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Processo n.º 398/2017
(Autos de recurso contencioso)

Relator: Fong Man Chong
Data: 06/Junho/2019

Assuntos:

- Medida de interdição em Macau e pressupostos de facto
- Absolvição no crime imputado e manutenção da medida administrativa referida


SUMÁRIO:

I – Com base nos fortes indícios da prática pelo Recorrente de factos integradores de um crime de burla informática, a Entidade Recorrida aplicou-lhe a medida de interdição de entrar em Macau durante 5 anos. Posteriormente, em processo-crime o Recorrente veio a ser absolvido, visto que os factos essenciais da acusação ficaram não provados, já que os arguidos optaram exercer o seu direito de silêncio em audiência de julgamento Nesta óptica, não é afastar, de todo em todo, a intervenção do Recorrente nos factos, e, o juízo valorativo utilizado em processo penal é diferente do seguido em processo administrativo.

II – Neste processo administrativo, a Entidade Recorrida não chegou a afirmar peremptoriamente que o Recorrente cometeu, sem margem para dúvidas, os factos imputados. Mas sim, foi formado um juízo com base nos fortes indícios de que o Recorrente envolveu, conjuntamente com outras pessoas, nos factos integradores de burla informática, o que periga a ordem pública de Macau.

III - Nesta óptica, subsistindo os pressupostos de facto, com base nos quais foi formado o juízo jurídico-administrativo valorativo de censura sobre as condutas do Recorrente, e, não se detectando qualquer vício, nem o Recorrente chegou a carrear provas para afastar o seu envolvimento nos factos, é de manter a decisão recorrida.



O Relator,

________________
Fong Man Chong

Processo n.º 398/2017
(Autos de recurso contencioso)

Data : 06/Junho/2019

Recorrente : A (A)

Entidade Recorrida : Secretário para a Segurança

*
    ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA RAEM:
    
