Processo n.º 631/2018
(Autos de recurso contencioso)
Relator: Fong Man Chong
Data: 11/Julho/2019
Assuntos:
- Insuficiência de factos para integrar a violação (imputada a um guarda prisional) do dever considerado infringido e violação da lei
SUMÁRIO:
I – Na sequência de a Recorrente, guarda prisional, ter sido condenada num processo-crime pela prática de um crime de ofensa simples à integridade física, contra ela foi instaurado um processo disciplinar, em que, com base nos mesmos factos criminais, lhe se imputa a violação dum dever especial, previsto no artigo 22º/-14) da Lei nº7/2006, de 28 de Agosto, que tem o seguinte teor:
14) Manter, mesmo fora do âmbito de exercício efectivo de funções, um comportamento cívico adequado à sua qualidade de agente de autoridade de um serviço público, por forma a garantir junto da população prisional níveis elevados de confiança na sua seriedade, sobriedade e respeito;
II – Porém, no processo disciplinar, não foi factualmente alegado e demonstrado prejuízo para o serviço e respectiva imagem, nem foi alegada e demonstrada quebra, ou possibilidade de diminuição, do índice dos níveis de confiança da população prisional na seriedade, sobriedade e respeito da guarda prisional, ora Recorrente, por via do comportamento disciplinarmente investigado, isto por um lado; por outro, os factos criminais foram cometidos num espaço privado (casa e por motivo de namoro) sem conexão com as funções que a Recorrente desempenhava, o que demonstra claramente a insuficiência de factos para integrar a violação do dever considerado infringido. Pelo que, é de anular a decisão punitiva por violação da lei.
O Relator,
________________
Fong Man Chong
Processo n.º 631/2018
(Autos de recurso contencioso)
Data : 11/Julho/2019
Recorrente : A
Entidade Recorrida : Secretário para a Segurança
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ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA RAEM:
I – RELATÓRIO
A, Recorrente, devidamente identificado nos autos, discordando do despacho do Secretário para a Segurança, datado de 21/05/2018, que negou provimento ao recurso hierárquico necessário interposto pela Recorrente contra o despacho punitivo do Director dos Serviços Correccionais (que foi notificada em 4 de Abril de 2018), através do qual lhe foi aplicada a pena disciplinar de multa, em quantitativo equivalente a dois dias de vencimento, veio, em 29/06/2018 interpor o presente recurso contencioso para este TSI, com os fundamentos constantes de fls. 2 a 14, tendo formulado as seguintes conclusões:
1. 被訴實體於該批示以司法上訴人涉及之刑事案卷就認定其違反了《獄警通則》第22條第(十四)項規定的特別義務。
2. 但被訴實體於該批示內沒有就司法上訴人的行為如何違反特別義務作出任何理由說明。
