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Processo n.º 866/2018
(Autos de recurso de decisões jurisdicionais do TA)
     
Relator: Fong Man Chong
Data: 30/Maio/2019

Assuntos:
     

- Direito à audiência administrativa e forma de cumprimento

SUMÁRIO:

I – Quando a Administração Pública (Entidade Recorrida), antes de tomar decisão final num procedimento administrativo desencadeado pelo próprio Requerente e com base nos elementos fornecidos por ele próprio, convocou o Requerente para audiência presencial e oral, a fim de esclarecer algumas matérias, tendo o mesmo participado nesta diligência, não deve entender-se que foi violado o direito à audiência do artigo 93º do CPA.
     
II – Seguida esta lógica, quando o Requerente invocou determinados argumentos para defender que estava a reunir certos requisitos para obter uma habitação social com dispensa de observância de outros requisitos, a Entidade Recorrida, depois de analisar os dados fornecidos e realizar diligência pertinentes, e, também ouvir o interessado, veio depois a indeferir o pedido, não violou o direito de audiência deste último, já que este participou no procedimento desde o início e estava inteirado de todos os elementos por ele fornecidos. Não se verificando este vício alegado, é de revogar a sentença do Tribunal Administrativo que anulou a decisão administrativa alegadamente eivada de vício da violação do direito de audiência administrativa.
     
     

O Relator,

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Fong Man Chong
















Processo n.º 866/2018
(Autos de recurso de decisões jurisdicionais do TA)

Data : 30/Maio/2019

Recorrente : Presidente do Instituto de Habitação

Recorrido : A


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    ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA RAEM:
    
    I - RELATÓRIO
O Presidente do Instituto de Habitação, Recorrente nos presentes autos, devidamente identificado nos autos, não se conformando com a decisão proferida pelo Tribunal Administrativo, datada de 21/05/2018, que julgou procedente o recurso interposto pelo Recorrido/Recorrente A contra a decisão do Presidente do IH, veio, em 10/07/2018, recorrer para este TSI com os fundamentos constantes de fls. 86 a 91, tendo formulado as seguintes conclusões :
     1. 在本案,行政法院裁定被訴行政行為因欠缺聽證而應撤銷,並認為本案未出現《行政訴訟法典》第74條第5款規定的情況,無需對其餘瑕疵進行審理的必要。
     2. 上訴人並不認同,且認為有關判決在法律解釋及適用方面均存在錯誤。
     3. 上訴人認為免除聽證毋須在決定中以明示方式作出及說明理由。
     4. 因《行政程序法典》中未有對免除聽證的形式要件作出強制性規定或限定免除聽證必須以明示方式作出。
     5. 事實上,《行政程序法典》第93條明確規定,只要符合第96及97條規定的情況,行政當局已可以免除聽證及直接作出決定,而無須再於決定中特別注明作出決定前免除聽證及說明理由,因法典中沒有其他額外的規定。
     6. 所以,在被訴行政行為中未有以明示方式作出免除聽證不應被視為欠缺聽證或未依法決定免除聽證。
     7. 其次,上訴人認為被訴行政行為符合《行政程序法典》第97條a)項的規定,可免除聽證。
     8. 被訴行政行為是上訴人駁回司法上訴人依據第25/2009號行政法規《社會房屋的分配、租賃及管理》第8條第1款所提出的例外申請分配社會房屋。
     9. 按上述規定,僅在“在面臨社會、身體或精神危機,又或遭受災難急須安置的個人或家團”的情況下,房屋局局長方具條件以例外方式批准社會房屋,但司法上訴人所提出申請的理由不符上述規定。
     10. 透過行政卷宗第29頁中可見,上訴人早已對司法上訴人所提出的理由作出再分析,並安排職員於2016年9月20日與司法上訴人展開會談,已明確表示司法上訴人所提交的資料不符合例外許可獲批的情況,故所提交的申請可能會被拒絕,並給予司法上訴人陳述其意見的機會。
     11. 而司法上訴人亦在會談中表示明白,並同時發表補充意見,有關意見載於行政卷宗第29頁,第2-22行。
     12. 由會談後至作出行政決定之日(2016年10月7日),司法上訴人均未有提交新的理由或表示將會提交新的申請理由。
     13. 由此可見,司法上訴人已對就決定屬重要的事實及所提出的證據表明全部立場,且上訴人後續作出的決定內容亦完全依據司法上訴人已發表意見的事實作出,故《行政程序法典》第97條a)項的規定可免除聽證的情況。
     14. 最後,上訴人亦認為被訴行為已遵守了聽證原則,司法上訴人的辯護權利已得到保障,並賦予了司法上訴人行使辯護的權利。
     15. 如前所述,司法上訴人已在程序中發表了其口頭意見,且在其後的聲明異議中,亦向上訴人發表了書面意見。
     16. 透過行政卷宗中第53至54頁,上訴人亦對其所提交的書面意見作出了具體的實質分析,認為其所述的理據仍不符合法定要件。
     17. 所以,就被訴行為而言,其本身絕無行政法院所指的存在欠缺聽證的瑕疵。