    I – RELATÓRIO
A (A), Recorrente, devidamente identificado nos autos, discordando do despacho do Secretário para a Segurança, datado de 12/01/2017, que lhe negou o pedido formulado no recurso hierárquico necessário, mantendo a decisão do Senhor Comandante do CPSP, que ao Recorrente foi aplicada a medida de interdição de entrar em Macau durante 5 anos, veio, em 05/05/2017, interpor o competente recurso contencioso para este TSI, com os fundamentos constantes de fls. 2 a 8, tendo formulado as seguintes conclusões:
1. 約於2016年09月,司法上訴人接收到由治安警察局局長作出之批示,內容為決定對司法上訴人實施禁止進入澳門特別行政區的措施,為期五年。
2. 司法上訴人對上述局長之決定不服,並於2016年10月20日透過委託之律師向治安警察局局長之上級保安司司長適時提交了必要訴願, 請求撤銷(廢止)上述局長之決定。
3. 及後,於2017年03月16日,司法上訴人的受託律師收到治安警察局之通知書,該通知內容顯示司法上訴人的訴願被駁回。(請參閱附件 1)
4. 上述通知附有保安司司長批示及報告書。
5. 上述批示中,保安司司長指出:
經考慮治安警察局局長2016年12月6日報告書所作之分析,以及司法警察局第25469/S/2016號公函內容,鑑於存在強烈跡象(特別是,現場所搜出的刷卡機經改裝,以及有多名職員承認公司主要業務係客人刷卡套現)顯示利害關係人與他人共同作出電腦詐騙罪,危害公共治安秩序,因此,根據《行政程序法典》第161條1款規定,決定維持禁止原禁止入境的決定。
6. 附於上述通知的報告書,按報告書上的簽名,可以得知有關的報告書是副局長/副警務總監吳XX親自作出。
形式瑕疵—欠缺說明理由
7. 司法上訴人現正面對的是一個由行政機關對其作出禁止入境5年的行政決定。
8. 禁止入境無疑屬在一段時間內限制司法上訴人自由進入澳門特區的權利。
9. 因此,當行政機關作出這樣的決定時,負有說明理由的義務。
10. 首先,第一點應該要指出,附於通知中的報告書並非由治安警察局局長作出,而是由副局長/副警務總監作出的。
11. 批示中提及由治安警察局局長作出的報告書實質是不存在的。
12. 另一方面,司法警察局第25469/S/2016號公函本質上不屬於意見書,也不屬於報告或建議書。
13. 保安司司長提及的治安警察局局長的報告書根本不存在於卷宗內,而且司法警察局第25469/S/2016號公函其本質也不能替代說明理由或成為說明理由的組成部分。
14. 保安司司長在作出維持禁止入境5年的決定時,有關的報告書及公函不能組成說明理由的部分,餘下能夠利用的部分(鑑於存在強烈跡象(特別是,現場所搜出的刷卡機經改裝,以及有多名職員承認公司主要業務係客人刷卡套現)顯示利害關係人與他人共同作出電腦詐騙罪,危害公共治安秩序,因此,根據《行政程序法典》第161條1款規定,決定維持禁止原禁止入境的決定。)便不能滿足說明理由的法定要求。
15. 單純闡述「強烈跡象(現場所搜出的刷卡機經改裝,以及有多名職員承認公司主要業務係客人刷卡套現)顯示利害關係人與他人共同作出電腦詐騙罪,危害公共治安秩序」作為理據,這樣難以令人理解到司法上訴人如何對澳門特別行政區的公共安全或公共秩序確實構成危險。
