--- Decisão Sumária nos termos do art.º 407º, n.º 6 do C.P.P.M. (Lei n.º 9/2013). ----------
--- Data: 05/03/2019 --------------------------------------------------------------------------------------
--- Relator: Dr. Dias Azedo -----------------------------------------------------------------------------
Processo nº 63/2019
(Autos de recurso penal)
(Decisão sumária – art. 407°, n.° 6, al. b) do C.P.P.M.)
Relatório
1. A, arguido com os restantes sinais dos autos, vem recorrer do Acórdão do T.J.B. que o condenou como autor material da prática de 1 crime de “furto qualificado”, p. e p. pelo art. 198°, n.° 1, al. a) e 196°, al. a) do C.P.M., na pena de 1 ano de prisão, e no pagamento de uma indemnização no montante de MOP$43.000,00 ao ofendido dos autos; (cfr., fls. 238 a 242-v que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).
*
Inconformado, o arguido recorreu para, em síntese, dizer (tão só) que excessiva é a pena e que lhe devia ser suspensa na sua execução; (cfr., fls. 265 a 272).
*
Respondendo, diz o Ministério Público que o recurso é de rejeitar; (cfr., fls. 274 a 277).
*
Neste T.S.I., e em sede de vista, juntou o Ilustre Procurador Adjunto o seguinte douto Parecer:
“Na Motivação de fls.266 a 272 dos autos, o recorrente solicitou a redução da pena aplicada pelo Tribunal a quo para a não superior a nove meses e a suspensão da execução, assacando o erro de direito ao Acórdão em escrutínio (cfr. fls.238 a 242 verso dos autos), por tal Acórdão infringir as disposições nos arts.64.º e 48.º do Código Penal de Macau (CPM)
Antes de mais, subscrevemos inteiramente as criteriosas explanações do ilustre Colega na douta Resposta (cfr. fls.274 a 277 dos autos).
*
Ressalvado respeito pelo entendimento diferente, afigura-se-nos que a doença AIDS da qual padece o ora recorrente, só por si, não possui a virtude de atenuação especial, e não se descortina nestes autos qualquer circunstância de atenuação especial favorável ao recorrente.
Sendo assim e na medida em que a pena de um ano de prisão aplicada pelo Tribunal a quo é apenas um quinto (1/5) do limite máximo da moldura consagrada no n.º1 do art.198º do CPM, temos por concludente que tal pena de um ano de prisão é benevolente em vez de ser excessiva severidade, e o Acórdão in quaestio não infringe o disposto no art.64.º do CPM, decaindo assim o pedido de redução da pena.
*
O n.º1 do art.48º do CPM revela inequivocamente que a suspensão da execução de pena de prisão depende do preenchimento cumulativo de dois requisitos: o formal traduz em a pena aplicada não ser superior a 3 anos; e o material na razoável conclusão (do julgador) de que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam, adequada e suficientemente, as finalidades da punição que, de acordo com a determinação no art.40º do CPM. Nos termos deste segmento legal, tal conclusão tem de angular-se em apreciação e valorização prévias, de índole prognóstico e prudente, de personalidade do agente, das condições da sua vida, da conduta anterior e posterior ao crime e das circunstâncias deste.
Vale ter presente a sensata jurisprudência que inculca que mesmo sendo favorável o prognóstico relativamente ao delinquente, apreciado à luz de considerações exclusivas da execução da prisão, não será decretada a suspensão se a ela se opuserem as necessidades de reprovação e prevenção do crime. (vide. Acórdãos do TSI nos Processos n.º242/2002, n.º190/2004 e n.º192/2004)
Em esteira e atendendo ao antecedente criminal e ao vício de consumo de droga, sufragamos a deliberada conclusão extraída pelo ilustre colega, no sentido de que “至於是否對上訴人適用緩刑之問題,檢察院認為上訴人之個案未能符合法律規定給予緩刑的實質要件。尤其是上訴人不是初犯,且是在另案(CR4-15-0191-PCC)的緩刑期間再次犯同類的盜竊罪,顯示其極度藐視法律,嚴重缺乏守法意識,故僅對事實作出讉責並以監禁作威嚇不足以實現處罰之目的。因此,不應給予上訴人緩刑。”
Interessa assinalar que o cumprimento efectivo da pena de prisão não interrompe nem impede a consulta médica periódica para remediar a doença do recorrente, por isso, o facto de ele necessitar de tratamento médico não justifica a suspensão da execução.
