terá direito ao dobro do que receberia, mesmo sem trabalhar (n.º 6, al. a)).
Como remunerar, então, este dia de trabalho prestado em dia que seria de descanso semanal?
Ora bem. Numa 1ª perspectiva, se o empregador pagou o valor devido (pagou o dia de descanso que sempre teria que ser pago), falta pagar o trabalho prestado. E como o prestado é pago em dobro, tem o empregador que pagar duas vezes a “retribuição normal” (o diploma não diz o que seja retribuição normal, mas entende-se que se refira ao valor remuneratório correspondente a cada dia de descanso, que por sua vez corresponde a um trinta avos do salário mensal).
Numa 2ª perspectiva, se se entender que o empregador pagou um dia de salário pelo serviço prestado, continuam em falta:
- Um dia de salário (por conta do dobro fixado na lei), e ainda,
- O devido (o valor de cada dia de descanso, que não podia ser descontado, face ao art. 26º, n.º 1);
E, em qualquer caso, sem prejuízo da remuneração correspondente ao dia de “descanso compensatório” a que se refere o art. 17º, nº4 - desde que peticionada, como foi o caso, - quando nele se tenha prestado serviço (neste sentido, v.g., Ac. TSI, de 15/05/2014, Proc. nº 89/2014).
Quanto à remuneração pelo dia de descanso semanal, temos, portanto, que a fórmula a utilizar será sempre AxBx2.
Não faria, aliás, sentido que fosse de outra maneira. Na verdade, se o trabalhador, mesmo sem prestar serviço nesse dia de descanso (v.g., domingo), sempre auferiria o correspondente valor (a entidade patronal não lho poderia descontar, visto que o salário é mensal), não faria sentido que, indo trabalhar nesse dia, apenas passasse a receber em singelo o trabalho efectivamente prestado. Seria injusto que apenas se pagasse ao trabalhador esse dia de serviço, que deveria ser de folga e descanso. Que vantagem teria então o trabalhador por prestar serviço a um domingo, se, além do que receberia mesmo sem trabalhar, apenas lhe fosse pago o valor do trabalho efectivamente prestado nesse dia de folga como se tratasse de uma dia normal de trabalho?!
Por isso é que o legislador previu que o trabalho efectivamente prestado nesses dias pelo trabalhador, além do valor que já lhes seria devido em qualquer caso, fosse compensado em dobro pelo valor da retribuição normal diária. Quando a lei fala em dobro refere-se, obviamente, à forma de remunerar esse serviço efectivamente prestado nesses dias de descanso, sem prejuízo, como é bom de ver, do valor da remuneração a que sempre teria direito correspondente a cada um desses dias de descanso e que já recebeu.
Significa isto, assim, que a 1ª instância não poderia ter descontado o valor em singelo já recebido pelo recorrente.
Mas, por outro lado, não temos a certeza de que este seja o valor correcto, tendo em atenção de que ele não terá em conta os períodos de dispensa ao serviço, conforme facto provado nº 4 (alínea D).
Assim, e sem deixar de considerar a fórmula de cálculo acima definida, será caso para apuramento em sede própria quanto ao quantum compensatório, face à anulação parcial da sentença com vista à ampliação da matéria de facto e repetição de julgamento nessa parte (neste sentido, v.g. Acs. de 29/06/2017, Processos nºs 341/2017, 313/2017).
*
2 – Do trabalho em dias de feriado obrigatório
A sentença, neste passo, considerou que o autor tinha direito a receber por cada dia de feriado obrigatório não gozado um acréscimo salarial nunca inferior ao dobro, a que haveria que deduzir-se o montante em singelo já pago por cada dia de serviço efectivamente prestado.
Simplesmente, por não se ter apurado quais os dias de feriado obrigatório em que prestou trabalho, relegou a sua liquidação para execução de sentença.
O autor, ora recorrente, não se insurge contra a circunstância de ter sido relegada a liquidação do valor indemnizatório a este título para execução de sentença, mas sim, e apenas, contra a parte em que o tribunal decidiu que a prestação do trabalho deveria ser compensada apenas com mais um salário diário por cada dia de feriado não gozado.
Repare-se no que foi dito, por exemplo, no acórdão proferido no Proc. deste TSI nº 824/2012, em 15/12/2012:
“Esta lei trouxe inovações: introduziu uma indemnização especial, chamemos-lhe assim, que a lei anterior não previa e alargou o leque dos dias feriados remunerados, pois aos previstos na lei anterior, somaram-se agora os três dias do Ano Novo Chinês (cfr. art. 19º, n.3). Portanto, o gozo desses dias é feito, não apenas sem perda de remuneração (já era assim na lei anterior), como ainda deve ser extraordinariamente compensado.
