Processo n.º 54/2019. Recurso jurisdicional em matéria cível.
Recorrente: A.
Recorrida: B.
Assunto: Marcas. Erro ou confusão do consumidor. Landmark. 置地.
Data do Acórdão: 22 de Maio de 2019.
Juízes: Viriato Manuel Pinheiro de Lima (Relator), Song Man Lei e Sam Hou Fai.
SUMÁRIO:
Existe susceptibilidade de erro ou confusão por parte do consumidor médio em Macau, entre as marcas Landmark e 置地 para a mesma classe de serviços.
O Relator,
Viriato Manuel Pinheiro de Lima
ACORDAM NO TRIBUNAL DE ÚLTIMA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU:
I – Relatório
B interpôs recurso judicial do despacho de 13 de Fevereiro de 2017, da Chefe do Departamento de Propriedade Industrial, da Direcção dos Serviços de Economia, que concedeu o registo da marca N/97773, 置地, para assinalar serviços da classe 35.ª, a A.
Por sentença do Tribunal Judicial de Base foi julgado improcedente o recurso.
B interpôs recurso jurisdicional para o Tribunal de Segunda Instância (TSI) que, por Acórdão de 6 de Dezembro de 2018, concedeu provimento ao recurso, anulando o despacho recorrido, determinando a sua substituição por outro que negue o registo mencionado.
Inconformada, recorre A para este Tribunal de Última Instância (TUI), formulando as seguintes conclusões:
A. O acórdão recorrido determina a recusa de registo da marca N/97773, destinada a assinalar serviços na classe 35.a, que se caracteriza pelo sinal 置地, porque atenta contra a marca prioritária LANDMARK, da Recorrida, protegida pelo registo N/12114, destinado a assinalar serviços na classe 35.a.
B. Fundamenta o TSI a sua decisão nos motivos que levaram o TUI, no acórdão proferido no recurso n.o 18/2018, a recusar a marca N/97774, caracterizada pelo sinal 置地, que havia sido pedida pela ora Recorrida para assinalar serviços da classe 36.a.
C. Para fundamentar a recusa, o TUI invocou que a expressão 置地 é indissociável da expressão LANDMARK, razão pela qual não pode a recorrente obter o respectivo registo, que colidiria com o registo da Recorrida.
D. Nenhuma semelhança gráfica, figurativa ou fonética se detecta entre LANDMARK e 置地, pelo que não se verifica o requisito básico e indispensável da imitação ou reprodução, muito menos ocorrendo risco de confusão ou de associação, que pudesse ter conduzido à aplicação dos artigos 214.º e 215.º do RJPI.
E. Por outro lado, a Recorrente e sociedades do grupo que integra são titulares de diversos direitos de propriedade industrial que integram a expressão置地: (i) marca N/l1861, mista, que contém as expressões MACAU LANDMARK e 澳門置地廣場, para serviços da classe 36.ª; (ii) nome de estabelecimento E/40 misto, que contém as expressões MACAU LANDMARK e 澳門置地廣場, para administração e gestão de propriedades; (iii) marca N/12024, mista, que contém as expressões 置地廣場酒店澳門, para serviços da classe 42.ª; (iv) marca N/64135, mista, que contém as expressões MACAU LANDMARK e 澳門置地廣場, para serviços da classe 43.ª.
F. O que tudo justifica a concessão da marca à Recorrente, conforme havia sido já decidido pela DSE e pelo TJB.
G. O acórdão recorrido violou o disposto na alínea b) do n.º 2 do artigo 214.º e na alínea c) do n.º 1 do artigo 215.º, ambos do RJPI.
II – Os factos
Os factos considerados provados são os seguintes:
A 30/03/2015 “A”, parte contrária, apresentou o pedido de registo de marca com o número N/97773 (que consiste em “置地”), para a classe 35ª, tendo a Direcção dos Serviços de Economia promovido, nos termos do artigo 210º do RJPI, a publicação do respectivo pedido no Boletim Oficial da RAEM (“B.O.”), II Série, de 13/06/2015.
A 03/08/2015 B, apresentou a reclamação e foi considerada improcedente pela DSE.
Foi feito o exame da marca e por despacho de 13/02/2017 foi concedido o registo da Marca N/97773.