3. 被訴實體雖然曾籠統地在該批示指出“訴願人身為獄警隊伍人員,在明知其行為可能導致他人受傷、且為法律所不容許的情況下,仍然故意作出有關行為,最終導致他人受傷,清楚顯示訴願人欠缺守法意識,作為一名公共部門執法人員,有關行為明顯與其身份應有的公民行為表現不符。”
4. 但被訴實體並沒有指出司法上訴人的行為令被監禁人對獄警隊伍人員莊重、節制及尊嚴形象失去高度信任。
5. 此等含糊且不充分的描述,依法應被視為無說明理由(《行政程序法典》第115條第二款)。
6. 被該批示確認之「裁定批示」雖曾提及司法上訴人的行為“經審判及確定判決已為公眾所知,必然對獄警隊伍及部門的形象及聲譽造成影響,亦會令被監禁人失去對獄警隊伍人員莊重、節制及尊嚴形象的信任;......”但這僅為個人主觀意見,並沒有客觀證據支持。
7. 該批示確認之「裁定批示」沒有就司法上訴人的行為如何違反特別義務作出任何理由說明。
8. 該批示確認之「裁定批示」沒有指出司法上訴人的行為如何令被監禁人對獄警隊伍人員莊重、節制及尊嚴形象失去高度信任。
9. 此等含糊且不充分的描述,依法應被視為無說明理由(《行政程序法典》第115條第二款)。
10. 被訴實體作出之行政行為欠缺說明理由,根據《行政程序法典》第122條第一款之規定,該行政行為應被視為無效。
11. 根據《通則》第277條規定“本地區現行刑法之規定,經適當配合後,以候補方式適用於紀律制度。”
12. 即刑法的“無罪推定”及“疑罪從無”之原則依法應適用於本紀律程序。
13. 被訴實體從來沒有提出任何客觀證據證明司法上訴人違反了特別義務。
14. 僅存有刑事案卷的判決絕對不代表“必然對獄警隊伍及部門的形象及聲譽造成影響,亦會令被監禁人失去對獄警隊伍人員莊重、節制及尊嚴形象的信任”。
15. 被訴實體作出的該批示根本不能使人毫無疑問地相信司法上訴人的行為違反了特別義務。
16. 被訴實體作出的該批示、或是經其確認之「裁定批示」明顯違反了“無罪推定”及“疑罪從無”的大原則。
17. 被訴實體沒有證明司法上訴人於私人生活期間作出的行為與其履行職務有任何聯繫。
18. 司法上訴人的行為依法不具不法性,即其行為不構成任何違紀行為,故不應對其提出紀律程序。
19. 被訴實體作出之行政行為違反多項法律,根據《行政程序法典》第124條的規定,該行政行為屬可撤銷。
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Citada a Entidade Recorrida, o Senhor Secretário para a Segurança veio contestar o recurso com os fundamentos constantes de fls. 25 a 28, tendo formulado as seguintes conclusões:
1. 歸納上訴人提起上訴的依據,主要是關於對第7/2006號法律《獄警隊伍職程人員通則》第二十二條(十四)項規定的理解。
2. 第7/2006號法律《獄警隊伍職程人員通則》第二十二條(十四)項的法律條文清晰地表達了對獄警人員行為的要求―獄警人員在實際執行職務範圍以外的事宜上,仍須保持與公共部門執法人員身份相符的公民行為表現,否則便違反了有關的特別義務。
3. 在尊重不同的意見下,我們認為第7/2006號法律第二十二條(十四)項後半部份的內容:“......以維持被監禁人對獄警隊伍人員莊重、節制及尊嚴形象的高度信任。”,僅表達了法律對獄警人員的行為作出有關要求的原因,並非要求造成損害結果方視為侵犯到該項職務責任。
4. 因此,在考慮上訴人的行為是否違反上述的特別義務時,無需證明其行為有否損害被監禁人對獄警隊伍人員莊重、節制及尊嚴形象的高度信任。
5. 根據已轉為確定的法院判決,上訴人以直接正犯、或然故意及既遂方式觸犯了《刑法典》第137條結合第13條第3款所規定及處罰的一項普通傷害身體完整性罪。
6. 法院認定上訴人是自由、自主及有意識地作出有關犯罪行為,且深知其行為為法律所不容。
7. 身體完整性是一項受刑法所保護的重要法益,上訴人故意侵犯他人身體完整性的行為,已充分顯示上訴人沒有保持與公共部門執法人員身份相符的公民行為表現。
8. 即使上訴人的行為與實際執行職務無關,仍然違反了第7/2006號法律第二十二條(十四)項規定的特別義務。
9. 正如終審法院在第62/2010號案中指出,公職人員的私人生活事實是可以成為紀律處分的標的。
10. Dr. Manuel Leal-Henriques在其著作中指出:“服務於行政當局的人有義務在工餘時不作出損害職務上的尊嚴,且間接地影響到其自己機構的行為,亦不作出使公眾對其職務上的公正和道德產生強烈懷疑的行為。例如:當工作人員在公眾場所醉酒、不恭敬、實施偷竊或做出其他損毀其公僕聲譽的行為。
11. 上訴人的行為違反了第7/2006號法律第二十二條(十四)項所規定的特別義務,侵犯了一個其應遵守的職務責任,其行為具有不法性。
12. 綜上述理由,被上訴的行為不存在上訴人所指的欠缺說明理由及違反法律的情況。
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O Digno. Magistrado do Ministério Público junto do TSI emitiu o seguinte douto parecer (fls. 68 a 69):
Objecto do presente recurso contencioso é o despacho de 21 de Maio de 2018, da autoria do Exm.º Secretário para a Segurança, que negou provimento ao recurso hierárquico necessário interposto por A contra o despacho punitivo do Director dos Serviços Correccionais, de que foi notificada em 4 de Abril de 2018, através do qual lhe foi aplicada a pena disciplinar de multa, em quantitativo equivalente a dois dias de vencimento.