Se o trabalhador prestar serviço nesses dias, diz o diploma, além da remuneração normal, receberá ainda um acréscimo salarial não inferior ao dobro da retribuição normal (art. 20º, n. 1). O que quer dizer “não inferior”? Quer dizer que pode ser igual, mas não descer desse limite. E até pode ser superior, mas nesse caso só o empregador poderá fixar o valor, singularmente ou por acordo com o empregado. O que não pode é o tribunal, arbitrariamente subir acima dessa barreira.
Aqui chegados, de novo pensemos nas duas perspectivas acima avançadas: a de o trabalhador ter sido pago pelo valor do devido e a de ter sido remunerado pelo valor do serviço prestado. É bom que se equacionem estas duas acepções para se ver até que ponto a solução pode diferir.
1ª Perspectiva (pagamento do devido)
O empregador pagou ao trabalhador o valor remuneratório que, pela lei, sempre lhe seria devido (ou seja, pagou a “remuneração correspondente aos feriados…”: art. 19º, n.3, até porque não lhos podia descontar: art.26º, n.1).
Sendo assim, falta pagar ao trabalhador o seguinte: a remuneração do trabalho efectivamente prestado (um dia de salário), mais um acréscimo em dobro, nos termos do art. 20º, n. 1(mais dois dias). Tudo perfaz 3 (três) dias de valor pecuniário.
2ª Perspectiva (pagamento do prestado)
Nesta óptica, o empregador o que fez foi pagar ao trabalhador em singelo o valor do serviço prestado.
Todavia, falta pagar o acréscimo em dobro (2 x salário) e ainda o valor do devido (um dia). Tudo perfaz 3 (três) dias de valor pecuniário.
Como se vê, qualquer que seja o prisma por que se encare a situação, o resultado é o mesmo. A fórmula é, em ambas, salário diário x 3 ”.
Como se vê, a fórmula obriga a ter em consideração 3 dias de remuneração.
Dito de outra maneira, terá que ser pago o dia de trabalho efectivamente prestado (singelo) acrescido do dobro do valor salarial diário.
Procede, pois, o recurso nesta parte.
Simplesmente, o quantum compensatório a este título deverá ser apurado nos termos que mais abaixo se dirão, face à anulação parcial da sentença para apuramento da pertinente matéria de facto (neste sentido, v.g. Acs. de 29/06/2017, Processos nºs 341/2017, 313/2017).
*
3 – Da presença ao serviço 30 minutos antes de cada turno laboral
O que se discute aqui é se a presença obrigatória dos trabalhadores no local de trabalho 30 minutos antes do início de cada turno laboral deve ser levada à conta de uma prestação efectiva de serviço.
O recorrente acha que sim; a sentença disse que não, com fundamento no disposto no art. 10º, nº4, do DL nº 24/89/M.
Certo é que, de acordo com o disposto a matéria do facto 30 da sentença (resposta ao art. 21º da BI), o autor estava obrigado a estar presente no seu local de trabalho devidamente uniformizado com a referida antecedência de 30 minutos.
Significa isto que o autor não era livre de comparecer, ou não, durante esse período que antecedia o início de cada turno de trabalho. Estava obrigado a fazê-lo porque assim lho era imposto pela entidade patronal e com carácter de regularidade.
Ora, tal não é o espírito da lei. O preceito citado apenas trata da possibilidade de o trabalhador poder ter que ultrapassar em 30 minutos (no conjunto) o tempo de trabalho fixado no nº1, desde que esse período de 30 minutos seja “necessário à preparação para o início do trabalho” (o que pressupõe que seja prévio ao início de cada turno), ou se mostre “necessário…à conclusão de transacções, operações e serviços começados e não acabados” (o que significa que é um tempo posterior ao termo de cada turno).
Ora, como nos parece ser bom de ver, a intenção do legislador será não fazer recair sobre a entidade patronal o período de tempo que antecede o início de cada turno na preparação da jornada de trabalho (v.g., o tempo que dura a substituir a roupa da viagem pela que seja mais próxima ao exercício laboral), bem assim como o tempo que dura a concluir um serviço começado e não acabado (v.g., concluir as contas ou, como também se diz, “fechar a caixa”), assim se evitando abusos do trabalhador com artimanhas e estratégias de serviço vagaroso que visem prolongar o horário da prestação de trabalho.
Só que estas são sempre situações que, por natureza não têm carácter regular. Cremos, antes, que sejam excepcionais, que se verificarão apenas quando necessárias, logo, esporádicas e ocasionais.
Porém, este trabalhador estava obrigado a comparecer ao local de trabalho 30 minutos antes todos os dias. Portanto, aquilo que era uma situação excepcional foi convertida em situação de normalidade por iniciativa da entidade patronal B.
Sendo assim, este período deve ser contado para o cômputo da compensação pela prestação de trabalho em horas extraordinárias, uma vez que o autor devia apresentar-se nas instalações da empresa durante esse período devidamente uniformizado, estando por isso ao serviço desta.
Procede, por conseguinte, o recurso nesta parte (no mesmo sentido, ver Ac.do TSI, de 27/04/2017, Proc. nº 167/2017).