16. 確實構成危險是一種結論或判斷,因此保安司司長上述的說明理由不能稱得上充分,尤其亦明顯欠缺指出禁止入境的法律依據。
17. 根據《行政程序法典》第115條第2款規定,在上述的情況之下,保安司司長的說明理由便欠缺明示指出有關決定之事實依據及法律依據,又或者,其說明不充分,後果等同於欠缺說明理由。
18. 根據《行政程序法典》第124條的規定,被訴批示違反說明理由義務屬形式瑕疵,因而具可撤銷性,應撤銷被訴批示。
即使法官 閣下不認同上述見解,退一步而言,亦有以下理由:
19. 說明理由應以明示方式作出,即不能用默示或沉默方式,甚至也不能透過推定。
20. 倘以先前的意見書、報告或建議組成說明理由內容應透過表示贊同的方式作出。
21. 表示贊同意味著行政機關對意見書、報告或建議的內容抱肯定的態度,行政機關在表示贊同時,可以用同意,贊成,支持,認同,認可,確認等近義詞來表示肯定的態度。
22. 但保安司司長在其批示中,沒有採用上述任一詞語來表示贊同,而僅僅是表示經考慮.....。
23. 考慮一詞絕對不能反映對意見書、報告或建議的內容抱肯定的態度,考慮一詞的含義為對問題或方案進行思索,以便日後作出決定。
24. 法律規定須表示贊同,如行政機關欠缺贊同的表示或立場不明確,即使其中有提及意見書、報告或建議,也不應該可以視為該等意見書、報告或建議成為說明理由的組成部分。
25. 根據《行政程序法典》第115條第2款規定,保安司司長的理由說明便欠缺明示指出有關決定之事實依據及法律依據,又或者,其說明不充分,後果等同於欠缺說明理由,根據《行政程序法典》第124條的規定應撤銷被訴批示。
違反行政法一般原則—過度原則
26. 在被訴批示中,保安司司長指「強烈跡象(特別是,現場所搜出的刷卡機經改裝,以及有多名職員承認公司主要業務係客人刷卡套現)顯示利害關係人與他人共同作出電腦詐騙罪,危害公共治安秩序」。
27. 保安司司長對司法上訴人作出維持禁止入境5年決定所依據的犯罪事實是基於司法上訴人涉嫌觸犯電腦詐騙罪。
28. 儘管依據司法警察局第25469/S/2016號公函的回覆,也僅僅顯示司法上訴人被指稱的犯罪所涉嫌的損失金額約值澳門幣叁萬肆仟捌佰捌拾陸圓(MOP$34,886.00)。
29. 既然保安司司長對司法上訴人作出維持禁止入境5年決定的基礎事實為司法上訴人涉嫌觸犯電腦詐騙罪,即使司法上訴人其被指稱的電腦詐騙罪成立,抽象刑幅的上限也僅是五年徒刑。
30. 行政措施對私人的損害或限制不應比刑法的制裁嚴厲或同等嚴厲,否則私人的權利在未獲得公正的審判前,就會預先被行政當局嚴重地損害。
31. 司法上訴人難以想像保安司司長是依據何等理據去決定對其採取禁止入境5年這樣長期限的措施,尤其保安司司長沒有陳述有關事實的嚴重程度、司法上訴人對公共安全構成危險的程度,以及司法上訴人罪過的程度。
32. 保安司司長對司法上訴人作出維持禁止入境5年決定因絕對不合理而非有效。
33. 根據《行政程序法典》第5條第2款及第6/2004號法律第12條第4款的規定,被訴批示違反適度原則,具可撤銷性,應撤銷被訴批示。
34. 綜上所述,被訴批示違反《行政程序法典》第124條規定的說明理由義務,構成行政行為形式上的瑕疵,因而具可撤銷性,應撤銷被訴批示;及
35.違反《行政程序法典》第5條第2款及第6/2004號法律第12條第 4款規定的適度原則,具可撤銷性,應撤銷被訴批示。