A recorrente acha que o acto padece dos vícios de forma por falta de fundamentação e de violação de lei, este último por ofensa do artigo 22.°, alínea 14), da Lei n.º 7/2006, porquanto não está demonstrado que o comportamento objecto da censura disciplinar tenha infringido o dever aí previsto.
A entidade recorrida, por seu turno, refuta que o acto padeça de tais vícios, afirmando a sua legalidade e pronunciando-se pela improcedência do recurso contencioso.
Vejamos, começando pela questão da falta de fundamentação.
Os argumentos arregimentados pela recorrente para assacar ao acto a falta ou insuficiência da fundamentação prendem-se com a falta de demonstração de que a actuação objecto de censura disciplinar pôs em xeque, junto da população prisional, os níveis de confiança na sua seriedade, sobriedade e respeito.
Salvo melhor juízo, esta deficiência assinalada ao acto não integra vício de forma por falta de fundamentação.
Em matéria de fundamentação, o artigo 115.º do Código do Procedimento Administrativo prescreve que ela deve ser expressa, através de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão, podendo consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas que constituem neste caso parte integrante do respectivo acto, equivalendo à sua falta a adopção de fundamentos que, por obscuridade, contradição ou insuficiência, não esclareçam concretamente a motivação do acto.
A partir deste inciso legal, a doutrina e a jurisprudência vêm apontando a relatividade do conceito e vincando que o que importa é que, perante o acto, um destinatário médio fique inteirado da motivação da decisão, das razões que levaram a Administração a decidir da forma como decidiu e não doutra. Consideram, por isso, que não vale como fundamentação a adopção de proposições ou juízos conclusivos desacompanhados da concretização factual em que assentam, porquanto dessa forma não se logra esclarecer a motivação do acto, desiderato essencial do dever de fundamentação.
No caso vertente, cremos que se mostra suficientemente cumprido aquele dever. Na verdade, os elementos fácticos e de direito arregimentados na fundamentação do acto, onde pontua a actuação protagonizada pela arguida, o dever que tal actuação violou, o normativo que o prevê, e a pena aplicada, permitem a um destinatário normal apreender os motivos por que se decidiu no sentido adoptado e não noutro. Aliás, a destinatária do acto e recorrente compreendeu bem as razões da decisão administrativa, como se extrai da petição com que impulsionou este recurso contencioso. Em bom rigor, as críticas que dirige ao acto, a propósito da alegada insuficiência da fundamentação, não relevam da fundamentação como exigência de forma - que é o que ora está em causa -, mas sim do mérito ou do acerto e suficiência substancial dos fundamentos, sendo esta uma questão diversa, porventura com acuidade para caracterização do outro vício que imputa ao acto, mas despida de importância para o aspecto formal da fundamentação. Soçobra este vício.
O outro vício invocado é o de violação de lei, em cujo âmbito a recorrente põe em causa a integração da sua actuação objecto de censura na norma que prevê o dever especial considerado violado - alínea 14) do artigo 22.º da Lei n.º 7/2006. Defende, na verdade, não ter ficado demonstrado que a sua conduta haja tido qualquer repercussão no serviço público onde trabalha, nomeadamente na população prisional, por forma a pôr em causa os níveis elevados de confiança na sua seriedade, sobriedade e respeito.
Cremos que lhe assiste razão.
A recorrente, na sua vida particular, fora do serviço e sem qualquer relação com este, teve uma altercação com uma cidadã, chegando ao confronto físico, vindo a ser condenada, em sede penal, por um crime de ofensa corporal simples.
Este é o facto que lhe é imputado disciplinarmente, em cujo procedimento não foi factualmente alegado e demonstrado prejuízo para o serviço e respectiva imagem, nem foi alegada e demonstrada quebra, ou possibilidade de diminuição, do índice dos níveis de confiança da população prisional na seriedade, sobriedade e respeito da guarda prisional ora recorrente, por via do comportamento disciplinarmente investigado. O juízo que o despacho punitivo mantido pelo acto recorrido faz a este propósito é subjectivo e conclusivo, não estando respaldado em factos apurados no procedimento, nem em alegado carácter público e notório do prejuízo para o serviço e para os níveis de confiança junto da população prisional. A circunstância de a recorrente ter sido julgada em sede penal, cujas audiências são públicas, no sentido de que são acessíveis ao público, não significa que o seu caso tenha tido foros de notoriedade e publicidade que dispensasse a invocação e a prova do prejuízo que a sua actuação trouxera ao serviço, nomeadamente em resultado do reflexo abaixamento dos níveis de confiança da população prisional na seriedade, sobriedade e respeito da recorrente.