Porém, foi provado que durante a relação laboral o autor gozou de vários períodos de dispensa ao trabalho (facto 4/alínea D) da especificação).
Assim, não se sabendo ao certo quantos dias o autor/recorrente se apresentou ao serviço com a referida antecedência, o quantum compensatório a este título deverá ser apurado nos termos que mais abaixo se dirão, face à anulação parcial da sentença para apuramento da pertinente matéria de facto (neste sentido, v.g. Acs. de 29/06/2017, Processos nºs 341/2017, 313/2017).
*
C – Do recurso da sentença interposto pelas rés da acção
…
2 - Do subsídio de alimentação
Acham as recorrentes que pelo facto de terem pago um valor salarial superior ao que resulta dos mínimos estabelecidos no contrato de prestação de serviços nº 2/96 (facto 9 da sentença/ 2º da BI) não teria que cumprir os valores definidos neste contrato a outros títulos, nomeadamente de subsídio de alimentação e outros.
Sem razão, tal como já foi decidido neste TSI, no Ac. de 25/07/2013, Proc. nº 322/2013, e aqui reiteramos: “Nada obsta que da relação entre o promitente e o terceiro (agência prestadora de serviços e mão de obra), para além do assumido nesse contrato entre o promitente e o promissário, nasçam outras obrigações como decorrentes de um outro contrato que seja celebrado entre o promitente (Ré, empregadora) e o terceiro (A., trabalhador)”.
Defendem, por outro lado, as recorrentes que o tribunal não podia proceder à sua condenação no pagamento do subsídio de alimentação concernente ao período de 22 de Janeiro de 2001 a 21 de Julho de 2003 e entre 22/07/2003 e 5/09/2005, pela simples razão de que se não sabe quantos dias ele terá faltado ao serviço.
Têm razão, quanto a este aspecto.
Sobre o assunto foi dito no Ac. do TSI, de 14/06/2012, Proc. nº 376/2012:
“Ora, este subsídio tem uma função social radicada numa despesa alimentar efectuada por causa da prestação de trabalho efectiva. E embora tenha havido por parte da jurisprudência alguma tendência para o considerar prestação retributiva, a verdade é que nem por isso outra a associava, mesmo assim, à noção de trabalho efectivo, tal como, por exemplo, foi asseverado no Ac. da Relação de Lisboa de 29/06/1994, Proc. nº 092324 “ Quer a Jurisprudência, quer a Doutrina têm vindo a entender que o subsídio de alimentação, sendo pago regularmente, integra o conceito de retribuição .... Porém, estando ligada essa componente salarial à prestação de facto do trabalho, só será devida quando o trabalhador presta serviço efectivo à entidade patronal…”.
Com o art. 260º do Código do Trabalho Português, o panorama mudou de figura, pois o nº2, do art. 260º deixou claro que esse subsídio não devia ser considerado remuneração, salvo nos casos em que o seu valor excede o montante da despesa alimentar. E assim, terá ficado mais claro que ele só é assumido pelo empregador por causa da prestação efectiva de trabalho. Ele “visa compensar uma despesa diariamente suportada pelos trabalhadores quando realiza a sua actividade”. Ou “…visa compensar uma despesa na qual o trabalhador incorre diariamente, sempre que vai trabalhar…” (destaque nosso).
Em Macau, não está regulada a atribuição destes subsídios, mas não cremos que o sentido da sua natureza que melhor se adequa à geografia local é aquele que atrás descrevemos. Por conseguinte, por não estar regulada na lei (DL nº 24/89/M), nem no referido contrato de prestação de serviços nº 45/94 (fls. 137 e sgs. dos autos), deveremos considerá-lo como compensação pela prestação de serviço efectivo.
Logo, da mesma maneira que deverá descontar-se o subsídio nos períodos de férias ou naqueles em que a pessoa está de licença de maternidade, também ele deve ser subtraído quando o trabalhador não prestou serviço por outra qualquer razão.”
A ré/recorrente manifesta-se contra a sentença, por considerar que o autor, conforme a matéria de facto provada, chegou a faltar alguns dias ao serviço, mesmo com justificação ou autorização.
Mas, o acórdão deste TSI de 29/05/2014 (Proc. nº 627/2013) deu a resposta para esta questão:
«Contrariamente ao sustentado, não será de afirmar que se retira necessariamente do facto de o autor não faltar sem ser autorizado o facto implícito de ter faltado…. Esse facto pode ser compatibilizado … se dele se retirar que aí se enuncia uma regra que não deixou de ser observada: o trabalhador não podia faltar sem autorização; o trabalhador não faltou sem autorização; se faltasse tinha que ser autorizado. Daqui não se pode concluir que faltou autorizadamente, ou seja, que alguma vez tenha usado essa faculdade». Foi uma solução que seguida foi também no Ac. de 19/06/2014, no Proc. nº 189/2014, e no Ac. de 29/05/2014, Proc. nº 627/2013.
