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Processo n.º 994/2018
(Autos de recurso contencioso)

Relator: Fong Man Chong
Data: 30/Maio/2019

Assuntos:

- Processo disciplinar e opção de sanções disciplinares legalmente fixadas: pena de aposentação compulsiva e outras penas menos gravosas
- Ponderação da natureza dos factos criminais imputados à Requerente e das circunstâncias concretas do caso sub judice
- Violação do princípio de proporcionalidade

SUMÁRIO:

I - A aplicação de uma medida expulsiva - quer se trate de demissão quer de aposentação compulsiva - só pode ter lugar quando a conduta do infractor atinge de tal forma o prestígio e a credibilidade da instituição de que faz parte e que a sua não aplicação iria contribuir para degradar a imagem de seriedade e de isenção dessa instituição.
II – O artigo 238º do EMFSM elenca as situações em que se pode aplicar a pena de demissão (ou de aposentação compulsiva), a opção de uma ou de outra depende da verificação dos pressupostos respectivos, enquanto nas hipóteses previstas no artigo 240º do mesmo EMFSM aplica-se a pena de demissão.
III – O princípio de proporcionalidade, entendido, em sentido amplo, como proibição do excesso, postula que a Administração prossiga o interesse público pelo meio que represente um menor sacrifício para as posições dos particulares. Incorpora, como subprincípio constitutivo, o princípio da exigibilidade, também conhecido como princípio da necessidade ou da menor ingerência possível, que destaca a ideia de que o cidadão tem direito à menor desvantagem possível.
IV - Para maior operacionalidade deste princípio, a doutrina acrescenta, entre outros elementos, o da exigibilidade espacial, que aponta para a necessidade de limitar o âmbito da intervenção na esfera jurídica das pessoas cujos interesses devam ser sacrificados (vd. J. J. Gomes Canotilho, in Direito Constitucional e Teoria da Constituição, 7ª ed., Almedina, 266, ss.).
V – Os factos imputados à Recorrente integram nas infracções previstas no artigo 238º/1 e 2/-n) do EMFSM, por ter sido condenada criminalmente pela prática de factos integradores do crime de fraude de mercadoria, p. e p. pelo artigo 28º/1-b) da Lei nº 6/96/M, de 30 de Dezembro, circunstâncias estas que levaram a Entidade Recorrida a aplicar-lhe a pena de aposentação compulsiva, por entender que tais factos causaram impacto negativo na corporação que albergava a Recorrente e se revelou susceptível de atingir a dignidade de que é credora e o prestígio das FSM em que se integra; entendendo também que se mostra suficientemente justificada a inviabilidade da manutenção da relação funcional, pois foi violado o dever de aprumo, previsto no artigo 12º/2-g) e o) do EMFSM, o que justificava, no entender da Entidade Recorrida, o recurso à sanção de aposentação compulsiva prevista no artigo 238.º/2-n) e no artigo 239º /-b), todos do EMFSM.

VI – Porém, tendo em conta as circunstâncias particulares e concretas do caso em apreciação - são factos praticados sem conexão com o serviço; era primária; obteve louvores e elogios nos serviços (fls. 42 a 45 do PA); tem mais de 25 anos de serviços; os produtos, cuja etiquete foi modificada, não se destinavam a consumo, mas sim, são pomadas! os factos cometidos não causam danos nem aos serviços nem ao público -, e na opção de tipo de medidas punitivas há-de respeitar o princípio de proporcionalidade, que postula a proibição do excesso. Sopesando os aspectos positivos e negativos decorrentes da aplicação de uma pena expulsiva, afigura-se-nos que esta aplicação não é necessária para alcançar os fins de reposição do prestígio das Forças de Segurança abalado com a conduta da Recorrente, tendo em conta que a experiência de uma bombeira com largos anos de serviço é certamente um bem inestimável, quer para a Instituição em causa, quer para a população, existindo outras opções, em termo de tipo de sanções disciplinares, que podem contribuir certamente para o desiderato visado.

VII - Deste modo, e porque se verificou erro manifesto na escolha da medida sancionatória aplicada, não sendo respeitado assim o princípio de proporcionalidade nos termos acima vistos, e como cabe dentro dos poderes do Tribunal a sindicância desse erro manifesto, é de conceder provimento ao recurso, anulando o despacho recorrido.



O Relator,

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Fong Man Chong



















Processo n.º 994/2018
(Autos de recurso contencioso)

Data : 30/Maio/2019

Recorrente : A

Entidade Recorrida : Secretário para a Segurança

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    ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA RAEM:
    