Encontram-se registadas em nome da Parte Contrária, “A” as seguintes marcas:
Requerente
Marca
Sinal
Classe
Despacho
Publicação no BORAEM
A
N/11861
36a
Registada
N.º 14-II Série de 07/04/2004
C
N/12024
42ª
Registada
N.º 18-II Série de 05/05/2004
A
E/40
Registada
N.º 14-II Série de 07/04/2004
A
N/64135
43ª
Registada
N.º 29-II Série de 20/07/2016
A
N/97239
43ª
Renunciada (Pedido duplicado)
N.º 48-II Série, de 02/12/2015
Encontram-se registadas em nome de B as seguintes marcas:
Reclamante
Marca
Sinal
Classe
Despacho
Publicação no BORAEM
B
N/12113
Landmark
36a
Registada
N.º 05-II Série, de 04/02/2015
B
N/12114
Landmark
35a
Registada
N.º 03-II Série, de 18/01/2017
B
N/12115
Landmark
42a
Extinta
N.º 05-II Série, de 09/06/2014
O pedido de registo das seguintes marcas de B foi recusado:
Reclamante
Marca
Sinal
Classe
Despacho
Publicação no BORAEM
B
N/12110
置地
35a
Recusada
N.º 14-II Série, de 06/04/2005
B
N/12111
置地
36a
Recusada
N.º 22-II Série, de 03/06/2015
B
N/12112
置地
42a
Recusada
N.º 05-II Série, de 02/02/2017
Em 13/02/2017 concedeu o registo da marca N/97773 “置地” dos presentes autos.
*
Convém ainda ter presente que em 18 de Setembro de 2003 a recorrente apresentou o pedido de registo de marca N/12114 para a classe 35ª (Acórdão deste TSI, no âmbito do Processo n.º 656/2016).
III – O Direito
1. As questões a resolver
Importa decidir se há risco de confusão entre a marca registada dos autos 置地 e a marca Landmark anteriormente registada para serviços da mesma classe 35.ª.
Seguir-se-á a argumentação seguida no nosso acórdão de 7 de Novembro de 2018, no Processo n.º 85/2018, que decidiu existir susceptibilidade de erro ou confusão por parte do consumidor médio em Macau, entre as marcas Landmark e 置地 para a mesma classe de serviços.
3. Marcas. Imitação.
Como se sabe, o registo das marcas é efectuado por produtos ou serviços, competindo à DSE indicar as respectivas classes de acordo com a classificação prevista na lei [artigo 205.º do Regime Jurídico da Propriedade Industrial, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 97/99/M, de 13 de Dezembro (RJPI)].
Como tivemos oportunidade de reflectir no recente acórdão de 20 de Maio de 2015, no Processo n.º 19/2015:
«A marca é um dos direitos de propriedade industrial.
O direito de propriedade industrial confere ao respectivo titular a plena e exclusiva fruição, utilização e disposição das invenções, criações e sinais distintivos, dentro dos limites, condições e restrições fixados na lei [artigo 5.º do Regime Jurídico da Propriedade Industrial (RJPI)].
Como se refere no artigo 197.º do RJPI, “Só podem ser objecto de protecção ao abrigo do presente diploma, mediante um título de marca, o sinal ou conjunto de sinais susceptíveis de representação gráfica, nomeadamente palavras, incluindo nomes de pessoas, desenhos, letras, números, sons, a forma do produto ou da respectiva embalagem, que sejam adequados a distinguir os produtos ou serviços de uma empresa dos de outras empresas”.
A marca destina-se a distinguir produtos ou serviços. Sendo ela “… um sinal distintivo de coisas, há-de ela ser dotada, para o bom desempenho da sua função, de eficácia ou capacidade distintiva, isto é, há-de ser apropriada para diferenciar o produto marcada de outros idênticos ou semelhantes”1.
Como se sabe, vigora em matéria de marcas o princípio da especialidade, segundo o qual a marca há-de ser constituída por forma a que não se confunda com outra anteriormente adoptada para o mesmo produto ou semelhante.