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Citada a Entidade Recorrida, o Senhor Secretário para a Segurança veio contestar o recurso com os fundamentos constantes de fls. 25 a 29, tendo formulado as seguintes conclusões:
一、上訴人針對保安司司長維持治安警察局局長所作出的禁止其進入澳門特別行政區為期五年的決定,提起本上訴。
二、上訴理由主要是,被上訴行為缺乏理由說明、違反適度原則,以及絕對不合理。
三、上訴理由是不成立的。
四、理由說明要求表明作出相關行政行為的原因或動機,使得相對人可以對於其所造成的損害有效地作出反應,確保行政決定的透明及公正。
五、因此,只要一名智力正常的普通相對人,能夠理解行政決定的意思以及支撐該決定的理由,令其可以在接受該決定,或者在運用法律手段提出申訴之間,作出選擇,便已屬適當地說明了理由。
六、正如本上訴案,保安司司長是在考慮了治安警察局代局長(因筆誤寫成治安警察局局長)就訴願所製作的報告書,以及司法警察局第25469/S/2016號公函的內容後,作出判斷,認為確實存在強烈顯示上訴人及他人共同作出電腦詐騙,危害公共治安及秩序,因此,決定維持對其所作出的禁止入境決定。
七、被訴行為以清晰、充分以及前後一致的方式適當地說明了事實及法律依據,清楚解釋了做出該行為的具體理由,不存在任何含糊、不充分或矛盾之處。相信任何一個智力正常的普通人,均能清楚明白有關禁止入境的決定是基於什麼理由而作出的。
八、不僅如此,透過訴狀內容可知上訴人完全明白導致其被禁止入境的具體原因。上訴人可以不認同被訴行為所引用的理由,但是不能否認理由說明的存在。
九、因此,不存在對《行政程序法典》第115條規定的說明理由義務的違反。
十、禁止入境決定一項保障社會治安和秩序的預防性措施,適用於有理由令人擔憂會損害本特區公共安全及公共秩序的非居民。
十一、根據卷宗資料,調查發現,由於存在強烈跡象顯示上訴人與他人共同參與犯罪活動,行政當局決定對其採取禁止入境措施,使其遠離本地區,以防止其繼續作出相同或類似的損害公共利益的行為。
十二、禁止非本地居民進入澳門特別行政區,以及訂定禁止入境的期限,屬行政當局自由裁量的範圍,立法者賦予行政機關在作出禁止入境決定及訂定相關期限時,享有廣泛的自由選擇空間。
十三、行政當局以公共安全利益的需要為指導,根據其專屬職能及日常工作經驗,以及作出行為時所實行的政策和標準來訂定相關期限的長短。
十四、對於一名有跡象顯示作出上指犯罪活動的非居民實施禁止入境措施,作為排除對公共安全及公共秩序構成實際或潛在威險的唯一方式,是適當及完全必要的。
十五、反觀上訴人方面,卻不存在任何特別重要並受到法律保護的權益。上訴人為非居民,在澳門特別行政區不從事任何為行政當局所許可的活動,僅以遊客身份在澳門逗留。儘管其聲稱係澳門有關公司的股東及行政管理成員,但並不意味著必須親身直接參與公司管理,因此,逗留狀況與一般遊客無異。相反,如親身直接參與管理公司,卻不具備所需的行政許可,則涉嫌非法工作。
十六、因此,有關措施並不對上訴人構成任何不利影響,更談不上過度不利影響。
十七、行政法方面的理論學說和司法見解普遍接受的觀點是,行政當局行使自由裁量權所作出的決定,只有在存有明顯錯誤或絕對不合理的情況下才不被允 許。
十八、上指絕對不合理指的並非以主觀角度得出的隨便一種不合理性,而是指有關行為在所有人眼中均明顯地、完全地不合情理。所有人均認同所採用的手段與所保護的法益以及所追求的公共利益之間存在完全不相協調或不合理的狀況,但這種情況在本案中根本不存在。
十九、行使自由裁量權所作出之被上訴行為,只是不允許上訴人,一名非居民,且對於公共安全及公共秩序存在潛在威脅,進入澳門,以減少罪案,保障整體社會治安穩定,從其擬達至的目的來看,根本不存在不合理性,更不要說完全的不合理性了。

