Processo n.º 1037/2015
(Autos de recurso contencioso)
Relator: Fong Man Chong
Data: 09/Maio/2019
Assuntos:
- Concurso público para aquisição de leite destinado a alunos
- Padrões de avaliação de propostas fixadas pela Comissão de Avaliação
- Alegados vícios da violação desses patrões
SUMÁRIO:
I – Em matéria de concurso público para adquisição de bens pela Administração Pública, cabe à entidade competente fixar, nos termos legalmente fixados, os critérios para avaliação de propostas apresentadas pelas empresas concorrentes.
II – No caso sub judice, foram fixados, entre outros, os seguintes critérios - conforme os critérios previstos nos pontos 17.2.c. e 17.2.d. do Regulamento do Concurso - para calcular as cotações das concorrentes, tendo em conta os elementos apresentados pelas mesmas:
17.2 Critérios de adjudicação:
a. …,
b. …,
c. Experiência do concorrente no fornecimento de leite e/ou leite de soja‒15%;
d. História da bebida ‒15%;
e ....
A fim de densificar tais critérios, na primeira reunião, ocorrida em 17 de Abril de 2015, a Comissão de Apreciação, esclarecendo, à luz do regulamento do concurso, os critérios supra aludidos em c. e d., exarou em acta o seguinte:
Quanto à alínea c, a apreciação é feita de acordo com o ponto 8.12.1 do programa do concurso... O concorrente obteria a classificação máxima de 15 pontos se, durante o período compreendido entre 2009 e 2014, lhe fossem adjudicados em Macau três ou mais serviços de fornecimento de produtos de leite, e a falta de cada um serviço implica a redução de 5 pontos.
Quanto à alínea d, a apreciação é feita de acordo com o ponto 8.12.2 do programa do concurso… A história da bebida é contada por ano desde a criação da respectiva marca até 2014. A marca com história mais longa tem 15 pontos, e os restantes obtêm classificações proporcionalmente. Quanto menor for a história, menor será a pontuação obtida.
III – Respeitante ao critério da alínea c), defende a Recorrente que como o seu currículo comporta três adjudicações de serviços, todas relativas a fornecimentos de leite a escolas, enquanto os outros concorrentes, embora patenteiem igual histórico de três adjudicações, estas não respeitam todas a fornecimentos a escolas, pelo que, neste campo, as pontuações deveriam ter sido diferenciadas, com prevalência para a proposta da Recorrente, e não iguais como foram. Não é de aceitar este raciocínio, visto que O critério do item C em análise, em lado nenhum se refere que “o fornecimento de produtos aos alunos (ou às escolas) nos anos anteriores” como critério de avaliação, pois, o que está em causa é o tipo e a qualidade de produtos fornecidos e não tanto os destinatários dos mesmos.
IV – Relativamente ao critério da alínea d), defende a Recorrente que a marca de leite XX, que a Recorrente apresentou a concurso, devia ser considerada mais antiga e, por isso, ter obtido melhor pontuação que a marca XX apresentada pelo recorrido particular e adjudicatário, pois aquela é produzida pela “XX Corporation”, uma sociedade com um histórico de mais de 125 anos de produção de bebidas, e esta última apenas conta com um historial de 58 anos. Igualmente improcede este argumento da Recorrente, posto que a marca XX, segundo os elementos fornecidos a concurso pela própria recorrente, foi criada em 1981, e não há mais de 125 anos, como parece querer sustentar agora. Há 125 ou mais ano foi criada a firma fabricante, “XX Corporation”, só que não é o historial do fabricante que está aqui em jogo, mas sim, e apenas, o da marca apresentada a concurso, e essa tinha, no momento do concurso, 33 anos de história. Por sua vez, a marca XX tinha, ao tempo, 58 anos de experiência, pelo que, à luz das regras do concurso, não podia deixar de ser a melhor pontuada neste item.”
V – Inverificados os vícios apontados pela Recorrente, é de julgar improcedente o recurso por ela interposto, mantendo-se a decisão recorrida.
O Relator,
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Fong Man Chong
Processo n.º 1037/2015
(Autos de recurso contencioso)
Data : 09/Maio/2019
Recorrente : - Agência Comercial A, Limitada (A有限公司)
Entidade Recorrida : - Chefe do Executivo da RAEM
Contra-interessados : - Supermercados B (B有限公司)
- C (Macau), Limitada (C(澳門)有限公司)
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ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA RAEM:
I – RELATÓRIO
Agência Comercial A, Limitada (A有限公司), Recorrente, devidamente identificado nos autos, discordando do despacho do Chefe do Executivo, datado de 14/11/2016, exarado sobre o parecer do Secretário para os Assuntos Sociais e Cultura da RAEM de 30/09/2015, mandado tornar público pelo ofício n.º 7379/DASE/2015 do Director do Departamento de Educação e Juventude em nome do Presidente da Comissão Administrativa do Fundo de Acção Social Escolar, que indeferiu a reclamação apresentada pela ora Recorrente em 28/08/2015 quanto à decisão de adjudicação no âmbito do “Concurso Público para Prestação de Serviços de Fornecimento de Leite e Leite de Soja às Escolas nos Anos Escolares de 2015/2016 e 2016/2017”, veio em 13/04/2017 interpor o competente recurso contencioso para este TSI, com os fundamentos constantes de fls. 223 a 240, tendo formulado as seguintes conclusões:
A. A ora Recorrente foi notificada em 21 de Agosto de 2015 do ofício n.º 5681/DASE/2015 do FASE do Governo da RAEM, tendo sido informada de que não obtivera adjudicação no Programa de Concurso para a “Prestação de serviços de fornecimento de leite e leite de soja às escolas nos anos escolares de 2015/2016 e 2016/2017”.
B. Inconformada, a Recorrente apresentou a sua reclamação ao SASC em 26 de Agosto de 2015, requerendo, sumariamente, que a adjudicação fosse reconsiderada, atendendo ao facto de as duas marcas apresentadas pela Recorrente (“XX” e “XX”) se encontrarem ancoradas no fornecimento irrepreensível de tais produtos às escolas de Macau entre os anos lectivos de 2011/2012 e 2014/2015.
C. Em resposta à referida reclamação, o ofício n.º 7379/DASE/2015 do FASE de 5 de Novembro de 2015 (junto como documento 1 na petição de recurso) veio notificar a Recorrente que a sua reclamação tinha sido indeferida por Despacho de 16 de Outubro de 2015 do Chefe do Executivo da RAEM, exarado sobre o parecer do Secretário para os Assuntos Sociais e Cultura da RAEM de 30 de Setembro de 2015.
