打印全文
Processo nº 1096/2018
(Autos de Recurso Civil e Laboral)

Data: 27 de Junho de 2019

ASSUNTO:
- Insuficiência da matéria de facto


SUMÁRIO:
- Se os factos alegados pela Ré, uma vez assentes ou provados, são susceptíveis de constituir uma solução plausível da questão de direito, nomeadamente para a eventual excepção de incumprimento e/ou a resolução do acordo por alteração anormal das circunstâncias, o juiz deve, nos termos do nº 1 do artº 430º do CPC, seleccionar tais factos, indicando os que considera assentes e os que, por serem controvertidos, integram a base instrutória.
- Não o fazendo, gera a insuficiência da matéria de facto para a boa decisão da causa, o que implica a anulação da sentença recorrida.
O Relator






Processo nº 1096/2018
(Autos de Recurso Civil e Laboral)

Data: 27 de Junho de 2019
Recorrente: A (1º Réu)
Recorrido: B (Autor)

ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:

I – Relatório
Por sentença de 27/04/2018, julgou-se a acção parcialmente procedente e, em consequência, condenou-se o 1º Réu A a pagar o Autor B a quantia total de MOP$11,330,000.00, acrescida de juros de mora à taxa dos juros legais a contar desde a data da citação até efectivo e integral pagamento.
Dessa decisão vem recorrer o 1º Réu, alegando, em sede de conclusão, o seguinte:
1. Vem o presente recurso da douta sentença explicitada em 27 de Abril de 2018, que julgou, parcialmente, procedente por provada a acção intentada por B contra (i) A (1.º Réu e ora Recorrente) e (ii) C, LIMITADA (2.ª Ré) e, em consequência, condenou o 1.º Réu, ora Recorrente, a pagar ao Autor a quantia de MOP$11.330.000,00 (correspondente a HK$11.000.000,00), acrescida de juros de mora à taxa legal, a contar desde a data da citação até efectivo e integral pagamento.
2. O Recorrente limita o seu recurso a esta decisão, não pretendendo impugnar a douta Sentença recorrida na parte em que foi considerada improcedente a Reconvenção, por si apresentada.
3. Constata-se que, na douta Sentença recorrida, o Meritíssimo Juiz a quo, ao elencar os factos dados por apurados, fê-los anteceder de alíneas de a) a cc), certo sendo que tal forma de apresentar a factualidade apurada pode determinar uma errada interpretação da matéria fáctica dada por provada, uma vez que, para além dos factos assentes serem identificados por alíneas, na formulação dos quesitos dos factos que integram a base instrutória, foram feitas remissões para as mesmas.
4. Pode defender-se que o Meritíssimo Juiz a quo fez anteceder a matéria dada por apurada de alíneas escritas em minúsculas e que não tem correspondência com as alíneas escritas em maiúsculas (forma usual de apresentar os factos assentes) mas o Recorrente não pode deixar de alegar a necessidade de ser feita a rectificação, porque constitui um direito seu, previsto no art.º 570.º, n.º 2, do C.P.C.
5. O Recorrente imputa um vício precedente na selecção da matéria controvertida, que constituiu um óbice a que determinados factos relevantes para apurar com justeza o litígio tenham sido objecto de julgamento e produção de prova, questão que suscita, no presente recurso, como forma de impugnação do despacho que, em sede de julgamento, indeferiu a ampliação da matéria de facto requerida nos termos dos art.ºs 5.º e 553.º, n.º 2, alínea f), do CPC.
6. Imputa, também, o Recorrente ao douto Acórdão de facto o vício da nulidade por haver contradição, obscuridade e deficiência nas respostas aos quesitos, vício este decorrente do recurso a remissões para factos assentes, quer na formulação dos quesitos, quer nas suas respostas, quer, ainda, na fundamentação do douto Acórdão de facto.