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O Digno. Magistrado do Ministério Público junto do TSI emitiu o seguinte douto parecer (fls. 88 e 90):
Na petição inicial, o ora recorrente solicitou a anulação do despacho recorrido que consiste em negar provimento ao recurso hierárquico necessário e manter a decisão de interdição de entrada por período de 5 anos tomada pelo Comandante da PSP, arrogando o vício de forma por falta de fundamentação e a violação do princípio da proporcionalidade.
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Em sede do vício de forma por falta de fundamentação, o recorrente arrogou, em primeiro lugar, a inexistência da “informação do Comandante da PSP” referida no despacho em crise, existindo na realidade apenas uma informação subscrita pelo superintende de nome Ng XX. E de outro lado, invocou ainda que nesse despacho não havia explícita declaração de concordância, por o Exmo. Senhor Secretário para a Segurança não usar as expressões de “同意”, “贊成”, “支持”, “認同”, “認可” ou “確認” para manifestar a sua concordância, mas somente a de “經考慮”.
Repare-se que a sobredita Informação cujo texto integral foi enviado ao recorrente conjuntamente com o despacho em escrutínio a coberto do mesmo ofício é subscrita pelo senhor superintende de nome Ng XX na qualidade de comandante substituto (docs. de fls.13 a 17 dos autos).
Sendo assim, e dado que o despacho recorrido referiu exactamente à data daquela Informação (o dia 06/12/2016), colhemos tranquilamente que pese embora a designação “治安警察局代局長” seja mais apropriada e precisa, a menção de “治安警察局局長” no mesmo despacho não diminui a sua compreensibilidade, nem prejudica o recorrente a compreender os fundamentos de facto e de direito do dito despacho, portanto não pode deixar de degredar num mero lapso inócuo, sem virtualidade invalidante.
De acordo com o disposto no n.°1 do art.115° do CPA, a fundamentação por remissão tem por pressuposto uma declaração de concordância com informações, relatórios ou pareceres. No caso sub judice, é verdade que o Exmo. Senhor Secretário para a Segurança não usa as expressões de “同意”, “贊成”, “支持”, “認同”, “認可” ou “確認” no acto recorrido.
Ressalvado elevado respeito pela opinião diferente, afigura-se-nos que a expressão de “經考慮” significa que o Exmo. Sr. Secretário para a Segurança, na qualidade do autor do despacho in questio, tomou não só em consideração, mas também por base tanto a Informação atrás aludida como o ofício n.º25469/S/2016 da Polícia Judiciária. Daí decorre que tal expressão de “經考慮” equivale a uma declaração de concordância.
A jurisprudência mais autorizada alerta (Acórdão do STA de 10/03/1999, no Processo n.º44302): A fundamentação é um conceito relativo que depende do tipo legal do acto, dos seus termos e das circunstâncias em que foi proferido, devendo dar a conhecer ao seu destinatário as razões de facto e de direito em que se baseou o seu autor para decidir nesse sentido e não noutro, não se podendo abstrair da situação específica daquele e da sua possibilidade, face às circunstâncias pessoais concretas, de se aperceber ou de apreender as referidas razões, mormente que intervém no procedimento administrativo impulsionando o itinerário cognoscitivo da autoridade decidente.
Em esteira, e atendendo ao teor da sobredita Informação e do ofício n.º25469/S/2016 da polícia Judiciária, inclinamos a entender que não se verifica in casu a assacada falta de fundamentação, pois a fundamentação do despacho questionado habilita suficientemente o recorrente a aperceber o itinerário cognoscitivo do Exmo. Senhor Secretário para Segurança.
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Ora bem, o Venerando. TUI vem constante e incansavelmente asseverando que «Ao Tribunal não compete dizer se o período de interdição de entrada fixado ao recorrente foi ou não proporcional à gravidade, perigosidade ou censurabilidade dos actos que a determinam, se tal período foi o que o Tribunal teria aplicado se a lei lhe cometesse tal atribuição. Essa é uma avaliação que cabe exclusivamente à Administração; e o papel do Tribunal é o de concluir se houve erro manifesto ou total desrazoabilidade no exercício de poderes discricionários, por violação do princípio da proporcionalidade ou outro.» (vide, Acórdãos tirados nos Processos n.°13/2012 e n.°112/2014)
Em conformidade com esta brilhante, jurisprudência, e considerando os argumentos descritos pelo recorrente nas conclusões 26 a 33 da petição inicial, afigura-se-nos que não se divisa in casu o erro manifesto, a total desrazoabilidade ou a injustiça intolerável, portanto é incuravelmente descabida a arguição da violação deste princípio de proporcionalidade.
No Requerimento de fls.38 e verso dos autos, o recorrente solicitou a apropriada decisão após a devida consideração da eventual inutilidade superveniente da lide, em virtude de que ele teve rogado ao Exmo. Senhor Secretário para Segurança a revogação do despacho objecto do recurso em apreço, com único fundamento do Acórdão de absolvição da Acusação tirado no Processo n.° CR3-17-0120-PCC (doc. de fls.39 a 56 e 57 a 75 dos autos).
Ora bem, é pacífica a jurisprudência mais autorizada que assevera que “O princípio «tempus regit actum» manda aferir a legalidade do acto administrativo pela situação de facto e de direito existente à data da sua prolação. (a título meramente exemplificativo, cfr. Acórdão do TSA de Portugal de 19/04/2012, no Processo n.º 01187/11)” No ordenamento jurídico de Macau, o Venerando TUI estraíu a prudente regra geral, no sentido de que “Os vícios do acto administrativo, pela natureza das coisas, têm de preceder ou ser contemporâneos do acto. Não podem ser posteriores.” (cfr. Acórdão no Processo n.º30/2016)
À luz desta orientação jurisprudencial e da disposição na primeira parte do n.º3 do art.68° do CPAC, afigura-se-nos que um aresto judicial de absolvição da Acusação penal, emanado na pendência dum recurso contencioso, só é relevante para este recurso se e quando o respectivo recorrente tiver oportunamente assacado o vício de erro nos pressupostos de facto à correlacionada decisão administrativa tomada pela Administração de acordo com as disposições nas alíneas 3) do n.º2 do art.4º da Lei n.º4/2003 e 1) do n.º2 do art.12° da Lei n.°6/2004.
No caso sub judice, o recorrente nunca arguiu o vício de erro nos pressupostos de facto, nem sequer apresentou alegações facultativas, pelo que o Acórdão de absolvição da Acusação atrás apontado, só por só, não se dispõe da virtualidade de invalidar o despacho em questão.
***
Por todo o expendido acima propendemos pela improcedência do presente recurso contencioso.