Sucede, contudo, que tal solução não dá resposta segura às situações em que tenha havido gozo efectivo dos dias de descanso anual e de feriados obrigatórios. Por outro lado, estamos em crer que uma leitura mais objectiva da resposta ao art. 7º da BI permite concluir que o trabalhador terá dado algumas faltas ao serviço, ainda que com autorização.
Assim, a melhor solução é aquela que propende para remeter a fixação da indemnização a este título para execução de sentença (assim foi decidido, por exemplo, nos Acs. de Ac. de 13/03/2014, Proc. nº 414/2012, 24/04/2014, Proc. nº 687/2013, 29/05/2014, Proc. nº 168/2014, 24/07/2014, Proc. nº 128/2014)”.
Não seguiremos, neste caso, porém, a tese de relegar a liquidação em execução de sentença, visto que há matéria que deverá ser de novo quesitada, tal como melhor se dirá mais adiante (neste sentido, v.g. Acs. de 29/06/2017, Processos nºs 341/2017, 313/2017).
…
4 - Do trabalho prestado em dias de descanso semanal e feriado obrigatório
Vêm as recorrentes manifestar-se contra a atribuição do valor liquidado a título de trabalho nos dias de descanso semanal e nos feriados obrigatórios.
Em sua opinião, uma vez que ficou provado que o autor teve faltas, ainda que justificadas, não seria possível especificar o número de dias devidos e não gozados por ele, ao contrário do que fez a sentença recorrida.
Tem razão, tal como se decidiu no TSI, de 27/04/2017, Proc. nº 167/2017, cujos termos aqui fazemos nossos.
Sucede, porém, que foi alegada matéria concernente aos dias de trabalho a que o autor terá faltado e que não foi quesitada, e que deverá constituir assim factualidade a que o tribunal “a quo” terá que voltar em sede de repetição de julgamento após a necessária quesitação (neste sentido, v.g. Acs. de 29/06/2017, Processos nºs 341/2017, 313/2017).
*
5 - Do trabalho extraordinário
As recorrentes reiteram a ideia de que o autor da acção deu faltas ao serviço, além de ter gozado férias anuais. Com base nisso, defendem que não podia o tribunal apurar os dias em que ele teria efectuado serviço extraordinário nos turnos.
Têm razão.
Contudo, e ao contrário do que se tem decidido quanto a esta questão (em que se tem relegado a liquidação do valor indemnizatório a este título para execução de sentença, conforme, v.g., Ac. deste TSI, de 27/04/2017, Proc. nº 167/2017), haverá que ampliar a matéria de facto para o que o processo deverá baixar à 1ª instância, nos termos que mais adiante se dirão.…”1
E mantém-se a sentença recorrida na parte referente à liquidação já procedida quanto ao subsídio de efectividade, bem como ao comparticipação no alojamento.
No entanto, tendo-se realizado a repetição do julgamento nos termos definidos no douto acórdão, não se provam em que datas concretas, incluindo os dias concretos de feriado obrigatório, é que o Autor prestou trabalho, nem os concretos dias de trabalho efectivamente prestado pelo Autor.
Assim, deverá relegar a liquidação dos referidos créditos para a execução da sentença ou julgar improcedente o pedido a eles referentes?
Salvo melhor entendimento, entende o Tribunal que não deixa de ser a segunda opção solução do presente caso.
De facto, no nosso modesto entendimento, verifica-se no presente caso a antecipação da apreciação da liquidação dos créditos.
Como se refere, e bem, o douto acórdão do Venerando Tribunal de Segunda da Instância no processo n. 341/2017 (jurisprudência que foi também adoptada nos outros arestos do mesmo Tribunal relativamente aos casos paralelos ao presente):
“…A questão que ora se coloca vinha já sendo anunciada, quando, em passos vários, tivemos necessidade de dizer que a liquidação se faria em sede própria, perspectivando-se uma anulação de sentença com repetição do julgado na parte respectiva ou uma liquidação de execução de sentença.
Invoca-se uma insuficiente fundamentação e afigura-se-nos que a Ré, ora recorrente, tem razão, na medida em que o Mmo Juiz se terá baseado num cômputo de dias que vêm alegados pelo A., não se alcançando em que bases se louvou para o seu cálculo.