Nestes termos, crê-se que os factos imputados à recorrente são insuficientes para integrar a violação do dever considerado infringido.
Procede, a nosso ver, a suscitada violação de lei, pelo que, no provimento do recurso, deve o acto ser anulado.
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Foram colhidos os vistos legais.
Cumpre analisar e decidir.
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II – PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
Este Tribunal é o competente em razão da nacionalidade, matéria e hierarquia.
O processo é o próprio e não há nulidades.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária e são dotadas de legitimidade “ad causam”.
Não há excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
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III – FACTOS
São os seguintes elementos, extraídos do processo principal e do processo administrativo com interesse para a decisão da causa:
- No âmbito do processo do Recurso Penal nº 847/2016, do TSI, em que é arguida a ora Recorrente, ficaram provados os seguintes factos:
‒ 約於2008年年尾開始,嫌犯朱XX入住廖XX(被害人)位於澳門…的住所。
‒ 及後,嫌犯與廖XX的關係轉差,嫌犯便搬離上述住所。
‒ 2015年3月3日上午約10時,嫌犯欲返回上址執拾其財物,廖XX便讓嫌犯進入,及後,二人因事口角,繼而發生爭執。
‒ 接著,嫌犯與廖XX互相拉扯(身體),期間,廖XX跪在地上,嫌犯用手拉著廖XX的頸部位置,拉扯其頭髮,因而導致廖XX身體受傷。
‒ 及後,嫌犯離開現場,廖XX於晚上稍後時間報警求助,並到仁伯爵綜合醫院接受治療。
‒ 依臨床法醫學鑑定書所載,廖XX被診斷有以下傷勢:頸部、左手中指及右膝部軟組織挫擦傷,估計共需要1日康復,相關臨床法醫學鑑定書載於卷宗第122頁,為著適當的法律效力,在此視為完全轉錄。
‒ 嫌犯明知與被害人廖XX互相拉扯身體時,其用手拉著被害人的頸部位置很有可能會導致後者頸部受傷,但其仍然故意作出有關行為,對被害人上述身體完整性受到傷害的結果的可能產生抱有放任及接受的態度。
‒ 嫌犯自由、自願及有意識地作出上述行為、且深知其行為為法律所不容。
‒ 嫌犯與廖XX曾為情侶關係,廖XX其後懷疑嫌犯移情別戀,雙方最終感情破裂。
‒ 案發時,當嫌犯準備離開案發單位之時,廖XX攔截住嫌犯,不許嫌犯離開。
‒ 由於嫌犯堅持要離開,廖XX在一怒之下將嫌犯的部份物品抛出案發住宅單位門外。
‒ 廖XX是空手道黑帶。
‒ 案發日,嫌犯患病,身體處於較為虛弱狀態。
‒ 在嫌犯的手提電話內的WhatsApp通話記錄中,廖XX曾向嫌犯發出充滿怨恨的過激言語,例如:“我宜家就做九你”、“你太唔了解我,必要時我攬住你同歸於盡”、“我殺死你再自殺”、“你再激嬲我你唔好後悔”。
另外證明以下事實:
‒ 嫌犯現為獄警,每月收入約澳門幣30,000元。
‒ 嫌犯為未婚,無需供養任何人。
‒ 嫌犯學歷為大學畢業。
‒ 嫌犯否認其被指控的事實。
‒ 根據刑事紀錄證明,嫌犯為初犯。
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- Neste processo a Recorrente/arguida foi condenada na pena de multa de 60 dias, à taxa diária de $180 patacas.
- Depois foi instaurada o competente processo disciplinar contra a Recorrente.
- Feita instrução do processo, o Director dos SC proferiu a decisão punitiva de multar a arguida por 2 dias.
- Discordando desta decisão foi interposto recurso hierárquico necessário para o Secretário para a Segurança, que veio a proferir a decisão final, pela qual manteve a decisão do Director.