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O Recorrido/Recorrente A não apresentou contra-alegações do recurso.
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O Digno. Magistrado do Ministério Público junto do TSI emitiu o seguinte douto parecer:
     No âmbito do recurso contencioso de anulação n.º 2002/2017-ADM, em que era visado o despacho de 11 de Outubro de 2016, da autoria do Exm.º Presidente do Instituto da Habitação, foi proferida, em 21 de Maio de 2018, a sentença de fls. 75 e seguintes, do Tribunal Administrativo, que anulou o acto por preterição da formalidade de audiência do interessado.
     É desta sentença que vem interposto o presente recurso jurisdicional, em cuja alegação o recorrente jurisdicional sustenta ter havido errado julgamento do vício, devido a incorrecta interpretação das normas atinentes ao direito de audição.
     Para tanto, aduz que, no caso, era possível dispensar a audiência e que esta foi implicitamente dispensada.
     Vejamos.
     Como é sabido, o princípio da participação dos interessados na formação das decisões administrativas que lhes digam respeito, proclamado no artigo 10.º do Código do Procedimento Administrativo, encontra expressão prática no exercício do direito de audiência previsto nos artigos 93.º e seguintes do Código do Procedimento Administrativo. Concluída a instrução, os interessados devem ser convocados ou notificados, conforme se opte pela audiência oral ou escrita, para exercitarem tal direito. Só assim não será nas hipóteses previstas nos artigos 96.º e 97.º do Código do Procedimento Administrativo, ou seja, nos casos de inexistência e de dispensa de audição. Não haverá lugar à audiência nos casos em que a decisão se revele urgente ou possa ver comprometida a sua execução ou utilidade pela própria audiência, e ainda nos procedimentos em massa. E a audiência poderá ser dispensada quando os interessados já se hajam pronunciado no procedimento sobre as provas produzidas e sobre as questões pertinentes para a decisão, bem como quando o procedimento aponte para uma decisão favorável aos interessados.
     Vistos os autos e o processo instrutor, é claro que não foi facultada ao recorrente a possibilidade de exercitar o direito de audiência.
     A entidade ora recorrente argumenta que o recorrente contencioso já se havia pronunciado no procedimento sobre as questões objecto de audiência, o que esteve na base da dispensa da audiência.
     Crê-se que não tem razão.
     A dispensa de audiência tem que ser declarada e fundamentada no próprio procedimento - cf. Mário Esteves de Oliveira e outros, Código do Procedimento Administrativo, comentado, 2.ª edição, Almedina, a páginas 463 e seguintes, e Lino Ribeiro/Cândido de Pinho, Código do Procedimento Administrativo de Macau, anotado e comentado, edição Fundação Macau e SAFP. Ora, no procedimento relativo ao acto impugnado, não foi lançada qualquer indicação nem exarada qualquer decisão expressa, a propósito da questionada dispensa. E também não se vislumbra que o recorrente se haja pronunciado, no procedimento, sobre as questões que importavam à decisão e sobre as provas produzidas, o que retira qualquer acuidade à invocada dispensa implícita.
     Em suma, não foi dada ao administrado a possibilidade de se pronunciar no procedimento, antes de ser tomada a decisão final, sendo certo que também não foi dispensada a audiência, nem era, aliás, caso de dispensa da audiência, o que aponta para a ocorrência do vício procedimental em análise, sendo que, dada a discricionariedade que enforma o acto, a formalidade não se degrada em não essencial, como a sentença bem frisou.
     Ante o exposto, e na improcedência dos vícios imputados à sentença recorrida, é de negar provimento ao recurso jurisdicional.
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Foram colhidos os vistos legais.
Cumpre analisar e decidir.
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    II – PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
Este Tribunal é o competente em razão da nacionalidade, matéria e hierarquia.
O processo é o próprio e não há nulidades.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária e são dotadas de legitimidade “ad causam”.
Não há excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
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    III – FACTOS
São os seguintes elementos considerados assentes pelo Tribunal Administrativo com interesse para a decisão da causa:
     - 2016年8月22日,房屋局收到司法上訴人來函(收件編號99001621192)申請以例外情況租賃社會房屋,並提交社會房屋一般項目申請表等相關文件 (詳見行政卷宗一第1頁至第12頁) 。
     - 2016年9月5日,房屋局發出編號1609050084/DHS公函通知司法上訴人於2016年9月20日親臨房屋局遞交文件 (詳見行政卷宗一第15頁) 。
     - 2016年9月20日,司法上訴人與房屋局工作人員進行面談,並提交婚姻狀況聲明書、每月收入聲明書等相關文件 (詳見行政卷宗一第16頁、第18頁至第24頁及第28頁背頁)。
     - 2016年10月11日,被上訴實體於編號2771/DHP/DHS/2016建議書上作出批示,經分析司法上訴人提交的資料,認為其情況不符合第25/2009號行政法規《社會房屋的分配、租賃及管理》第8條1)項之規定,決定不接納其提出以例外情況分配社會房屋之申請,並於同月13日發出編號1610070023/DHS公函通知司法上訴人上述決定 (見行政卷宗一第28頁至第30頁及第32頁至第33頁)。
     - 2017年3月16日,司法上訴人之委任訴訟代理人針對上述決定向本院提起本司法上訴。
     
