--- Decisão Sumária nos termos do art.º 407º, n.º 6 do C.P.P.M. (Lei n.º 9/2013). ----------
--- Data: 20/05/2019 --------------------------------------------------------------------------------------
--- Relator: Dr. Dias Azedo -----------------------------------------------------------------------------
Processo nº 456/2019
(Autos de recurso penal)
(Decisão sumária – art. 407°, n.° 6, al. b) do C.P.P.M.)
Relatório
1. A, com os restantes sinais dos autos e ora preso no Estabelecimento Prisional de Coloane (E.P.C.), vem recorrer da decisão que lhe negou a concessão de liberdade condicional, motivando para, a final, concluir, imputando à decisão recorrida o vício de violação do disposto no art. 56° do C.P.M.; (cfr., fls. 220 a 224-v que como as que adiante se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os legais efeitos).
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Em resposta, pugna o Exmo. Magistrado do Ministério Público no sentido da improcedência do recurso; (cfr., fls. 227 a 228-v).
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Em sede de vista, juntou o Ilustre Procurador Adjunto o seguinte douto Parecer:
“Na Motivação (efr. fls.220 a 224 dos autos), o recorrente pediu a revogação da douta decisão recorrida e a sua substituição pela decisão de conceder a liberdade condicional, assacando-lhe a violação do preceito no n.°1 do art.56° do CPM, por entender que ele reunir todos os pressupostos.
Antes de mais, subscrevemos as criteriosas explanações do ilustre Colega na douta Resposta (vide. fls.227 a 228 verso).
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No dia de hoje, constitui jurisprudência firme que a concessão da liberdade condicional depende do preenchimento cumulativo de todos os pressupostos, quer formais quer substanciais, consignados no art.56° do CPM, bastando a não verificação de qualquer um para se negar o pedido da liberdade condicional (a título exemplificativo, Acórdão do TSI no Processo n.°195/2003).
Importa recordar que a liberdade condicional não é uma medida de clemência ou de recompensa por mera boa conduta prisional, e serve na política do C.P.M. um objectivo bem definido: o de criar um período de transição entre a prisão e a liberdade, durante o qual o recluso possa equilibradamente recobrar o sentido de orientação social fatalmente enfraquecido por efeito da reclusão. (cfr. Acórdão do TSI no Processo n.°50/2002)
Daí decorre que se, não obstante um comportamento prisional adequado, pelo passado do recluso e perspectivas de reintegração se não se formula um juízo de prognose favorável a uma regeneração e se teme pelas razões de prevenção geral. (cfr. Acórdão do TSI no Processo n.°225/2010)
Ainda se inculca reiteradamente que cada situação deve ser observada em concreto e caso a caso, num circunstancialismo de modo, tempo e lugar próprios, analisando de forma crítica a personalidade do recluso e de um juízo de prognose fortemente indiciador de que o mesmo se vai reinserir na sociedade e ter uma vida em sintonia com as regras de convivência normal, devendo ainda constituir matéria de ponderação, a defesa da ordem jurídica e da paz social. (cfr. Acórdãos do TSI nos Processos n.°225/2010 e n.°404/2011)
Envolvendo conceitos indeterminados de prognose, as alíneas a) e b) do n.°1 do art.56° dotam aos julgadores certa margem de livre apreciação na interpretação e na valorização, pelo que a convicção de não verificação dos pressupostos subjectivos só poderia ser neutralizado se houvesse uma exemplar e excelente evolução activa da personalidade do recluso durante a execução da prisão, e não um mero comportamento passivo cumpridor das regras básicas de conduta prisional. (cfr. Acórdão do TSI no Processo n.°9/2002)
No caso sub judice, quanto à prevenção especial, a MMa Juiz a quo aponta prudentemente: aponta prudentemente: 綜上所述,雖然已由家人支付賠償金及餘下的訴訟費用及延遲利息,且被判刑人近年表現有改善的跡象,但鑑於案情的嚴重程度極高,被判刑人在獄中初期行為表現相當不穩定,基於此,現階段未具備足夠的跡象顯示其人格已獲得徹底的矯治,本法庭認為尚須對其作進一步觀察,方能合理預期被判刑人一旦獲釋,將能以對社會負責任的方式生活及不再犯罪。因此,法庭認為被判刑人尚未符合《刑法典》第56條第1款a)項的要件。
A nível da prevenção geral, lá lê-se: 基於此,考慮到被判刑人餘下的刑罰尚有約三年六個月,現時並無特殊的情況足以改變上述一般預防的要求,單純以被判刑人已服的刑期實不足以抵銷其惡害。倘現時提前釋放被判刑人,將難獲得社會普遍成員的認同,進而對法制的社會效力構成負面影響。因此,法庭認為本案現時尚未符合《刑法典》第56條第1款b)項的要件,須繼續執行刑罰,以防衛社會及確保社會成員對法律制度的信心。
Assim, não obstante se militarem, nos autos, umas circunstâncias favoráveis ao recorrente, mas, na esteia das persuasivas jurisprudências supra citadas, aderimos, sem reserva, à cristal preocupação do MM° Juiz a quo, no sentido de aquele ainda não preencher, por ora, os pressupostos consagrados no n.°1 do art.56° do CPM.