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Foram colhidos os vistos legais.
Cumpre analisar e decidir.
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    II – PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
Este Tribunal é o competente em razão da nacionalidade, matéria e hierarquia.
O processo é o próprio e não há nulidades.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária e são dotadas de legitimidade “ad causam”.
Não há excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
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    III – FACTOS
São os seguintes elementos, extraídos do processo principal e do processo administrativo com interesse para a decisão da causa:
- Na sequência de receber informações fornecidas pela PJ, a PSP abriu processo com fim de decretar a medida de interdição de entrada em Macau a aplicar-se ao Requerente.
- Foi elaborada a respectiva informação constante de fls. 6 e 7 do PA, cujo teor se dá por reproduzido para todos os efeitos legais;
- O Comandante do CPSP acabou decretar ao Requerente a medida de interdição de entrada em Macau durante 5 anos (fls. 9 do PA);
- Discordando da decisão o Recorrente interpôs recurso hierárquico necessário para o Secretário para a Segurança, pedindo a revogação da medida;
- Com base na proposta, o Secretário para a Segurança veio a proferir o despacho de indeferimento com o seguinte teor:

批示
事項:必要訴顯
利害關係人:A

利害關係人就治安警察局局長禁止其入境澳門為期五年的決定提起必要訴願。
經考慮治安警察局局長2016年12月6日報告書所作之分析,以及司法警察局第25469/S/2016號公函內容,鑑於存在強烈跡象(特別是,現場所搜出的刷卡機經改裝,以及有多名職員承認公司主要業務係為客人刷卡套現)顯示利害關係人與他人共同作出電腦詐騙罪,危害公共治安秩序,因此,根據《行政程序法典》第161條1款規定,決定維持禁止原禁止入境的決定。
保安司司長
黃少澤
二零一七年一月十二日
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    IV – FUNDAMENTOS
Neste recurso o Recorrente imputa à decisão recorrida dois vícios:
1) - O vício da falta de fundamentação da decisão;
2) - O vício da violação do princípio de proporcionalidade.
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Comecemos pela primeira questão suscitada.
1ª questão: o vício da falta de fundamentação da decisão
    
O dever legal de fundamentar cumpre uma dupla função: endógena, ao exigir ao decisor a expressão dos motivos e critérios determinantes da decisão, assim contribuindo para a sua ponderação e transparência; exógena, ao permitir ao destinatário do acto uma opção esclarecida entre a conformação e a impugnação graciosa ou contenciosa.
Em matéria de fundamentação da decisão administrativa, o artigo 115.º (Requisitos da fundamentação) do Código do Procedimento Administrativo (CPA) prescreve:
1. A fundamentação deve ser expressa, através de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão, podendo consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas que constituem neste caso parte integrante do respectivo acto.
2. Equivale à falta de fundamentação a adopção de fundamentos que, por obscuridade, contradição ou insuficiência, não esclareçam concretamente a motivação do acto.
3. Na resolução de assuntos da mesma natureza, pode utilizar-se qualquer meio mecânico que reproduza os fundamentos das decisões, desde que tal não envolva diminuição das garantias dos administrados.
Também se mostra suficientemente claro e perceptível para o comum dos cidadãos o motivo que levou a que a Entidade Recorrida manteve a sua decisão. É de ver que, em síntese, esta invocou e que se revela suficientemente esclarecedor as razões da decisão em causa.
Crê-se que, em qualquer das hipóteses, um destinatário médio fica inteirado das razões de facto e de direito por que se decidiu naquele sentido e não noutro. Tanto basta para que o acto se deva ter por suficientemente fundamentado à luz do artigo 115.º do Código do Procedimento Administrativo.

