Proc. nº 361/2018 – Incidente – A
Acordam em conferência no Tribunal de Segunda Instância
I – Relatório
Proferido o aresto de fls. 1325-1361, pelos RR A, “B” e C, foi imputada a sua nulidade em relação aos recursos A e B e efectuado pedido de esclarecimento relativamente ao segmento concernente ao recurso C (cfr. fls. 1371-1375; 1378-1383).
A essa global pretensão foi dada resposta, em conferência, pelo acórdão de fls. 1436-1445.
Vêm agora, através da peça de fls. 1452 e sgs., os mesmos RR suscitar a nulidade do acórdão de fls. 1325 e sgs. na parte relativa ao recurso C.
Em sua opinião, essa decisão padece de:
- “Excesso de pronúncia” no que se refere à decisão sobre a nomeação de peritos, o que traduz a nulidade a que se refere o art. 571º, nº1, 2ª parte, al. d), do CPC;
- “Omissão de fundamentação de direito”, no que tange à nomeação de um colégio pericial, o que constitui a nulidade a que se refere o art. 571º, nº1, al. b), do CPC.
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A parte contrária, notificada, remeteu-se ao silêncio.
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II – Apreciando
1- Da 1ª nulidade
Recordando, está em causa apenas o Recurso C.
Entendem os arguentes que o TSI conheceu de questão de que não podia tomar conhecimento. Dizem que o TSI não podia entrar na análise sobre se a equipa de peritos deveria ser a mesma ou se podia ter diferente composição, visto que essa matéria não tinha feito parte da matéria da impugnação recursória.
Vejamos.
Por despacho judicial, transcrito a fls. 1348-1351, o magistrado titular do processo nomeou para o apenso C “os mesmos peritos” que já haviam realizado a anterior perícia no processo principal.
Inconformados, os RR recorreram jurisdicionalmente.
E o que alegaram?
- Que a apensação não significa fusão e que, por isso, cada acção continua a ter individualidade própria, nomeadamente para efeito de uso de meios de prova, ficando reservada às partes de cada acção o direito de requerer uma perícia e indicar um perito para integrar o colégio de especialistas (conclusão e));
- Que no caso não havia razões para a unidade de instrução quanto à prova pericial (conclusão f));
- Que a 1º instância nomeou “o colégio de peritos que já concluíra a perícia na acção principal”, e isto “sem qualquer fundamento legal e assim,…, violando elementares princípios processuais e direitos dos Recorrentes” (conclusão g));
- Que “a realização da perícia…sem um perito indicado pelos Réus consubstancia uma violação do direito de defesa dos Recorrentes (art. 1º do CPC), bem como dos princípios do contraditório (art. 3º/3, do CPC) e da igualdade das partes (art. 4º do CPC), e também a violação dos arts. 219º e 63º, nº1, do CPC e ainda das regras sobre a realização de perícias…” (conclusão i));
- Que “…o juiz do Tribunal a quo devia ter ordenado a notificação do Autor e ora recorrido, nos termos e para os efeitos dos arts. 499º/1 e 490º/4 do CPC…” (conclusão j)).
O acórdão em crise, o que fez?
Perante este argumentário alegatório, disse o que achava que tinha que dizer:
- Que a perícia deveria ter sido realizada no apenso (e não no processo principal) e pela mesma equipa de peritos que tinha realizado a perícia anterior e não por outra equipa que integrasse um perito dos RR.
Ora, esta decisão responde integralmente à preocupação que os RR manifestaram no recurso, porque se consideravam no direito de indicar um perito “seu”, o que significava que o novo colégio pericial deveria ter diferente composição e não a mesma do anterior.
Como se vê, esta questão essencial esteve no centro da nossa atenção, quando expressamente afirmamos serem várias as razões – que apreciámos – que nos levavam a discordar dos recorrentes quanto à perícia “sem indicação do seu perito”. Isto é, ao mantermos a decisão da 1ª instância, fica muito claro que a sua posição não foi aceite pelo colectivo julgador do TSI. Isto é, o aresto, quanto a este aspecto, respeitou fielmente os limites dos nossos poderes decisórios, tal como, de resto, já tivemos ocasião de afirmar e explicitar no acórdão de fls. 1436 e sgs, em especial a fls. 1442vº a 1444vº, lavrado em sede de aclaração.
Não precisamos de dizer mais nada para, em absoluto, não reconhecermos razão na invocação da nulidade a que se refere o art. 571º, nº1, 2ª parte da alínea d), do CPC.