…
Embora se acolha a linha jurisprudencial mais permissiva, no sentido de que sempre que o tribunal verificar o dano ou a prestação devida, mas não tiver elementos para fixar o seu valor, quer se tenha pedido um montante determinado ou formulado um pedido genérico, lhe cumpre relegar a fixação do montante indemnizatório para liquidação em execução de sentença, ao abrigo do disposto no art. 564º/2 do CPC11 - mesmo que se possa afirmar que se está a conceder uma nova oportunidade ao autor que tenha deduzido pedido líquido de provar o quantitativo devido, não se vislumbra qualquer ofensa do caso julgado, material ou formal, na medida em que a existência de danos já está provada e apenas não está determinado o seu exacto valor e só no caso de se não ter provado a existência de prestação devida é que se forma caso julgado material sobre tal objecto, impedindo nova prova do facto no posterior incidente de liquidação, estando subjacente a esta jurisprudência a ideia de que razões de justiça e de equidade impedem que se absolva a demandada uma vez demonstrada a sua obrigação -, a situação presente não consentirá essa via, na exacta medida em que houve já uma liquidação e o apuramento de uma base de cálculo, não se tendo o Mmo Juiz limitado a uma enunciação genérica de trabalho prestado não apurado.
Ainda que que não se enjeite essa possibilidade, numa recondução a um completamento de matéria de facto, estamos em crer que a presente solução aponta para uma necessidade de exigência e de rigor, desde logo, para as próprias partes - muitas nem sequer aqui permanecendo, porventura desinteressando-se dos seus direitos aquando da cessação dos contratos, visto até o tempo entretanto decorrido -, não podendo elas facilitar na concretização e prova das prestações que dizem estar em dívida. Quanto se diz não retira de forma nenhuma o reconhecimento à tutela dos direitos dos trabalhadores que tenham sido violados, apenas se pretendendo a sua cooperação e responsabilização na realização da Justiça. …”
Com a mesma doutrina, o Venerando Tribunal de Segunda da Instância acordaram em repetir, e só, o julgamento de forma a apurar os concretos dias de trabalho efectivamente prestado pelo Autor, confirmando os créditos, só na sua qualidade mas não na sua quantidade, relativos aos subsídios de alimentação e às importâncias devidas a título de trabalho prestado em dias de feriados obrigatórios, de descanso semanal, descanso compensatório, trabalho extraordinário e por turnos.
Assim, salvo melhor entendimento, a repetição do julgamento no presente caso não deixa de ser entendida como uma liquidação ad hoc, cuja decisão fará caso julgado material nos termos e para efeitos do art. 574º do CPC, abstendo-se de repetir e discutir a liquidação no futuro, nomeadamente no momento da execução da sentença.
Isto quer dizer que, uma vez que não se provam nem se apuram os concretos dias de trabalho efectivamente prestado pelo Autor, não deixa de ser julgada improcedente, em vez de relegar a liquidação para a execução da sentença, a acção intentada pelo Autor relativamente aos subsídios de alimentação, às compensações devidas a título de trabalho prestado em dias de feriados obrigatórios, de descanso semanal, descanso compensatório, trabalho extraordinário e por turnos.
*
V - DECISÃO
Pelo exposto, julga-se a acção improcedente, por não provada, e em consequência absolver as Rés do pedido, sem prejuízo dos outros que já foram decididos pelo presente Tribunal e foram confirmados pelo douto acórdão do Venerando Tribunal de Segunda da Instância, nomeadamente a condenação relativamente aos subsídios de efectividade e de comparticipação no alojamento.
Custas pelo Autor.
Registe e notifique.
* * *
Questões a resolver:
O Recorrente/Autor invocou os seguintes vícios:
- Erro de facto;
- Erro de julgamento;
- Falta de fundamentação da decisão.
No fundo importa resolver neste recurso as seguintes questões:
1) – Âmbito fixado pelo acórdão do TSI para efeitos de repetição do julgamento; e
2) - (In)Suficiência de 2 quesitos aditados e “reclamação” contra a decisão de facto oportunamente apresentada pelo Autor.
*
Passemos a conhecer das questões suscitadas, começando pela primeira.
1ª questão: Âmbito fixado pelo acórdão do TSI para efeitos de repetição do julgamento
Importa recordar os termos fixados pelo Acórdão deste TSI (Ac. n.º 710/2017), em sede de repetição do julgamento:
Aditar à Base Instrutória, o(s) quesito(s) necessário(s) e referentes, nomeadamente: à concretização dos dias de trabalho efectivo - tendo em vista as ausências autorizadas, para além das férias gozadas - determinante para efeitos do cômputo da indemnização devida a título de subsídio de alimentação, trabalho por turnos e trabalho extraordinário trabalho prestado em dia de descanso semanal e descanso compensatório não gozados; à determinação de quais os dias em que o trabalho foi prestado para efeitos de apuramento da quantia devia pelos dias de feriados obrigatórios e ao ao apuramento dos dias das ausências autorizadas e das férias gozadas;
Ou seja, a parte decisiva constante do acórdão do TSI que requer a densificação por parte do JL (Juízo Laboral) é a seguinte:
a) Anular parcialmente a sentença de forma a apurar os concretos dias de trabalho efectivamente prestado e a poder fixar-se a compensação relativa aos subsídios de alimentação, bem como as importâncias devidas a título de trabalho prestado em dias de descanso semanal, descanso compensatório, trabalho extraordinário e por turnos e feriados obrigatórios;
(…)
Repare-se, o que o TSI decidiu no acórdão do processo nº710/2017 é apurar os concretos dias de trabalho efectivo, prestado pelo Autor, não é o número total dos dias concreto de trabalho efectivo. São duas coisas distintas!