    I – RELATÓRIO
A, Recorrente, devidamente identificado nos autos, bombeira de 1ª classe, discordando do despacho do Secretário para a Segurança, datado de 08/10/2018, que lhe aplicou a pena disciplinar de aposentação compulsiva (decisão rectificada por Despacho Nº 146/SS/2018, de 14/12/2018, constante de fls. 38 dos presentes autos), veio, em 08/11/2018 interpor o competente recurso contencioso para este TSI, com os fundamentos constantes de fls. 2 a 17, tendo formulado as seguintes conclusões:
1. Vem o presente recurso interposto do douto despacho proferido pelo Senhor Secretário para a Segurança, que aplicou a recorrente a pena disciplinar de aposentação compulsiva, ao abrigo do disposto dos artigos 238.° n.º 2 alínea n) e 240.° alínea a) do Estatuto dos Militarizados, e nos termos do artigo 239.° do mesmo diploma, por consideração ao circuntancialismo atenuante e após a verificação do pressuposto da recorrente contar mais de 15 anos de serviço efectivo.
2. O despacho recorrido considerou como provados os factos: “Provado no Acórdão condenatório, que a recorrente vendeu a quatros farmácias de Macau, um medicamento da medicina tradicional, cuja data da validade originária, já ultrapassada, foi, em todos esses casos, alterada por sobreposição de uma etiqueta de data mais recente, dando, assim, a aparência de inteira validade e aptidão para ser consumido”.
3. No despacho recorrido imputa “a arguida violou, o dever de aprumo previsto no art.º 11.º Estatuto dos Militarizados das Forças de Segurança de Macau, na expressão da alínea o) do seu n.º 2 - não praticar qualquer acção ou omissão que possa constituir ilícito criminal ou contravencional - , infracção que resulta agravada pelo circunstância da alínea d) - infracção comprometedora da honra, do brio ou do decoro pessoal ou da instituição do n.º 2 do artigo 201.º daquele estatuto. Imputa ainda a arguida nunca solicitou autorização para o exercício de qualquer actividade privada, sob a forma de trabalho dependente ou outra, nem disso alguma vez informou os seus superiores, o que constitui uma infracção ao disposto na alínea b) do artigo 16.º do mesmo EMFSM. O facto de a arguida ser favorecida pelas atenunantes das alíneas b) - bom comportamento anterior; h) - reconhecimento de mérito profissional e f) - boa informação dos superiores de quem depende, todas do n.º 2 do artigo 200.º do EMFSM, atenua, embora ligeiramente, a censurabilidade ético-jurídica da conduta descrita, uma vez que, integrando as forças de segurança, em quem a sociedade projecta uma especial reserva de valores morais e cívicos que não se compadecem com o não cumprimento da lei, era seu dever manter uma postura na sua vida privada que reforçasse em permanência a sua própria dignidade pessoal e profissional, como membro de uma das suas corporações e o prestígio da insitiuição. Tendo praticado, embora fora da sua actividade, como servidora pública, factos que, pela sua gravidade, desabonam a sua idoneidade moral e determinam a perda de confiança geral para o exercício de funções, factos esses que constituem crime previsto e punível, abstractamente, com pena de prisão superior a 3 anos, a arguida não reúne condições para se manter ao serviço das forças de segurança”.
4. A arguida reconhece que infringiu o dever de aprumo preceituado no art. 12.º n.º 2 o) do MDFSM - em não praticar qualquer acção ou omissão que possa constituir ilícito criminal ou contravencional.
5. Mas no entanto, a essa infracção foi ainda imputada a ora recorrente, acompanhada com a agravante da circuntância de - da alínea d) - infracção comprometedora da honra, do brio ou do decoro pessoal ou da instituição do n.º 2 do artigo 201.º daquele estatuto, que a ora recorrente não asssite razão.
6. Desde já o incidente ocorreu num local arredado ao público e não foi dada a publicidade.
7. Assim como, no decorrer de todo o inquérito crime e julgamento não foi dada quaisquer publicidade, e o Corpo dos Bombeiros só se tomou conhecimento do caso após de ser comunicado o acórdão fornecido pelo respectivo Tribunal.
8. Tratando-se de um ilícito apesar criminal, mas muito privatizado, pelo que a recorrente não praticou acções contrárias à ética, à deontologia funcional, ao brio ou ao decoro das FSM.
9. Quanto a imputação do dever de recusar a nomeação para qualquer cargo, comissão, função ou emprego, sem prévia autorização da entidade competente, enquanto na efectividade de serviço preceituado no art.º 16.° b) do EMFSM, a recorrente quer esclarecer que nunca tinha aceitado a quaisquer cargo, função ou sócio de sociedade, e que a empresa C, constantes nos autos no Acórdão punitivo, apenas é propriedade do seu cunhado D, conforme certidão da Conservatória do Registo Comercial já junta nos autos.
10. Conforme o despacho impugnado, a ora recorrente foi aplicada a pena de aposentação compulsiva ao abrigo do disposto dos artigos 238.° n.º 2 alínea n) e 240.° alínea a) do Estatuto dos Militarizados, e nos termos do artigo 239.° do mesmo diploma.
11. Ora, para que possa ser aplicada a norma da alínea n) do n.º 2 do artigo 238.° exige que o infractor - Praticar, ainda que fora do exercício das suas funções, acto revelador de ser o seu autor incapaz ou indigno de exercer o cargo ou que implique a perda da confiança geral necessária ao exercício da função.
12. A recorrente aceita que praticou a infracção fora do exercicio das suas funções mas para satisfazer os requisitos dessa norma 240.° n.º 2) b) exige ainda que o autor seja incapaz ou indigno da confiança necessária ao exercício da função.
13. Porém, do despacho recorrido não explicita ou não fundamenta de como a recorrente ficou incapaz ou indigna da confiança necessária ao exercício da função.
14. É humilhante e vexatório sentir que se expulsou do Corpo dos Bombeiros uma sua agente, residente da RAEM, com vinte e cinco anos de bons serviços prestados, e que é definidio pelos seus superiores hierárquicos como um boa Bombeira e reconhecimento com mérito profissional pela Corporação.
15. Assim, nunca pode ser considerar, que face a uma condenação de crime mercantil, tornou-se de imediato, uma boa e méritória agente bombeira que serviu a Corporação por 25 anos, incapaz ou indigna da confiança necessária ao exercío da função.
16. E finalmente também não assiste razão a aplicação da norma do artigo 240.° alínea a).
17. Com efeito, nada se prova em concreto que seja suspeptível de se imputar a arguida - ter praticado qualquer crime doloso punível com pena de prisão superior a três anos, com flagrante e grave abuso da função que exerce e com manifesta e grave violação dos deveres que lhe são inerentes, porque nem o despacho recorrido referencia sobre tal.
18. Talvez tenha sido razão por lapso que o despacho recorrido queria referenciar a norma da alínea b) do mesmo artigo 240.° - ter praticado, ainda que fora do exercício das funções, crime doloso punível com pena de prisão superior a 3 anos que revele ser o seu autor incapaz ou indigno da confiança necessária ao exercício da função?
19. Assim, se se não faz menção à al. a) do artigo 240.°, e se faz alínea b) do mesmo n.º 2 e do mesmo artigo, é também a norma respeitante com o requisito - autor incapaz ou indigno da confiança necessária ao exercício da função.
20. Assim, relativamente a a norma da alínea b) do artigo 240.°, pouco se vislumbra sobre a materialidade necessária a tal qualificação, conforme as razões já acima expostas da presente petição.
21. Portanto, não se verificou em algumas das situações referidas no artigo 238.° do EMFSM.
22. E conforme o artigo 232.° do EMFSM na medida e graduação da pena disciplinar “(...) atender-se-á aos critérios gerais enunciados nos artigos seguintes, à natureza e gravidade da infracção, à categoria ou posto do infractor, ao grau de culpa, à sua personalidade, ao seu nível cultural e a todas as circunstâncias que militem contra ou a favor do arguido.”
23. Pelo que a recorrente não deve ser punida com penas que inviabilizam a relação funcional, pena de aposentação compulsiva ou demissão, por não verificação dos seus pressupostos.
24. O acto recorrido é, em consequência dos apontados vícios de violação de lei e do princípio da proporcionalidade anulável nos termos gerais do direito administrativo.

* * *
Citada a Entidade Recorrida, o Senhor Secretário para a Segurança veio contestar o recurso com os fundamentos constantes de fls. 33 a 38, tendo formulado as seguintes conclusões:
- Foi corrigida a subsunção legal de uma das normas fundamento da medida sancionatória, nos termos e com os efeitos do artigo 135.º do CPA;
- Não se antolha qualquer erro nos pressupostos de facto que inquinem a fundamentação do acto administrativo impugnado, pelo que não pode proceder o vício de forma invocado;
- Não se antolha qualquer irracionalidade, injustiça, desproporcionalidade ou ilegalidade no acto administrativo, pelo que não pode proceder o alegado vício de violação de lei.