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    IV - FUNDAMENTOS
Como o presente recurso tem por objecto a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo, importa ver o que este decidiu. Este afirmou:
     一、 案件概述
     A,詳細身分資料記錄於卷宗內(下稱司法上訴人),針對房屋局局長 (下稱被上訴實體)於2016年10月11日作出的不批准司法上訴人提出以例外情況申請社會房屋的決定,向本院提起本司法上訴,請求因被上訴行為存在行使自由裁量權出現明顯錯誤、違反《行政程序法典》第7條規定的公正原則及第93條對利害關係人之聽證的瑕疵,要求撤銷被上訴行為。
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     被上訴實體提交答辯,請求因被上訴行為不存在司法上訴人所指的瑕疵,駁回本司法上訴。
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     於法定期間內,訴辯雙方均沒有提交非強制性陳述。
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     駐本院檢察官發表意見,認為被上訴行為有違適當及適度原則,行使自由裁量權出現明顯錯誤的瑕疵,建議裁定本案司法上訴理由成立,撤銷被上訴行為 (見卷宗第72頁至第74頁,有關內容在此視為完全轉錄)。
     ***
     本院對此案有管轄權。
     本案訴訟形式恰當及有效。
     訴訟雙方具有當事人能力及正當性。
     不存在待解決的無效、抗辯或其他先決問題以妨礙審理本案的實體問題。
     ***
     二、 事實
     根據本卷宗及行政卷宗所載資料,本院認定以下對案件審判屬重要的事實:
     (......)
     ***
     三、理由說明
     司法上訴人在起訴狀指被上訴實體在行使自由裁量權時出現明顯錯誤,違反了《行政程序法典》第7條規定的行政公正原則,此外在作出最終決定前未對司法上訴人作出聽證通知,違反同一法典第93條的規定。
     *
     先看有關欠缺進行聽證的瑕疵。
     在司法上訴人看來,被上訴實體未能遵守《行政程序法典》第93條規定在最終決定前通知司法上訴人發表意見,而被上訴實體反駁指在接到司法上訴人提交之申請後,已於2016年9月20日安排工作人員與之會談,故司法上訴人已在程序中表明意見,符合《行政程序法典》第97條第1款規定可免除聽證的情況。
     首先,作為行政程序中應奉行的一般原則之一的參與原則,要求“公共行政當局之機關,在形成與私人及以維護其利益為宗旨之團體有關之決定時,應確保私人及該等團體之參與,尤應透過本法典所規定之有關聽證確保之” (參見《行政程序法典》第 10 條的規定)。
     為具體落實上指原則,《行政程序法典》第 93 條至第98條的規定確立了聽證制度,其中第93條第1款明確要求 “調查完結後,利害關係人有權於最終決定作出前在程序中陳述意見,並尤其應獲通知可能作出之最終決定;但第九十六條及第九十七條規定之情況除外。”
     再看法律規定無須及可免除對利害關係人進行聽證的情況:
     “第九十六條
     (不進行對利害關係人之聽證)
     在下列情況下,不進行對利害關係人之聽證:
     a) 須緊急作出決定;
     b) 有理由預料聽證可能影響決定之執行或效用;
     c) 因待聽證之利害關係人人數過多,以致不適宜進行聽證;在此情況下,應儘可能以最合適之方式對該等利害關係人進行公開諮詢。
     第九十七條
     (免除對利害關係人之聽證)
     在下列情況下,負責調查之機關得免除對利害關係人之聽證:
     a) 利害關係人就對決定屬重要之問題及就所提出之證據,已在程序中表明意見;
     b) 根據在程序中獲得之資料,將作出對利害關係人有利之決定。”