Como? É uma tarefa incumbida ao Tribunal a quo no cumprimento das normais aplicáveis e do decidido, e, os termos acima expendidos são muito claros, que não devem suscitar dúvidas!
Veremos com detalhe esta questão a seguir, em conjugação com o que foi feito pelo Tribunal a quo.
*
2ª questão: (In)Suficiência de 2 quesitos aditados e “reclamação” contra a decisão de facto oportunamente apresentada pelo Autor.
Na sequência da baixa dos autos, veio o JL aditar 2 artigos com o seguinte teor (fls. 502):
Facto 23º
Entre 22/07/1996 e 21/07/2003, o Autor prestou 2258 dias de trabalho efectivo junto da 1ª Ré?
Facto 24º
Entre 22/07/2003 e 05/09/2005, o Autor prestou 625 dias de trabalho efectivo junto da 2ª Ré?
Repetido o julgamento, tais factos ficaram NÃO PROVADOS (fls. 534).
Se conjugarmos o facto 23º acima citado com o conteúdo dos outros factos já considerado assentes, nomeadamente o da A), B) e C), das respostas dadas aos quesitos 4º a 6º, 9º a 11º, 17º a 22º todos considerados assentes na primeira sentença, é fácil verificar-se alguma incoerência entre eles, pois:
- Por um lado, com estes 2 novos factos aditados, ficamos no mesmo, eles não têm aptidão para se tirar de nada, nem acrescentar também nada! Porque não esclarece quando é que foram tais dias de trabalho, ele coincidiam ou não com os dias de feriados obrigatórios? Eles foram todos seguidos? Ou entre eles houve alguma “pausa”? Perante este quadro, não se tem condições para dar cumprimento ao acórdão em causa.
- Por outro lado, é quase irrelevante o número total de dias concretos de trabalho efectivo prestado pelo Autor (aliás, este resultado poderá ser obtido mediante um juízo matemático), não é esta matéria em causa conforme os termos fixados no acórdão deste TSI acima citado.
A forma de redigir os factos inseridos nos artigos 23º e 24º solicita apenas um juízo matemático, e não valorativo!
Há quem diga que a própria forma de dizer as coisas também se dizem as coisas.
À luz da forma como os 2 quesitos foram formulados pelo Tribunal a quo, sem dúvida que o seu conteúdo foi buscar aos quesitos 3º e 4º da BI (constante da 1ª sentença, fls. 540), e depois contam-se o número de dias a que se refere o período em que o Autor prestava serviços junto da 1ª Ré e da 2ª Ré, respectivamente.
Mas isso não basta! Porque:
Em primeiro lugar, em sede de julgamento, realça-se, o Tribunal a quo tem de cingir-se aos factos alegados pelas Partes, salvo as situações previstas no artigo 434º do CPC.
No caso, em lado nenhum o Autor invocou simplesmente o número total de dias em que ele prestava serviços à 1ª Ré e à 2ª Ré. Ou seja, o Tribunal não deve substituir-se às partes em sede de alegação de factos!
Em segundo lugar, mesmo que tais 2 novos factos ficassem provados, o Tribunal a quo continuava a não ter condições para cumprir o ordenado no acórdão do TSI acima citado, pois este mandou esclarecer os seguintes aspectos: apurar os dias concretos de trabalho prestado em dias de descanso semanal, descanso compensatório, trabalho extraordinário e por turnos e feriados obrigatórios. Para satisfazer estas exigências, não há outra solução senão fraccionar os períodos por mês e semanas, porque são por estas unidades que se calculam as indemnizações reclamadas pelo Autor.
Aqui, é de recordar o que o legislador manda no artigo 430º (Selecção da matéria de facto) do CPC que tem o seguinte teor:
1. Se o processo tiver de prosseguir e a acção tiver sido contestada, o juiz, no próprio despacho a que se refere o artigo anterior ou, não havendo a ele lugar, no prazo fixado para o proferir, selecciona a matéria de facto relevante, segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito, indicando:
a) Os factos que considera assentes;
b) Os factos que, por serem controvertidos, integram a base instrutória.
2. As partes podem reclamar contra a selecção da matéria de facto considerada assente ou integrada na base instrutória, com fundamento em deficiência, excesso ou obscuridade.
3. O despacho proferido sobre as reclamações apenas pode ser impugnado no recurso interposto da decisão final.
Ou seja, deve seleccionar-se os factos segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito!
Em terceiro lugar, na sequência do dito, os 2 factos padecem de obscuridade e deficiência, pois não permitem dar cumprimento cabal ao ordenado pelo TSI. Admitindo-se que ficassem provados estes 2 factos, como é o Tribunal iria fixar as indemnizações a título de a título de trabalho prestado em dias de descanso semanal, descanso compensatório, trabalho extraordinário e por turnos e feriados obrigatórios? Quase impossível com este conteúdo!