D. O mesmo ofício veio esclarecer as pontuações atribuídas para cada um dos critérios de adjudicação apresentados no ponto 17 do Programa de Concurso, tendo a decisão da entidade adjudicante atribuiu a pontuação máxima (15 pontos) aos três produtos apresentados a concurso no critério c. do Programa de Concurso (cfr. ofício n.º 7379/DASE/2015 do FASE de 5 de Novembro de 2015 supra apresentado).
E. A decisão da entidade adjudicante atribuiu ainda a pontuação máxima (15 pontos) à marca “XX” no critério d., enquanto a marca “XX” recebeu 8.53 pontos neste critério.
F. A Recorrente não pode aceitar o Despacho do Chefe do Executivo que confirmou a decisão da entidade adjudicante porquanto tal decisão constitui uma violação de lei na forma de erro manifesto ou total desrazoabilidade no exercício de poderes discricionários por parte da entidade adjudicante, nos termos do artigo 21º, parágrafo 1), alínea d) do CPAC.
G. De facto, a decisão ora recorrida, que foi confirmada pelo Despacho do Chefe do Executivo da RAEM de 16 de Outubro de 2015, viola também de forma clara o princípio da legalidade ao basear-se numa avaliação patentemente desrazoável dos critérios em exame.
H. A procedência do presente recurso contencioso de anulação afectará a adjudicação do fornecimento de leite à rede escolar pelas entidades adjudicatárias, a saber, os Supermercados B (“B市場”) e à C (Macau), Limitada (C(澳門)有限公司), em conformidade com o Despacho do Chefe do Executivo da RAEM de 10 de Julho de 2015, exarado sobre o Parecer n.º 365/PDASE/2015- FASE do FASE,
I. Pelo que se requer a citação dos Supermercados B (“B市場”), empresa comercial com morada na XXX, Macau, e registada em nome do empresário em nome individual D, com matrícula n.º XXX junto da Conservatória do Registo Comercial e de Bens Móveis de Macau, a título de contra-interessada nos presentes autos, nos termos do artigo 42°, n.º 1, alínea b) do CPAC,
J. E ainda a citação da C (Macau), Limitada (C(澳門)有限公司), sociedade comercial com sede na XXX, Macau, e registada junto da Conservatória do Registo Comercial e de Bens Móveis de Macau sob o número SO XXX, a título de contra-interessada nos presentes autos, igualmente nos termos do artigo 42°, n.º 1, alínea b) do CPAC.
K. Em primeiro lugar, o critério c. do Programa de Concurso aloca 15 pontos na avaliação da experiência de cada concorrente no fornecimento de leite e/ou leite de soja.
L. Ora este critério encontra formalização no ponto 8.12 do mesmo Programa, que requer como documento para instrução da proposta, entre outros, o currículo do concorrente com a “descrição da sua experiência no fornecimento do leite e/ou leite de soja, às instituições ou escolas de Macau, entre 2009 e 2014 (...)” (negrito nosso).
M. Ao contrário do sustentado no ponto 4. do ofício n.º 7379/DASE/2015 do FASE de 5 de Novembro de 2015 (que notificou a Recorrente do Despacho do Chefe do Executivo da RAEM de 16 de Outubro de 2015), a experiência da entidade adjudicatária e da Recorrente não é nem quantitativa nem qualitativamente igual.
N. No que toca à experiência da ora Recorrente, a mesma arrima-se no facto de ter vencido os concurso públicos para a prestação de serviços de fornecimento de leite e de leite de soja às escolas nos anos escolares de 2011/2012 e 2012/2013, e ainda de 2013/2014 e 2014/2015, tendo-lhe ainda sido adjudicada a prestação de serviços de fornecimento de leite nos anos escolares de 2007/2008 e 2008/2009.
O. Já a empresa adjudicatária, malgrado forneça leite a outras instituições ou órgãos do Governo de Macau, não possui qualquer experiência no fornecimento às escolas de Macau, que é, retoma-se, o propósito do Concurso em análise.
P. Sendo o objecto do Programa de Concurso “(...) o fornecimento de leite e leite de soja aos alunos das escolas, a ter lugar do mês de Outubro de 2015 ao mês de Julho de 2016 e do mês de Outubro de 2016 ao mês de Julho de 2017, num total de 20 meses” e ainda “Fornecer o leite ou leite de soja nos dias lectivos, nos anos escolares de 2015/2016 e de 2016/2017, aos alunos do ensino infantil ao 6.° ano do ensino primário das escolas da Região Administrativa Especial de Macau (RAEM) (...)” (cfr. pontos 1.1 e 1.2 da Parte I do Programa de Concurso), não se compreende em que se baseou a entidade adjudicante para atribuir a mesma pontuação às duas entidades concorrentes.
Q. De facto, atendendo à extensa experiência que a ora Recorrente acumulou no exacto serviço que se procurava adjudicar, outra conclusão não podia ser tomada senão a atribuição de uma pontuação largamente superior aos produtos apresentados pela mesma, por mor de seis anos lectivos em que a Recorrente foi fornecedora de leite às escolas de Macau.
R. No que tange ao histórico da marca da bebida, a marca de leite “XX” proposta pela empresa adjudicatária recebeu 15 pontos neste critério, ou seja, a pontuação máxima.
S. Já as marcas “XX” e “XX” apresentadas pela Recorrente receberam 8.53 e 3.88 pontos, respectivamente.
T. Ora a marca “XX” pertence à empresa “XX Corporation”, uma sociedade que apresenta um currículo com mais de 125 anos de experiência na produção de um extenso leque de bebidas e que, aliás detém uma sólida reputação no sector.
U. Já a marca “XX”, pertencente à sociedade com o mesmo nome, tem um historial que se resume a 58 anos de experiência,
V. Pelo que, e em termos comparativos, facilmente se depreende que o valor a atribuir à marca “XX” apresentada pela ora Recorrente deveria ter obtido um valor superior à marca “XX” proposta pela entidade adjudicatária, na medida em que aquela possui maior experiência, mais tempo de implantação no mercado e, evidentemente, uma reputação mais antiga e consolidada que a marca “XX”.
W. De facto, se a entidade adjudicante decidiu atribuir 3.88 pontos à marca “XX” apresentada pela ora Recorrente, por presumivelmente considerar que esta detém um histórico menor que as outras duas marcas a concurso, não se compreende como é que a marca “XX”, com um histórico mais extenso e mais antigo do que as restantes, não recebeu pontuação máxima e comparativamente superior neste critério.