- Tal decisão final tem o seguinte teor:
第059/SS/2018號
事由:訴願
卷宗編號:懲教管理局第00023-PDD/DSC/2017號紀律程序
訴願人:A,懲教管理局確定委任第二職階警員
被訴願行為:懲教管理局局長對訴願人科處2日罰款處分的批示
根據載於卷宗的法院確定判決內容,訴願人被判處以直接正犯、或然故意及既遂方式觸犯了一項普通傷害身體完整性罪。
經查閱上述已轉為確定的法院判決中所認定的事實,訴願人於2015年3月3日與一名女子發生爭執,雙方互相拉扯(身體),其間,該名女子跪在地上,訴願人用手拉著該名女子的頸部位置,拉扯其頭髮,因而導致該名女子身體受傷。法院認定訴願人明知與該名女子互時拉扯身體時,用手拉著該女子的頸部位置很有可能會導致其頸部受傷,但仍然故意作出有關行為,對該女子的身體完整性受到傷害的結果的可能產生抱有放任及接受的態度。同時,法院亦認定訴願人是自由、自主及有意識地作出上述行為,且深知其行為為法律所不容。
根據第7/2006號法律第二十二條(十四)項所規定的獄警隊伍人員特別義務,獄警隊伍人員在實際執行職務範圍以外的事宜上,仍須保持與公共部門執法人員身份相符的公民行為表現,以維持被監禁人對獄警隊伍人員莊重、節制及尊嚴形象的高度信任。
上述的一項獄警隊伍人員必須遵守的特別義務,其訂定之目的是規範獄警隊伍人員的行為,藉以維持被監禁人對獄警隊伍人員莊重、節制及尊嚴形象的高度信任。獄警隊伍人員即使在實際執行職務範圍以外的事宜上,仍需遵守該項義務,獄警隊伍人員必須時刻保持與公共部門執法人員身份相符的公民行為表現,否則,已違反了該項特別義務。
訴願人身為獄警隊伍人員,在明知其行為可能導致他人受傷、且為法律所不容許的情況下,仍然故意作出有關行為,最終導致他人受傷,清楚顯示訴願人欠缺守法意識,作為一名公共部門執法人員,有關行為明顯與其身份應有的公民行為表現不符。
經審閱及分析題述卷宗,預審程序的進行符合法律規定,而經考慮訴願人行為的性質及嚴重性、過錯程度、人格,以及其他有利及不利於訴願人的情節後,向科處訴願人的處分屬適當及適度。
基此,保安司司長行使第6/1999號行政法規第四條,以及第111/2014號行政命令賦予的權限,根據《澳門公共行政工作人員通則》第三百四十一條第三款,以及《行政程序法典》第一百六十一條的規定,駁回本訴願,並確認被訴願的行為。
著令通知訴願人得就本批示於三十日內向中級法院提起司法上訴。
二零一八年五月二十一日於澳門特別行政區保安司司長辦公室。
保安司司長
黃少澤
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IV – FUNDAMENTOS
Neste recurso contencioso interposto pelo Recorrente são suscitadas essencialmente as seguintes questões que importa analisar e resolver:
1) - Vícios de forma por falta de fundamentação;
2) - Vício de violação de lei, por ofensa do artigo 22.°, alínea 14), da Lei n.º 7/2006 (não está demonstrado que o comportamento objecto da censura disciplinar tenha infringido o dever aí previsto).
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Comecemos pela 1ª questão.
Neste ponto, o Digno. Magistrado do MP emite o seguinte douto parecer:
“No caso vertente, cremos que se mostra suficientemente cumprido aquele dever. Na verdade, os elementos fácticos e de direito arregimentados na fundamentação do acto, onde pontua a actuação protagonizada pela arguida, o dever que tal actuação violou, o normativo que o prevê, e a pena aplicada, permitem a um destinatário normal apreender os motivos por que se decidiu no sentido adoptado e não noutro. Aliás, a destinatária do acto e recorrente compreendeu bem as razões da decisão administrativa, como se extrai da petição com que impulsionou este recurso contencioso. Em bom rigor, as críticas que dirige ao acto, a propósito da alegada insuficiência da fundamentação, não relevam da fundamentação como exigência de forma - que é o que ora está em causa -, mas sim do mérito ou do acerto e suficiência substancial dos fundamentos, sendo esta uma questão diversa, porventura com acuidade para caracterização do outro vício que imputa ao acto, mas despida de importância para o aspecto formal da fundamentação.”