* * *
O Digno. Magistrado do Ministério Público junto do TSI emitiu o seguinte douto parecer (fls. 54 a 56):
Vem interposto recurso contencioso do despacho de 08 de Outubro de 2018, da autoria do Exm.º Secretário para a Segurança, através do qual foi aplicada à recorrente A a pena de aposentação compulsiva.
Na petição de recurso vêm imputados ao acto os diversos vícios de violação de lei aí explicitados, vícios cuja existência a entidade recorrida refuta, sustentando a legalidade do acto.
Vejamos.
Diz a recorrente que o acto incorreu em violação da norma do artigo 201.°, n.º 2, alínea d), do Estatuto dos Militarizados das Forças de Segurança de Macau (EMFSM), já que considerou a existência da agravante “infracção comprometedora da honra, do brio ou do decoro pessoal ou da instituição”, quando é certo que os factos integradores da violação do dever de aprumo, cuja existência assume, não ocorreram em público nem tiveram publicidade.
Cremos que a ocorrência em público, ou a publicidade, dos factos que substanciam a violação do dever de aprumo não é factor necessário à verificação da referida agravante. O que interessa é que a infracção disciplinar ocorra num círculo de valores cuja ofensa ponha em xeque a honra, o brio ou o decoro do infractor ou da instituição que serve. Pois bem, sabendo-se que a materialidade da infracção ao dever de aprumo ocorre no âmbito de uma venda de medicamentos cujo prazo de validade expirara, o que a recorrente ocultou através da sobreposição de uma etiqueta com outro prazo, assim enganando os destinatários imediatos e mediatos dos medicamentos, não pode deixar de se considerar que tal acção põe em xeque a integridade de carácter e a honestidade da sua autora, a ora recorrente, o que nos remete para a questão da honra e do decoro pessoal de que fala a norma.
Não se divisa, assim, que, ao considerar tal agravante, o despacho recorrido haja incorrido em qualquer violação de lei, pelo que improcede este primeiro vício.
Argumenta também a recorrente que o acto viola a norma do artigo 16.°, alínea b), do EMFSM, porquanto nunca aceitou qualquer cargo ou função, tal como não assumiu a qualidade de sócio, na empresa “Medicina Singapura”, que é propriedade de um seu cunhado.
Não se afigura que lhe assista razão. Quando fala no dever dos militarizados em recusar a nomeação para qualquer cargo, comissão, função ou emprego, sem prévia autorização da entidade competente, enquanto na efectividade de serviço, a norma pretende acautelar todas as situações de possível acumulação ilegal de funções, quer estejam em causa lugares ou cargos públicos, quer se trate de actividade privada, como resulta da utilização dos diversos vocábulos atinentes às variadas hipóteses enquadráveis na função pública e na actividade privada (cargo, comissão, função, emprego). A utilização da palavra nomeação adquire, neste contexto, o significado de incumbência. Ora, a realização plúrima de vendas de medicamentos a farmácias, ocorrida na efectividade de serviço e sem obtenção de autorização, integra, salvo melhor juízo, a violação do dever plasmado no aludido artigo 16.°, alínea b), do EMFSM, conforme ponderou a decisão recorrida, sendo indiferente, para a verificação da violação do dever, que a recorrente fosse ou não sócia da firma para a qual, ou em favor da qual, realizou a actividade.
Improcede também este vício.
Em seguida, a recorrente aduz que o despacho recorrido violou os artigos 238.°, n.º 2, alínea n), 240.°, alínea b), e 239.°, do EMFSM, por não ter explicitado a razão de a recorrente se ter tornado incapaz ou indigna da confiança necessária ao exercício da função, o que redunda na ausência do pressuposto da inviabilidade da manutenção da relação jurídico-funcional e na violação do princípio da proporcionalidade.
Crê-se que, também aqui, lhe falece razão.
Com efeito, após ter elencado sucintamente os factos imputados à recorrente e os ter integrado na violação dos deveres considerados infringidos, o despacho recorrido invocou a gravidade acentuada de tais factos, que, além do mais, integram crime punível abstractamente com pena de prisão superior a três anos, e ponderou o desabono que eles representam para a idoneidade moral da infractora e a perda de confiança geral que acarretam para o exercício de funções, acabando por concluir que a arguida, ora recorrente, deixou, por isso, de reunir condições para se manter ao serviço das forças de segurança. Posto o que, fazendo apelo às normas pertinentes das penas expulsivas, acabou por punir a recorrente com a pena de aposentação compulsiva, uma das penas aplicáveis ao caso.
Do exposto resulta que a matéria factual com que lidou o acto recorrido integra a previsão das normas punitivas nele consideradas, que não se mostram violadas, tal como resulta que foi suficientemente explicitada a razão da inviabilidade da manutenção da relação jurídico-funcional.
Acresce, no tocante à suposta violação do princípio da proporcionalidade, que importa ter em conta, como o Tribunal de Última Instância tem vindo a decidir, que a aplicação pela Administração de penas disciplinares, dentro das espécies e molduras legais - como no caso sucedeu - é, em princípio, insindicável contenciosamente, salvo nos casos de erro manifesto, notória injustiça ou violação dos princípios gerais do Direito Administrativo - cf., v.g., acórdãos de 28 de Julho de 2004, 21 de Janeiro de 2015 e 4 de Novembro de 2015, respectivamente nos Processos 27/2003, 26/2014 e 71/2015. Ora, no caso, não se divisa de que forma possa ter sido afrontado o princípio da proporcionalidade, ante a gravidade que a lei confere a uma das infracções apuradas, que engloba expressamente nos casos passíveis de expulsão.
Improcedem igualmente estes vícios de violação de lei.
Termos em que, na improcedência dos suscitados vícios, o nosso parecer vai no sentido do não provimento do recurso.
* * *
Foram colhidos os vistos legais.
Cumpre analisar e decidir.
* * *
    II – PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
Este Tribunal é o competente em razão da nacionalidade, matéria e hierarquia.
O processo é o próprio e não há nulidades.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária e são dotadas de legitimidade “ad causam”.
Não há excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
* * *
    III – FACTOS
São os seguintes elementos, extraídos do processo principal e do processo administrativo com interesse para a decisão da causa:
- Na sequência do processo disciplinar instaurado contra a Recorrente, foi esta punida inicialmente com a pena de demissão, depois convolada para a aposentação compulsiva;
- A Recorrente (2ª Ré do processo de crime) foi condenada pelo TJB por acórdão proferido no processo CR2-14-0310-PCC, pela prática de crime de fraude de mercadoria, p. e p. pelo artigo 28º/1-b) da Lei nº 6/96/M, de 30 de Dezembro;
- A decisão condenatória foi confirmada pelo TSI, não obstante ter sido feita qualificação jurídica diferente sobre os factos imputados.
- No acórdão do TSI consideraram-se provados os seguintes factos:

‒ 第一嫌犯為於1990年6月28日在澳門開業的經營藥物產品出入口及批發的“C”的負責人,而第二嫌犯則為該商號在澳門營運的具體負責人。
‒ 2009年12月23日衛生局人員在位於澳門XXXXXX地下的“E中藥房”內進行稽查期間,發現擺放在接待公眾室內正待出售的6瓶“紅花田七三蛇虎標油(120ml)”的外包裝盒上所標示的批號為“1011”,其有效日期位置貼有標示為“5-2012”字樣的貼紙,但其內包裝上所印的批號及有效期卻被鐳射貼紙遮蓋住。
‒ 經檢查,被貼紙所掩蓋的該批藥品的真正有效期為“2008.7”。
‒ 以上貨物全由第二嫌犯以“C”名義向“E中藥房”提供。
‒ 2010年4月1日衛生局人員在位於澳門XXXXXX地下A鋪的“F中藥房”內進行稽查期間發現正待出售的5瓶“星洲救心油(20ml)”和7瓶“星洲萬應毛雞油(10ml)”的外包裝盒上印有有效期為“10/2012”和“3/2013”字樣,但原有效期說明“8/2008”字樣則被遮蓋住,而另外7瓶正待出售的“星洲萬應莪術油(40ml)”內包裝上所印的“07/2008”有效期標籤說明被人用貼紙遮蓋住,外包裝盒上則印有到期日“2012.5”字樣。
‒ 以上藥物全由第二嫌犯以“C”名義向“F中藥房”提供。
‒ 2010年4月8日衛生局人員在位於澳門XXXXXX地下的“G中藥房”內進行稽查期間發現正待出售的3瓶“星洲萬應莪術油(40ml)”、3瓶“星洲青竹油(40ml)”、1盒“星洲萬應止痛膏(12g)”和4盒“星洲萬應止痛膏(65g)”的外包裝上所顯示的有效期雖然分別為05/2012、05/2013、12/2012、05/2012,但其內、外包裝上均有位置被貼上鐳射標籤,在撕開貼紙後發現該批藥品的真正有效期為“07/2008”。
‒ 以上藥品全由第二嫌犯以“C”名義向“G中藥房”提供。
‒ 2010年11月4日衛生局人員在位於澳門XXXXXX地下B座的“H藥房”內進行稽查時,發現尚待出售的6瓶貼有“呂良氏”商標的20ml裝追風拳頭油和14瓶貼有“呂良氏”商標的40ml裝追風拳頭油。
‒ 經衛生局人員檢查,以上貨品內包裝上所印批號(10333)及有效期(10/2009)說明均被人貼上鐳射標籤遮蓋起來,而外包裝上印上“05/2012”、“03/2013”的新有效期字樣,原有效期則被鐳射貼紙所覆蓋。
‒ 以上藥物全由第二嫌犯以“C”名義向“H藥房”提供。
‒ 對被衛生局所查獲的上述所有藥品兩嫌犯均無法提供合法的進口文件。
‒ 以上兩名嫌犯在明知的情況下,通過以鐳射貼紙遮蓋藥品原有效期、張貼新有效期字樣貼紙於藥品包裝盒,令消費者對藥品的有效期產生混淆以欺騙消費者,兩名嫌犯達到為自己謀取非法利益的目的而作出上述行為。
‒ 兩名嫌犯在自由、有意識的情況下,故意實施上述行為。
‒ 兩名嫌犯清楚知道其行為屬法律所不容。