     而設立上述聽證制度之目的,無論是澳門特別行政區的法律學說抑或司法見解均曾作過較為深入的闡釋,概言之,乃“讓利害關係人可參與有關程序,發表自己的意見,以供行政當局參考及避免意料之外之決定。” (詳見中級法院2013年11月21日第843/2012號卷宗的裁判及2014年5月8日第2/2013號卷宗的裁判)。
     回到本案,雖然被上訴實體於答辯中表示,於2016年9月20日該局工作人員與司法上訴人進行會談,聲稱符合《行政程序法典》第 97條第1款a)項的免除聽證的情況。但翻閱資料,無論卷宗還是行政卷宗均無顯示被上訴實體於2016年10月11日作出被上訴行為前,曾通過明示決定以上指依據免除對司法上訴人進行聽證。
     一如Lino José Baptista Rodrigues Ribeiro 及José Cândido de Pinho在《Código do Procedimento Administrativo de Macau Anotado e Comentado》一書內對有關條文的註解所述“…Em primeiro lugar a não realização da audiência por razões de urgência ou de comprometimento da decisão ou da sua execução depende sempre de um despacho do órgão instrutor. Mas para se aquilatar da justeza da sua posição ele há de expor devidamente os fundamentos subjacentes a ela, de onde resulte a inevitabilidade da solução adoptada. Terá que justificar que não tinha saída, se não impedir a audiência.... Quanto às situações alineadas no n.º 2, as preocupações são semelhantes. Também aqui se espera que o órgão fundamente as razões de dispensa, embora se lhe reconheça um maior poder de flexibilidade e discricionariedade na sua decisão. De toda a maneira, e para não desvirtuar o alcance da audiência, e porque a sua não realização pode ser apreciada (quanto aos pressupostos, por exemplo) em sede contenciosa no ataque ao acto final, o órgão instrutor não pode deixar de observar a necessidade de fundamentação…”(參見上指著作第498頁至第499頁內容)。
     行政機關免除進行聽證與其單純遺漏聽證的情況不同,前者要求其在權衡相關利益後作出明示的決定並說明理由,以便該決定及相關理據可接受司法機關的審查。
     現在被上訴實體顯然未對司法上訴人進行預先聽證,未給予其陳述意見的機會,亦似乎從無依法決定免除聽證程序。其行為無疑沾有程序性瑕疵。另外,其欲在答辯狀中通過嗣後說明以補正以上所指的遺漏,卻為時已晚。
     與此同時,考慮到主流司法見解認為,當面對行政當局行使被限定權力的情形,只要法院透過事後判斷能夠得出行政當局所作的決定是在具體情況下唯一可能的決定的結論,那麼規定於《行政程序法典》第 93 條第1款的對利害關係人的聽證便降格為行政程序中的非根本性手續(參閱終審法院2012年7月25日第48/2012號卷宗的裁判)。
     現被上訴的不接納司法上訴人提出以例外情況租賃社會房屋之申請的決定,其行為依據為第25/2009號行政法規《社會房屋的分配、租賃及管理》第8條1)項的規定:
     “在例外情況下,且經房屋局局長預先許可,可免除申請的任何要件,分配房屋予:
     (一)面臨社會、身體或精神危機,又或遭受災難急須安置的個人或家團;
     …”
     
