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--- Decisão Sumária nos termos do art.º 407º, n.º 6 do C.P.P.M. (Lei n.º 9/2013). ----------
--- Data: 25/06/2019 --------------------------------------------------------------------------------------
--- Relator: Dr. Dias Azedo -----------------------------------------------------------------------------
Processo nº 621/2019
(Autos de recurso penal)

(Decisão sumária – art. 407°, n.° 6, al. b) do C.P.P.M.)

Relatório

1. A (A), com os restantes sinais dos autos e ora preso no Estabelecimento Prisional de Coloane (E.P.C.), vem recorrer da decisão que lhe negou a concessão de liberdade condicional, motivando para, a final, concluir, imputando à decisão recorrida o vício de violação do disposto no art. 56° do C.P.M.; (cfr., fls. 211 a 221 que como as que adiante se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os legais efeitos).

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Em resposta, pugna o Exmo. Magistrado do Ministério Público no sentido da improcedência do recurso; (cfr., fls. 223 a 224-v).

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Em sede de vista, juntou o Ilustre Procurador Adjunto o seguinte douto Parecer:

“Na Motivação (cfr. fls.211 a 221 dos autos), o recorrente solicitou a revogação do douto despacho recorrido e a sua substituição pela decisão de deferir o pedido da liberdade condicional, assacando-lhe a violação do preceito no n.º1 do art.56º do Código Penal de Macau.
Antes de mais, subscrevemos inteiramente as criteriosas explanações da ilustre Colega na douta Resposta (vide. fls.223 a 224 verso dos autos).
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No dia de hoje, constitui jurisprudência firme que a concessão da liberdade condicional depende do preenchimento cumulativo de todos os pressupostos, quer formais quer substanciais, consignados no art.56º do CPM, bastando a não verificação de qualquer um para se negar o pedido da liberdade condicional (a título exemplificativo, Acórdão do TSI no Processo n.º195/2003).
Importa recordar que a liberdade condicional não é uma medida de clemência ou de recompensa por mera boa conduta prisional, e serve na política do C.P.M. um objectivo bem definido: o de criar um período de transição entre a prisão e a liberdade, durante o qual o recluso possa equilibradamente recobrar o sentido de orientação social fatalmente enfraquecido por efeito da reclusão. (cfr. Acórdão do TSI no Processo n.º50/2002)
Daí decorre que se, não obstante um comportamento prisional adequado, pelo passado do recluso e perspectivas de reintegração se não se formula um juízo de prognose favorável a uma regeneração e se teme pelas razões de prevenção geral (cfr. Acórdão do TSI no Processo n.º225/2010). Ainda se inculca que cada situação deve ser observada em concreto e caso a caso, num circunstancialismo de modo, tempo e lugar próprios, analisando de forma crítica a personalidade do recluso e de um juízo de prognose fortemente indiciador de que o mesmo se vai reinserir na sociedade e ter uma vida em sintonia com as regras de convivência normal, devendo ainda constituir matéria de ponderação, a defesa da ordem jurídica e da paz social. (cfr. Acórdãos do TSI nos Processos n.º225/2010 e n.º404/2011)
Envolvendo conceitos indeterminados de prognose, as alíneas a) e b) do n.º1 do art.56º dotam aos julgadores certa margem de livre apreciação na interpretação e na valorização, pelo que a convicção de não verificação dos pressupostos subjectivos só poderia ser neutralizado se houvesse uma exemplar e excelente evolução activa da personalidade do recluso durante a execução da prisão, e não um mero comportamento passivo cumpridor das regras básicas de conduta prisional. (cfr. Acórdão do TSI no Processo n.º9/2002)
No caso sub judice, relativamente à prevenção especial, o MMº Juiz a quo aponta prudentemente que “綜合上述之情況,服刑人因觸犯不同犯罪而入獄,並有不同的犯罪前科,服刑人雖在服刑期間表示承認所犯的過錯,並感到後悔,但考慮到服刑人在獄中表現評價為一般,在服刑期間亦曾作出違規行為而被處分,顯示其未有充份悔悟,而有關刑罰對其亦未發揮教化之效,故仍須繼續接受刑罰的教育及矯治以加強其守法意識。因此,法庭認為目前不可合理期望服刑人獲釋後能以負責任及守法生活而不再犯罪。”
A nível da prevenção geral, lá lê-se: 本案中,服刑人觸犯了不同的犯罪,對法律所要保護的法益、社會安寧及法律秩序均構成較為嚴重的負面影響,損害人們對法律制度的期盼。同時,考慮到服刑人非為本澳居民卻專程來澳實施犯罪,且存有多項犯罪前科記錄,倘現時提前釋放服刑人將損害公眾對被觸犯的法律條文的效力所持有的期望,也必然對澳門法律秩序造成一定的負面衝擊,甚至極可能對潛在不法分子釋出錯誤訊息,使之以為犯罪的成本並不高而來澳犯罪。因此,法庭認為給予假釋將不符合一般預防之要求。
Assim, não obstante se militarem, nos autos, umas circunstâncias favoráveis ao recorrente, mas, na esteia das persuasivas jurisprudências supra citadas, aderimos, sem reserva, à cristal preocupação do MMº Juiz a quo, no sentido de aquele ainda não preencher, por ora, os pressupostos consagrados no n.º1 do art.56º do CPM.
Com efeito, como bem observou o MMº Juiz a quo, existe ainda a séria dúvida de que o recorrente tenha já adquirido a estável capacidade de conduzir a sua vida de modo socialmente responsável, sem ir cometer crime; e prevê-se razoavelmente que a colocação dele em liberdade nesta altura não é compatível com a paz social.
De qualquer modo, importa ter presente que é generalizadamente consabido que em termos comparativos, as sanções penais da ordem jurídica da RAEM são mais benevolentes. Daí que Macau deve tentar todo o esforço para evitar a desastre de ser destino ou “paraíso” de delinquentes.
Nesta linha de perspectiva, não podemos deixar de entender que não tem cabimento o pedido da recorrente, e não merece censura alguma o douto despacho em escrutínio que não contende com o disposto no n.º1 do art.56º do Código Penal de Macau.
(…)”; (cfr., fls. 235 a 236-v).