É o que decorre da alínea b) do n.º 2 do artigo 214.º do RJPI, que estatui que “O pedido de registo também é recusado sempre que a marca ou algum dos seus elementos contenha: b) Reprodução ou imitação, no todo ou em parte, de marca anteriormente registada por outrem, para produtos ou serviços idênticos ou afins, que possa induzir em erro ou confusão o consumidor, ou que compreenda o risco de associação com a marca registada ”.
Como explica FERRER CORREIA2 “A marca não pode, portanto, ser igual ou semelhante a outra já anteriormente registada. O grau de semelhança que a marca não deve ter com outra registada anteriormente é definido por este elemento: possibilidade de confusão de uma com outra no mercado. Mas não pode haver confusão entre a marca adoptada para certo produto e a marca adoptada para outro que daquele seja completamente distinto. Por isso a lei restringe o princípio da especialidade da marca aos produtos da mesma espécie ou afins, nessa conformidade tendo substituído ao sistema do registo por classes o sistema de registo por produtos”».
Como mencionámos no Acórdão de 26 de Outubro de 2011, no Processo 38/2011:
«No Acórdão de 21 de Outubro de 2009, no Processo n.º 21/2009 dissemos que se discorda da tese, segundo a qual os caracteres 香港, que significam Hong Kong, juntos aos caracteres 置地 [Chi Tei] (que são a expressão utilizada em chinês para significar Landmark), ou seja, Hong Kong Landmark, permitam ao consumidor médio distinguir claramente a marca da recorrida particular 香港置地 [Hong Kong Chi Tei], ou seja Hong Kong Landmark, do nome de estabelecimento - 澳門置地廣場 [Ou Mun Chi Tei Kuong Cheong], ou seja, Macau Landmark Plaza.
Na verdade, não parece que uma designação de proveniência geográfica, como Hong Kong, seja capaz de fornecer eficácia distintiva aos caracteres 置地 [Chi Tei].
Manifestamente, na marca 香港置地 [Hong Kong Chi Tei], que corresponde a Hong Kong Landmark, não é a designação “Hong Kong” que tem eficácia distintiva. É antes 置地 [Chi Tei], ou seja, “Landmark”.
O mesmo acontece no nome de estabelecimento - 澳門置地廣場 [Ou Mun Chi Tei Kuong Cheong], ou seja, Macau Landmark Plaza. O que tem capacidade distintiva é 置地 [Chi Tei], ou seja, “Landmark”.
Da mesma maneira, recorrendo a um exemplo, nos nomes Holiday Inn Hong Kong e Holiday Inn Plaza, o que tem carácter distintivo é Holiday Inn e não Hong Kong ou Plaza. Um consumidor médio pensará que há ligação entre os dois nomes. Isto sem esquecer que, provavelmente, Holiday Inn é uma marca mais forte que Landmark.
O mesmo se diga quanto à firma de duas das recorrentes. O elemento característico é a palavra Landmark.
No caso dos autos, um consumidor médio em Macau, que não faça um exame atento ou confronto, pode confundir o nome do estabelecimento e as duas firmas com a marca, pode pensar que a marca está ligada ao estabelecimento de hotel Landmark, que aquela marca provém deste estabelecimento.
Afigura-se-nos, portanto, que a mencionada marca, a que foi concedido o registo em Macau, é susceptível de induzir o consumidor em erro ou confusão com o nome do estabelecimento».
Mantemos o mesmo entendimento deste anterior acórdão: entre a população de Macau, que é maioritariamente chinesa, tal como os turistas que nos visitam, há uma evidente associação entre os caracteres 置地 e a expressão inglesa Landmark, até porque a grande maioria destes consumidores não lê inglês. Para a maioria dos consumidores de Macau ao ler 置地 está a representar Landmark.
Logo, estando registada a marca Landmark para serviços da classe 35.ª não podia ter sido concedida a marca 置地 para a mesma classe de serviços.
Improcede, assim, o recurso.
IV – Decisão
Face ao expendido, negam provimento ao recurso.
Custas pela recorrente.
Macau, 22 de Maio de2019.
Juízes: Viriato Manuel Pinheiro de Lima (Relator) – Song Man Lei – Sam Hou Fai
1 FERRER CORREIA, Lições de Direito Comercial, Universidade de Coimbra, Volume I, 1973, p. 323.
2 FERRER CORREIA, Lições …, p. 328 e 329.
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