Pois, o despacho recorrido foi precedido do parecer/informação de 6 de Dezembro de 2016, da autoria do Comandante Substituto do CPSP, no qual se louvou, tendo também convocado o teor dos ofícios n.ºs 0395/2016 e 25469/2016, da Polícia Judiciária, e manteve, na íntegra, o despacho hierarquicamente recorrido, da autoria do Comandante do CPSP. Assim, ao manter tal despacho e ao remeter para o parecer que o precedeu e para a informação veiculada pelos ofícios da Polícia Judiciária, o acto recorrido incorporou os fundamentos constantes daqueles despacho e parecer e ofício.
Neste ponto, o Digno. Magistrado do MP emitiu o seguinte douto parecer:
“Sendo assim, e dado que o despacho recorrido referiu exactamente à data daquela Informação (o dia 06/12/2016), colhemos tranquilamente que pese embora a designação “治安警察局代局長” seja mais apropriada e precisa, a menção de “治安警察局局長” no mesmo despacho não diminui a sua compreensibilidade, nem prejudica o recorrente a compreender os fundamentos de facto e de direito do dito despacho, portanto não pode deixar de degredar num mero lapso inócuo, sem virtualidade invalidante.
De acordo com o disposto no n.°1 do art.115° do CPA, a fundamentação por remissão tem por pressuposto uma declaração de concordância com informações, relatórios ou pareceres. No caso sub judice, é verdade que o Exmo. Senhor Secretário para a Segurança não usa as expressões de “同意”, “贊成”, “支持”, “認同”, “認可” ou “確認” no acto recorrido.
Ressalvado elevado respeito pela opinião diferente, afigura-se-nos que a expressão de “經考慮” significa que o Exmo. Sr. Secretário para a Segurança, na qualidade do autor do despacho in questio, tomou não só em consideração, mas também por base tanto a Informação atrás aludida como o ofício n.º25469/S/2016 da Polícia Judiciária. Daí decorre que tal expressão de “經考慮” equivale a uma declaração de concordância.
A jurisprudência mais autorizada alerta (Acórdão do STA de 10/03/1999, no Processo n.º44302): A fundamentação é um conceito relativo que depende do tipo legal do acto, dos seus termos e das circunstâncias em que foi proferido, devendo dar a conhecer ao seu destinatário as razões de facto e de direito em que se baseou o seu autor para decidir nesse sentido e não noutro, não se podendo abstrair da situação específica daquele e da sua possibilidade, face às circunstâncias pessoais concretas, de se aperceber ou de apreender as referidas razões, mormente que intervém no procedimento administrativo impulsionando o itinerário cognoscitivo da autoridade decidente.
Em esteira, e atendendo ao teor da sobredita Informação e do ofício n.º25469/S/2016 da polícia Judiciária, inclinamos a entender que não se verifica in casu a assacada falta de fundamentação, pois a fundamentação do despacho questionado habilita suficientemente o recorrente a aperceber o itinerário cognoscitivo do Exmo. Senhor Secretário para Segurança.”
Só que, posteriormente, os factos foram julgados pelo tribunal penal, tendo este proferido a respectiva decisão final.
O que significa que o quadro fáctico com base no qual foi tomada a respectiva decisão, objecto deste recurso, sofreu “alterações”.
Ou seja, tais factos, integradores do crime de burla informática, constantes de acusação penal, foram julgados pelo Tribunal penal, tendo este proferido a decisão de absolvição do Recorrente/arguido por falta de provas.
Porém, a razão de absolvição prende-se com a circunstância de que os factos essenciais da acusação ficaram não provados porque os arguidos optaram exercer o seu direito de silêncio em audiência de julgamento, ou seja, não é de todo em todo o Recorrente não teve envolvimento nos factos, e, o juízo valorativo utilizado em processo penal é diferente do seguido em processo administrativo. Neste, a Entidade Recorrida também não chegou a afirmar peremptoriamente que o Recorrente cometeu, sem margem para dúvidas, os factos imputados, mas sim, foi formado um juízo com base nos fortes indícios de que o Recorrente envolveu, conjuntamente com outras pessoas, nos factos integradores de burla informática, o que periga a ordem pública de Macau.
Nesta óptica, subsistem os pressupostos de facto, com base nos quais foi formado o juízo jurídico-administrativo valorativo de censura sobre as condutas do Recorrente, pelo que, não se detectando qualquer vício, nem o Recorrente chegou a carrear provas para afastar o seu envolvimento nos factos, pelo que, é de manter a decisão recorrida.
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Passemos a ver a 2ª questão: violação do princípio da proporcionalidade.
O Recorrente imputa também à decisão o vício da violação do princípio da proporcionalidade.
Nestes termos, é do entendimento deste Tribunal:
Este princípio, que é um corolário do princípio da justiça, obriga a que as decisões administrativas que colidam com direitos e interesses dos particulares apenas possam afectar as posições destes na justa medida da necessidade reclamada pelos objectivos a prosseguir. Subjacente à estatuição do acto está o perigo, para a segurança e ordem pública da Região Administrativa Especial de Macau, representado pela possibilidade de cometimento de novos factos criminalmente ilícitos e pelo potencial de ameaça latente que isso representa para aqueles valores. O recorrente questiona a duração da interdição de entrada, considerando-a desproporcionada.