- O despacho punitivo tem o seguinte teor:

第108/SS/2018號批示
紀律程序編號:D/23/18/MAI
嫌疑人:A,一等消防員,編號XXXXXX

嫌疑人A,一等消防員,編號XXXXXX,隸屬消防局,根據已於2018年5月10日轉為確定的中級法院合議庭裁判,因實施第6/96/M號法律第28條第1款b)項所規定及處罰的貨物欺詐罪,被判處18個月徒刑,緩刑2年。
根據裁定有罪的合議庭裁判中獲證明之事實,嫌疑人在合議庭裁判中所列之方式和時間情節下,為著一切效力,在此視為完全轉錄,向四間澳門藥房銷售一款有效期已過的中醫藥物,貼上新日期標籤來更改有效期,從而偽裝仍在有效期內和適合銷售。
嫌疑人的故意行為罪過程度高,違反了12月30日第66/94/M號法令核准的《澳門保安部隊軍事化人員通則》第11條所載的端莊義務,第2款o)項---不實施任何可構成刑事不法行為或輕微違反不法行為之作為或不作為---的規定,違法行為構成《澳門保安部隊軍事化人員通則》第201條第2款d)項規定---作出有損於個人或機構名譽、聲譽或尊嚴之違法行為---的加重情節。
而且,無論是自受僱或其他形式的工作,嫌疑人從未取得從事私人業務的許可,亦未曾通知其上級,構成違反《澳門保安部隊軍事化人員通則》第16條b)項的規定。
《澳門保安部隊軍事化人員通則》第200條第2款b)項---過往行為良好;h)項---專業功績的認可以及f)項---所屬之上級所作之良好評語,是對嫌疑人有利的減輕情節,雖然輕微減低其行為在道德—法律上的可譴責性,但鑑於社會預期保安部隊整體對道德及公民價值特別謹慎,不能違反法律,作為部隊的一員及部隊的聲譽,她有責任在其個人生活中保持姿態,持續提升其個人尊嚴及職務之尊嚴。
雖然是在公職人員的工作以外發生,但事實的嚴重性使其喪失了道德品行,以及引致失去執行職務之一般信任,該等事實原則上構成可處以超逾三年徒刑的犯罪,嫌疑人不具備條件維持保安部隊之職務。
基於此,保安司司長行使第111/2014號行政命令第1款所授予的執行權限,以及《澳門保安部隊軍事化人員通則》第211條所指之附件G表所賦予的紀律懲戒權限;
聽取司法暨紀律委員會的意見後,決定採取撤職處分;
考慮到事實的客觀嚴重性,消防局一等消防員,編號XXXXXX,A的相關道德紀律譴責及主觀責任,處分是按照《澳門保安部隊軍事化人員通則》第238條第2款n)項及第240條a)項(撤職處分)的規定,但考慮到減輕情節,以及嫌疑人實際服務超過15年的前提條件,根據同一法規第239條的規定,科處嫌疑人強迫退休處分。
著告知嫌疑人本批示之內容,並知會其可自通知日起計30天內,向中級法院提起司法上訴。
2018年10月8日於澳門
保安司司長
(簽名見原文)
- Foi proferido posteriormente o despacho rectificativo com o seguinte teor:

Despacho N.º 146/SS/2018
Processo disciplinar n. ° D/23/18/MAI
Arguido: A, Bombeira de primeira n.º XXXXXX