Por todo o expendido acima, propendemos pela improcedência do presente recurso”; (cfr., fls. 291 a 292).
*
Em sede de exame preliminar constatou-se da “manifesta improcedência” do presente recurso, e, nesta conformidade, atento o estatuído no art. 407°, n.° 6, al. b) e 410°, n.° 1 do C.P.P.M., (redacção dada pela Lei n.° 9/2013, aplicável aos presentes autos nos termos do seu art. 6°, n.° 1 e 2, al. 2), e tendo-se presente que a possibilidade de “rejeição do recurso por manifesta improcedência” destina-se a potenciar a economia processual, numa óptica de celeridade e de eficiência, visando, também, moralizar o uso (abusivo) do recurso, passa-se a decidir.
Fundamentação
Dos factos
2. Estão “provados” os factos como tal elencados no Acórdão recorrido a fls. 238-v a 239, e que aqui se dão como integralmente reproduzidos, (não havendo factos por provar).
Do direito
3. Vem o arguido recorrer do Acórdão que o condenou como autor material da prática de 1 crime de “furto qualificado”, p. e p. pelo art. 198°, n.° 1, al. a) e 196°, al. a) do C.P.M., na pena de 1 ano de prisão, e no pagamento de uma indemnização no montante de MOP$43.000,00 ao ofendido dos autos, afirmando que “excessiva” é a pena e que se lhe devia decretar a “suspensão da execução da pena”.
Porém, e sem embargo do muito respeito por outro entendimento, não se vislumbra que tenha o recorrente qualquer razão, apresentando-se-nos de julgar o presente recurso “manifestamente improcedente”, como já se deixou adiantado e infra se passa a (tentar) explicitar.
Vejamos, (notando-se desde já que o facto de padecer o arguido de doença infecciosa não se nos apresenta como factor a ponderar no âmbito das questões colocadas).
Pois bem, ao crime de “furto qualificado” cabe a pena de prisão até 5 anos ou pena de multa 600 dias; (cfr., art. 198°, n.° 1 do C.P.M.).
Nos termos do art. 40° do C.P.M.:
“1. A aplicação de penas e medidas de segurança visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade.
2. A pena não pode ultrapassar em caso algum a medida da culpa.
3. A medida de segurança só pode ser aplicada se for proporcionada à gravidade do facto e à perigosidade do agente”.
Por sua vez, preceitue o art. 64° do mesmo C.P.M. que:
“Se ao crime forem aplicáveis, em alternativa, pena privativa e pena não privativa da liberdade, o tribunal dá preferência à segunda sempre que esta realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição”.
E, em sede de determinação da pena, tem este T.S.I. entendido que “Na determinação da medida da pena, adoptou o Código Penal de Macau no seu art.º 65.º, a “Teoria da margem da liberdade”, segundo a qual, a pena concreta é fixada entre um limite mínimo e um limite máximo, determinados em função da culpa, intervindo os outros fins das penas dentro destes limites”; (cfr., v.g., os recentes Acs. deste T.S.I. de 24.05.2018, Proc. n.° 301/2018, de 13.09.2018, Proc. n.° 626/2018 e de 17.01.2019, Proc. n.° 1077/2018).
No caso dos autos, o arguido ora recorrente tem “antecedente criminal”, não sendo primário, (cfr., C.R.C., a fls. 221 a 230), tendo já cometido (recentemente) o mesmo crime de “furto”, tudo a indicar uma personalidade que insiste em delinquir, alheia às normas de convivência social, pelo que, atenta a factualidade dada como provada, ponderando nos critérios do art. 40°, 64° e 65°, à pena aplicável para o crime cometido, e tendo em conta as fortes necessidades de prevenção especial e geral, excessiva não se apresenta a pena de 1 ano de prisão, que se situa a 11 meses do mínimo legal, e a 4 anos do seu máximo, (cabendo notar que adequada se nos mostra a opção do Tribunal a quo por uma “pena de prisão”, em detrimento de uma pena de multa, pois que esta não realiza, da forma adequada e suficiente, as finalidade da punição, cfr., art. 64°).