Com efeito, como bem observou o MM° Juiz a quo, existe ainda a séria dúvida de que o recorrente tenha já adquirido a estável capacidade de conduzir a sua vida de modo socialmente responsável, sem ir cometer crime; e prevê-se razoavelmente que a colocação dele em liberdade nesta altura não é compatível com a paz social.
De qualquer modo, importa ter presente que é generalizadamente consabido que em termos comparativos, as sanções penais da ordem jurídica da RAEM são mais benevolentes. Daí que Macau deve tentar todo o esforço para evitar a desastre de ser destino ou “paraíso” de delinquentes.
Nesta linha de perspectiva, não podemos deixar de entender que não tem cabimento o pedido do recorrente, e não merece censura o douto despacho em escrutínio.
(…)”; (cfr., fls. 235 a 236-v).
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Em sede de exame preliminar constatou-se da “manifesta improcedência” do presente recurso, e, nesta conformidade, atento o estatuído no art. 407°, n.° 6, al. b) e 410°, n.° 1 do C.P.P.M., (redacção dada pela Lei n.° 9/2013, aplicável aos presentes autos nos termos do seu art. 6°, n.° 1 e 2, al. 2), e tendo-se presente que a possibilidade de “rejeição do recurso por manifesta improcedência” destina-se a potenciar a economia processual, numa óptica de celeridade e de eficiência, visando, também, moralizar o uso (abusivo) do recurso, passa-se a decidir.
Fundamentação
Dos factos
2. Flui dos autos a factualidade seguinte (com relevo para a decisão a proferir):
– A, ora recorrente, deu entrada no E.P.C. em 09.05.2009, para cumprimento de uma pena única de 13 anos e 3 meses de prisão, resultado do cúmulo jurídico das penas que lhe foram aplicadas em 3 processos, nos quais foi condenado pela prática dos crimes de “furto”, “ofensa grave à integridade física (originando a morte da vítima)”, “burla” e “abuso de confiança”;
– em 08.03.2018, cumpriu dois terços de tal pena, expiando-a em 08.08.2022;
– durante a sua reclusão foi 2 vezes disciplinarmente punido: em 06.03.2012 e em 16.05.2012;
– se lhe vier a ser concedida a liberdade condicional, irá viver com a sua família, em Macau, de onde é natural.
Do direito
3. Insurge-se o ora recorrente contra a decisão que lhe negou a concessão de liberdade condicional, afirmando, em síntese, que se devia considerar que reunidos estão todos os pressupostos do art. 56° do C.P.M. para que tal libertação antecipada lhe fosse concedida.
Vejamos.
— Preceitua o citado art. 56° do C.P.M. (que regula os “Pressupostos e duração” da liberdade condicional) que:
“1. O tribunal coloca o condenado a pena de prisão em liberdade condicional quando se encontrarem cumpridos dois terços da pena e no mínimo 6 meses, se:
a) For fundadamente de esperar, atentas as circunstâncias do caso, a vida anterior do agente, a sua personalidade e a evolução desta durante a execução da prisão, que o condenado, uma vez em liberdade, conduzirá a sua vida de modo socialmente responsável, sem cometer crimes; e
b) A libertação se revelar compatível com a defesa da ordem jurídica e da paz social.
2. A liberdade condicional tem duração igual ao tempo de prisão que falte cumprir, mas nunca superior a 5 anos.
3. A aplicação da liberdade condicional depende do consentimento do condenado”; (sub. nosso).
Constituem, assim, “pressupostos objectivos” ou “formais”, a condenação em pena de prisão superior a seis (6) meses e o cumprimento de dois terços da pena, num mínimo de (também) seis (6) meses; (cfr. n.° 1).
“In casu”, atenta a pena única que ao recorrente foi fixada, e visto que se encontra ininterruptamente preso desde 09.05.2009, expiados estão já dois terços de tal pena, pelo que preenchidos estão os ditos pressupostos formais.