RECTIFICAÇÃO
     Constatando existir um lapso material na subsunção da matéria de facto a uma das normas sancionatórias referidas no despacho n.º 108/SS/2018 de 08 de Outubro de 2018, que pune a ex-bombeira de primeira, n.º XXXXXX, A com a pena de Aposentação Compulsiva, lapso que decorre do silogismo subjacente à formação da decisão e respectivo conteúdo, determino, nos termos e com os efeitos retroactivos constantes do artigo 135.° do Código do Procedimento Administrativo, o seguinte:
     Onde se lê:
     “Ponderada a gravidade objectiva dos factos, a respectiva censura ético-disciplinar e a responsabilidade subjectiva da arguida A, Bombeira de primeira n.º XXXXXX do Corpo de Bombeiros e não obstante a cominação que resulta das disposições conjugadas dos artigos 238.º n.º 2 al n) e 240.º al a) o citado Estatuto dos Militarizados (pena de demissão) pune-a, com a pena APOSENTAÇAO COMPULSIVA, nos termos do artigo 239.º do mesmo diploma, por consideração ao circunstancialismo atenuante e após a verificação do pressuposto de arguida contar mais de 15 anos de serviço efectivo.”
     Deve ler-se:
     Ponderada a gravidade objectiva dos factos, a respectiva censura ético-disciplinar e a responsabilidade subjectiva da arguida A, Bombeira de primeira n.º XXXXXX do Corpo de Bombeiros e não obstante a cominação que resulta das disposições conjugadas dos artigos 238.º n.º2 al n) e 240.º al b) do citado Estatuto dos Militarizados (pena de demissão) pune-a, com a pena de APOSENTAÇÃO COMPULSIVA, nos termos do artigo 239.º do mesmo diploma, por consideração ao circunstancialismo atenuante e após a verificação do pressuposto de arguida contar mais de 15 anos de serviço efectivo.
     Notifique-se o conteúdo do presente despacho
     Gabinete do Secretário para a Segurança, aos 14 de Dezembro de 2018
     O Secretário para a Segurança
     XXX
* * *
    IV – FUNDAMENTOS
Neste recurso contencioso interposto pela Recorrente são suscitadas essencialmente as seguintes questões que importa analisar e resolver:
1) – Vícios da violação da lei – infringindo:
 a) - O artigo 16º/-b) do EMFSM;
 b) - O artigo 201º/2-d) do EMFSM;
 c) - Os artigos 238º/2-n) e 239º/b) do EMFSM.
2) - Vício da violação do princípio da proporcionalidade.
*
I – Vício da violação das leis:
A) - Começando pela análise do vício decorrente da violação do artigo 16º/-b) do EMFSM
Nesta matéria a Recorrente argumenta que nunca aceitou qualquer cargo ou função, tal como não assumiu a qualidade de sócio, na empresa “Medicina Singapura”, que é propriedade de um seu cunhado.
Ou seja, a mesma negou que violou o artigo 16º/b) do EMFSM.
O artigo 16º (Outros deveres) do EMFSM dispõe:
     Constituem, ainda, deveres do militarizado:
     a) Abster-se de exercer actividades incompatíveis com o seu grau hierárquico ou com o decoro pessoal ou da instituição, ou que o coloquem em situação de dependência susceptível de afectar a sua respeitabilidade pessoal e dignidade funcional perante as FSM ou a sociedade;
     b) Recusar a nomeação para qualquer cargo, comissão, função ou emprego, sem prévia autorização da entidade competente, enquanto na efectividade de serviço;
     c) Comunicar a nomeação para qualquer cargo, comissão, função ou emprego público, quando fora da efectividade de serviço;
     d) Comunicar a constituição do seu agregado familiar;
     e) Comunicar todas as alterações à sua evolução técnica e cultural, relativamente às habilitações literárias que obtenha ou cursos técnicos e superiores que complete;
     f) Comunicar com os imediatos superiores quando detido por autoridade competente estranha às FSM;
     g) Comunicar superiormente a sua residência habitual ou ocasional e, no caso de ausência por motivo de férias, licença ou doença, o local onde possa ser encontrado ou contactado.
A propósito deste normativo, bem observou o Digno. Magistrado do MP junto deste TSI:
Quando fala no dever dos militarizados em recusar a nomeação para qualquer cargo, comissão, função ou emprego, sem prévia autorização da entidade competente, enquanto na efectividade de serviço, a norma pretende acautelar todas as situações de possível acumulação ilegal de funções, quer estejam em causa lugares ou cargos públicos, quer se trate de actividade privada, como resulta da utilização dos diversos vocábulos atinentes às variadas hipóteses enquadráveis na função pública e na actividade privada (cargo, comissão, função, emprego). A utilização da palavra nomeação adquire, neste contexto, o significado de incumbência. Ora, a realização plúrima de vendas de medicamentos a farmácias, ocorrida na efectividade de serviço e sem obtenção de autorização, integra, salvo melhor juízo, a violação do dever plasmado no aludido artigo 16.°, alínea b), do EMFSM, conforme ponderou a decisão recorrida, sendo indiferente, para a verificação da violação do dever, que a recorrente fosse ou não sócia da firma para a qual, ou em favor da qual, realizou a actividade.
Ponto de vista que subscrevemos inteiramente, pois resulta do PA claramente que a Recorrente chegou a prestar serviços, durante largo período de tempo, na empresa “Medicina Singapura”, sem que estivesse devidamente autorizada. Pois, não se tratam de actos casuisticamente praticados e imputado a ela, tal resulta claramente dos termos exarados no acórdão condenatório.
Pelo que, é de julgar improcedente o argumento da Recorrente invocado nesta parte do recurso.
*
B - Passemos a ver a questão da eventual violação do artigo 201º/2-d) do EMFSM
O artigo 201º (Circunstâncias agravantes) do EMFSM preceitua:
     1. São circunstâncias agravantes da responsabilidade disciplinar as que aumentarem a culpabilidade do arguido ou o grau de ilicitude do facto.
     2. São circunstâncias agravantes da responsabilidade disciplinar, nomeadamente:
     a) Ser a infracção cometida em ocasião de grave alteração da ordem pública;
     b) Ser a infracção cometida em acto de serviço ou por motivo do mesmo ou na presença de outros, especialmente sendo inferiores do infractor, ou ainda em público ou em local aberto ao público;
     c) O conluio com outros elementos para a prática da infracção;
     d) Ser a infracção comprometedora da honra, do brio ou do decoro pessoal ou da instituição;
     e) A vontade determinada de, pela conduta seguida, produzir resultados prejudiciais ao serviço, à disciplina, ao interesse geral ou a terceiros, independentemente de estes se verificarem;
     f) A produção efectiva de resultados prejudiciais ao serviço, à disciplina, ao interesse geral ou a terceiros, nos casos em que o militarizado devesse prever essa consequência como efeito necessário da sua conduta;
     g) O mau comportamento anterior;
     h) A premeditação;
     i) Ser a infracção cometida durante o cumprimento de pena disciplinar;
     j) A persistência na prática da infracção, nomeadamente após ter sido reprovada por superior hierárquico, depois de o infractor ter sido intimado à obediência ou depois de o mesmo ter sido alertado para os inconvenientes do seu comportamento;
     l) A reincidência;
     m) A acumulação de infracções.
     3. Considera-se haver mau comportamento anterior, quando o elemento se encontre na 4.ª classe de comportamento.
     4. A premeditação consiste no desígnio formado 24 horas, pelo menos, antes da prática da infracção.
     5. A reincidência dá-se quando a infracção for cometida antes de decorridos 6 meses sobre o dia em que tiver findado o cumprimento da pena imposta por infracção anterior ou sobre a data em que devesse ter início a execução, conforme os casos.
     6. A acumulação dá-se quando duas ou mais infracções são cometidas na mesma ocasião ou quando uma é cometida antes de ter sido punida a anterior.
     7. Na acumulação de infracções aplica-se uma única pena; quando às infracções correspondam penas diferentes, aplicar-se-á a de maior gravidade.
 