X. Ainda que se considere que os 58 anos de historial da marca “XX” proposta pela entidade adjudicatária justificam a atribuição da pontuação máxima no critério d) do Programa de Concurso, o que apenas por hipótese se admite, sem no entanto conceder, sempre se dirá, pelo supra exposto, que a ora Recorrente deveria ter, pelo menos, recebido também a pontuação máxima no que respeita à marca “XX”.
Y. Em conclusão, a decisão da entidade adjudicante nos critérios c. e d. do Programa de Concurso constitui uma violação de lei na forma de erro manifesto ou total desrazoabilidade no exercício de poderes discricionários por parte daquela, nos termos do artigo 21°, parágrafo 1), alínea d) do CPAC,
Z. Violando especificamente o princípio da legalidade ao basear a decisão numa avaliação patentemente desrazoável dos critérios c. e d. do Programa de Concurso em exame, atendendo aos factos subjacentes,
AA. Pelo que se requer a anulação do acto administrativo recorrido, nos termos e pelas razões ora apresentados, com a consequente reapreciação dos critérios em crise.
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Citada a Entidade Recorrida, o Senhor Chefe do Executivo da RAEM veio contestar o recurso com os fundamentos constantes de fls. 245 a 258, tendo formulado as seguintes conclusões:
1. 基於公平合理的考量,根據招標方案第8.12.1點和第17.2 點c項的規定,以及第一次評審委員會會議紀錄第4.3點的決議,投標人於2009至2014年期間向本澳學校或其他機構,供應牛奶服務達三項或以上,便可得到招標方案“判給標準內的投標人供應牛奶的經驗佔15%”規定之下的15分。
2. 可見,投標人供應牛奶的經驗的評分標準,並非投標人獲判給牛奶供應服務數量較多或曾向學校供應牛奶則評分必然較高;而是以投標人有否於2009至2014年期間於本澳獲判給牛奶供應服務達三項或以上。
3. 基於B市場和A有限公司於2009至2014年期間在本澳獲判給牛奶供應服務達三項,故均獲15分的滿分。
4. 因此,評審委員會全面充分地考慮了B市場和A有限公司提交的有關供應牛奶經驗的資料,並根據招標方案第17.2點c項的判給標準和第一次評審委員會會議第4.3點的決議,以及法律的一般原則,評審投標人以往供應牛奶的經驗。
5. 綜上所述,B市場與A有限公司供應牛奶經驗的分數相同,符合招標方案和法律的一般規定,並不存在任何瑕疵。
6. 根據第一次評審委員會會議紀錄第4.4點“按招標方案的第 8.12.2點的內容(即:投標人履歷及產品簡介,其中說明將供應的牛奶和/或豆奶產品的歷史簡介)作評審,當中飲品的歷史按有關的飲品品牌由創立至2014年間相距的年數計算,歷史年期最長的可獲15分,而其餘按比例得分,年期越少得分越低”的規定,投標人供應的飲品的歷史年期最長可獲15分。
7. 根據B市場提交的有關XX品牌歷史文件的內容“XX Dairy Coop is based in Sardinia ITALY and is a Cooperative specialized in the production of cow liquid milk and dairy products. The Cooperative has recently celebrated its 58 year of activities: XX Dairy Coop dated back in 1956 in the production of dairy products”,XX品牌始於一九五六年,具有五十八年歷史。
8. 根據A有限公司提交的有關XX品牌歷史的文件,以及起訴狀附件三有關XX品牌歷史的文件,均指出“XX has been making every meal a delight for 30 years since it started in 1981 as a business unit of XX Corporation's XX Ice Cream Division”,XX品牌始於一九八一年,具有三十三年歷史。
9. A有限公司於起訴狀附件三有關XX Corporation歷史的文件,指出“Established in 1890,La Fabrica de Cerveza de XX, Southeast Asia's First brewery produced and bottled what would eventually become one of the bestselling beers in the region.”,雖然XX Corporation成立於一八九零年,但其當時的業務是生產啤酒,並不是生產牛奶。
10. 同時,根據上述有關XX品牌歷史的文件,指出的XX與XX Corporation的關係“XX has been making every meal a delight for 30 years since it started in 1981 as a business unit of XX Corporation's XX Ice Cream Division”,XX品牌自一九八一年才成為XX Corporation's XX Ice Cream Division的其中一部分。
11. 因此,XX品牌並非始於XX Corporation成立的一八九零年,而是始於其一九八一年成為XX Corporation的其中一部分,故XX牛奶品牌僅具有三十三年歷史。
12. 基於B市場供應的XX品牌歷史年期最長,故排名第一;同時,基於A有限公司供應的XX牛奶品牌和XX品牌的歷史年期分別為三十三年和十五年,故上述兩品牌分別排名第二和第三。
13. 因此,評審委員會全面充分地考慮了B市場和A有限公司提交的有關牛奶品牌歷史的資料,並根據招標方案第17.2點d項的判給標準和第一次評審委員會會議第 4.4點的決議,以及法律的一般原則,評審投標人提交的有關牛奶品牌歷史的資料。
14. 綜上所述,B市場供應XX品牌的歷史獲15分滿分,以及A有限公司供應的XX品牌和XX品牌的歷史,分別獲8.53分和3.88分,符合招標方案和法律的一般規定,並不存在任何瑕疵。
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Citados os Contra-interessados, o Supermercados B (B有限公司) veio contestar o recurso com os fundamentos constantes de fls. 294 a 298, tendo formulado as seguintes conclusões:
i. A Recorrente AGÊNCIA COMERCIAL A, LIMITADA (A有限公司) interpõe o presente recurso contra o despacho de Sua Excelência o Chefe do Executivo, de 16 de Outubro de 2015 respeitante à adjudicação do “CONCURSO PÚBLICO PARA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE FORNECIMENTO DE LEITE E LEITE DE SOJA ÀS ESCOLAS NOS ANOS ESCOLARES DE 2015/2016 E 2016/2017” (o “Despacho Recorrido”);
ii. A Recorrente põe em crise as avaliações atribuídas pela entidade adjudicante aos concorrentes ao abrigo de dois critérios: a “experiência do concorrente no fornecimento do leite e/ou do leite de soja” e “histórico da marca da bebida”;
iii. Alegando que aquelas avaliações atribuídas pela entidade adjudicante, e, por conseguinte, o Despacho Recorrido, que as confirma, enfermam de violação de lei, na forma de erro manifesto ou total desrazoabilidade no exercício de poderes discricionários por parte da Administração, nos termos e para os efeitos da alínea d) do n.º 1 do artigo 21.º do CPAC;
iv. O ora Contra-Interessado entende, porém, que não assiste razão à Recorrente;
v. Nos termos do Programa de Concurso, os concorrentes têm que apresentar (1) a “Descrição da sua experiência no fornecimento do leite e/ou do leite de soja, às instituições ou escolas de Macau, entre 2009 e 2014 […].” (cfr. o ponto 8.12.1; sublinhado nosso), bem como (2) um “Breve historial sobre o leite e/ou o leite de soja a fornecer.” (cfr. o ponto 8.12.2);
vi. De acordo com a alínea c) do ponto 17.2 do Programa de Concurso e do ponto 4.3 da deliberação constante da acta da 1.ª reunião da Comissão de Avaliação, se os concorrentes tivessem fornecido leite às escolas ou outras instituições de Macau, durante o período entre 2009 e 2014, em três ou mais adjudicações, poderiam obter 15 pontos (sublinhado nosso);