Em quarto lugar, temos de observar também o regime que o legislador estatuiu em matéria de repetição do julgamento, o qual está previsto no artigo 629º/4 (Modificabilidade da decisão de facto) do CPC, que consagra:
1. A decisão do tribunal de primeira instância sobre a matéria de facto pode ser alterada pelo Tribunal de Segunda Instância:
a) Se do processo constarem todos os elementos de prova que serviram de base à decisão sobre os pontos da matéria de facto em causa ou se, tendo ocorrido gravação dos depoimentos prestados, tiver sido impugnada, nos termos do artigo 599.º, a decisão com base neles proferida;
b) Se os elementos fornecidos pelo processo impuserem decisão diversa, insusceptível de ser destruída por quaisquer outras provas;
c) Se o recorrente apresentar documento novo superveniente e que, por si só, seja suficiente para destruir a prova em que a decisão assentou.
2. No caso a que se refere a segunda parte da alínea a) do número anterior, o Tribunal de Segunda Instância reaprecia as provas em que assentou a parte impugnada da decisão, tendo em atenção o conteúdo das alegações de recorrente e recorrido, sem prejuízo de oficiosamente atender a quaisquer outros elementos probatórios que tenham servido de fundamento à decisão de facto impugnada.
3. O Tribunal de Segunda Instância pode determinar a renovação dos meios de prova produzidos em primeira instância que se mostrem absolutamente indispensáveis ao apuramento da verdade, quanto à matéria de facto objecto da decisão impugnada, aplicando-se às diligências ordenadas, com as necessárias adaptações, o preceituado quanto à instrução, discussão e julgamento na primeira instância e podendo o relator determinar a comparência pessoal dos depoentes.
4. Se não constarem do processo todos os elementos probatórios que, nos termos da alínea a) do n.º 1, permitam a reapreciação da matéria de facto, pode o Tribunal de Segunda Instância anular, mesmo oficiosamente, a decisão proferida na primeira instância, quando repute deficiente, obscura ou contraditória a decisão sobre pontos determinados da matéria de facto ou quando considere indispensável a ampliação desta; a repetição do julgamento não abrange a parte da decisão que não esteja viciada, podendo, no entanto, o tribunal ampliar o julgamento de modo a apreciar outros pontos da matéria de facto, com o fim exclusivo de evitar contradições na decisão.
5. Se a decisão proferida sobre algum facto essencial para o julgamento da causa não estiver devidamente fundamentada, pode o Tribunal de Segunda Instância, a requerimento da parte, determinar que o tribunal de primeira instância a fundamente, tendo em conta os depoimentos gravados ou escritos ou repetindo a produção da prova, quando necessário; sendo impossível obter a fundamentação com os mesmos juízes ou repetir a produção da prova, o juiz da causa limita-se a justificar a razão da impossibilidade.
Repare-se, o nº 4 do normativo acima citado tem por destinatário também o Tribunal que vai repetir o julgamento, como tal ele deve ser observado e cumprido.
Em quinto lugar, como o Tribunal a quo deu uma resposta negativa a tais 2 factos, gera-se contradição neste aspecto: passa ser assente que o Autor só trabalhou durante os dias de feriado obrigatório para a 1ª Ré e 2ª Ré, quando fazemos leitura conjunta dos factos assentes (que não foram impugnados), nomeadamente os 17º e 20º (assentes)!! Porque são estes factos que sobram!
Eis uma incoerência e ilógica das coisas!
Nos termos do artigo 629º/4 do CPC acima citado, o Tribunal a quo, ao repetir o julgamento, tem de manter a coerência e lógica das coisas, nomeadamente fará tudo para evitar contradições entre os factos já assentes e os novos! Pela vista, não foi devidamente acautelado este ponto.
Em sexto lugar, e salvo outro entendimento e o merecido respeito que é muito, em face da evidente obscuridade e deficiência dos factos aditados, outra solução não há senão mandar baixar NOVAMENTE os autos ao JL para repetir o julgamento, de forma a apurar as matérias necessárias ao esclarecimento das questões em abordagem, ou seja, apurar os dias concretos em que o Autor laborou, nos termos expressamente fixados na alínea a) da parte decisiva do acórdão do Processo nº 710/2017, de acordo com o disposto no artigo 629º/4 do CPC.