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2- Da 2ª nulidade
Defendem os arguentes que o aresto cometeu a nulidade a que se refere o art. 571º, nº1, al. b), do CPC, por não conter os fundamentos jurídicos.
Como é sabido, só a absoluta falta de fundamentos, e não a justificação deficiente, medíocre ou errada, determina a nulidade da sentença ou despacho (v.g., Ac. do TUI, de 15/02/2012, Proc. nº 1/2012; TSI, de 15/12/2009, Proc. nº 1027/2009). Ou seja, a nulidade da alínea b), do art. 571º do CPC não se basta com uma fundamentação insuficiente ou pouco convincente, antes impondo uma ausência de razões que suportam a opção final; isto é, só ocorre a nulidade do art. 571º, nº1, al. b), do CPC quando se verifica ausência total de fundamentação. A mera insuficiência ou deficiência de fundamentação da sentença pode redundar em erro de julgamento (Ac.do TSI, de 18/01/2018, Proc. nº 596/2018).
No caso vertente, se bem se reparar, a decisão da 1ª instância (transcrita a fls. 1348 a 1351; no acórdão a fls. 47 a 53) explicitou a razão da necessidade de realização de uma segunda perícia. Além disso, esclareceu os motivos quanto à escolha dos peritos, com alusão expressa ao art. 490º, nº6, do CPC, acrescentando que a nomeação dos peritos pelo juiz se devia ao facto de as partes já terem pronunciado sobre a nomeação dos peritos, sem que o autor IAS tenha posto em causa a perícia já realizada.
Portanto, a fundamentação estava dada pelo tribunal “a quo”. Ao negar provimento ao recurso e confirmar a decisão recorrida, o TSI acabava de concordar, se se quiser, implicitamente, com a fundamentação nela vertida, onde, como se disse, estava vazada de forma suficiente a fundamentação jurídica.
Em todo o caso, o TSI, no aludido aresto, não acompanhou a tese dos recorrentes e apontou os fundamentos segundo os quais a perícia deveria ser realizada pela mesma equipa, tal como fora decidido na 1ª instância.
E tais razões, aqui unificadas por comodidade, dizem respeito, segundo foi referido, a “maior propensão para a uniformidade de critérios na avaliação do seu objecto”, a “garantias de coerência e sintonia de pontos de vista”, a “probabilidade de um maior acerto”, a “economia e celeridade” e a “justa composição do litígio”.
São razões jurídicas, que estão reflectidas nalguns preceitos normativos, como é o caso dos arts. 6º, nºs 1 e 3 (celeridade e justa composição do litígio), 7º (adequação formal), 8º, nº1 (brevidade e celeridade e justa composição do litígio), 87º e 88º (economia processual), entre outros, do CPC.
Ou seja, o TSI apresentou argumentos jurídicos, apenas não chegou a citar os preceitos normativos pertinentes. Mas, essa omissão, como bem sabem os ilustres advogados que subscrevem a peça de fls. 1452, não representa a nulidade do art. 571º, nº1, al. b), do CPC. Como é assinalado no Ac. do STJ, de 9/07/2002, Proc. nº 02B331, “… a jurisprudência dos nossos tribunais de recurso tem adoptado continuadamente teses mais moderadas e, assim, vem-se decidindo que não há nulidade se a decisão, sem indicar as normas jurídicas concretas, se abona na jurisprudência do tribunal superior, unânime, vasta e sobejamente conhecida a mencionar os princípios jurídicos ou doutrinais aplicados na decisão. Parece-nos, assim, que “não é indispensável - que na sentença se especifiquem as disposições legais que fundamentam a decisão: essencial é que se mencionem os princípios, as regras - em que a sentença se apoia”, e somente em relação à solução nela adoptada.”.
Neste mesmo sentido, Ac. do STJ, de 19/10/2004, Proc. nº 04B2638; Ac. do STJ, de 17/04/2007, Proc. nº 07B418; Ac. da RL, de 5/06/2007, Proc. nº 3129/2007; ver, também, Antunes Varela, Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, 2ª ed., pág. 688.
Portanto, não se sufraga a tese da nulidade imputada pelos arguentes.
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III – Decidindo
Face ao exposto, acordam em indeferir a arguição de nulidades.
Custas pelos arguentes com taxa de justiça em 8 UCs.
T.S.I., 16 de Maio de 2019
José Cândido de Pinho
Tong Hio Fong
Lai Kin Hong
361/2018 – Incidente - A 1