Por sua vez, e como temos vindo a afirmar, importa ter presente que com os recursos não se visa eliminar a margem de livre apreciação reconhecida ao Tribunal de 1ª Instância em matéria de determinação da pena, devendo-se confirmar a pena aplicada se verificado estiver que no seu doseamento foram observados os critérios legais legalmente atendíveis; (cfr., v.g., os Acs. do Vdo T.U.I. de 03.12.2014, Proc. n.° 119/2014 e de 04.03.2015, Proc. n.° 9/2015).
Acompanhando o Tribunal da Relação de Évora temos igualmente considerado que:
“I - Também em matéria de pena o recurso mantém o arquétipo de remédio jurídico, pelo que o tribunal de recurso deve intervir na pena (alterando-a) apenas e só quando detectar incorrecções ou distorções no processo de determinação da sanção.
II - Por isso, o recurso não visa nem pretende eliminar alguma margem de apreciação livre reconhecida ao tribunal de 1ª instância nesse âmbito.
III - Revelando-se, pela sentença, a selecção dos elementos factuais elegíveis, a identificação das normas aplicáveis, o cumprimento dos passos a seguir no iter aplicativo e a ponderação devida dos critérios legalmente atendíveis, justifica-se a confirmação da pena proferida”; (cfr., o Ac. de 22.04.2014, Proc. n.° 291/13, in “www.dgsi.pt”, aqui citado como mera referência, e Acórdão do ora relator de 12.07.2018, Proc. n.° 534/2018, de 25.10.2018, Proc. n.° 570/2018 e de 17.01.2019, Proc. n.° 1138/2018).
No mesmo sentido decidiu este T.S.I. que: “Não havendo injustiça notória na medida da pena achada pelo Tribunal a quo ao arguido recorrente, é de respeitar a respectiva decisão judicial ora recorrida”; (cfr., o Ac. de 24.11.2016, Proc. n.° 817/2016).
E, como se tem igualmente decidido:
“O recurso dirigido à medida da pena visa tão-só o controlo da desproporcionalidade da sua fixação ou a correcção dos critérios de determinação, atentos os parâmetros da culpa e as circunstâncias do caso.
A intervenção correctiva do Tribunal Superior, no que diz respeito à medida da pena aplicada só se justifica quando o processo da sua determinação revelar que foram violadas as regras da experiência ou a quantificação se mostrar desproporcionada”; (cfr., o Ac. da Rel. de Lisboa de 24.07.2017, Proc. n.° 17/16).
“O tribunal de recurso deve intervir na pena, alterando-a, apenas quando detectar incorrecções ou distorções no processo de aplicação da mesma, na interpretação e aplicação das normas legais e constitucionais que a regem. Nesta sede, o recurso não visa nem pretende eliminar alguma margem de actuação, de apreciação livre, reconhecida ao tribunal de primeira instância enquanto componente individual do ato de julgar.
A sindicabilidade da pena em via de recurso situa-se, pois, na detecção de um desrespeito dos princípios que norteiam a pena e das operações de determinação impostas por lei. E esta sindicância não abrange a determinação/fiscalização do quantum exacto da pena que, decorrendo duma correcta aplicação das regras legais e dos princípios legais e constitucionais, ainda se revele proporcionada”; (cfr., o Ac. da Rel. de Guimarães de 25.09.2017, Proc. n.° 275/16).
Dito isto, e não nos parecendo haver erro evidente ou manifesta desproporção, à vista está a solução quanto à questão da espécie e “medida da pena”.
–– Continuemos, passando-se para a pretendida “suspensão da execução da pena”.
Nos termos do art. 48° do C.P.M.:
“1. O tribunal pode suspender a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a 3 anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
2. O tribunal, se o julgar conveniente e adequado à realização das finalidades da punição, subordina a suspensão da execução da pena de prisão, nos termos dos artigos seguintes, ao cumprimento de deveres ou à observância de regras de conduta, ou determina que a suspensão seja acompanhada de regime de prova.