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Em sede de exame preliminar constatou-se da “manifesta improcedência” do presente recurso, e, nesta conformidade, atento o estatuído no art. 407°, n.° 6, al. b) e 410°, n.° 1 do C.P.P.M., e tendo-se presente que a possibilidade de “rejeição do recurso por manifesta improcedência” destina-se a potenciar a economia processual, numa óptica de celeridade e de eficiência, visando, também, moralizar o uso (abusivo) do recurso, passa-se a decidir.

Fundamentação

Dos factos

2. Flui dos autos a factualidade seguinte (com relevo para a decisão a proferir):

– A, ora recorrente, deu entrada no E.P.C. em 05.07.2017, para cumprimento de duas penas sucessivas que totalizam 1 ano e 15 meses de prisão;
– em 04.01.2019, cumpriu dois terços de tais penas, expiando-as em 04.10.2019;
– em 13.12.2017 foi disciplinarmente punido;
– em caso de vir a ser libertado, irá viver com a sua família, em Hong Kong, de onde é natural.

Do direito

3. Insurge-se o ora recorrente contra a decisão que lhe negou a concessão de liberdade condicional, afirmando, em síntese, que se devia considerar que reunidos estão todos os pressupostos do art. 56° do C.P.M. para que tal libertação antecipada lhe fosse concedida.

Como se deixou adiantado, cremos que manifesto é que não se lhe pode reconhecer razão.

Vejamos.

— Preceitua o citado art. 56° do C.P.M. (que regula os “Pressupostos e duração” da liberdade condicional) que:

“1. O tribunal coloca o condenado a pena de prisão em liberdade condicional quando se encontrarem cumpridos dois terços da pena e no mínimo 6 meses, se:
a) For fundadamente de esperar, atentas as circunstâncias do caso, a vida anterior do agente, a sua personalidade e a evolução desta durante a execução da prisão, que o condenado, uma vez em liberdade, conduzirá a sua vida de modo socialmente responsável, sem cometer crimes; e
b) A libertação se revelar compatível com a defesa da ordem jurídica e da paz social.
2. A liberdade condicional tem duração igual ao tempo de prisão que falte cumprir, mas nunca superior a 5 anos.
3. A aplicação da liberdade condicional depende do consentimento do condenado”; (sub. nosso).

Constituem, assim, “pressupostos objectivos” ou “formais”, a condenação em pena de prisão superior a seis (6) meses e o cumprimento de dois terços da pena, num mínimo de (também) seis (6) meses; (cfr. n.° 1).

“In casu”, atentas as penas que ao recorrente foram fixadas, e visto que se encontra ininterruptamente preso desde 05.07.2017, expiados estão já dois terços de tal pena sucessiva, pelo que preenchidos estão os ditos pressupostos formais.