vii. Segundo os documentos apresentados pelo Contra-Interessado quanto à sua experiência no fornecimento de leite (vide fls. 621 a 623 e 630 a 647 do processo administrativo), este-conseguiu obter três adjudicações, durante o período entre 2009 e 2014, a saber:
a) fornecimento de leite para consumo de funcionários do Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais, no primeiro semestre de 2011;
b) fornecimento de leite para a sociedade XX, S.A., entre 1/12/2014 e 30/11/2015; e
c) fornecimento de leite e produtos lacticínios para os serviços públicos da RAEM, em 2015;
viii. Pelo que, o Contra-Interessado obteve 15 pontos, nos termos do Programa de Concurso e da acta da 1.ª reunião da Comissão de Avaliação;
ix. Tal avaliação afigura-se correcta, na medida em que, ao contrário do que a Recorrente parece fazer crer nos artigos 16.º a 20.º da sua petição, a experiência de fornecimentos a escolas ou outras instituições tem o mesmo valor para efeitos do concurso sub judice;
x. O leite de marca “XX”, proposta pelo Contra-Interessado, é produzida continuamente desde 1956, tendo celebrado em 2014 o seu 58.º aniversário de funcionamento (vide fls.652 do processo administrativo)
xi. Doutro passo, a Recorrente propunha duas marcas de leite: “XX” e “XX”. Os documentos apresentados pela Recorrente indicam que a marca “XX” foi fundada em 1981, contando com uma história de 33 anos, e a marca “XX” encontra-se implantada no mercado desde 1999, tendo 15 anos de antiguidade (com referência a 2014);
xii. Assim, as marcas em apreço, nomeadamente “XX”, “XX” e “XX” são classificadas em 1.º, 2.º e 3.º lugares, respectivamente, segundo o critério de historial e período de tempo com presença no mercado, razão pela qual o Contra-Interessado obteve a pontuação máxima (15 pontos), porquanto a marca “XX” é, claramente, percorrendo os documentos apresentados pelos concorrentes, aquela que é comercializada há mais tempo;
xiii. Afigurando-se, portanto, não assistir razão à Recorrente, porquanto as avaliações atribuídas aos concorrentes assentaram em critérios objectivos, cognoscíveis e razoáveis, não padecendo de qualquer erro.
* * *
O Digno. Magistrado do Ministério Público junto do TSI emitiu o seguinte douto parecer (fls. 339 a 341):
“Agência Comercial A, Limitada” recorre contenciosamente do despacho de 16 de Outubro de 2015, do Senhor Chefe do Executivo, que lhe indeferiu impugnação administrativa da decisão de adjudicação no âmbito do “Concurso Público para Prestação de Serviços de Fornecimento de Leite e Leite de Soja às Escolas nos Anos Escolares de 2015/2016 e 2016/2017”.
Diz que o acto padece de violação de lei por manifesta desrazoabilidade no exercício dos poderes discricionários e por ofensa dos critérios constantes dos pontos 17.2 c. e 17.2.d. do Programa do Concurso.
Nas suas contestações, quer a autoridade recorrida, quer o recorrido particular D, adjudicatário do serviço posto a concurso, refutam que o acto padeça de qualquer ilegalidade, pugnado pela sua manutenção.
Vejamos, começando por notar que, quando fala de desrazoabilidade no exercício de poderes discricionários, a recorrente pretende aludir à forma como foram interpretados aqueles critérios constantes dos pontos 17.2.c. e 17.2.d.. Pois bem, o Programa do Concurso encerra o regulamento ou o conjunto de regras ou normas pelo qual se há-de reger o concurso. A tarefa de interpretação destas normas não envolve, salvo melhor juízo, qualquer discricionariedade, pois, na tarefa de interpretação, a Administração não está legitimada para escolher qualquer uma de entre várias interpretações possíveis ‒ ainda que seja aquela que se lhe afigura melhor defender o interesse público ‒ mas deve adoptar a interpretação correcta, sendo certo que só há uma forma correcta de interpretar a norma. Ademais, verifica-se que, na explicitação/densificação daqueles critérios, inserta nos pontos 4.3 e 4.4 da acta da primeira reunião da Comissão de Apreciação, limitou-se esta a exarar aí as regras previstas no próprio Programa do Concurso, sem que lhes introduzisse qualquer inovação.
Assim, não há aqui qualquer momento de discricionariedade, pelo que se revela improcedente a imputada desrazoabilidade no exercício de poderes discricionários.
Passemos, então à violação de lei por ofensa dos critérios previstos nos pontos 17.2.c. e 17.2.d. do Regulamento do Concurso.
Rezam assim tais pontos:
17.2 Critérios de adjudicação:
a. …,
b. …,
c. Experiência do concorrente no fornecimento de leite e/ou leite de soja‒15%;
d. História da bebida ‒15%;
e ....
Constata-se que na sua primeira reunião, ocorrida em 17 de Abril de 2015, a Comissão de Apreciação, esclarecendo, à luz do regulamento do concurso, os critérios supra aludidos em c. e d., exarou em acta o seguinte:
Quanto à alínea c, a apreciação é feita de acordo com o ponto 8.12.1 do programa do concurso... O concorrente obteria a classificação máxima de 15 pontos se, durante o período compreendido entre 2009 e 2014, lhe fossem adjudicados em Macau três ou mais serviços de fornecimento de produtos de leite, e a falta de cada um serviço implica a redução de 5 pontos.
Quanto à alínea d, a apreciação é feita de acordo com o ponto 8.12.2 do programa do concurso… A história da bebida é contada por ano desde a criação da respectiva marca até 2014. A marca com história mais longa tem 15 pontos, e os restantes obtêm classificações proporcionalmente. Quanto menor for a história, menor será a pontuação obtida.