Ora, efectivamente o dever de fundamentar a decisão está cumprido, pois uma pessoa de diligência normal, ao olhar para a decisão em causa, fica a perceber a motivação subjacente e os fundamentos respectivos.
Pelo que, é de julgar improcedente o recurso nesta parte.
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Passemos a ver a 2ª questão.
O processo disciplinar foi instaurado essencialmente com base factos julgados no processo crime, Proc. nº 847/2016, do TSI, em que a Recorrente foi punida pela prática de um crime de ofensa simples à integridade física, sendo vítima uma senhora, amiga da Recorrente/arguida.
Ora, foi invocada a violação do dever previsto no artigo 22.° (Deveres especiais), alínea 14), da Lei n.º 7/2006, de 28 de Agosto, que tem o seguinte teor:
O pessoal do CGP está sujeito aos deveres gerais definidos no regime geral da Função Pública e ainda, nomeadamente, aos seguintes deveres especiais:
1) Apresentar-se ao serviço, independentemente de convocação, sempre que situações de necessidade urgente exijam a sua presença;
2) Não aceitar, a qualquer título, dádivas ou vantagens de reclusos, de familiares destes ou de outras pessoas em consequência da profissão exercida;
3) Não deixar introduzir nem sair do estabelecimento objectos pertencentes a reclusos ou a eles destinados, sem autorização superior;
4) Não comprar, vender, emprestar ou pedir emprestados objectos ou valores a reclusos ou aos seus familiares, salvo autorização superior;
5) Não permitir comunicações não autorizadas superiormente entre reclusos e pessoas estranhas ao estabelecimento;
6) Não empregar reclusos ao seu serviço nem utilizar a sua força de trabalho, excepto nos casos superiormente autorizados;
7) Não influenciar os reclusos na escolha do seu defensor;
8) Ser urbano nas relações com os reclusos, quer na correcção da linguagem, quer na afabilidade do trato, sem deixar de manter atitudes serenas e firmes e uma total independência de acção;
9) Participar aos superiores hierárquicos, com objectividade e prontidão, as ocorrências verificadas em serviço;
10) Manter com os colegas boas relações de colaboração, com vista a tornar mais eficiente o desempenho das tarefas comuns;
11) Zelar pela conservação dos artigos de fardamento, armamento e outros que estejam a seu cargo;
12) Apresentar-se ao serviço rigorosamente uniformizado com o modelo de fardamento legalmente aprovado;
13) Saudar com continência os superiores hierárquicos, de acordo com o respectivo regulamento;
14) Manter, mesmo fora do âmbito de exercício efectivo de funções, um comportamento cívico adequado à sua qualidade de agente de autoridade de um serviço público, por forma a garantir junto da população prisional níveis elevados de confiança na sua seriedade, sobriedade e respeito;
15) Fazer uso de armas, quando lhe for ordenado superiormente ou em caso de necessidade imperiosa, para repelir uma agressão ou tentativa eminente de agressão contra si, um ataque ao seu posto ou uma tentativa eminente de fuga, devendo sempre tomar as devidas precauções;
16) Não consentir que alguém se apodere ilegitimamente das armas que lhe estejam distribuídas ou à sua responsabilidade, devendo contudo entregá-las sempre que os superiores hierárquicos o determinem;
17) Não encobrir criminosos ou transgressores nem lhes prestar qualquer auxílio com intenção ou com consciência de, total ou parcialmente, impedir, frustrar ou iludir a sua submissão à acção da justiça;
18) Quando no gozo de licença, folga ou dispensa, não contactar, por qualquer meio, com reclusos, nem aceitar ser intermediário entre estes e pessoas que com eles tenham qualquer ligação familiar, legal ou de trabalho, nem frequentar qualquer dependência afecta ao EPM.
Ora, analisados os factos imputados, não nos parece que a Recorrente violou o dever acima citado, visto que:
1) – Os factos ocorreram na fracção autónoma em que as duas, amigas que eram, viviam;
2) – Houve rixa entre as duas, porque a Recorrente queria levar os objectos seus para deixar definitivamente a fracção autónoma em que as duas viviam durante algum tempo, depois de se separarem;
3) – Não se apurou quem é que começou a agarrar ao corpo de outra em primeiro lugar;
4) – Os factos imputados ocorreram sem conexão com as funções que desempenhava;
5) – Os mesmos ocorreram dentro do espaço privado, em casa;
6) – Não se apurou quais motivos que determinaram a actuação da Recorrente naquela maneira.