     在上引條文中,立法者使用了“社會、身體或精神危機”的不確定概念(conceito impreciso ou indeterminado)作為例外許可分配社會房屋的前提要件,藉此賦予行政當局自由裁量的空間。故行政當局所作的決定不應是在具體情況下唯一可能的決定,司法上訴人應被給予機會陳述意見並試圖影響有關最終決定的意向。
     因此,被上訴行為因未依法免除聽證,導致存在欠缺聽證的瑕疵,應撤銷之。
     由於本案未出現《行政訴訟法典》第74條第5款規定的情況,已無對其餘瑕疵進行審理的必要。
     ***
     四、決定
     
     綜上所述,本院裁定司法上訴人提出的司法上訴勝訴,撤銷被上訴行為。
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     免除支付本案的訴訟費用,因被上訴實體獲得主體豁免。
     *
     登錄本判決及依法作出通知。
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Quid Juris?
Neste recurso o Recorrente (Presidente do IH) veio a suscitar uma única questão: má interpretação pelo Tribunal Administrativo da norma que prevê o direito de audiência do administrado, pelo que pede anulação da sentença recorrida.
Vejamos se ele tem razão ou não.
Ora, em matéria de audiência, o legislador estipula no artigo 93º (Audiência dos interessados) do CPA:
     1. Salvo o disposto nos artigos 96.º e 97.º, concluída a instrução, os interessados têm o direito de ser ouvidos no procedimento antes de ser tomada a decisão final, devendo ser informados, nomeadamente, sobre o sentido provável desta.
     2. O órgão instrutor decide, em cada caso, se a audiência dos interessados é escrita ou oral.
     3. A realização da audiência dos interessados suspende a contagem de prazos em todos os procedimentos administrativos.
Este preceito legal consagra um direito procedimental do administrado, pois, o legislador proclama que “têm direito a…,” apesar de não ser um direito absoluto, na medida em que a audiência pode ser dispensada nas condições que o legislador prevê, mas deve fundamentar a decisão de não audiência.
A audiência dos interessados inicia uma fase do procedimento – de pré-decisão ou de saneamento, quando estão reunidos os elementos necessários para ponderar qual o sentido da decisão, razão pela qual o “direito a ser ouvido”, que se concretizava mediante a audiência prevista no artigo 93º do CPA, deve consistir na possibilidade concedida ao interessado de participação útil no procedimento, razão pela qual, deve pressupor a possibilidade real e efectiva de apresentar factos, motivos, argumentação e razão susceptíveis de constituir, tanto uma cooperação para a decisão, como também elementos de um controlo preventivo por parte do particular em relação à Administração.
Assim, como bem se viu, na audiência de interessados, segundo o n.º 1 do artigo 93º do CPA, foi dado conhecimento do sentido provável da decisão, o que não aconteceu no caso sub judice, e como tal gera-se um vício de forma na audiência de interessados “quando o interessado vir, de facto, afectados os seus direitos e, em particular, as suas garantias de defesa”, uma vez que a formalidade da audiência corresponde, per si, a um direito dos interessados. In casu, houve omissão dessa formalidade?