A recorrente entende que foram violadas estas regras. No tocante ao critério da alínea c), porque o seu currículo comporta três adjudicações de serviços, todas relativas a fornecimentos de leite a escolas, sendo certo que os outros concorrentes, embora patenteiem igual histórico de três adjudicações, estas não respeitam todas a fornecimentos a escolas, pelo que, neste campo, as pontuações deveriam ter sido diferenciadas, com prevalência para a proposta da recorrente, e não iguais como foram. No tocante ao critério da alínea d), a marca de leite XX, que a recorrente apresentou a concurso, devia ser considerada mais antiga e, por isso, ter obtido melhor pontuação que a marca XX apresentada pelo recorrido particular e adjudicatário, pois aquela é produzida pela “XX Corporation”, uma sociedade com um histórico de mais de 125 anos de produção de bebidas, e esta última apenas conta com um historial de 58 anos.
Esta argumentação não é procedente.
Contrariamente ao raciocínio subjacente à tese da recorrente, a aludida regra da alínea c. não privilegia, em detrimento doutras, as adjudicações de fornecimentos a escolas. Isso resulta claro do ponto 8.12.1, onde se esclarece que a experiência dos concorrentes será aquilatada com base nos dados relativos a fornecimento de leite a escola ou instituição de Macau. Assim, ao pontuar em pé de igualdade, nesse campo, as propostas apresentadas, provenientes de concorrentes aos quais haviam sido adjudicados, no período considerado, três fornecimentos de leite, a Administração limitou-se a cumprir rigorosamente as regras do concurso.
E no tocante à história das marcas também não se detecta qualquer atropelo às regras do concurso, nomeadamente à já referida regra da alínea d. Na verdade, o que está em causa, na respectiva pontuação, é o historial da marca da bebida em concurso, o leite. Ora, a marca XX, segundo os elementos fornecidos a concurso pela própria recorrente, foi criada em 1981, e não há mais de 125 anos, como parece querer sustentar agora. Há 125 ou mais anos foi criada a firma fabricante, “XX Corporation”, só que não é o historial do fabricante que está aqui em jogo, mas sim, e apenas, o da marca apresentada a concurso, e essa tinha, no momento do concurso, 33 anos de história. Por sua vez, a marca XX tinha, ao tempo, 58 anos de experiência, pelo que, à luz das regras do concurso, não podia deixar de ser, como foi, a melhor pontuada neste item.
Improcede, assim, a suscitada violação de lei por inobservância das regras dos pontos 17.2.c. e 17.2.d..
Ante o exposto, o recurso não merece provimento.
* * *
Foram colhidos os vistos legais.
Cumpre analisar e decidir.
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II – PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
Este Tribunal é o competente em razão da nacionalidade, matéria e hierarquia.
O processo é o próprio e não há nulidades.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária e são dotadas de legitimidade “ad causam”.
Não há excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
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III – FACTOS
São os seguintes elementos, extraídos do processo principal e do processo administrativo com interesse para a decisão da causa:
1. Em 21 de Agosto de 2015 a Recorrente foi notificada do oficio n.º 5681/DASE/2015, do Fundo de Acção Social Escolar (FASE) do Governo da RAEM, o qual decidiu que a proposta apresentada pela Recorrente no âmbito do “Concurso Público para Prestação de Serviços de Fornecimento de Leite e Leite de Soja às Escolas nos Anos Escolares de 2015/2016 e 2016/2017” (Concurso Público) não obtivera vencimento.
2. Em 28 de Agosto de 2015, a Recorrente apresentou uma reclamação ao Secretário para os Assuntos Sociais e Cultura da RAEM (SASC), defendendo, por um lado, a qualidade superior dos dois produtos apresentados a concurso bem como o reconhecimento internacional das marcas respectivas, por outro lado, o preço convidativo dos dois produtos e, por fim, a vasta experiência da Recorrente no fornecimento de tais lacticínios em concursos análogos nos anos transactos, tendo requerido a reapreciação da decisão de adjudicação do fornecimento a favor da Recorrente.
3. Em resposta à referida reclamação, a Recorrente foi notificada em 6 de Novembro de 2015 do oficio n.º 7379/DASE/2015 do Director do Departamento de Educação e Juventude em nome do Presidente da Comissão Administrativa do FASE, que notificou a Recorrente do Despacho de Indeferimento do Chefe do Executivo da RAEM de 16 de Outubro de 2015 que indeferiu a supracitada reclamação apresentada em 26 de Agosto de 2015 (junto como documento 1 na petição de recurso de 1 de Dezembro de 2015).
4. O oficio n.º 7379/DASE/2015 do FASE supra indicado veio ainda esclarecer a Recorrente sobre os critérios de avaliação utilizados na decisão desse fundo para o Concurso Público em causa, apresentando um quadro com as pontuações finais obtidas pelas marcas apresentadas a concurso em cada um dos elementos de avaliação, que aqui se retoma por facilidade de exposição:
Concorrente
Entidade adjudicatária
Recorrente
Marca
XX
XX
XX
Preço da bebida (30% da avaliação final);
22.39
18.78
30.00
Análise de ingredientes da bebida (30% da avaliação final);
29.25
29.25
30.00
Experiência do concorrente no fornecimento de leite e/ou leite de soja (15% da avaliação final);
15.00
15.00
15.00
Histórico da marca da bebida (15% da avaliação final);
15.00
8.53
3.88
Certificado de qualidade da bebida (30% da avaliação final).
10.00
10.00
10.00
91.64
81.56
88.88
5. A Recorrente apresentou o presente recurso contencioso de anulação do Despacho do Chefe do Executivo, por não aceitar a avaliação feita quanto a alguns desses elementos, nomeadamente os critérios c. e d. (“experiência do concorrente no fornecimento de leite e/ou leite de soja” e “histórico da marca da bebida”, respectivamente) do Programa do Concurso Público (Programa de Concurso), por entender que o Despacho do Chefe do Executivo de 16 de Outubro de 2015, que confirmou a decisão da entidade adjudicante sobre aqueles critérios, corporiza uma violação de lei na forma de erro manifesto ou total desrazoabilidade no exercício de poderes discricionários por parte da mesma (o artigo 21°, parágrafo 1), alínea d) do CPAC) e também viola também de forma clara o princípio da legalidade ínsito no artigo 3° do Código do Procedimento Administrativo (CPA) pois baseia-se numa aplicação errónea e patentemente desrazoável dos critérios c. e d. do Programa de Concurso em exame, como veremos de seguida.