 Ora neste ponto, é da posição do MP junto deste TSI:
“Diz a recorrente que o acto incorreu em violação da norma do artigo 201.°, n.º 2, alínea d), do Estatuto dos Militarizados das Forças de Segurança de Macau (EMFSM), já que considerou a existência da agravante “infracção comprometedora da honra, do brio ou do decoro pessoal ou da instituição”, quando é certo que os factos integradores da violação do dever de aprumo, cuja existência assume, não ocorreram em público nem tiveram publicidade.
Cremos que a ocorrência em público, ou a publicidade, dos factos que substanciam a violação do dever de aprumo não é factor necessário à verificação da referida agravante. O que interessa é que a infracção disciplinar ocorra num círculo de valores cuja ofensa ponha em xeque a honra, o brio ou o decoro do infractor ou da instituição que serve. Pois bem, sabendo-se que a materialidade da infracção ao dever de aprumo ocorre no âmbito de uma venda de medicamentos cujo prazo de validade expirara, o que a recorrente ocultou através da sobreposição de uma etiqueta com outro prazo, assim enganando os destinatários imediatos e mediatos dos medicamentos, não pode deixar de se considerar que tal acção põe em xeque a integridade de carácter e a honestidade da sua autora, a ora recorrente, o que nos remete para a questão da honra e do decoro pessoal de que fala a norma.
Não se divisa, assim, que, ao considerar tal agravante, o despacho recorrido haja incorrido em qualquer violação de lei, pelo que improcede este primeiro vício.”
Fazemos a mesma leitura dos factos imputados à Recorrente, pois, não se nos afigura de que o despacho recorrido padece do vício imputado, os actos por ela praticados demonstram alguma deshonestidade de uma pessoa e também põem evidentemente em causa a imagem da instituição a que a mesma pertencia Importa-se distinguir entre agente do funcionalismo público e agentes comerciais, enquanto àqueles se incumbe de realizar, de modo exclusivo, interesse público, o que solicita uma imagem mais transparente e imparcial perante o público.
Qualquer das maneiras, a honestidade é um valor básico que se impõe a qualquer pessoa enquanto ser humano e animal social, e mormente para um agente militarizado, incumbindo-se-lhe a missão de manter a ordem social e de salvar a pessoas e proteger o património da população. Ora, os actos praticados pela Recorrente são incompatíveis com este valor e como tal merecem censura.
Pelo que, é de julgar improcedente a argumentação produzida pela Recorrente nesta parte do recurso.
*
C – A questão da eventual violação do artigos 238º/2-n) e 239º/b) do EMFSM
O artigo 238º (aposentação compulsiva e demissão) do EMFSM tem o seguinte teor:
1. As penas de aposentação compulsiva e de demissão são aplicáveis, em geral, por infracções disciplinares que inviabilizam a manutenção da relação funcional.
2. As penas referidas no número anterior são aplicáveis ao militarizado que, nomeadamente:
a) Agredir, injuriar ou desrespeitar gravemente superior hierárquico, colega, subordinado ou terceiro, em local de serviço ou em público;
b) Usar de poderes de autoridade não conferidos por lei ou abusar dos poderes inerentes às suas funções excedendo os limites do estritamente necessário, quando seja indispensável o uso dos meios de coerção ou de quaisquer outros susceptíveis de ofenderem os direitos do cidadão;
c) Encobrir criminosos ou prestar-lhes qualquer auxílio que possa contribuir para frustrar ou dificultar a acção da justiça;
d) Por virtude de falsas declarações causar prejuízo a terceiros ou favorecer o descaminho de armamento;
e) Praticar ou tentar praticar acto demonstrativo da perigosidade da sua permanência na instituição ou acto de desobediência grave ou de insubordinação, bem como de incitamento à desobediência ou insubordinação colectiva;
f) Praticar de forma frustrada, tentada ou consumada crime de furto, roubo, burla, abuso de confiança, peculato, concussão, extorsão, peita, suborno e corrupção, associação de malfeitores, consumo e tráfico de estupefacientes, falsificação de documentos e pertença a sociedade secreta;
g) Tomar parte ou interesse, directamente ou por interposta pessoa, em qualquer contrato celebrado ou a celebrar por qualquer serviço da Administração Pública;
h) Violar segredo profissional ou cometer inconfidência de que resulte prejuízo para o Território ou para terceiros;
i) Se constituir na situação de ausência ilegítima durante 5 dias seguidos ou 10 interpolados, dentro do mesmo ano civil;
j) Aceitar, directa ou indirectamente, dádiva, gratificação ou participação em lucros ou outras vantagens patrimoniais, em resultado do lugar que ocupa, ainda que sem o fim de acelerar ou retardar qualquer serviço ou expediente;
l) Abusar habitualmente de bebidas alcoólicas ou consumir ou traficar estupefacientes ou substâncias psicotrópicas;
m) For cúmplice ou encobridor de qualquer crime previsto nas alíneas anteriores:
n) Praticar, ainda que fora do exercício das suas funções, acto revelador de ser o seu autor incapaz ou indigno de exercer o cargo ou que implique a perda da confiança geral necessária ao exercício da função.
O Digno. Magistrado do MP junto deste TSI emitiu o seguinte douto parecer neste ponto:
“Em seguida, a recorrente aduz que o despacho recorrido violou os artigos 238.°, n.º 2, alínea n), 240.°, alínea b), e 239.°, do EMFSM, por não ter explicitado a razão de a recorrente se ter tornado incapaz ou indigna da confiança necessária ao exercício da função, o que redunda na ausência do pressuposto da inviabilidade da manutenção da relação jurídico-funcional e na violação do princípio da proporcionalidade.
Crê-se que, também aqui, lhe falece razão.
Com efeito, após ter elencado sucintamente os factos imputados à recorrente e os ter integrado na violação dos deveres considerados infringidos, o despacho recorrido invocou a gravidade acentuada de tais factos, que, além do mais, integram crime punível abstractamente com pena de prisão superior a três anos, e ponderou o desabono que eles representam para a idoneidade moral da infractora e a perda de confiança geral que acarretam para o exercício de funções, acabando por concluir que a arguida, ora recorrente, deixou, por isso, de reunir condições para se manter ao serviço das forças de segurança. Posto o que, fazendo apelo às normas pertinentes das penas expulsivas, acabou por punir a recorrente com a pena de aposentação compulsiva, uma das penas aplicáveis ao caso.
Do exposto resulta que a matéria factual com que lidou o acto recorrido integra a previsão das normas punitivas nele consideradas, que não se mostram violadas, tal como resulta que foi suficientemente explicitada a razão da inviabilidade da manutenção da relação jurídico-funcional.”
Ora, subscrevemos inteiramente esta posição acabada de transcrita, tratando-se de uma análise lógica, bem fundamentada e em sintonia com a legislação aplicável, pelo que, julga-se igualmente improcedente a argumentação tecida pela Recorrente nesta parte.
*
II – Violação do princípio da proporcionalidade
 2ª questão: Vício da violação do princípio da proporcionalidade
Uma outra questão suscitada pela Recorrente é a violação do princípio da proporcionalidade.
O princípio da proporcionalidade está consagrado no artigo 5º do CPA, ao estabelecer que
«2. As decisões da Administração que colidam com direitos subjectivos ou interesses legalmente protegidos dos particulares só podem afectar essas posições em termos adequados e proporcionados aos objectivos a realizar”.
Entendido, em sentido amplo, como proibição do excesso, o princípio da proporcionalidade postula que a Administração prossiga o interesse público pelo meio que represente um menor sacrifício para as posições dos particulares. Incorpora, como subprincípio constitutivo, o princípio da exigibilidade, também conhecido como princípio da necessidade ou da menor ingerência possível, que destaca a ideia de que o cidadão tem direito à menor desvantagem possível.

Para maior operacionalidade deste princípio, a doutrina acrescenta, entre outros elementos, o da exigibilidade espacial, que aponta para a necessidade de limitar o âmbito da intervenção na esfera jurídica das pessoas cujos interesses devam ser sacrificados (vd. J. J. Gomes Canotilho, in Direito Constitucional e Teoria da Constituição, 7ª ed., Almedina, 266, ss.).

Nesta óptica, a questão essencial reside em saber qual medida punitiva –aposentação compulsiva ou outra medida menos grovosa – que é mais proporcional à sanção motivada pelos factos praticados pela Recorrente.
No fundo, importa saber se o tipo de penas foi bem escolhido ou não. Ou seja, é uma matéria que se prende com a questão da aplicação correcta ou não do artigo 238º, 239º e 240º do EMFSM.
O artigo 238º (Aposentação compulsiva e demissão) do EMFSM tem o seguinte teor:
1. As penas de aposentação compulsiva e de demissão são aplicáveis, em geral, por infracções disciplinares que inviabilizam a manutenção da relação funcional.
2. As penas referidas no número anterior são aplicáveis ao militarizado que, nomeadamente:
a) Agredir, injuriar ou desrespeitar gravemente superior hierárquico, colega, subordinado ou terceiro, em local de serviço ou em público;
b) Usar de poderes de autoridade não conferidos por lei ou abusar dos poderes inerentes às suas funções excedendo os limites do estritamente necessário, quando seja indispensável o uso dos meios de coerção ou de quaisquer outros susceptíveis de ofenderem os direitos do cidadão;
c) Encobrir criminosos ou prestar-lhes qualquer auxílio que possa contribuir para frustrar ou dificultar a acção da justiça;
d) Por virtude de falsas declarações causar prejuízo a terceiros ou favorecer o descaminho de armamento;
e) Praticar ou tentar praticar acto demonstrativo da perigosidade da sua permanência na instituição ou acto de desobediência grave ou de insubordinação, bem como de incitamento à desobediência ou insubordinação colectiva;
f) Praticar de forma frustrada, tentada ou consumada crime de furto, roubo, burla, abuso de confiança, peculato, concussão, extorsão, peita, suborno e corrupção, associação de malfeitores, consumo e tráfico de estupefacientes, falsificação de documentos e pertença a sociedade secreta;
g) Tomar parte ou interesse, directamente ou por interposta pessoa, em qualquer contrato celebrado ou a celebrar por qualquer serviço da Administração Pública;
h) Violar segredo profissional ou cometer inconfidência de que resulte prejuízo para o Território ou para terceiros;
i) Se constituir na situação de ausência ilegítima durante 5 dias seguidos ou 10 interpolados, dentro do mesmo ano civil;
j) Aceitar, directa ou indirectamente, dádiva, gratificação ou participação em lucros ou outras vantagens patrimoniais, em resultado do lugar que ocupa, ainda que sem o fim de acelerar ou retardar qualquer serviço ou expediente;
l) Abusar habitualmente de bebidas alcoólicas ou consumir ou traficar estupefacientes ou substâncias psicotrópicas;
m) For cúmplice ou encobridor de qualquer crime previsto nas alíneas anteriores:
n) Praticar, ainda que fora do exercício das suas funções, acto revelador de ser o seu autor incapaz ou indigno de exercer o cargo ou que implique a perda da confiança geral necessária ao exercício da função.