7. Por outro lado, o Recorrente imputa à douta decisão recorrida contradição na fundamentação, por não ter o douto Tribunal a quo deixado claramente perceptível qual foi o processo lógico ou racional subjacente à formação da sua convicção, para aplicar o Direito aos factos dados por provados e para fazer a interpretação dos acordos feitos entre a empresa "D Macau" e várias pessoas singulares, designadamente, o acordo decorrente da deliberação da assembleia geral de 17 de Novembro de 2006 da "C, Limitada" (2.ª Ré no presente processo) entre vários interessados, nomeadamente, entre o Autor e o 1.º Réu.
8. O Recorrente não pode deixar de afirmar que há falta de factos necessários, relevantes para a correcta decisão da causa e justa composição do litígio, e pese o facto de haver elementos probatórios que pudessem permitir uma reapreciação da matéria de facto e sXXequente modificação da mesma por parte do Venerando Tribunal ad quem, nos termos do art. 629.º, n.º 1 do CPC, a complexidade da presente causa impõe, antes, que seja anulada a douta decisão recorrida e seja repetido o julgamento com a indispensável ampliação da matéria de facto.
9. Tal questão pode ser suscitada em sede de recurso como forma de impugnação do despacho que, em sede de julgamento, indeferiu ampliação da matéria de facto requerida nos termos dos art.ºs 5.º e 553.º, n.º 2, alínea f), do CPC.
10. Pretende o Recorrente que o Venerando Tribunal ad quem considere que há factos relevantes para uma boa decisão da causa e, ao abrigo do disposto no art.º 629.º, n.º 4, do CPC, considere indispensável a ampliação da matéria de facto.
11. Dúvidas não podem existir quanto à necessidade de ser ampliada a matéria de facto, designadamente, no que se refere à revogação unilateral da procuração outorgada em favor de A e às circunstâncias em que foi celebrada a escritura pública de compra e venda que formalizou a transmissão da propriedade do terreno da "D Macau" para a "Companhia E", propondo-se que sejam assim formulados:
“21º
Após o 1.º Réu, A, ter pago o montante de MOP$581.000.000,00, para expurgar o prédio da hipoteca constituída a favor do Banco F, a companhia "D Macau", representada por G, no dia 9 de Novembro de 2007, revogou, unilateralmente, a procuração outorgada em 11 de Dezembro de 2006, passada em favor de A, conferindo-lhe poderes para efectuar negócio consigo mesmo? (facto alegado na Contestação - artigo 32.º - e suportado pelo doc. n.º 7, com ela junto).
22º
No dia 22 de Fevereiro de 2008, a companhia "D Macau", representada por G e a companhia "H", no âmbito do processo CV3-07-0049-CAO, intentado por esta contra aquela, procederam uma transacção e com base nessa transacção foi registada em 3 de Março de 2008, junto da C.R.P., a hipoteca judicial, onerando o prédio prometido a vender à companhia E, no valor de HKD597.617.324,00? (facto alegado na Contestação - art.º 33.º e suportado pelo doc. n.º 8, com ela junto).
23º
Tendo sido revogada em 9 de Novembro de 2007, a procuração outorgada em 11 de Dezembro de 2006, o 1.º Réu, A, ficou impossibilitado de celebrar a escritura pública de compra e venda que iria formalizar a transmissão do terreno sito em Macau na Estrada XX n.ºs XX, para a Companhia E?
24.º
No dia 11 de Julho de 2008, a companhia D intentou, contra a companhia E, uma acção judicial com vista à obtenção da declaração de nulidade do contrato-promessa de compra e venda do terreno sito em Macau na Estrada XX n.ºs XX, celebrado com a companhia E em 18/1/2007, a qual correu termos sob o número de processo CV2-08-0048-CAO? (facto alegado na Contestação - art.º 59.º - e suportado pelo doc. n.º 16, junto com requerimento de 2/12/2013).
25.º
A celebração da escritura pública de compra e venda do imóvel, através da qual o imóvel, a que se referem os autos, foi transmitido da "D Macau" à "E Limitada", ocorreu no dia 10 de Janeiro de 2009, tendo sido intervenientes no acto os respectivos representantes das partes contratantes e sem recurso a qualquer outra procuração conferindo poderes ao 1.º Réu, A?”