6. A Recorrente requereu a citação dos Supermercados B (“B市場”), empresa comercial com morada na XXX, Macau, e registada em nome do empresário em nome individual D, com matrícula n.º XXX junto da Conservatória do Registo Comercial e de Bens Móveis de Macau, a título de contra-interessada nos presentes autos, nos termos do artigo 42°, n.º 1, alínea b) do CPAC, e ainda a citação da C (Macau), Limitada (C(澳門)有限公司), sociedade comercial com sede na XXX, Macau, e registada junto da Conservatória do Registo Comercial e de Bens Móveis de Macau sob o número SO XXX, a título de contra-interessada nos presentes autos (artigo 42°, n." 1, alínea b) do CPAC).
* * *
IV – FUNDAMENTOS
Neste recurso a Recorrente veio a suscitar essencialmente 2 questões que importa analisar e decidir:
1) – O vício de violação de lei por manifesta desrazoabilidade no exercício dos poderes discricionários;
2) – Vício decorrente da ofensa dos critérios constantes dos pontos 17.2 c. e 17.2.d. do Programa do Concurso.
Comecemos pela primeira questão.
Em bom rigor, conforme a matéria está alegada e a forma de tratamento da questão em causa, não estamos perante um genuíno problema de exercício de poder discricionário, pois, nesta matéria, é do entendimento maioritário:
“(…) Depois do que se disse, parece-nos legítimo sustentar que a discricionariedade pode ser atribuída por diversas vias:
a) Os poderes discricionários do administrador são eventualmente resultado duma remissão para conceitos-tipo, sem se curar de saber se a indeterminação reside na hipótese ou na estatuição.
b) A discricionariedade surgirá ainda porque se impôs ao agente o dever de utilizar padrões de valoração de qualidade de pessoas ou coisas dos quais tem o monopólio legal. É o que se passa com o funcionamento de júris de exame, que se apoia na suposição de que os seus membros usufruem dos conhecimentos técnicos suficientes – que poderiam ser também encontrados em outros órgãos equivalentes – mas, além disso, duma capacidade incontrolável de apreciação da importância relativa dos conhecimentos ou da habilidade demonstrada para o desempenho duma tarefa específica, da atribuição duma habilitação genérica ou de concessão dum status. Quer dizer: não se trata apenas de decidir se está certo ou errado, bem ou mal feito, mas se os resultados positivos são bastantes para preencher um estalão incontrolável ou alcançar um dos seus sucessivos degraus. Identicamente acontece com a classificação de coisas do ponto de vista artístico, histórico, paisagístico ou ecológico.
A estes casos deve somar-se o conjunto das situações caracterizadas por uma avaliação de circunstâncias futuras (“decisões de prognose”).
É isto que, sem o querer, a corrente do controlo total acabar por ter de aceitar quando se afasta duma revisão judicial nos casos de prerrogativa de avaliação.
c) E, naturalmente, por fim, a discricionariedade surge ainda nas situações em que o legislador directamente concede ao agente uma “faculdade de acção”, isto é, em que remete para duas ou mais soluções à escolha.
41. Chegarmos às conclusões anteriores não invalida contudo o trabalho de análise do material jurídico posto à disposição do administrador, que as várias correntes representam. É que compreender o sentido de cada grau de vinculação não satisfaz um desejo bizantino. Convém não esquecer que qualquer discricionariedade que se atribua não equivale à aceitação do arbítrio, não permite uma solução de moeda ao ar. Nem sequer vale como uma remissão para uma responsabilidade moral do agente. Ora, se há encargo jurídico que pesa sobre o agente, ele careceria de sentido caso não se previsse a existência de um controlo. (in Direito Administrativo, Rogério Soares, lições aos alunos do 2º ano da Faculdade de Direito da Universidade católica do Porto, pág. 61 e seguintes).
O que se discute neste autos pode ser a má aplicação dos critérios fixados pela própria Administração, na densificação dos padrões fixados no programa do concurso para adquisição de bens e serviços em causa. E parece, salvo o melhor respeito, é este argumento principal que a Recorrente invocou para tentar destruir a decisão administrativa atacada.
A mesma leitura faz o Digno. Magistrado do MP junto deste TSI ao opinar do seguinte modo:
“Vejamos, começando por notar que, quando fala de desrazoabilidade no exercício de poderes discricionários, a recorrente pretende aludir à forma como foram interpretados aqueles critérios constantes dos pontos 17.2.c. e 17.2.d.. Pois bem, o Programa do Concurso encerra o regulamento ou o conjunto de regras ou normas pelo qual se há-de reger o concurso. A tarefa de interpretação destas normas não envolve, salvo melhor juízo, qualquer discricionariedade, pois, na tarefa de interpretação, a Administração não está legitimada para escolher qualquer uma de entre várias interpretações possíveis ‒ ainda que seja aquela que se lhe afigura melhor defender o interesse público ‒ mas deve adoptar a interpretação correcta, sendo certo que só há uma forma correcta de interpretar a norma. Ademais, verifica-se que, na explicitação/densificação daqueles critérios, inserta nos pontos 4.3 e 4.4 da acta da primeira reunião da Comissão de Apreciação, limitou-se esta a exarar aí as regras previstas no próprio Programa do Concurso, sem que lhes introduzisse qualquer inovação.
Assim, não há aqui qualquer momento de discricionariedade, pelo que se revela improcedente a imputada desrazoabilidade no exercício de poderes discricionários.”
Considerações estas que subscrevemos também, pois não se verifica nenhuma desrazoabilidade no exercício do poder de avaliação por parte da Administração Pública, nem a Recorrente chegou a indicar concretamente quais factos ou fundamentos que sejam capaz de invalidar neste ponto a decisão ora atacada, o que determina necessariamente a improcência da argumentação invocada pela Recorrente nesta parte do recurso.
*
Passemos a conhecer da 2ª questão.
Os critérios previstos nos pontos 17.2.c. e 17.2.d. do Regulamento do Concurso têm o seguinte teor:
17.2 Critérios de adjudicação:
a. …,
b. …,
c. Experiência do concorrente no fornecimento de leite e/ou leite de soja‒15%;
d. História da bebida ‒15%;
e ....
Constata-se que na sua primeira reunião, ocorrida em 17 de Abril de 2015, a Comissão de Apreciação, esclarecendo, à luz do regulamento do concurso, os critérios supra aludidos em c. e d., exarou em acta o seguinte:
Quanto à alínea c, a apreciação é feita de acordo com o ponto 8.12.1 do programa do concurso... O concorrente obteria a classificação máxima de 15 pontos se, durante o período compreendido entre 2009 e 2014, lhe fossem adjudicados em Macau três ou mais serviços de fornecimento de produtos de leite, e a falta de cada um serviço implica a redução de 5 pontos.