Nas hipóteses tipificadas no artigo 238º do EMFSM pode aplicar-se tanto a pena de aposentação compulsiva, como a de demissão! A opção de uma ou de outra depende da verificação dos pressupostos exigidos.
Nas situações previstas no artigo 240º do EMFSM aplica-se a pena de demissão!
Nas hipóteses do artigo 239º do EMFSM, aplica-se a pena de aposentação compulsiva, desde que se verifiquem os pressupostos aí fixados.
Neste ponto, no que toca à alegada violação do princípio da proporcionalidade, questiona- que a decisão punitiva haja sacrificado ou beneficiado desproporcionadamente os interesses em confronto?
Pois, na óptica da Entidade Recorrida, a conduta infraccional da Recorrente enquadra-se na previsão da alínea n) dos n.ºs 1 e 2 do artigo 238.º do EMFSM, entendendo que são factos graves. Será esta leitura correcta?

Ora, na aplicação das penas, deve atender-se a um conjunto de factores:
- A natureza e a gravidade dos factos;
- A categoria do funcionário ou agente;
- A sua personalidade;
- O grau de culpa do infractor;
- Os danos e prejuízos causados;
- A perturbação produzida no normal funcionamento dos serviços;
Em geral, a todas as circunstâncias em que a infracção tiver sido cometida que militem contra ou a favor do arguido/Recorrente.
É o que resulta do artigo 232º do EMFSM.
E também é sabido que “As penas de inactividade ou de aposentação compulsiva e demissão são aplicáveis às infracções a seguir indicadas, conforme, ponderadas todas as circunstâncias atendíveis, inviabilizem ou não a manutenção da relação funcional”, o que significa que não basta a prática de “conduta constitutiva de crime…que possa atentar contra o prestígio e dignidade da função” ou que traduza a “violação de segredo profissional e omissão de sigilo devido relativamente aos assuntos conhecidos em razão do cargo ou da função, sempre que daí resulte prejuízo para o desenvolvimento do trabalho policial ou para qualquer pessoa” (Ac. do STA de 11/10/2006, Proc. nº 010/06).
Há-de haver, além disso, um “quid” perturbador da relação de confiança recíproca que inviabilize a manutenção do vínculo profissional. Como ainda recentemente se disse em aresto do STA, a pena de demissão aplica-se «a comportamentos que atinjam um grau de desvalor de tal modo grave que mine e quebre, definitiva e irreversivelmente, a confiança que deve existir entre o serviço público e o agente» (Ac. do STA de 11/10/2006, Proc. nº 010/06).
Como se decidiu no Ac. de 01.04.2003 do mesmo Supremo – Rec. 1.228/02, “A valoração das infracções disciplinares como inviabilizantes da manutenção da relação funcional tem de assentar não só na gravidade objectiva dos factos cometidos, mas ainda no reflexo dos seus efeitos no desenvolvimento da função exercida e no reconhecimento, através da natureza do acto e das circunstâncias em que foi cometido, de que o seu autor revela uma personalidade inadequada ao exercício dessas funções” (no mesmo sentido, os acórdãos de 18.6.96, proc.º nº 39.860, de 16.5.02, proc.º nº 39.260, de 5.12.02, proc.º nº 934/02, de 24/03/2004, Proc. nº 0757/03; e 11/10/2006, Proc. nº 010/06).

Quer dizer, ao órgão com competência disciplinar reconhece-se «no preenchimento dessa cláusula geral, ampla margem de liberdade administrativa, tal tarefa está limitada pelos princípios da imparcialidade, justiça e proporcionalidade – além de ficar, depois, sujeita ao poder sindicante dos tribunais administrativos, se forem detectáveis erros manifestos» (cf. o cit. 24/03/2004, Proc. nº 0757/03; tb. AC. do STA/Pleno de 19/03/99, Proc. nº 030896).
Ou, como é dito noutro aresto do STA do Portugal, “…o preenchimento do conceito indeterminado que corresponde à inviabilidade da manutenção da relação funcional, (…) constitui tarefa da Administração, a concretizar mediante um juízo de prognose. Contudo, a jurisprudência do STA, tem realçado que tais juízos têm de assentar em pressupostos como a gravidade objectiva do facto cometido, o reflexo no exercício das funções e a personalidade do agente se revelar inadequado para o exercício de funções públicas. Confrontar, a título meramente exemplificativo, os Acs. de 6-10-93 – Rec. 30463 e de 18-6-96 – Rec. 39860” (Ac. do STA de 2/12/2004, Proc. nº 01038/04).

A aplicação de uma medida expulsiva - quer se trate de demissão quer de aposentação compulsiva - só pode ter lugar quando a conduta do infractor atinge de tal forma o prestígio e a credibilidade da instituição de que faz parte que a sua não aplicação não só iria contribuir para degradar a imagem de seriedade e de isenção dessa instituição como também poderia ser considerada pela opinião pública como chocante ou escandalosa.
Por ser assim é que a aplicação daquelas penas aos agentes ou funcionários das FSM depende da prática de “infracções disciplinares que inviabilizam a manutenção da relação funcional” (art.º 238º/1 e 2-l) do EMFSM), isto é, de comportamentos capazes de minar de forma inapagável não só a imagem de prestígio e de credibilidade daquela Corporação como também a confiança que nelas depositam os cidadãos e que, por isso, impossibilitem a relação de confiança indispensável à manutenção do vínculo funcional.

Nestes termos, a posição da Entidade Recorrida merece algum reparo, pois, importa sublinhar as particularidades inerentes aos factos cometidos pela Recorrente:
- São factos praticados sem conexão com o serviço;
- Era primária;
- Obteve louvores e elogios nos serviços (fls. 42 a 45 do PA);
- Tem mais de 25 anos de serviços;
- Os produtos, cuja etiquete foi modificada, não se destinavam a consumo, mas sim, são pomadas!
- Os factos cometidos não causam danos nem aos serviços nem ao público.