12. Caso venha a ser julgada procedente a impugnação do indeferimento, em sede de julgamento, do pedido de ampliação da matéria de facto e, consequentemente, venha a ser reenviado o processo para novo julgamento, podem ser introduzidos factos instrumentais de tal modo que seja possível ter-se uma exacta percepção da teia de negociações que a anterior, proprietária do terreno, a companhia "D Macau", desenvolveu com as mais diversas pessoas singulares e colectivas tendo como objecto mediato o mesmo imóvel.
13. Qualquer pessoa colocada na posição do destinatário da decisão deve compreender o sentido das respostas aos quesitos, não podendo estas levantarem dúvidas interpretativas de qual será a posição do tribunal, sendo que esta clarividência deve não só resultar da resposta isolada aos quesitos, mas também da análise conjugada de todas as respostas e, portanto, resultar evidente o que motivou o julgador a responder num determinado sentido, pois, aliás, só assim, se legitimará a decisão, e poderá persuadir o destinatário da razão da resposta.
14. Em suma, as respostas em si mesmas e quando conjugadas com as demais, bem como com a matéria assente, devem ser harmonizáveis, coerentes e congruentes, admitindo uma interpretação única e clara, para que, posteriormente, na fase de aplicação do direito, inexistam dúvidas sobre o sentido da(s) resposta(s) que dificultem ou até mesmo impeçam uma correcta interpretação jurídica.
15. O Recorrente impugna a matéria de facto, por incontornável obscuridade, nos pontos concretamente indicados no texto das presentes Alegações de recurso, designadamente, no que respeita aos quesitos 12.º e 13.º da Base Instrutória, dois quesitos interligados e com remissão para a alínea M) dos factos assentes, certo sendo que dela não consta qualquer "acordo", conforme matéria quesitada.
16. O Recorrente imputa à douta decisão recorrida contradição na fundamentação, por não ter o douto Tribunal a quo deixado claramente perceptível qual foi o processo lógico ou racional subjacente à formação da sua convicção, para aplicar o Direito aos factos dados por provados e para fazer a interpretação dos acordos feitos entre a empresa "D Macau" e várias pessoas singulares, designadamente, o acordo decorrente da deliberação da assembleia geral de 17 de Novembro de 2006 da "C, Limitada" (2.ª Ré no presente processo) entre vários interessados, nomeadamente, entre o Autor e o 1.º Réu.
17. O Recorrente considera que a douta Sentença recorrida está eivada do vício da contradição insanável da sua fundamentação, porque o douto Tribunal a quo entendeu simplificar a situação de grande complexidade de que se revestem os vários acordos celebrados entre a empresa "D Macau, Limitada" e as pessoas singulares e colectivas referidos no presente processo.
18. O douto Tribunal a quo não interpretou os acordos em conformidade com o que consta da alínea P) dos factos assentes.
19. E quando o ora Recorrente afirma que o douto Tribunal a quo não interpretou em conformidade com o transcrito no referido acordo, fá-lo, porque, em concreto, as partes contratantes, quais sejam, o Autor B, o 1º Réu, A, e o sócio I deliberaram, numa assembleia geral da C, Limitada, realizada em 17 de Novembro de 2006, que os direitos e deveres emergentes da aquisição do referido terreno, que o antigo sócio J havia prometido, fê-lo em representação da C, Limitada e não em nome pessoal.
20. E os mesmos contratantes concordaram transferir para A, 1.º Réu e ora Recorrente, todos os direitos e deveres emergentes dos montantes pagos, assim como os documentos referentes ao aludido contrato-promessa de compra e venda do terreno, celebrado entre a C, Limitada e a "D Macau", passando a ser A a responsabilizar-se, a título individual, pelo respectivo direito de fruição e posseguimento do cumprimento, de onde decorre que foram as partes contratantes nesse acordo que fizeram depender a sua validade, na condição de A continuar com os poderes e deveres que a C, Limitada, se obrigou, ao celebrar o contrato-promessa, com a D Macau, através do seu representante J, nomeadamente os direitos e deveres do contrato-promessa de aquisição do prédio nº XX da XX, celebrado em 29 de Outubro de 2005, que este celebrou em representação da C, Limitada.