3. Os deveres, as regras de conduta e o regime de prova podem ser impostos cumulativamente.
4. A decisão condenatória especifica sempre os fundamentos da suspensão e das suas condições.
5. O período de suspensão é fixado entre 1 e 5 anos a contar do trânsito em julgado da decisão”.
Tratando de idêntica matéria teve já este T.S.I. oportunidade de consignar que:
“O artigo 48º do Código Penal de Macau faculta ao juiz julgador a suspensão da execução da pena de prisão aplicada ao arguido quando:
– a pena de prisão aplicada o tenha sido em medida não superior a três (3) anos; e,
– conclua que a simples censura do facto e ameaça de prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição (cfr. Art.º 40.º), isto, tendo em conta a personalidade do agente, as condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste.
E, mesmo sendo favorável o prognóstico relativamente ao delinquente, apreciado à luz de considerações exclusivas da execução da prisão não deverá ser decretada a suspensão se a ela se opuseram as necessidades de prevenção do crime”; (cfr., v.g., os recentes Acs. deste T.S.I. de 11.01.2018, Proc. n.° 1157/2017, de 26.04.2018, Proc. n.° 228/2018 e de 25.10.2018, Proc. n.° 570/2018).
O instituto da suspensão da execução da pena baseia-se numa relação de confiança entre o Tribunal e o condenado. Aquele convence-se, em juízo de prognose favorável, que o arguido, sentindo a condenação, é capaz de passar a conduzir a sua vida de modo lícito e adequado, acreditando ainda que o mesmo, posto perante a censura do facto e a ameaça da pena, é capaz de se afastar da criminalidade; (cfr., v.g., os recentes Acs. deste T.S.I. de 09.11.2017, Proc. n.° 853/2017, de 18.01.2018, Proc. n.° 1/2018 e de 12.07.2018, Proc. n.° 534/2018).
Como decidiu o T.R. de Guimarães:
“I) As razões que estão na base do instituto da suspensão da execução da pena radicam, essencialmente, no objectivo de afastamento das penas de prisão efectiva de curta duração e da prossecução da ressocialização em liberdade.
II) Por isso, se conclui sempre que, desde que seja aconselhável à luz de exigências de socialização, a pena de substituição só não deverá ser aplicada se a opção pela execução efectiva de prisão se revelar indispensável para garantir a tutela do ordenamento jurídico ou para responder a exigências mínimas de estabilização das expectativas comunitárias”; (cfr., o Ac. de 11.05.2015, Proc. n.° 2234/13).
Considerava também Jescheck que: “o tribunal deve dispor-se a correr um risco aceitável, porém se houver sérias dúvidas sobre a capacidade do réu para aproveitar a oportunidade ressocializadora que se lhe oferece, deve resolver-se negativamente a questão do prognóstico”; (in, “Tratado de Derecho Penal”– Parte General – Granada 1993, pág. 760, e, no mesmo sentido, o Ac. da Rel. de Lisboa de 05.05.2015, Proc. n.° 242/13, e, mais recentemente, da Rel. de Coimbra de 27.09.2017, Proc. n.° 147/15, onde se consignou que “Na formulação deste juízo [de prognose] o tribunal deve correr um risco prudente pois a prognose é uma previsão, uma conjectura, e não uma certeza. Quando existam dúvidas sérias e fundadas sobre a capacidade do agente para entender a oportunidade de ressocialização que a suspensão significa, a prognose deve ser negativa e a suspensão negada”, in “www.dgsi.pt”).
No caso, e como se disse, atento o antecedente criminal do ora recorrente, e constatando-se que cometeu o crime dos autos em pleno período de suspensão da execução da pena aplicada pelo anterior crime de “furto”, (patentemente) inviável é um novo “juízo de prognose favorável”, pois que muito fortes são as necessidades de prevenção especial, a afastar uma pretendida suspensão da execução da pena aplicada.
Outra questão, (ainda que de conhecimento oficioso), não havendo, há que decidir como segue.
Decisão
4. Nos termos e fundamentos expostos, decide-se rejeitar o recurso.
Pagará o arguido a taxa de justiça que se fixa em 4 UCs, e como sanção pela rejeição do recurso o equivalente a 3 UCs; (cfr., art. 410°, n.° 3 do C.P.P.M.).
Honorários ao Exmo. Defensor no montante de MOP$1.800,00.
Registe e notifique.
Nada vindo de novo, e após trânsito, remetam-se os autos ao T.J.B. com as baixas e averbamentos necessários.
Macau, aos 05 de Março de 2019
Proc. 63/2019 Pág. 2
Proc. 63/2019 Pág. 1