Pois bem, constata-se que, no confronto dos interesses do recorrente – de normal entrada e permanência na RAEM – e do interesse público de salvaguarda dos valores inerentes à segurança e ordem pública, o despacho recorrido atribuiu supremacia ao interesse público, o que se compreende e é aceitável, face ao potencial de ameaça latente que a prática de crimes pode representar para a segurança e ordem pública da Região Administrativa Especial de Macau. E esta primazia conferida ao interesse público tem que aceitar-se porquanto, sendo o acto proferido no exercício de um poder discricionário, posto que enformado pela ponderação de certos aspectos a que a lei manda atender, não padece de erro palmar, ostensivo ou grosseiro que caucione uma interferência do tribunal relativamente ao sentido do exercício desse poder. Aliás, no aspecto específico do prazo da interdição, conforme doutrina do Tribunal de Última Instância – cf.,v.g., acórdão de 19 de Novembro de 2014, exarado no Processo 112/2014 – não compete ao tribunal dizer se o período de interdição fixado foi ou não proporcional à gravidade, perigosidade ou censurabilidade do facto que a determinou, sendo essa uma avaliação que cabe exclusivamente à Administração, só sindicável judicialmente em caso de erro manifesto ou de total desrazoabilidade no exercício de poderes discricionários, por violação do princípio da proporcionalidade ou outro. Ora, também no tocante ao período da interdição, crê-se que, face aos elementos indiciários com que lidou o acto, essa hipótese de erro palmar ou ostensiva desrazoabilidade não ocorre, pelo que o tribunal não deverá imiscuir-se no juízo formulado pela Administração.
Subscrevemos inteiramente este ponto de vista, pois, dada a natureza dos factos e o número de pessoas envolvidas e ainda a forma de actuação, a interdição de entrar em Macau durante 5 (cinco) anos é reputada justa e proporcional.
O princípio da proporcionalidade, que é um corolário do princípio da justiça, obriga a que as decisões administrativas que colidam com direitos e interesses legítimos dos particulares apenas possam afectar as posições destes na justa medida da necessidade reclamada pelos objectivos a prosseguir. E não se pode falar de desrazoabilidade ou de erro notório, no exercício de poderes discricionários, quando a actuação administrativa é adequada à prossecução do interesse público que lhe cabe salvaguardar, desde que o sacrifício do interesse particular encontre justificação na importância do interesse público a salvaguardar.
O princípio de proporcionalidade, entendido, em sentido amplo, como proibição do excesso, postula que a Administração prossiga o interesse público pelo meio que represente um menor sacrifício para as posições dos particulares. Incorpora, como subprincípio constitutivo, o princípio da exigibilidade, também conhecido como princípio da necessidade ou da menor ingerência possível, que destaca a ideia de que o cidadão tem direito à menor desvantagem possível.
Para maior operacionalidade deste princípio, a doutrina acrescenta, entre outros elementos, o da exigibilidade espacial, que aponta para a necessidade de limitar o âmbito da intervenção na esfera jurídica das pessoas cujos interesses devam ser sacrificados (vd. J. J. Gomes Canotilho, in Direito Constitucional e Teoria da Constituição, 7ª ed., Almedina, 266, ss.).
Advoga o Recorrente que a decisão de que ora recorre atenta contra o princípio administrativo consagrado no artigo 5º/2 (princípio da proporcionalidade) do CPA.
Ora, face aos factos apurados, não se crê que a negação de renovação de residência tenha incorrido em grave, manifesto, ostensivo erro no exercício dos poderes discricionários, sendo que só nesse caso o vício poderia proceder, tal como é jurisprudência firme nos tribunais da RAEM. (v.g., Ac. do TUI, de 22/03/2018, Proc. nº 83/2016; tb. cit. Ac. TSI de 8/03/2018, Proc. nº 252/2017).
Pelo expendido, tendo em conta o objectivo e o interesse que se pretende alcançar e prosseguir com a imposição de tal medida de interdição.
Pelo que, é de julgar improcedente o recurso interposto pelo Recorrente.
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Tudo visto e analisado, resta decidir.

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    V – DECISÃO
Em face de todo o que fica exposto e justificado, os juízes do TSI acordam em julgar improcedente o presente recurso interposto pelo Recorrente, mantendo-se a decisão recorrida.
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Custas pelo Recorrente que se fixam em 7 UCs.
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Notifique e Registe.
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RAEM, 06 de Junho de 2019.
Fong Man Chong
Ho Wai Neng
José Maria Dias Azedo
Mai Man Ieng

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