21. Decorre do mesmo acordo que, só satisfazendo as duas primeiras condições é que A devia "compensar" o Autor B e o sócio I, isto é, em conformidade com o que ficou estipulado nos n.ºs 3 e 4, da deliberação da assembleia geral realizada em 17 de Novembro de 2006 e consta da alínea P) dos factos assentes, as partes contratantes fizeram consignar que os direitos e deveres emergentes da promessa de aquisição do referido terreno efectuada, em 29 de Outubro de 2005, pelo antigo sócio J, não foi em nome pessoal deste mas sim, em representação da C e, ainda, que todos esses direitos e deveres emergentes do montantes pagos, assim como documentos referentes ao contrato-promessa do aludido terreno, celebrado entre a C, Limitada e a "D Macau".
22. O Recorrente entende que "a situação/condição acima referida nunca foi concretizada" abrange não só o eventual acordo mencionado na alínea M) dos factos assentes (que aliás não menciona qualquer acordo) mas toda a problemática relativa ao "Contrato de Cooperação de Desenvolvimento Imobiliário Conjunto"; à constituição da sociedade comercial "C Limitada"; à deliberação tomada em 17 de Novembro de 2006 na assembleia geral da "C Limitada", certo sendo que as condições previstas nos acordos que se foram sucessivamente estabelecendo, acabaram por não se concretizar, porquanto a "D Macau", enquanto proprietária do imóvel a que se se referem os autos, sempre, estabeleceu uma teia de negociações com diversas pessoas colectivas e singulares, tendo por objecto mediato tal imóvel, não deixando que os negócios se concretizassem em conformidade com os usos e costumes no mercado imobiliário.
23. Por outro lado, esse facto dado por assente, entra em contradição com o que se afirma na douta Sentença recorrida, no sentido de que a condição, prevista no n.º 4 da Alínea P) dos factos assentes, se verificou, porque foi outorgada em favor do 1.º Réu, ora Recorrente, uma procuração com poderes especiais incluindo o de fazer negócio consigo próprio, procuração essa que foi revogada pela "D Macau", unilateralmente, impedindo o ora Recorrente de celebrar a escritura pública de compra e venda, a única forma legal para se operar a transmissão da propriedade do imóvel.
24. Resulta do n.º 4 do acordo constante da alínea P) dos factos assentes que, o 1.º Réu, ora Recorrente, apenas, deveria compensar os então sócios I e B, depois de celebrar com a "D Macau" a escritura de compra e venda respeitante ao aludido terreno, conforme resulta dos n.ºs 3 e 4 da deliberação da assembleia geral de 17 de Novembro de 2006 da C, Limitada.
25. Também, se identifica contradição entre factos provados e a fundamentação de facto da douta Sentença recorrida, relativamente à forma como surgiu uma procuração conferindo poderes especiais ao 1.º Réu, ora Recorrente, certo sendo que resulta da resposta ao facto vertido no quesito 6.º da Base Instrutória, que a procuração para administrar o imóvel em causa, conferindo poderes especiais designadamente o de fazer negócio consigo próprio, foi uma exigência do 1.º Réu como garantia do pagamento da dívida ao Banco F, enquanto, a fls 31 da douta Sentença recorrida, o Meritíssimo Juiz a quo, afirmou que a mesma procuração surgiu após o acordo resultante da acta da assembleia geral de 17 de Novembro de 2006 da "C, Limitada", tendo o A, em contrapartida, assumido o encargo de pagar o que fosse devido para expurgar o prédio da hipoteca constituída a favor do Banco F.
