--- Decisão Sumária nos termos do art.º 407º, n.º 6 do C.P.P.M. (Lei n.º 9/2013). ----------------
--- Data: 14/06/2019 --------------------------------------------------------------------------------------------
--- Relator: Dr. Chan Kuong Seng.--------------------------------------------------------------------------
Processo n.º 354/2019
(Autos de recurso penal)
Recorrentes: A e B
DECISÃO SUMÁRIA NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA
1. Inconformados com o despacho judicial que não admitiu liminarmente o seu pedido cível de indemnização pretendidamente enxertado, aquando da apresentação da contestação deles como 3.o e 4.o demandados relativamente ao pedido cível enxertado pela lesada C, no Processo Comum Colectivo n.o CR2-18-0213-PCC do 2.o Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base, no qual ficou pronunciado o arguido D pela prática, em autoria material, na forma consumada, de um crime de falsificação de documento do art.o 244.o, n.o 1, alínea a), do Código Penal (CP), um crime de abuso de confiança do art.o 199.o, n.os 1 e 4, alínea b), do CP, e um crime de burla do art.o 211.o, n.os 1 e 4, alínea a), do CP, vieram A e B recorrer para este Tribunal de Segunda Instância (TSI), pedindo a revogação daquela decisão de não admissão do pedido cível deles, com conseguinte almejada determinação da admissão do mesmo pedido cível (cfr. a motivação una do recurso deles, a fls. 3 a 6v dos presentes autos recursórios).
Ao recurso, respondeu a demandante C a fls. 53 a 59v dos presentes autos recursórios, no sentido de improcedência do recurso dos 3.o e 4.o demandados.
Subido o recurso, declarou a Digna Procuradora-Adjunta, em sede de vista (dada a fl. 69), que não tinha legitimidade para emitir parecer, por estar em causa tão-só a matéria cível.
Cabe decidir sumariamente do recurso, nos termos do art.o 621.o, n.o 2, do Código de Processo Civil, ex vi do art.o 4.o do Código de Processo Penal (CPP), dada a simplicidade da questão, unicamente de foro civil, a decidir.
2. Do exame dos autos, sabe-se o seguinte:
– o arguido D ficou pronunciado como autor material, na forma consumada, de um crime de falsificação de documento do art.o 244.o, n.o 1, alínea a), do CP, um crime de abuso de confiança do art.o 199.o, n.os 1 e 4, alínea b), do CP, e um crime de burla do art.o 211.o, n.os 1 e 4, alínea a), do CP (cfr. o teor do despacho de pronúncia disponibilizado textualmente a partir de 25 de Abril de 2018, certificado a fls. 28v a 31 dos presentes autos recursórios);
– em 20 de Julho de 2018, foi admitido liminarmente, por despacho judicial (a que alude o teor ora certificado a fl. 44 dos presentes autos recursórios), o pedido cível de indemnização (com teor certificado a fls. 38 a 43v dos mesmos autos recursórios) enxertado no subjacente Processo Comum Colectivo n.o CR2-18-0213-PCC, pela lesada C contra o arguido pronunciado D como 1.o demandado, E como 2.o demandado, e A e B como 3.o e 4.o demandados;
– esses 3.o e 4.o demandados, ao apresentarem a contestação una daquele pedido cível, apresentaram também, em peça autónoma, pretendidamente a enxertar no mesmo subjacente processo penal, o pedido cível deles contra C, D e E, pedido cível este que não foi admitido pelo M.mo Juiz titular do processo penal em primeira instância, com fundamento nuclear em que o pedido cível em causa integraria a figura de reconvenção, e na tramitação do enxerto cível de indemnização, não seria permitido aos demandados contestantes formular reconvenção aquando da contestação (cfr. a fundamentação do despacho judicial ora recorrido, com teor certificado a fl. 50 a 50v dos presentes autos recursórios);
– dá-se por aqui integralmente reproduzida a matéria fáctica descrita no despacho de pronúncia contra o arguido D.
3. De antemão, cumpre notar que mesmo em processo penal, e com excepção da matéria de conhecimento oficioso, ao tribunal de recurso cumpre resolver só as questões material e concretamente alegadas na motivação do recurso e ao mesmo tempo devidamente delimitadas nas conclusões da mesma, e já não responder a toda e qualquer razão aduzida pela parte recorrente para sustentar a procedência das suas questões colocadas (nesse sentido, cfr., de entre muitos outros, os acórdãos do TSI, de 7 de Dezembro de 2000 no Processo n.o 130/2000, de 3 de Maio de 2001 no Processo n.o 18/2001, e de 17 de Maio de 2001 no Processo n.o 63/2001).
Nesses parâmetros, conhecendo:
No caso dos autos, o M.mo Juiz a quo qualificou juridicamente como reconvenção o “pedido cível” apresentado em peça autónoma pelos 3.o e 4.o demandados civis aquando da apresentação da contestação deles contra o pedido civil de C.
Por outra banda, alegaram os dois ora recorrentes que eles tinham o direito de deduzir pedido cível de indemnização no âmbito do mesmo processo penal, nos termos sobretudo dos art.os 64.o e 66.o do CPP.
A argumentação jurídica do Tribunal recorrido seria pertinente se os dois ora recorrentes não pudessem ser considerados como lesados pelos actos delituais penais alegadamente praticados pelo arguido.
Entretanto, ante a matéria de facto imputada no despacho de pronúncia contra o arguido, os dois recorrentes deveriam ser considerados também como lesados por actos delituais penalmente relevantes alegadamente praticados a montante pelo arguido contra C. Daí que assiste aos dois recorrentes o direito de deduzir pedido cível de indemnização no subjacente processo penal (cfr. o art.o 60.o do CPP).
A lei processual penal vigente não impõe limite ao número de pedidos cíveis de indemnização a enxertar em processo penal.
Contudo, uma coisa é ter todo o lesado o direito para formular o pedido cível em processo penal, e outra coisa, bem distinta, é saber se o pedido cível formulado em concreto pode ser admitido liminarmente, já que caberá ao tribunal verificar se o pedido cível apresentado em concreto satisfaz todos os pressupostos processuais para poder ser admitido liminarmente.
Razões por que procede a pretensão dos dois recorrentes de revogação da decisão recorrida, cumprindo ao mesmo Tribunal a quo decidir de novo sobre a admissibilidade liminar do pedido cível então apresentado pelos ora dois recorrentes, em sede de verificação de pressupostos processuais.
As custas da presente lide recursória ficarão a cargo de C, por ela ter defendido a improcedência do recurso dos dois recorrentes (sendo de fixar em concreto uma taxa de justiça, por a presente decisão sumária do recurso não ter conhecido do mérito do pedido cível dos dois recorrentes).
4. Dest’arte, julga-se provido o recurso, revogando a decisão judicial recorrida, cabendo ao mesmo Tribunal recorrido decidir de novo sobre a admissibilidade liminar do pedido cível de indemnização então apresentado pelos dois ora recorrentes A e B.
Custas da presente lide recursória por C, com taxa de justiça ora fixada em duas UC.
Macau, 14 de Junho de 2019.
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Chan Kuong Seng
(Relator)
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