A propósito desta matéria, entende a doutrina dominante:
     IV. O direito de audiência dos interessados cumpre-se dando-lhes o instrutor a possibilidade de se pronunciarem, e não com a sua efectiva pronúncia. Como não podia deixar de ser. Só há, portanto, incumprimento de formalidade pela Administração, se o interessado não foi chamado a pronunciar-se ou se foi chamado a fazê-lo em termos legalmente insuficientes.
     A doutrina e a jurisprudência têm entendido, em geral, a audiência como uma formalidade absolutamente essencial, para além, claro, dos casos em que se trata de um verdadeiro direito de defesa (como acontece nos procedimentos sancionatórios). Nos outros casos, entende-se que a omissão desta formalidade gera vício de forma, é certo, mas, pelo menos para alguns AA., só “quando o interessado viu, de facto, afectados os seus direitos e, em particular, as suas garantias de defesa” (Santos Botelho, Pires Esteves e Cândido Pinho, ob. cit., 1ª ed., pág. 252). Discute-se agora questão diversa da que se tratou nos Preliminares desta Secção: aí queria-se saber se, a existir invalidade por falta de audiência, se tratava de nulidade ou mera anulabilidade; agora, do que se cuida é de saber se essa falta redunda sempre em invalidade.
     Por nós, preferimos defender, para já pelo menos, uma posição mais cautelosa: a formalidade da audiência corresponde a um direito dos interessados, com dignidade e assento constitucional e legal e degradá-la logo em formalidade relativamente essencial parece-nos excessivo, menosprezando-se o alcance jurídico que se quis dar à sua introdução no procedimento administrativo.
     Além disso, com o nosso sistema de garantias contenciosas, baseado na “presunção da legalidade” do acto administrativo, tal solução tornar-se-ia um contra-senso: afinal, aquilo que a lei concebeu como um direito dos interessados, tornar-se-ia contenciosamente num ónus seu, pois que seria a eles que competiria fazer a prova de que a omissão da formalidade redundara em prejuízo dos seus interesse ou da sua posição procedimental.
     E, portanto, das duas uma: ou se imputa, a partir de agora, esse ónus à Administração (que omitiu a formalidade) ou se considera que tal omissão, quando comprovada, gera a invalidade insuprível (mesmo se relativa) da respectiva decisão (in Código do Procedimento Administrativo Comentado, Mário Esteves de Oliveira, Pedro Costa Gonçalves, João Pacheco de Amorim, Livraria Almedina, 2ª edição, 1997, pág. 454).
No caso, a decisão final tomada pelo Presidente do IH assenta na proposta de fls. 17 a 19 dos autos, em que se procedeu à análise dos argumentos invocados pelo Recorrido/Recorrente A, negando-lhe a razão e não reconhecendo que ele estava a reunir os requisitos necessários para obter uma habitação social por motivos excepcionais.
Analisando todo o teor desta proposta, não é difícil verificar-se que, para além de refutar todos os argumentos do Recorrido/Recorrente, o IH chegou a realizar umas diligências tendentes ao apuramento da verdade material, nomeadamente as constantes do relatório final, que transcrevemos parcialmente aqui:
     有關個案,工作員已作出跟進,現報告如下:
     (1) 在I.H (房屋局)資料顯示,申請人A於經濟房屋(VXXXX73)XX新邨XX樓XX樓XX座登記為家團成員,關係為朋友(51),該單位業住為B,而該單位已出售。
     (2) 在D.S.F.(財政局)資料顯示,申請人A沒有物業登記記錄。
     (3) 在DSAJ(法務局)資料顯示,申請人所申報的地址XX新邨XX樓XX樓XX座,現時業主為B。
     (4) 在F.S.S.(社會保障基金)資料顯示,申請人A以任意性方式供款。
     為了解申請人A之居住、經濟、健康及家庭狀況,於二零一六年九月五日致函申請人邀約於九月二十日上午十時正到本局面談。約見當日,申請人出席面談。
     申請人表示所申報的地址XX新邨XX樓XX樓XX座單位是其前妻子B的物業,因其在澳沒有居所,故使用B的住址作為其聯絡地址。申請人表示與前妻B離婚多年,其後與現任C結婚,於二零零五年期間其認識了內地女子D並同居,於二零一一年生了兒子E,現年5歲,其與D沒有登記結婚,於二零一三年兩人因兒子E的撫養問題而到廣東新興縣人民法院辦理其子的撫養權,經雙方調解後,其子的撫養權歸其所擁有,而D會探望其子,二人仍有聯絡,其與現任妻子C現正辦理離婚,兩人已沒有聯絡,只知道C在八佰伴任職售貨員,其妻C要求其每月支付$8,000的贍養費或一次過支付二十萬,但其沒有能力支付,現雙方已交由律師處理。
     申請人表示於內地居住差不多有十年,與兒子居於珠海兄長的家中,無需支付租金,其子就讀於澳門XX幼稚園,平日其負責接送兒子返學,但當身體不適時或天雨時,其兄及兒子的生母D會協助接送兒子返學,同時D亦有探望兒子,其表示與兒子居於內地,對兒子上學造成很大不便,特別是遇上雨季及颱風,所以為方便其子在澳上學及其在澳門覆診,其希望本局能批准其租住社會房屋。工作員向其解釋根據社會房屋分配的相關法例,以例外情況入信要求租住社屋,須有非常危急之情況,故此其申請不一定會獲批准,工作員將按其情況作出匯報,其表示明白。