26. Ao debruçar-se sobre a forma como o imóvel a que se referem os autos foi transmitido para a Companhia E, da qual o 1.º Réu é sócio maioritário e único administrador, o douto Tribunal a quo concluiu erradamente que se tratou de um acto de disposição praticado com uma procuração que lhe havia sido outorgada para fazer negócio consigo mesmo, tendo por base um erro de facto, uma vez que a escritura pública de compra e venda do identificado imóvel não foi praticada com recurso a uma procuração pois esta havia sido revogada pela mandante, a empresa "D Macau" e, portanto, a condição prevista no acordo para ser compensado o Autor não se verificou.
*
O Autor respondeu à motivação do recurso acima em referência nos termos constante a fls. 1437 a 1457 dos autos, cujo teores aqui se dão por integralmente reproduzidos, pugnando pela improcedência do recurso.
*
Foram colhidos os vistos legais.
*
II – Factos
Vêm provados os seguintes factos pelo Tribunal a quo:
a) O 1º Réu A é um comerciante dedicado especialmente na área de investimento de património, compra e venda de imóvel, bem como desenvolvimento de construção;
b) Entre 1991 e 16 de Fevereiro de 2009, D Macau era proprietária do edifício e do terreno onde se encontra o edifício (adiante designado por terreno), situados em Macau, Estrada XX n.ºs XX, com uma área total de 56.166 m2, sendo este terreno descrito na Conservatória do Registo Predial de Macau sob o nº 2XX6;
c) O 1º Réu é também sócio de uma companhia limitada registada em Macau, Companhia Desenvolvimento E, Limitada, em chinês E有限公司, cuja sede se situa em Macau, Rua do XX nº XX, XXº andar, com registo comercial nº 2XX53 (SO) e capital social de MOP100,000.00, constituída em 19 de Dezembro de 2006, dedicada na área de investimento imobiliário, detendo uma acção no valor nominal de MOP87,000.00 – conforme documentos de fls. 43 a 46, para os devidos efeitos jurídicos, aqui se dá por integralmente reproduzido;
d) A 2ª Ré, sociedade C, Limitada, em chinês C有限公司, cuja sede se situa em Macau, Beco da XX nº XX, Edf. XX, r/c, com registo comercial nº 2XX98 (SO) e capital social de MOP60.000,00, constituída em 14 de Novembro de 2005, dedicada na área de desenvolvimento e compra e venda de imóvel - conforme documentos de fls. 47 a 52, para os devidos efeitos jurídicos, aqui se dá por integralmente reproduzido;
e) A partir de 20 de Outubro de 2003, o Autor B assumia o cargo de administrador, como também gerente da equipa B da Empresa de Fomento e Investimento D (Macau), Limitada (em chinês D(澳門)實業發展有限公司, adiante designada por D Macau, cuja sede se situa em Macau, Rua da XX nº XX, Edf. XX, r/c, D, constituída em 01 de Setembro de 1988, dedicada na área de construção e investimento de imóvel, com registo comercial nº 3XX3 SO e capital social de MOP100.000,00), dedicada principalmente nas actividades de construção e investimento de imóvel;
f) De acordo com o “Contrato de Cooperação de Desenvolvimento Imobiliário Conjunto”, D Macau contribui, como financiamento, o terreno sito em Macau, Estrada XX n.ºs XX, enquanto J, K e o 1º Réu A financiam integralmente o desenvolvimento do imóvel sobre o terreno, cooperando assim, de forma conjunta, para o projecto de desenvolvimento imobiliário, sendo o eventual direito distribuído em metade (50%) por cada parte;
g) Além do mais, conforme a segunda parte da “forma de cooperação” mencionada no “Contrato de Cooperação de Desenvolvimento Imobiliário Conjunto”, o Autor B e I, em representação da D Macau, constituem, juntamente com o 1º Réu A, J, K, a 2ª Ré C, Limitada. De acordo com o “Contrato de Cooperação de Desenvolvimento Imobiliário Conjunto”, D Macau fornece o aludido terreno e a parte do 1º Réu A fornece “capital”, sendo os direitos, interesses e deveres suscitados distribuídos em metade (50%) por cada parte;