7) – Pelo que, achamos que faltam elementos fácticos para encaixar a conduta da Recorrente no dever acima citado.
Não restam dúvidas que a decisão punitiva tem que se basear em factos e provas que possibilitem formular, segundo o princípio da livre apreciação da prova e das regras da experiência comum, um juízo de certeza razoável de que o arguido praticou efectivamente os factos que lhe são imputados.
Portanto, a responsabilidade disciplinar administrativa assenta na ideia de que o facto há-de corresponder a uma acção culposa e ilícita, cabendo ao ente disciplinar fazer prova dos factos que integram o ilícito disciplinar
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Neste ponto, é da posição do Magistrado do MP:
“A recorrente, na sua vida particular, fora do serviço e sem qualquer relação com este, teve uma altercação com uma cidadã, chegando ao confronto físico, vindo a ser condenada, em sede penal, por um crime de ofensa corporal simples.
Este é o facto que lhe é imputado disciplinarmente, em cujo procedimento não foi factualmente alegado e demonstrado prejuízo para o serviço e respectiva imagem, nem foi alegada e demonstrada quebra, ou possibilidade de diminuição, do índice dos níveis de confiança da população prisional na seriedade, sobriedade e respeito da guarda prisional ora recorrente, por via do comportamento disciplinarmente investigado. O juízo que o despacho punitivo mantido pelo acto recorrido faz a este propósito é subjectivo e conclusivo, não estando respaldado em factos apurados no procedimento, nem em alegado carácter público e notório do prejuízo para o serviço e para os níveis de confiança junto da população prisional. A circunstância de a recorrente ter sido julgada em sede penal, cujas audiências são públicas, no sentido de que são acessíveis ao público, não significa que o seu caso tenha tido foros de notoriedade e publicidade que dispensasse a invocação e a prova do prejuízo que a sua actuação trouxera ao serviço, nomeadamente em resultado do reflexo abaixamento dos níveis de confiança da população prisional na seriedade, sobriedade e respeito da recorrente.
Nestes termos, crê-se que os factos imputados à recorrente são insuficientes para integrar a violação do dever considerado infringido.”
Alinhamos também este ponto de vista.
Pelo que, é julgar procedente o recurso interposto pela Recorrente.
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Síntese conclusiva:
I – Na sequência de a Recorrente, guarda prisional, ter sido condenada num processo-crime pela prática de um crime de ofensa simples à integridade física, contra ela foi instaurado um processo disciplinar, em que, com base nos mesmos factos criminais, lhe se imputa a violação dum dever especial, previsto no artigo 22º/-14) da Lei nº7/2006, de 28 de Agosto, que tem o seguinte teor:
14) Manter, mesmo fora do âmbito de exercício efectivo de funções, um comportamento cívico adequado à sua qualidade de agente de autoridade de um serviço público, por forma a garantir junto da população prisional níveis elevados de confiança na sua seriedade, sobriedade e respeito;
II – Porém, no processo disciplinar, não foi factualmente alegado e demonstrado prejuízo para o serviço e respectiva imagem, nem foi alegada e demonstrada quebra, ou possibilidade de diminuição, do índice dos níveis de confiança da população prisional na seriedade, sobriedade e respeito da guarda prisional, ora Recorrente, por via do comportamento disciplinarmente investigado, isto por um lado; por outro, os factos criminais foram cometidos num espaço privado (casa e por motivo de namoro) sem conexão com as funções que a Recorrente desempenhava, o que demonstra claramente a insuficiência de factos para integrar a violação do dever considerado infringido. Pelo que, é de anular a decisão punitiva por violação da lei.
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Tudo visto e analisado, resta decidir.
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V - DECISÃO
Em face de todo o que fica exposto e justificado, os juízes do TSI acordam em julgar procedente o presente recurso, anulando-se o despacho punitivo recorrido (2 dias de multa).
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Sem custas.
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Notifique e Registe.
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RAEM, 11 de Julho de 2019.
Fong Man Chong
Ho Wai Neng
José Cândido de Pinho
Fui presente
Joaquim Teixeira de Sousa
2018-631-guarda-rixa-muota 20