Todavia, e como é sabido, tal “circunstancialismo” não basta, já que não sendo a liberdade condicional uma medida de concessão automática, impõe-se para a sua concessão, a verificação cumulativa de outros pressupostos de natureza “material”: os previstos nas alíneas a) e b) do n.° 1 do referido art. 56°.

Com efeito, importa ter em conta que a liberdade condicional não é uma “medida de clemência”, constituindo uma medida que faz parte do normal desenvolver da execução da pena de prisão, manifestando-se como uma forma de individualização da pena no fito de ressocialização, pois que serve um objectivo bem definido: o de criar um período de transição entre a prisão e a liberdade, durante o qual o delinquente possa, equilibradamente, recobrar o sentido de orientação social fatalmente enfraquecido por efeito da reclusão; (cfr., v.g., J. L. Morais Rocha e A. C. Sá Gomes in “Entre a Reclusão e a Liberdade – Estudos Penitenciários”, Vol. I, em concreto, “Algumas notas sobre o direito penitenciário”, IV cap., pág. 41 e segs.).

Na esteira do repetidamente decidido nesta Instância, a liberdade condicional “é de conceder caso a caso, dependendo da análise da personalidade do recluso e de um juízo de prognose fortemente indiciador de que o mesmo vai reinserir-se na sociedade e ter uma vida em sintonia com as regras de convivência normal, devendo também constituir óbviamente matéria de ponderação, a defesa da ordem jurídica e da paz social”; (cfr., v.g., os recentes Acs. deste T.S.I. de 25.04.2019, Proc. n.° 339/2019, de 09.05.2019, Proc. n.° 404/2019 e de 06.06.2019, Proc. n.° 542/2019, podendo-se também sobre o tema ver o Ac. da Rel. de Coimbra de 24.01.2018, Proc. n.° 540/16).

Assim, detenhamo-nos na apreciação de tais pressupostos de natureza material.

Ponderando na factualidade atrás retratada, poder-se-á dizer que é fundadamente de esperar, atentas as circunstâncias do caso, a vida anterior do agente, a sua personalidade e a evolução desta durante a execução da prisão, que o condenado, uma vez em liberdade, conduzirá a sua vida de modo socialmente responsável, sem cometer crimes, mostrando-se a pretendida liberdade condicional compatível com a defesa da ordem jurídica e paz social?

Como já se deixou relatado, temos para nós que de sentido negativo terá de ser a resposta.

Com efeito, demonstram os autos que o ora recorrente, em período de reclusão, sofreu 1 punição disciplinar.

Outrossim, verifica-se que foi várias vezes condenado, (cfr., C.R.C., a fls. 124 e segs. e fls. 129 do P.E.P.), tendo já cometido 5 crimes de “reentrada ilegal”, mesmo após cumprimento de pena de prisão, tendo também sido condenado pelos crimes de “usura qualificada” e “furto qualificado”, tudo a revelar uma personalidade com tendência para a prática de ilícitos e avessa ao direito.

Dest’arte, (e independentemente do demais), afigura-se-nos evidente que, não existem indícios – minimamente – seguros de ter “vontade séria” de vir a levar vida honesta uma vez posto em liberdade, (totalmente) inviável sendo assim o necessário “juízo de prognose favorável”, pois que em face das acentuadas “necessidades de prevenção criminal especial”, aconselhável é um acrescido período de reclusão, por forma a ser possibilitada uma melhor interiorização do desvalor da sua conduta.

Como já tivemos oportunidade de considerar, a liberdade condicional não é de conceder quando o percurso até ao momento experienciado pelo condenado não oferece ainda suficiente segurança para sustentar um “juízo positivo” acerca do seu comportamento futuro quando em meio livre; (neste sentido, cfr., v.g., o recente Ac. da Rel. de Évora de 19.02.2019, Proc. n.° 13/16).

Assim, em face das expostas considerações, e manifesto sendo que verificado não está o pressuposto do art. 56°, n.° 1, al. a) do C.P.M., há que decidir em conformidade.

Decisão

4. Nos termos e fundamentos expostos, decide-se rejeitar o recurso.

Pagará o recorrente a taxa de justiça que se fixa em 3 UCs, e como sanção pela rejeição do recurso o equivalente a 3 UCs; (cfr., art. 410°, n.° 3 do C.P.P.M.).

Honorários ao Exmo. Defensor no montante de MOP$1.800,00.

Registe e notifique.

Nada vindo de novo, e após trânsito, remetam-se os autos com as baixas e averbamentos necessários.

Macau, aos 25 de Junho de 2019
José Maria Dias Azedo
Proc. 621/2019 Pág. 14

Proc. 621/2019 Pág. 13