h) O 1º Réu A, J e K concordam que todo o capital necessário para o desenvolvimento do terreno também é considerado como investimento do projecto especializado;
i) D Macau declara que no dia de celebração do presente contrato já recebeu o montante de HKD15,000,000.00 entregue pelo 1º Réu A, J e K, pois o montante será devolvido no futuro pela dedução prioritária do rendimento auferido no projecto especializado de desenvolvimento imobiliário conjunto;
j) O 1º Réu A, J e K prometem que, no prazo de 60 dias a contar da celebração do presente contrato e 10 dias a contar da aprovação da planta de construção por parte da DSSOPT, irão pagar mais HKD5,000,000.00 e HKD30,000,000.00 à D Macau, como também adiantar MOP493,000,000.00 para ser depositado no processo judicial do Tribunal de Macau a título da D Macau, a fim de reembolsar a dívida que o Banco F de Macau intentou em execução junto do Tribunal, sendo o montante devolvido no futuro pela dedução prioritária do rendimento auferido no projecto especializado de desenvolvimento imobiliário conjunto;
k) Após a constituição da 2ª Ré C, Limitada, realizou-se a sessão plenária dos sócios no dia 14 de Dezembro de 2005, confirmando o conteúdo do “Contrato-Promessa de Compra e Venda” e da “Declaração” celebrados entre D Macau e J, como também que no futuro os direitos e interesses do terreno sito em Macau, Estrada XX n.ºs XX terão de ser restituídos à 2ª Ré;
l) No dia 08 de Maio de 2005, sob a presença do Dr. H. Miguel de Senna Fernandes de Macau, J, a 2ª Ré C, Limitada, e D Macau, as três partes celebraram em conjunto o documento de “Alienação dos Direitos e Interesses emergentes do Contrato-Promessa de Compra e Venda”. A 2ª Ré C, Limitada, assume a posição contratual de promitente-comprador do terreno sito em Macau, Estrada XX n.ºs XX, adquirida por J, bem como os relacionados direitos e interesses;
m) Em 07 de Março de 2006, o 1º Réu A adquiriu parte da quota social da C, Limitada, detida por I, isto é, uma acção de MOP2,000.00;
n) Em 08 de Maio de 2006, o 1º Réu adquiriu, separadamente, parte das quotas sociais da C, Limitada, detidas por I, K e J, isto é, uma acção de MOP2,000.00, uma acção de MOP10,000.00 e uma acção de MOP10,000.00, respectivamente;
o) Deste modo, até Novembro de 2006, o 1º Réu A acabou por adquirir uma quota da C, Limitada, de MOP34.000,00, tomando-se no sócio maioritário;
p) Em 17 de Novembro de 2006, o Autor B compareceu juntamente com o 1º Réu A e I na sessão plenária dos sócios da C, Limitada, tendo o conselho dos sócios tomado a seguinte deliberação sobre os direitos e deveres respeitantes ao projecto imobiliário do terreno sito em Macau, Estrada XX n.ºs XX:
1. Concordam, na desistência, por parte da C, Limitada, dos direitos e deveres emergentes da aquisição do terreno sito em Macau, Estrada XX n.ºs XX, efectuada pelo antigo sócio J a 29 de Outubro de 2005, em representação desta companhia, incluindo o “registo provisório” procedido a título de J na CRP de Macau;
2. Concordam em transferir a A (ora Réu) todos os direitos e deveres emergentes dos montantes pagos, assim como documentos referentes ao aludido do terreno celebrados entre a C, Limitada e D Macau, passando a ser A a responsabilizar-se, a título individual, pelo respectivo direito de fruição e prosseguição do cumprimento;
3. O 1º Réu A declara, a título de sócio da 2ª Ré, que concorda em compensar ao sócio I HKD240,000,000.00 (incluindo o montante pago de cento e dez milhões de dólares de Hong Kong, as despesas de desalojamento provisoriamente descontadas de vinte milhões, os honorários de dez milhões, o montante em dívida de L de dez milhões), uma vez que o remanescente de HKD90,000,000.00 terá que ser pago ao sócio I na data em que o 1º Réu A celebra, a título individual, com D Macau a escritura de compra e venda respeitante ao aludido terreno;