Todavia, e como é sabido, tal “circunstancialismo” não basta, já que não sendo a liberdade condicional uma medida de concessão automática, impõe-se para a sua concessão, a verificação cumulativa de outros pressupostos de natureza “material”: os previstos nas alíneas a) e b) do n.° 1 do referido art. 56°.
Com efeito, importa ter em conta que a liberdade condicional não é uma “medida de clemência”, constituindo uma medida que faz parte do normal desenvolver da execução da pena de prisão, manifestando-se como uma forma de individualização da pena no fito de ressocialização, pois que serve um objectivo bem definido: o de criar um período de transição entre a prisão e a liberdade, durante o qual o delinquente possa, equilibradamente, recobrar o sentido de orientação social fatalmente enfraquecido por efeito da reclusão; (cfr., v.g., J. L. Morais Rocha e A. C. Sá Gomes in “Entre a Reclusão e a Liberdade – Estudos Penitenciários”, Vol. I, em concreto, “Algumas notas sobre o direito penitenciário”, IV cap., pág. 41 e segs.).
Na esteira do repetidamente decidido nesta Instância, a liberdade condicional “é de conceder caso a caso, dependendo da análise da personalidade do recluso e de um juízo de prognose fortemente indiciador de que o mesmo vai reinserir-se na sociedade e ter uma vida em sintonia com as regras de convivência normal, devendo também constituir óbviamente matéria de ponderação, a defesa da ordem jurídica e da paz social”; (cfr., v.g., os recentes Acs. deste T.S.I. de 21.02.2019, Proc. n.° 67/2019, de 14.03.2019, Proc. n.° 169/2019 e de 25.04.2019, Proc. n.° 339/2019, podendo-se também sobre o tema ver o Ac. da Rel. de Coimbra de 24.01.2018, Proc. n.° 540/16).
Assim, detenhamo-nos na apreciação de tais pressupostos de natureza material.
Ponderando na factualidade atrás retratada, poder-se-á dizer que é fundadamente de esperar, atentas as circunstâncias do caso, a vida anterior do agente, a sua personalidade e a evolução desta durante a execução da prisão, que o condenado, uma vez em liberdade, conduzirá a sua vida de modo socialmente responsável, sem cometer crimes, mostrando-se a pretendida liberdade condicional compatível com a defesa da ordem jurídica e paz social?
Como se deixou adiantado, cremos que de sentido negativo terá de ser a resposta.
De facto, colhe-se dos autos que o ora recorrente sofreu já um total de 5 condenações, (cfr., fls. 124 a 143), tendo cometido um total de 8 crimes, (1 de “denúncia caluniosa”, 2 de “furto” e outro de “abuso de confiança”), estando agora a cumprir a pena única resultado do cúmulo jurídico de 4 crimes.
E, perante esta “insistência em delinquir”, muito fortes são as necessidades de prevenção criminal especial, que demandam acrescido período de reclusão, por forma a ser possibilitada uma melhor interiorização do desvalor da sua conduta, mostrando-se assim de dar por inverificado o pressuposto do art. 56°, n.° 1, al. a) do C.P.M. quanto ao necessário “juízo de prognose favorável”.
Por sua vez, e tendo também em conta os “tipos” e “natureza” dos crimes cometidos, a parcela da pena que falta cumprir e igualmente fortes sendo as necessidades de prevenção criminal geral, impõe-se dar também por não verificada a al. b) do n.° 1 do art. 56° do C.P.M..
Como no recente Ac. do T.R. de Évora de 05.02.2019, (Proc. n.° 669/16), se considera, importa ter em conta que “a compatibilidade da libertação condicional com a defesa da ordem e da paz social não se reconduz, restritivamente, à previsível ausência de expressões públicas de inconformismo, mas antes, mais latamente, à compatibilidade da libertação condicional com a defesa da sociedade e a prevenção da prática de crimes”, não sendo de se olvidar também que nos termos do art. 43°, n.° 2 do C.P.M. se prescreve que: “A execução da pena de prisão serve igualmente a defesa da sociedade, prevenindo o cometimento de crimes”.
Assim, em face das expostas considerações, impõe-se decidir em conformidade.
Decisão
4. Em face do exposto, decide-se rejeitar o presente recurso.
Custas pelo recorrente, com taxa de justiça que se fixa em 3 UCs, e como sanção pela rejeição do recurso o equivalente a 3 UCs; (cfr., art. 410°, n.° 3 do C.P.P.M.).
Honorários ao Exmo. Defensor no montante de MOP$1.800,00.
Registe e notifique.
Nada vindo de novo, e após trânsito, remetam-se os autos com as baixas e averbamentos necessários.
Macau, aos 20 de Maio de 2019
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