--- Decisão Sumária nos termos do art.º 407º, n.º 6 do C.P.P.M. (Lei n.º 9/2013). ----------
--- Data: 12/4/2019 --------------------------------------------------------------------------------------
--- Relator: Dr. Dias Azedo -----------------------------------------------------------------------------
Processo nº 312/2019
(Autos de recurso penal)
(Decisão sumária – art. 407°, n.° 6, al. b) e d) do C.P.P.M.)
Relatório
1. A, com os restantes sinais dos autos e ora preso no Estabelecimento Prisional de Coloane (E.P.C.), vem recorrer da decisão que lhe negou a concessão de liberdade condicional, motivando para, a final, concluir, imputando à decisão recorrida o vício de violação do disposto no art. 56° do C.P.M.; (cfr., fls. 75 a 79-v que como as que adiante se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os legais efeitos).
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Em resposta, pugna o Exmo. Magistrado do Ministério Público no sentido da improcedência do recurso; (cfr., fls. 81 a 82).
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Em sede de vista, juntou o Ilustre Procurador Adjunto douto Parecer pugnando pela confirmação da decisão recorrida; (cfr., fls. 129 a 130).
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Em sede de exame preliminar constatou-se da “manifesta improcedência” do presente recurso, e, nesta conformidade, atento o estatuído no art. 407°, n.° 6, al. b) e d) e 410°, n.° 1 do C.P.P.M., (redacção dada pela Lei n.° 9/2013, aplicável aos presentes autos nos termos do seu art. 6°, n.° 1 e 2, al. 2), e tendo-se presente que a possibilidade de “rejeição do recurso por manifesta improcedência” destina-se a potenciar a economia processual, numa óptica de celeridade e de eficiência, visando, também, moralizar o uso (abusivo) do recurso, passa-se a decidir.
Fundamentação
Dos factos
2. Flui dos autos a factualidade seguinte (com relevo para a decisão a proferir):
– por Acórdão do T.J.B. de 28.07.2017, foi, A, ora recorrente, condenado pela prática como autor material de 1 crime de “roubo qualificado”, na forma tentada, na pena de 3 anos e 3 meses de prisão;
– o mesmo recorrente, deu entrada no E.P.C. em 25.11.2016, e em 24.01.2019, cumpriu dois terços da referida pena, vindo a expiar totalmente a mesma pena em 24.02.2020;
– em 09.11.2018 foi disciplinarmente punido;
– em caso de vir a ser libertado, irá viver com a sua família em Macau, de onde é natural, pretendendo trabalhar numa firma de construção.
Do direito
3. Insurge-se o ora recorrente contra a decisão que lhe negou a concessão de liberdade condicional, afirmando, em síntese, que se devia considerar que reunidos estão todos os pressupostos do art. 56° do C.P.M. para que tal libertação antecipada lhe fosse concedida.
Porém, como se deixou adiantado, evidente é que não se pode reconhecer razão ao ora recorrente.
Vejamos.
— Preceitua o citado art. 56° do C.P.M. (que regula os “Pressupostos e duração” da liberdade condicional) que:
“1. O tribunal coloca o condenado a pena de prisão em liberdade condicional quando se encontrarem cumpridos dois terços da pena e no mínimo 6 meses, se:
a) For fundadamente de esperar, atentas as circunstâncias do caso, a vida anterior do agente, a sua personalidade e a evolução desta durante a execução da prisão, que o condenado, uma vez em liberdade, conduzirá a sua vida de modo socialmente responsável, sem cometer crimes; e
b) A libertação se revelar compatível com a defesa da ordem jurídica e da paz social.
2. A liberdade condicional tem duração igual ao tempo de prisão que falte cumprir, mas nunca superior a 5 anos.
3. A aplicação da liberdade condicional depende do consentimento do condenado”; (sub. nosso).
Constituem, assim, “pressupostos objectivos” ou “formais”, a condenação em pena de prisão superior a seis (6) meses e o cumprimento de dois terços da pena, num mínimo de (também) seis (6) meses; (cfr. n.° 1).
“In casu”, atenta a pena que ao recorrente foi fixada, e visto que se encontra ininterruptamente preso desde 25.11.2016, expiados estão já dois terços de tal pena, pelo que preenchidos estão os ditos pressupostos formais.
Todavia, e como é sabido, tal “circunstancialismo” não basta, já que não sendo a liberdade condicional uma medida de concessão automática, impõe-se para a sua concessão, a verificação cumulativa de outros pressupostos de natureza “material”: os previstos nas alíneas a) e b) do n.° 1 do referido art. 56°.
Com efeito, importa ter em conta que a liberdade condicional não é uma “medida de clemência”, constituindo uma medida que faz parte do normal desenvolver da execução da pena de prisão, manifestando-se como uma forma de individualização da pena no fito de ressocialização, pois que serve um objectivo bem definido: o de criar um período de transição entre a prisão e a liberdade, durante o qual o delinquente possa, equilibradamente, recobrar o sentido de orientação social fatalmente enfraquecido por efeito da reclusão; (cfr., v.g., J. L. Morais Rocha e A. C. Sá Gomes in “Entre a Reclusão e a Liberdade – Estudos Penitenciários”, Vol. I, em concreto, “Algumas notas sobre o direito penitenciário”, IV cap., pág. 41 e segs.).