4. O 1º Réu A declara, a título de sócio da 2ª Ré, que concorda em compensar ao sócio B (ora Autor) HKD20,000,000.00, uma vez que o montante terá que ser pago na data em que o 1º Réu A celebra, a título individual, com D Macau a escritura de compra e venda respeitante ao aludido terreno;
5. A C, Limitada, concorda que após o vencimento ou vencimento parcial da acção processual de hipoteca alusiva à D Macau e Banco F de Macau, S.A., o valor será distribuído em 50% para o sócio A (ora Réu), 25% para o sócio I, 25% para o sócio B (ora Autor);
q) O processo de execução nº CV3-05-0042-CEO do TJB de Macau trata-se de uma acção intentada pelo Banco F de Macau, S.A., através do contrato de mútuo com hipoteca acima referido, contra as mutuárias Companhia de Fomento Predial M, Limitada e Companhia de Fomento e investimento predial N, Limitada, assim como a fiadora D Macau, cujo valor de execução é de MOP1,252,166,667.56;
r) O Banco F de Macau, S.A. procedeu ao registo de penhora do terreno sito em Macau, Estrada XX n.ºs XX, com base neste processo;
s) D Macau celebrou, a 11 de Dezembro de 2006, no Notário Privado Fong Kin Ip de Macau, uma “Procuração com Poderes Especiais” que abrange o seguinte:
1. D Macau concorda em conceder ao 1º Réu, para a sua execução, as competências pertencentes ao proprietário do terreno sito em Macau, Estrada XX n.ºs XX;
2. A procuração abrange o poder de efectuar negócio consigo mesmo.
t) Em 02 de Fevereiro de 2009, o Autor interpelou, por carta registada com aviso de recepção, o 1º Réu A para o pagamento da compensação no valor de HKD20,000,000.00;
u) Por acção interposta em 24.10.2005 nos autos CV3-05-0042-CEO, o exequente Banco F pediu à Companhia D, proprietária do bem onerado com a garantia real- prédio nº XX da XX - pelo pagamento da quantia global de MOP576,326,010.25;
v) A hipoteca do prédio em causa prévia o montante máximo assegurado de MOP493,520,000.00;
w) Aos 06 de Dezembro de 1991, D Macau, e a Companhia de Fomento Predial M, Limitada (em chinês M地產置業投資有限公司, companhia limitada registada em Macau, cuja sede se situa em Macau, Avenida XX, Edifício XX, XXº andar XX, celebraram um “Contrato-Promessa de Compra e Venda” nos Escritórios dos Advogados XX, no qual consta que D Macau promete vender os nºs 14-17 da Estrada Marginal da Ilha Verde de Macau à Companhia de Fomento Predial M, Limitada, pelo preço de HKD420,000,000.00;
x) O 1º Réu A aceitou pagar o montante de MOP493,520,000.00 no processo de execução que correu termos neste tribunal sob o nº CV3-05-0042-CEO em que é exequente o Banco F de Macau, S.A., na condição da D Macau passar uma procuração a conceder ao 1º Réu as competências relativas ao direito de propriedade do terreno sito em Macau, Estrada XX n.ºs XX, garantindo deste modo o risco que aquele assumia ao pagar aquele montante;
y) A companhia E representada por A e a companhia D prometeram comprar e vender respectivamente o prédio do nº XX da XX pelo preço de HKD188,300,000.00, responsabilizando-se ainda o adquirente pelo pagamento do montante máximo assegurado de MOP493,520,000.00 ao Banco F no valor global de MOP687,469,000.00 (193,949,000.00 + 493,520,000.00);
z) O acordado em n) está sujeito à condição de que A vai continuar com todos os direitos e deveres do contrato-promessa de aquisição do prédio nº XX da XX de J, celebrado em 29.10.2005;
aa) A situação / condição acima referida nunca foi concretizada;
bb) A entregou ao Autor B no dia 20.12.2006 o cheque n° 229430 do Banco XX no valor de HKD2.000.000,00, no dia 06.02.2007 o cheque nº 22XXX5 do Banco XX no valor de HKD2,000,000.00 e no dia 25.10.2007 o cheque nº 22XXX0 do Banco XX no valor de HKD5,000,000.00;
cc) Quem pagou a quantia de MOP581,000,000.00, em nome da D foi E, mediante um cheque 396051 do Banco XX.