Quanto à alínea d, a apreciação é feita de acordo com o ponto 8.12.2 do programa do concurso… A história da bebida é contada por ano desde a criação da respectiva marca até 2014. A marca com história mais longa tem 15 pontos, e os restantes obtêm classificações proporcionalmente. Quanto menor for a história, menor será a pontuação obtida.
A Recorrente entende que foram violadas estas regras.
No que diz respeito à alínea c), a Recorrente invocou o seguinte:
a) Do critério de adjudicação c. do Programa de Concurso
13. O critério de adjudicação c. do Programa de Concurso, sob a epígrafe “experiência do concorrente no fornecimento de leite e/ou leite de soja”, aloca 15% da pontuação final na avaliação da experiência de cada concorrente no fornecimento de leite e/ou leite de soja.
14. Este critério encontra concretização fáctica no ponto 8.12 do mesmo Programa, que requer como documento para instrução da proposta, entre outros, o currículo do concorrente com a “descrição da sua experiência no fornecimento do leite e/ou leite de soja, às instituições ou escolas de Macau, entre 2009 e 2014 (…)” (negrito nosso).
15. Ora, ao contrário do sustentado no ponto 4. do oficio n.º 7379/DASE/2015 do FASE de 5 de Novembro de 2015 (que notificou a Recorrente do Despacho do Chefe do Executivo da RAEM de 16 de Outubro de 2015), a experiência da entidade adjudicatária e da Recorrente não é nem quantitativa nem qualitativamente igual.
16. De facto, a experiência da ora Recorrente baseia-se no facto de ter vencido os concurso públicos para a prestação de serviços de fornecimento de leite e de leite de soja às escolas nos anos escolares de 2011/2012 e 2012/2013, e ainda de 2013/2014 e 2014/2015, e, bem assim, no facto de lhe ter sido adjudicada a prestação de serviços de fornecimento de leite nos anos escolares de 2007/2008 e 2008/2009.
17. Acresce ainda o facto de a Recorrente ter experiência no fornecimento a instituições e órgãos do Governo, sendo presentemente um dos fornecedores de comida à Direcção dos Serviços de Finanças da RAEM.
18. Já a empresa adjudicatária, apesar de ter fornecido leite a outras instituições ou órgãos do Governo de Macau, não possui qualquer experiência no fornecimento à rede escolar de Macau, que é, retoma-se, o propósito do Concurso em análise.
19. Sendo o objecto do Programa de Concurso “(...) o fornecimento de leite e leite de soja aos alunos das escolas, a ter lugar do mês de Outubro de 2015 ao mês de Julho de 2016 e do mês de Outubro de 2016 ao mês de Julho de 2017, num total de 20 meses” e ainda “Fornecer o leite ou leite de soja nos dias lectivos, nos anos escolares de 2015/2016 e de 2016/2017, aos alunos do ensino infantil ao 6.º ano do ensino primário das escolas da Região Administrativa Especial de Macau (RAEM) (...)” (cfr. pontos 1.1 e 1.2 da Parte I do Programa de Concurso), não se compreende em que se baseou a entidade adjudicante para atribuir a mesma pontuação às duas entidades concorrentes.
20. De facto, atendendo à extensa experiência que a ora Recorrente acumulou no exacto serviço que se procurava adjudicar, outra conclusão não podia ser tomada senão a atribuição de uma pontuação largamente superior aos produtos apresentados pela mesma, por mor de seis anos lectivos em que a Recorrente foi fornecedora de leite às escolas de Macau.
Em suma, no entender da Recorrente, porque o seu currículo comporta três adjudicações de serviços, todas relativas a fornecimentos de leite a escolas, sendo certo que os outros concorrentes, embora patenteiem igual histórico de três adjudicações, estas não respeitam todas a fornecimentos a escolas, pelo que, neste campo, as pontuações deveriam ter sido diferenciadas, com prevalência para a proposta da Recorrente, e não iguais como foram.
Não acolhemos o raciocínio da Recorrente, visto que:
1) – O tema ou objectivo do concurso não corresponde necessariamente aos critérios que se utilizam para avaliar as propostas do concurso, obviamente tais critérios devem ser escolhidos tendo em conta o tipo e a qualidade dos produtos que se pretende obter.
2) – O critério do item C em análise, em lado nenhum se refere que “o fornecimento de produtos aos alunos (ou às escolas) nos anos anteriores” como critério de avaliação, pois, o que está em causa é o tipo e a qualidade de produtos fornecidos e não tanto os destinatários dos mesmos. Poderia ser este critério, mas não é o caso em apreciação!
3) – Até, caso fosse este critério optado o de “ter fornecidos os mesmos produtos aos alunos nos anos anteriores”, poderia suscitar a dúvida da violação do princípio de igualdade de tratamento de concorrentes, porque é uma exigência injustificada!
4) - Contrariamente ao raciocínio subjacente à tese da Recorrente, a aludida regra da alínea c) não privilegia, em detrimento doutras, as adjudicações de fornecimentos a escolas. Isso resulta claro do ponto 8.12.1, onde se esclarece que a experiência dos concorrentes será aquilatada com base nos dados relativos a fornecimento de leite a escola ou instituição de Macau.
5) - Nestes termos, não tem razão o argumento invocado pela Recorrente.
*
Acerca do critério da alínea d), a Recorrente veio a alegar o seguinte:
b) Do critério de adjudicação d. do Programa de Concurso
21. O critério de adjudicação d. do Programa de Concurso, sob a epígrafe “histórico da marca da bebida”, atribui 15% da pontuação final na avaliação da marca de leite e/ou leite de soja apresentada a concurso.
22. Neste critério, a marca de leite “XX” proposta pela empresa adjudicatária recebeu 15 pontos, tendo obtido aí a pontuação máxima.
23. Já as marcas “XX” e “XX” apresentadas pela Recorrente obtiveram 8.53 e 3.88 pontos neste critério, respectivamente.
24. Ora a marca “XX” pertence à empresa “XX Corporation”, uma sociedade que apresenta um currículo com mais de 125 anos de experiência na produção de um extenso leque de bebidas e que, aliás detém uma sólida reputação no sector.
25. Já a marca “XX”, pertencente à sociedade com o mesmo nome, tem um historial que se resume a 58 anos de experiência.
26. Assim, facilmente se depreende que o valor a atribuir à marca “XX” apresentada pela ora Recorrente deveria ter obtido um valor superior à marca “XX” proposta pela entidade adjudicatária, na medida em que aquela possui maior experiência, mais tempo de implantação no mercado e, evidentemente, uma reputação mais antiga e consolidada que a marca “XX”.