Na esteira do repetidamente decidido nesta Instância, a liberdade condicional “é de conceder caso a caso, dependendo da análise da personalidade do recluso e de um juízo de prognose fortemente indiciador de que o mesmo vai reinserir-se na sociedade e ter uma vida em sintonia com as regras de convivência normal, devendo também constituir óbviamente matéria de ponderação, a defesa da ordem jurídica e da paz social”; (cfr., v.g., os recentes Acs. deste T.S.I. de 31.01.2019, Proc. n.° 15/2019, de 21.02.2019, Proc. n.° 67/2019 e de 14.03.2019, Proc. n.° 169/2019, podendo-se também sobre o tema ver o Ac. da Rel. de Coimbra de 24.01.2018, Proc. n.° 540/16).
Assim, detenhamo-nos na apreciação de tais pressupostos de natureza material.
Ponderando na factualidade atrás retratada, poder-se-á dizer que é fundadamente de esperar, atentas as circunstâncias do caso, a vida anterior do agente, a sua personalidade e a evolução desta durante a execução da prisão, que o condenado, uma vez em liberdade, conduzirá a sua vida de modo socialmente responsável, sem cometer crimes, mostrando-se a pretendida liberdade condicional compatível com a defesa da ordem jurídica e paz social?
E, como se deixou adiantado, temos para nós que de sentido negativo terá de ser a resposta.
Com efeito, demonstram os autos que o ora recorrente, em período de reclusão, (e bem recentemente, em 09.11.2018), sofreu 1 punição disciplinar, não se podendo dar como viável o necessário juízo de prognose favorável, e, assim, verificado o pressuposto do art. 56°, n.° 1, al. a) do C.P.M..
Com efeito, e como parece evidente, a liberdade condicional não é de conceder quando o percurso até ao momento experienciado pelo condenado não oferece ainda suficiente segurança para sustentar um “juízo positivo” acerca do seu comportamento futuro quando em meio livre; (neste sentido, cfr., v.g., o recente Ac. da Rel. de Évora de 19.02.2019, Proc. n.° 13/16).
Assim, e em face das acentuadas “necessidades de prevenção criminal especial”, aconselhável é um acrescido período de reclusão, por forma a ser possibilitada uma melhor interiorização do desvalor da sua conduta.
Outrossim, no caso dos autos, resulta da matéria de facto que o arguido agiu com dolo directo e (muito) intenso, com “premeditação” e “persistência de intenção criminosa”, planeando o crime e aguardando pelo “momento” (mais) adequado para o cometer, “escolhendo” a vítima, utilizando grande violência, agredindo-a de surpresa com um tijolo na cabeça, tudo a revelar uma grande indiferença e insensibilidade em relação à vida e bens de terceiros, sendo muito fortes as necessidades de prevenção criminal.
Assim, atento o tipo e modus operandi do crime pelo ora recorrente cometido, que causa sempre (algum) “alarme social”, (notando-se que o mesmo apenas não se consumou porque o ofendido se pôs em perseguição do ora recorrente, vindo a conseguir alcançá-lo e a permitir assim a sua capture), importa também acautelar a sua repercussão na sociedade, o que equivale a dizer que não podem ser postergadas as exigências de tutela do ordenamento jurídico, (cfr., F. Dias in “Dto Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime”, pág. 528 e segs.), havendo igualmente que salvaguardar a confiança e as expectativas da comunidade no que toca à validade da norma violada através do “restabelecimento da paz jurídica comunitária abalada”, impondo-se, também por isso, uma reafirmação social mais intensa da validade das normas jurídicas violadas; (cfr., F. Dias in “Temas Básicos da Doutrina Penal”, pág. 106 e o Ac. da Rel. do Porto de 10.01.2018, Proc. n.° 417/15).
Como no recente Ac. do T.R. de Évora de 05.02.2019, (Proc. n.° 669/16), se considera, importa ter em conta que “a compatibilidade da libertação condicional com a defesa da ordem e da paz social não se reconduz, restritivamente, à previsível ausência de expressões públicas de inconformismo, mas antes, mais latamente, à compatibilidade da libertação condicional com a defesa da sociedade e a prevenção da prática de crimes”, não sendo de se olvidar também que nos termos do art. 43°, n.° 2 do C.P.M. se prescreve que: “A execução da pena de prisão serve igualmente a defesa da sociedade, prevenindo o cometimento de crimes”.
Assim, em face das expostas considerações, e verificado não estando os pressupostos do art. 56°, n.° 1, al. a) e b) do C.P.M., há que decidir como segue.
Decisão
4. Nos termos e fundamentos expostos, decide-se rejeitar o presente recurso.
Pagará o recorrente a taxa de justiça que se fixa em 4 UCs, e como sanção pela rejeição do recurso o equivalente a 3 UCs; (cfr., art. 410°, n.° 3 do C.P.P.M.).
Honorários ao Exmo. Defensor no montante de MOP$1.800,00.
Registe e notifique.
Nada vindo de novo, e após trânsito, remetam-se os autos com as baixas e averbamentos necessários.
Macau, aos 12 de Abril de 2019
José Maria Dias Azedo
Proc. 312/2019 Pág. 10
Proc. 312/2019 Pág. 11