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Processo n.º 2/2019 Data do acórdão: 2019-5-31
Assuntos:
– burla como modo de vida
– crime continuado
– atenuação especial da pena
S U M Á R I O
1. Inexistindo, no caso, alguma situação exterior, pressuposta no n.o 2 do art.o 29.o do Código Penal, susceptível de diminuir consideravelmente o grau da culpa da arguida, não é de aplicar a regra especial da punição plasmada no art.o 73.o deste Código.
2. Outrossim, no tocante à ainda pretendida atenuação especial da pena, esta tese da arguida é inviável, porquanto o grande número de ofendidos por ela burlados reclama naturalmente a aplicação da pena na sua moldura ordinária, em função das prementes necessidades da prevenção geral, em Macau, de condutas de burla como modo de vida – cfr. o critério material de atenuação especial da pena, postulado no art.o 66.o, n.o 1, parte final, do Código Penal.
O relator,
Chan Kuong Seng

Processo n.º 2/2019
(Autos de recurso penal)
Recorrente (1.a arguida): A (A)





ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU
I – RELATÓRIO
Inconformada com o acórdão proferido a fls. 2297 a 2340 dos autos de Processo Comum Colectivo n.° CR3-17-0282-PCC do 3.o Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base, que a condenou pela autoria material de 32 crimes consumados de burla como modo de vida, p. e p. pelo art.o 211.o, n.os 1 e 4, alínea b), do Código Penal (CP), em dois anos de prisão por cada, e, em cúmulo jurídico dessas 32 penas, na pena única de dez anos de prisão, e, em cúmulo jurídico ainda com a punição imposta no Processo n.o CR2-16-0270-PCC, finalmente na pena única de 14 anos de prisão, veio a 1.a arguida A, aí já melhor identificada, recorrer para este Tribunal de Segunda Instância (TSI), alegando, principalmente, na motivação apresentada a fls. 2380 a 2387 dos presentes autos correspondentes, que:
– os seus 32 crimes deveriam ser punidos em sede da figura de crime continuado do art.o 29.o do CP, com pena não superior a três anos e quatro meses de prisão, a qual, em cúmulo jurídico com a punição imposta no Processo n.o CR2-16-0270-PCC, deveria levar à aplicação, preferencialmente, de uma pena única não superior a oito anos de prisão;
– e mesmo que não se entendesse aplicável a figura de crime continuado, as condutas dela não integrariam a prática de crime como modo de vida.
Ao recurso, respondeu a Digna Delegada do Procurador (a fls. 2401 a 2402), no sentido de manutenção do julgado.
Subidos os autos, emitiu a Digna Procuradora-Adjunta parecer (a fls. 2421 a 2423), pugnando também pelo não provimento do recurso.
Feito o exame preliminar e corridos os vistos, cumpre decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICA
Do exame dos autos, sabe-se que o acórdão ora recorrido se encontrou proferido a fls. 2297 a 2340, cuja fundamentação fáctica e jurídica se dá por aqui integralmente reproduzida.
III – FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
De antemão, cumpre notar que mesmo em processo penal, e com excepção da matéria de conhecimento oficioso, ao tribunal de recurso cumpre resolver só as questões material e concretamente alegadas na motivação do recurso e ao mesmo tempo devidamente delimitadas nas conclusões da mesma, e já não responder a toda e qualquer razão aduzida pela parte recorrente para sustentar a procedência das suas questões colocadas (nesse sentido, cfr., de entre muitos outros, os acórdãos do TSI, de 7 de Dezembro de 2000 no Processo n.o 130/2000, de 3 de Maio de 2001 no Processo n.o 18/2001, e de 17 de Maio de 2001 no Processo n.o 63/2001).
Nesses parâmetros, conhecendo:
A arguida recorrente começa por pedir a sua condenação em sede da figura de crime continuado a que alude o art.o 29.o, n.o 2, do CP.
Mas, em vão, aos olhos do presente Tribunal de recurso.
É que atenta toda a matéria fáctica dada por provada em primeira instância, não é de julgar, desde logo e independentemente da indagação do demais, como existente, no caso, alguma situação exterior (pressuposta no n.o 2 do art.o 29.o do CP) susceptível de diminuir consideravelmente o grau da culpa da arguida, pelo que não é de aplicar a regra especial da punição plasmada no art.o 73.o do CP (sobre o sentido e alcance da figura de crime continuado, cf. EDUARDO CORREIA, in DIREITO CRIMINAL, II, Livraria Almedina, Coimbra, 1992, páginas 208 a 211).
E agora da questão da alegada não verificação da circunstância da prática de crime como modo de vida:
Vista a matéria de facto já dada por provada em primeira instância, é de louvar mesmo a decisão ora recorrida, condenatória da arguida como agente de 32 crimes de burla como modo de vida.
No tocante à ainda pretendida atenuação especial da pena, esta tese da Defesa é inviável, porquanto o grande número de ofendidos burlados reclama naturalmente a aplicação da pena na sua moldura ordinária, em função das prementes necessidades da prevenção geral, em Macau, de condutas de burla como modo de vida (cfr. o critério material na decisão sobre a atenuação especial, ou não, da pena, como tal postulado no art.o 66.o, n.o 1, parte final, do CP).
E é de observar que ponderadas todas as circunstâncias fácticas já apuradas e descritas no acórdão recorrido com pertinência à medida da pena aos padrões sobretudo vertidos nos art.os 40.o, n.os 1 e 2, 65.o, n.os 1 e 2, e 71.o, n.os 1 e 2, do CP, não se detecta qualquer injustiça notória na imposição, no aresto recorrido, de 14 anos de prisão única à arguida.
Razões por que naufraga o recurso, sem necessidade da apreciação de todo o remanescentemente alegado na motivação do recurso, por estar prejudicada em face da análise das coisas acima feita.
IV – DECISÃO
Dest’arte, acordam em julgar não provido o recurso.
Custas pela arguida recorrente, com quatro UC de taxa de justiça.
Macau, 31 de Maio de 2019.
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Chan Kuong Seng
(Relator)
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Tam Hio Wa
(Primeira Juíza-Adjunta)
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Choi Mou Pan
(Segundo Juiz-Adjunto)



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