27. Aliás, a título comparativo, se a entidade adjudicante decidiu atribuir 3.88 pontos à marca “XX” apresentada pela ora Recorrente, por presumivelmente considerar que esta detém um histórico menor que as outras duas marcas a concurso, não se compreende como é que a marca “XX”, com um histórico mais extenso e mais antigo do que as restantes, não recebeu pontuação máxima e comparativamente superior neste critério.
28. Ainda que se considere que os 58 anos de historial da marca “XX” proposta pela entidade adjudicatária justificam a atribuição da pontuação máxima no critério d) do Programa de Concurso, o que apenas por hipótese se admite, sem no entanto conceder, sempre se dirá, pelo supra exposto, que a ora Recorrente deveria ter, pelo menos, recebido também a pontuação máxima no que respeita à marca “XX”.
Ou seja, a Recorrente defende que a marca de leite XX, que a Recorrente apresentou a concurso, devia ser considerada mais antiga e, por isso, ter obtido melhor pontuação que a marca XX apresentada pelo Recorrido particular e adjudicatário, pois aquela é produzida pela “XX Corporation”, uma sociedade com um histórico de mais de 125 anos de produção de bebidas, e esta última apenas conta com um historial de 58 anos.
Assim, ao pontuar em pé de igualdade, nesse campo, as propostas apresentadas, provenientes de concorrentes aos quais haviam sido adjudicados, no período considerado, três fornecimentos de leite, a Administração cumpriu rigorosamente as regras do concurso.
E no tocante à história das marcas também não se detecta qualquer atropelo às regras do concurso, nomeadamente à já referida regra da alínea d).
Bem o observou o Digno. Magistrado do MP junto deste TSI:
“Na verdade, o que está em causa, na respectiva pontuação, é o historial da marca da bebida em concurso, o leite. Ora, a marca XX, segundo os elementos fornecidos a concurso pela própria recorrente, foi criada em 1981, e não há mais de 125 anos, como parece querer sustentar agora. Há 125 ou mais ano foi criada a firma fabricante, “XX Corporation”, só que não é o historial do fabricante que está aqui em jogo, mas sim, e apenas, o da marca apresentada a concurso, e essa tinha, no momento do concurso, 33 anos de história. Por sua vez, a marca XX tinha, ao tempo, 58 anos de experiência, pelo que, à luz das regras do concurso, não podia deixar de ser, como foi, a melhor pontuada neste item.”
Pelo que, não se verificando o vício imputado, é de manter a decisão administrativa ora posta em crise, julgando-se improcedente o recurso interposto pela Recorrente.
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Síntese conclusiva:
I – Em matéria de concurso público para adquisição de bens pela Administração Pública, cabe à entidade competente fixar, nos termos legalmente fixados, os critérios para avaliação de propostas apresentadas pelas empresas concorrentes.
II – No caso sub judice, foram fixados, entre outros, os seguintes critérios - conforme os critérios previstos nos pontos 17.2.c. e 17.2.d. do Regulamento do Concurso - para calcular as cotações das concorrentes, tendo em conta os elementos apresentados pelas mesmas:
17.2 Critérios de adjudicação:
a. …,
b. …,
c. Experiência do concorrente no fornecimento de leite e/ou leite de soja‒15%;
d. História da bebida ‒15%;
e ....
A fim de densificar tais critérios, na primeira reunião, ocorrida em 17 de Abril de 2015, a Comissão de Apreciação, esclarecendo, à luz do regulamento do concurso, os critérios supra aludidos em c. e d., exarou em acta o seguinte:
Quanto à alínea c, a apreciação é feita de acordo com o ponto 8.12.1 do programa do concurso... O concorrente obteria a classificação máxima de 15 pontos se, durante o período compreendido entre 2009 e 2014, lhe fossem adjudicados em Macau três ou mais serviços de fornecimento de produtos de leite, e a falta de cada um serviço implica a redução de 5 pontos.
Quanto à alínea d, a apreciação é feita de acordo com o ponto 8.12.2 do programa do concurso… A história da bebida é contada por ano desde a criação da respectiva marca até 2014. A marca com história mais longa tem 15 pontos, e os restantes obtêm classificações proporcionalmente. Quanto menor for a história, menor será a pontuação obtida.
III – Respeitante ao critério da alínea c), defende a Recorrente que como o seu currículo comporta três adjudicações de serviços, todas relativas a fornecimentos de leite a escolas, enquanto os outros concorrentes, embora patenteiem igual histórico de três adjudicações, estas não respeitam todas a fornecimentos a escolas, pelo que, neste campo, as pontuações deveriam ter sido diferenciadas, com prevalência para a proposta da Recorrente, e não iguais como foram. Não é de aceitar este raciocínio, visto que O critério do item C em análise, em lado nenhum se refere que “o fornecimento de produtos aos alunos (ou às escolas) nos anos anteriores” como critério de avaliação, pois, o que está em causa é o tipo e a qualidade de produtos fornecidos e não tanto os destinatários dos mesmos.
IV – Relativamente ao critério da alínea d), defende a Recorrente que a marca de leite XX, que a Recorrente apresentou a concurso, devia ser considerada mais antiga e, por isso, ter obtido melhor pontuação que a marca XX apresentada pelo recorrido particular e adjudicatário, pois aquela é produzida pela “XX Corporation”, uma sociedade com um histórico de mais de 125 anos de produção de bebidas, e esta última apenas conta com um historial de 58 anos. Igualmente improcede este argumento da Recorrente, posto que a marca XX, segundo os elementos fornecidos a concurso pela própria recorrente, foi criada em 1981, e não há mais de 125 anos, como parece querer sustentar agora. Há 125 ou mais ano foi criada a firma fabricante, “XX Corporation”, só que não é o historial do fabricante que está aqui em jogo, mas sim, e apenas, o da marca apresentada a concurso, e essa tinha, no momento do concurso, 33 anos de história. Por sua vez, a marca XX tinha, ao tempo, 58 anos de experiência, pelo que, à luz das regras do concurso, não podia deixar de ser a melhor pontuada neste item.”
V – Inverificados os vícios apontados pela Recorrente, é de julgar improcedente o recurso por ela interposto, mantendo-se a decisão recorrida.
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Tudo visto, resta decidir.
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V ‒ DECISÃO
Em face de todo o que fica exposto e justificado, os juízes do TSI acordam em julgar improcedente o presente recurso, mantendo-se o despacho recorrido.
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Custas pela Recorrente que se fixam em 7 UCs.
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Notifique e Registe.
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RAEM, 09 de Maio de 2019.
Fong Man Chong
Ho Wai Neng
José Cândido de Pinho
Fui presente
Joaquim Teixeira de Sousa
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