Processo n.º 1030/2017 Data do acórdão: 2019-4-4
Assuntos:
– erro notório na apreciação da prova
– art.º 400.º, n.º 2, alínea c), do Código de Processo Penal
S U M Á R I O
Como vistos todos os elementos da prova referidos na fundamentação probatória do acórdão recorrido, não se vislumbra que o tribunal a quo tenha violado, de modo patente, quaisquer regras da experiência da vida humana em normalidade de situações, quaisquer normas jurídicas sobre o valor legal da prova, ou ainda quaisquer leges artis a observar no julgamento de factos, não pode ter ocorrido o erro notório, por parte desse tribunal, na apreciação da prova como vício aludido na alínea c) do n.o 2 do art.o 400.o do Código de Processo Penal.
O relator,
Chan Kuong Seng
Processo n.º 1030/2017
(Recurso em processo penal)
Recorrente (arguido): B (B)
ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA
REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU
I – RELATÓRIO
Por acórdão proferido a fls. 643 a 654 do subjacente Processo Comum Colectivo n.o CR2-17-0058-PCC do 2.o Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base (TJB), ficou condenado o arguido B, aí já melhor identificado, como autor material, na forma consumada, de um crime de provocação de incêndio com perigo criado por negligência, p. e p. pelo art.o 264.o, n.os 2 e 1, alínea a), do Código Penal (CP), em três anos de prisão, suspensa na execução por três anos, sob condição de pagamento, dentro de três meses, das quantias indemnizatórias aí arbitradas oficiosamente (com juros legais desde a data desse acórdão até integral e efectivo pagamento) a favor de diversos ofendidos.
Inconformado, veio o arguido recorrer para este Tribunal de Segunda Instância (TSI), tendo alegado (no seu essencial) e peticionado o seguinte na sua motivação de fls. 666 a 694 dos presentes autos correspondentes:
– o Tribunal recorrido errou notoriamente na apreciação da prova, sobretudo ao dar por provado que o incêndio tinha sido provocado pela ponta de cigarro (ainda não apagada) lançada pelo próprio recorrente e inclusivamente que essa ponta de cigarro tinha incendiado vestígios de óleo combustível no chão do local em causa, pelo que em prol do princípio de in dubio pro reo, devia ser ele absolvido do crime por que vinha condenado em primeira instância;
– e mesmo que assim não se entendesse, sempre mereceria ele pena de prisão mais leve e período de suspensão da pena de prisão mais curto, aos critérios plasmados nos art.os 40.o, 65.o, n.os 1 e 2, e 48.o do CP.
Ao recurso, respondeu a Digna Delegada do Procurador a fls. 699 a 707 no sentido de improcedência do recurso.
Subidos os autos, opinou a Digna Procuradora-Adjunta a fls. 723 a 725, no sentido de manutenção do julgado.
Feito o exame preliminar e corridos os vistos, cumpre decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICA
Do exame dos autos, sabe-se que o acórdão ora recorrido se encontrou proferido a fls. 643 a 654 dos autos, cujo teor integral se dá por aqui integralmente reproduzido.
III – FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
De antemão, cabe notar que mesmo em processo penal, e com excepção da matéria de conhecimento oficioso, ao tribunal de recurso cumpre resolver apenas as questões material e concretamente alegadas na motivação do recurso e devidamente delimitadas nas conclusões da mesma, e já não responder a toda e qualquer razão aduzida pela parte recorrente para sustentar a procedência das suas questões colocadas (nesse sentido, cfr., de entre muitos outros, os acórdãos do TSI, de 7 de Dezembro de 2000 no Processo n.o 130/2000, de 3 de Maio de 2001 no Processo n.o 18/2001, e de 17 de Maio de 2001 no Processo n.o 63/2001).
É nesses parâmetros que vai ser decidida a presente lide recursória.
O arguido apontou à decisão condenatória recorrida, a título principal, o vício de erro notório na apreciação da prova, aludido na alínea c) do n.o 2 do art.o 400.o do CPP.
Entretanto, vistos todos os elementos da prova referidos na fundamentação probatória do acórdão recorrido, não se vislumbra que o Tribunal recorrido tenha violado, de modo patente, quaisquer regras da experiência da vida humana em normalidade de situações, quaisquer normas jurídicas sobre o valor legal da prova, ou ainda quaisquer leges artis a observar no julgamento de factos, pelo que não pode ter ocorrido o erro notório na apreciação da prova invocado na motivação do recurso.
Na verdade, o Tribunal recorrido já explicou minuciosamente (nas páginas 12 a 18 do texto do seu acórdão, concretamente a fls. 648v a 651v) o processo de formação da sua livre convicção no julgamento dos factos, permitida nos termos do art.o 114.o do CPP, tendo explicado até concretamente por quê é que não aderiu à tese fáctica exposta pela testemunha da defesa XXX. Por outro lado, é descabido ao recorrente levantar a questão à volta de vestígios de óleo combustível, pois o Tribunal recorrido deu provado que a ponta de cigarro (ainda não apagada) lançada pelo arguido incendiou o corpo de uma mota (cfr. os factos provados 4 e 5), e não que essa ponta de cigarro incendiou vestígios de óleo combustível no chão do local em causa. E a tese fáctica sustentada pelo arguido na motivação do recurso já foi contrariada pela livre convicção do Tribunal Colectivo (cfr. mormente os segundo e terceiro factos não provados descritos a fl. 648v), formada, aos olhos do presente Tribunal ad quem, sem violação patente, repita-se, de quaisquer regras da experiência da vida humana em normalidade de situações, quaisquer normas jurídicas sobre o valor legal da prova, ou ainda quaisquer leges artis a observar no julgamento de factos.
Quanto à medida concreta da pena de prisão, após ponderando tudo (com consideração de todas as circunstâncias fácticas já apuradas pelo Tribunal a quo e descritas como provadas no texto da decisão recorrida) à luz dos padrões da medida da pena vertidos nos art.os 40.º, n.os 1 e 2, e 65.º, n.os 1 e 2, do CP, não detecta Tribunal de recurso a existência de qualquer injustiça notória na aplicação da pena de três anos de prisão ao arguido. E no tocante à duração da suspensão da execução dessa pena de prisão, o período de três anos de suspensão já é benévolo ao arguido, atentas as circunstâncias fácticas já apuradas e as exigências prementes da prevenção do tipo de crime em mira.
Improcede, pois, o recuros, sem mais indagação por ociosa.
IV – DECISÃO
Dest’arte, acordam em julgar não provido o recurso, com custas do recurso pelo arguido, com seis UC de taxa de justiça.
Comunique a presente decisão aos ofendidos identificados no dispositivo do aresto recorrido.
Macau, 4 de Abril de 2019.
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Chan Kuong Seng
(Relator)
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Tam Hio Wa
(Primeira Juíza-Adjunta)
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Chou Mou Pan
(Segundo Juiz-Adjunto)
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