     申請人表示未患病前,曾任賭場中介人及裝修工人,其後因健康問題,不能做太操重的工作,故在今年二月至今已沒有工作,但其表示在今年年底如健康情況穩定,會再找一些簡單的裝修工作。另因其在澳居住不足18個月,故不符合申請社會工作局(下稱社工局)的援助金,但於本年九月份獲社會保障基金會批准提取公積金個人帳戶$30,000,而其子有接受教育暨青年局的學費津貼。申請人出示其銀行存摺,根據資料顯示,申請人在XX銀行截止二零一六年八月五日有澳門幣存款$3,000.20及在XX銀行截止二零一六年七月十二日有澳門幣存款$6332.09。申請人同意工作員將其銀行存摺複印及在銀行存摺副本寫上“願意交此資料予房屋局作審查”。申請人表示現時其沒有固定收入,故無法作出申報,現時生活費依靠兄長,其有七兄弟姐妹,三個兄長,其中一兄長已去世,三個姐姐,其排行最細,兩個兄長及一個姐姐在內地居住,兩個姐姐在澳門居住。 (…)
É de ver que a Entidade Recorrida, depois de realizar diligências pertinentes e analisar todos os fundamentos invocados pelo Recorrente, chegou a convocar o Requerente para audição presencial e oral, a fim esclarecer algumas matérias, em 20/09/2016, pelas 10H00. O Requerente participou nesta diligência.
Depois, a Entidade Recorrida chegou à conclusão de que o Requerente não reuniu os requisitos legalmente exigidos.
Ou seja, ao Requerente cabe alegar os factos que preencham os requisitos, cumprindo assim o ónus de prova, mas não o fez, isto por um lado, por outro, a decisão final da Entidade Recorrida assentou nos fundamentos invocados pelo Recorrente, pelo que, como o Recorrente participou desde o início no procedimento (visto que este foi desencadeado por ele próprio mediante requerimento), face ao disposto nos artigos 93º/1 e 95º do CPA, o Requerente exerceu o seu direito de audiência.
Pelo que, a actuação administrativa não é censurável em termos de Direito, por não violar o direito de audiência do Recorrido/Requerente. Não se verificando o vício assacado à decisão administrativa recorrida, é de revogar a sentença do TA, julgando improcedente o recurso interposto pelo Recorrente A.
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Síntese conclusiva:
I – Quando a Administração Pública (Entidade Recorrida), antes de tomar decisão final num procedimento administrativo desencadeado pelo próprio Requerente e com base nos elementos fornecidos por ele próprio, convocou o Requerente para audiência presencial e oral, a fim de esclarecer algumas matérias, tendo o mesmo participado nesta diligência, não deve entender-se que foi violado o direito à audiência do artigo 93º do CPA.
II – Seguida esta lógica, quando o Requerente invocou determinados argumentos para defender que estava a reunir certos requisitos para obter uma habitação social com dispensa de observância de outros requisitos, a Entidade Recorrida, depois de analisar os dados fornecidos e realizar diligência pertinentes, e, também ouvir o interessado, veio depois a indeferir o pedido, não violou o direito de audiência deste último, já que este participou no procedimento desde o início e estava inteirado de todos os elementos por ele fornecidos. Não se verificando este vício alegado, é de revogar a sentença do Tribunal Administrativo que anulou a decisão administrativa alegadamente eivada de vício da violação do direito de audiência administrativa.
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Tudo visto, resta decidir.

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    V - DECISÃO
Em face de todo o que fica exposto e justificado, os juízes do TSI acordam em conceder provimento ao presente recurso jurisdicional interposto pelo Presidente do IH, revogando a decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e julgando improcedente o recurso interposto pelo Recorrente A.
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Custas pelo Recorrente A que se fixam em 6 UCs, sem prejuízo de apoio judiciário concedido.
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Notifique e Registe.
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RAEM, 30 de Maio de 2019.

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Fong Man Chong Mai Man Ieng
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Ho Wai Neng
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José Cândido de Pinho

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