*
Num caso semelhante (Processo nº 11/2019, de 4/4/2019) decidido pelo venerando TUI em que este afirmou:
“O princípio da proporcionalidade da actuação administrativa (colidente com posições jurídicas dos administrados) exige que a decisão seja:
- adequada (princípio da adequação): a lesão de posições jurídicas dos administrados tem de revelar-se adequada, apta, à prossecução do interesse público visado;
- necessária (princípio da necessidade): a lesão daquelas posições tem que se mostrar necessária ou exigível (por qualquer outro meio não satisfazer o interesse público visado);
- proporcional (princípio da proporcionalidade em sentido estrito): a lesão sofrida pelos administrados deve ser proporcional e justa em relação ao benefício alcançado para o interesse público (proporcionalidade custo/benefício)”.
4. O caso dos autos
O recorrente foi punido com a demissão por ter sido condenado judicialmente pela prática de dois crimes.
A tais crimes cabia a penalidade de prisão até 2 anos ou multa até 240 dias.
Foi o recorrente punido judicialmente com a pena de multa de 120 dias por cada um dos crimes e em cúmulo jurídico das referidas penas, foi condenado na pena única de 180 dias de multa, à quantia diária de MOP$200,00, ou seja, em MOP$36.000,00.
De acordo com o disposto no artigo 64.º do Código Penal, se ao crime forem aplicáveis, em alternativa, pena privativa e pena não privativa da liberdade, o tribunal dá preferência à segunda sempre que esta realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
Quer isto dizer que o Tribunal considerou que a punição do recorrente com uma pena de multa realizava de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
Os crimes foram praticados fora do exercício das funções.
Sendo chefe assistente, estava integrado na categoria mais baixa (a quarta) da carreira superior (Anexo B a que se refere o n.º 1 do artigo 30.º do Regulamento Administrativo n.º 24/2001).
O recorrente tem louvores ou condecorações. Sabemos isso pela referência do acto punitivo à alínea h) do n.º 2 do artigo 200 do EMFSM, embora do mesmo não esclareça que prémios em concreto ele teve.
Os factos têm alguma gravidade. Se não tivessem não eram criminalmente punidos. Mas os crimes não são particularmente graves, (sublinhado nosso) visto que puníveis apenas com prisão até 2 anos ou multa até 240 dias.
De qualquer maneira, não consta que as fotografias da ex-namorada com o marido desta, enviadas digitalmente a amigos dela, fossem sensíveis.
O princípio da proporcionalidade postula a proibição do excesso.
Sopesando as vantagens e os inconvenientes da aplicação de uma pena expulsiva, afigura-se-nos que esta aplicação não é necessária para atingir os fins de reposição do prestígio das Forças de Segurança abalado com a conduta do recorrente, tendo em conta que a experiência de um bombeiro com largos anos de serviço é certamente um bem inestimável para a população, sendo que há outras penas que podem contribuir para aquele desiderato.
Somos, pois, de opinião que a aplicação de uma pena expulsiva é, no caso, excessiva e, portanto, desproporcionada, tanto para os interesses do particular como para o interesse público.
Daí que se conclua que o acto punitivo deve ser anulado por violação do princípio da proporcionalidade.”

Comparados os factos daquele processo e os vertidos neste, salvo o melhor respeito, aqueles devem reputados mais graves. Entende-se que é excessiva a opção de uma medida sancionatória radical, traduzida no corte com o serviço.
Mutatis mutandis, este critério e raciocínio valem também para este caso, e porque se verificou erro manifesto na escolha da medida sancionatória aplicada, não sendo respeitado assim o princípio de proporcionalidade nos termos acima vistos, e como cabe dentro dos poderes do Tribunal a sindicância desse erro manifesto, é de conceder provimento ao recurso, anulando o despacho recorrido.
*
Síntese conclusiva:
I - A aplicação de uma medida expulsiva - quer se trate de demissão quer de aposentação compulsiva - só pode ter lugar quando a conduta do infractor atinge de tal forma o prestígio e a credibilidade da instituição de que faz parte e que a sua não aplicação iria contribuir para degradar a imagem de seriedade e de isenção dessa instituição.

II – O artigo 238º do EMFSM elenca as situações em que se pode aplicar a pena de demissão (ou de aposentação compulsiva), a opção de uma ou de outra depende da verificação dos pressupostos respectivos, enquanto nas hipóteses previstas no artigo 240º do mesmo EMFSM aplica-se a pena de demissão.

III – O princípio de proporcionalidade, entendido, em sentido amplo, como proibição do excesso, postula que a Administração prossiga o interesse público pelo meio que represente um menor sacrifício para as posições dos particulares. Incorpora, como subprincípio constitutivo, o princípio da exigibilidade, também conhecido como princípio da necessidade ou da menor ingerência possível, que destaca a ideia de que o cidadão tem direito à menor desvantagem possível.

IV - Para maior operacionalidade deste princípio, a doutrina acrescenta, entre outros elementos, o da exigibilidade espacial, que aponta para a necessidade de limitar o âmbito da intervenção na esfera jurídica das pessoas cujos interesses devam ser sacrificados (vd. J. J. Gomes Canotilho, in Direito Constitucional e Teoria da Constituição, 7ª ed., Almedina, 266, ss.).

V – Os factos imputados à Recorrente integram nas infracções previstas no artigo 238º/1 e 2/-n) do EMFSM, por ter sido condenada criminalmente pela prática de factos integradores do crime de fraude de mercadoria, p. e p. pelo artigo 28º/1-b) da Lei nº 6/96/M, de 30 de Dezembro, circunstâncias estas que levaram a Entidade Recorrida a aplicar-lhe a pena de aposentação compulsiva, por entender que tais factos causaram impacto negativo na corporação que albergava a Recorrente e se revelou susceptível de atingir a dignidade de que é credora e o prestígio das FSM em que se integra; entendendo também que se mostra suficientemente justificada a inviabilidade da manutenção da relação funcional, pois foi violado o dever de aprumo, previsto no artigo 12º/2-g) e o) do EMFSM, o que justificava, no entender da Entidade Recorrida, o recurso à sanção de aposentação compulsiva prevista no artigo 238.º/2-n) e no artigo 239º /-b), todos do EMFSM.

VI – Porém, tendo em conta as circunstâncias particulares e concretas do caso em apreciação - são factos praticados sem conexão com o serviço; era primária; obteve louvores e elogios nos serviços (fls. 42 a 45 do PA); tem mais de 25 anos de serviços; os produtos, cuja etiquete foi modificada, não se destinavam a consumo, mas sim, são pomadas! os factos cometidos não causam danos nem aos serviços nem ao público -, e na opção de tipo de medidas punitivas há-de respeitar o princípio de proporcionalidade, que postula a proibição do excesso. Sopesando os aspectos positivos e negativos decorrentes da aplicação de uma pena expulsiva, afigura-se-nos que esta aplicação não é necessária para alcançar os fins de reposição do prestígio das Forças de Segurança abalado com a conduta da Recorrente, tendo em conta que a experiência de uma bombeira com largos anos de serviço é certamente um bem inestimável, quer para a Instituição em causa, quer para a população, existindo outras opções, em termo de tipo de sanções disciplinares, que podem contribuir certamente para o desiderato visado.

VII - Deste modo, e porque se verificou erro manifesto na escolha da medida sancionatória aplicada, não sendo respeitado assim o princípio de proporcionalidade nos termos acima vistos, e como cabe dentro dos poderes do Tribunal a sindicância desse erro manifesto, é de conceder provimento ao recurso, anulando o despacho recorrido.

*
Tudo visto e analisado, resta decidir.

* * *
    V - DECISÃO
Em face de todo o que fica exposto e justificado, os juízes do TSI acordam em julgar procedente o presente recurso, anulando-se o despacho recorrido.
*
Sem custas.
*
Notifique e Registe.
*
RAEM, 30 de Maio de 2019.
Fong Man Chong
Ho Wai Neng
José Cândido de Pinho
Mai Man Ieng


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