Neste aspecto o Recorrente/Autor tem razão quando argumentou:
6. Salvo o devido respeito, está o ora Recorrente em crer que, contrariamente ao que terá sido concluído pelo Tribunal a quo, a “repetição do julgamento” ordenada pelo Tribunal de Recurso impunha não só que fosse aditado à douta Base Instrutória o(s) quesito(s) necessário(s) à “concretização” dos “dias de trabalho efectivamente prestados” mas, igualmente, que fosse aditado o(s) quesito(s) com vista à “concretização” dos “dias de falta” e/ou “dias de ausência” do Autor ao longo da relação de trabalho com a Ré, porquanto se trata de matéria essencial com vista ao apuramento de determinadas “rubricas”, como é o caso da compensação pelos dias de feriados obrigatórios, o que manifestamente não foi levado a cabo pelo Tribunal a quo;
7. O mesmo é dizer que mais do que a determinação de “quantos” dias de trabalho terá o Autor prestado, impunha-se ao Tribunal a quo a determinação de “quais” os dias em que o trabalho foi efectivamente prestado, contrariamente ao que terá sido a interpretação seguida pelo Tribunal de Primeira Instância;
8. Ora, os dois únicos quesitos aditados à Base Instrutória são, na sua formulação, meramente “quantitativos” e, como tal, em caso algum se mostram idóneos a obter a “concretização” dos (quais) dias de trabalho prestado e dos (quais) os dias de falta e de dispensa ao trabalho, conforme expressamente ordenado pelo Tribunal de Recurso; (…).
Nestes termos, é de reconhecer que as matérias inseridas nos quesitos 25º a 31º propostos pelo Autor são pertinentes e que permitirão cumprir o ordenado no acórdão acima citado. Pelo que, este Tribunal ordena que sejam eliminados os 2 artigos inicialmente aditados pelo Tribunal a quo e, em substituição, sejam admitidos os quesitos propostos pelo Autor, sob os números 25º a 31º, que constituirão objecto de julgamento em sede da repetição, sem prejuízo de outras matérias que o Tribunal a quo venha a considerar relevantes para este efeito.
*
Síntese conclusiva:
I – Quando o Tribunal ad quem, em sede da decisão do recurso, fixou os termos de “apurar os concretos dias de trabalho efectivamente prestado e a poder fixar-se a compensação relativa aos subsídios de alimentação, bem como as importâncias devidas a título de trabalho prestado em dias de descanso semanal, descanso compensatório, trabalho extraordinário e por turnos e feriados obrigatórios”, o Tribunal a quo deve cumprir o ordenado mediante o aditamento de factos necessários, pertinentes e aptos a solucionar as questões pendentes, seleccionando os factos segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito.
II – O Tribunal a quo, em sede de repetição do julgamento, formulou dois quesitos com o seguinte teor: (artigo 23º) Entre 18/10/1996 e 21/07/2003, o Autor prestou 2258 dias de trabalho efectivo junto da 1ª Ré? (artigo 24º ) Entre 22/07/2003 e 05/09/2005 o Autor prestou 625 ds de trabalho efectivo junto da 2ª Ré? estes quesitos em causa, para além de conterem conteúdo deficiente, não têm aptidão para cumprir o ordenado do acórdão do TSI, razão pela qual é de anular o julgamento feito nestes termos.
III – Para a mesma finalidade e em sede da reclamação o Autor chegou a propôr 7 quesitos sob os números 25º a 31º com conteúdo pertinente e apto a cumprir o decidido no acórdão do TSI, é de admitir tais quesitos que constituirão objecto de novo julgamento a cargo do Tribunal a quo. É o que a este TSI compete decidir nestes autos.
*
Tudo visto, resta decidir.
* * *
V - DECISÃO
Em face de todo o que fica exposto e justificado, os juízes do Tribunal de 2ª Instância acordam em conceder provimento ao recurso interposto pelo Autor, anulando o julgamento já repetido, mandando agora repetir o julgamento nos termos fixados no acórdão proferido no processo nº 710/2017, com a admissão dos quesitos 25º a 31º propostos pelo Autor em substituição dos 2 quesitos anteriormente aditados pelo Tribunal a quo (sem prejuízo de outras matérias que o Tribunal a quo venha a considerar relevantes para este efeito), a fim de apurar os dias concretos de trabalho efectivo prestado pelo Recorrente/Autor, de forma a poder fixar-se a compensação relativa aos subsídios de alimentação, bem como as importâncias devidas a título de trabalho prestado em dias de descanso semanal, descanso compensatório, trabalho extraordinário e por turnos e feriados obrigatórios;
*
Quanto ao demais, mantém-se o já decidido.
*
Custas pelas Recorridas/Rés.
*
Registe e Notifique.
*
RAEM, 28 de Fevereiro de 2019.
Fong Man Chong
Ho Wai Neng
José Cândido de Pinho
1 Salvo o devido respeito, o Tribunal mantém a posição de que as compensações de trabalho em dia de descanso semanal e em dia de feriado obrigatório devem incluir o próprio salário daqueles dias. No entanto, esta posição nada impede o cumprimento do douto acórdão do Venerando TSI nos termos do art. 5º, n. 2º da LBOJ.
---------------
------------------------------------------------------------
---------------
------------------------------------------------------------
2018-1128-STDM – repedir-repetir-forma-cumprimento 39