*
III – Fundamentação
1. Da eventual inexactidão no elenco dos factos apurados:
Para o 1º Réu, a forma de elencar os factos apurados constantes da sentença recorrida (sob a forma de alíneas a) a cc)) pode criar uma errada interpretação da factualidade apurada, uma vez que, para além dos factos assentes serem identificados por alíneas, na formulação dos quesitos que integram a base instrutória foram feitas remissões para as mesmas.
Adiantamos que não lhe assiste mínima razão.
Em primeiro lugar, o 1º Réu não indicou concretamente que erro de interpretação de factos foi cometido pelo Tribunal a quo em consequência desta alegada inexactidão, apenas suscitou que poderia haver esta hipótese.
Ora, este TSI, como Tribunal de recurso, nunca aprecia as questões meramente hipotéticas.
Em segundo lugar, da análise da sentença recorrida não resulta qualquer erro de interpretação por parte do Tribunal a quo. Bem pelo contrário, o Tribunal a quo tem o cuidado de alterar a letra das alíneas constantes nos factos de forma a evitar a possibilidade de confusão.
Por exemplo, o quesito 12º da base instrutório fez referência ao acordado em M) e este quesito foi dado como provado.
O facto assente sob al. M) no despacho saneador corresponde a al. n) dos factos apurados da sentença recorrida e o facto provado do quesito 12º foi elencado na sentença recorrida sob a al. z).
Nesta última, o Tribunal a quo, em vez de escrever “o acordado em M)” tal como consta da versão originária do quesito 12º, alterou conscientemente para “o acordado em n)”, de forma a manter a mesma correspondência.
Pelo exposto, é de indeferir o pedido de rectificação, condenando a ora Recorrente nas custas do incidente com 2UC taxa de justiça.
2. Da insuficiência de factos:
Entende o 1º Réu que a factualidade assente e provada não é suficiente para uma boa decisão do mérito da causa, pois, para ele, tendo em conta o teor do Acordo de 17/11/2006, é indispensável apurar os seguintes factos:
21º
   Após o 1.º Réu, A, ter pago o montante de MOP$581.000.000,00, para expurgar o prédio da hipoteca constituída a favor do Banco F, a companhia "D Macau", representada por G, no dia 9 de Novembro de 2007, revogou, unilateralmente, a procuração outorgada em 11 de Dezembro de 2006, passada em favor de A, conferindo-lhe poderes para efectuar negócio consigo mesmo? (facto alegado na Contestação - artigo 32.º - e suportado pelo doc. n.º 7, com ela junto).
22º
   No dia 22 de Fevereiro de 2008, a companhia "D Macau", representada por G e a companhia "H", no âmbito do processo CV3-07-0049-CAO, intentado por esta contra aquela, procederam uma transacção e com base nessa transacção foi registada em 3 de Março de 2008, junto da C.R.P., a hipoteca judicial, onerando o prédio prometido a vender à companhia E, no valor de HKD597.617.324,00? (facto alegado na Contestação - art.º 33.º e suportado pelo doc. n.º 8, com ela junto).
23º
   Tendo sido revogada em 9 de Novembro de 2007, a procuração outorgada em 11 de Dezembro de 2006, o 1.º Réu, A, ficou impossibilitado de celebrar a escritura pública de compra e venda que iria formalizar a transmissão do terreno sito em Macau na Estrada XX n.ºs XX, para a Companhia E?
24.º
   No dia 11 de Julho de 2008, a companhia D intentou, contra a companhia E, uma acção judicial com vista à obtenção da declaração de nulidade do contrato-promessa de compra e venda do terreno sito em Macau na Estrada XX n.ºs XX, celebrado com a companhia E em 18/1/2007, a qual correu termos sob o número de processo CV2-08-0048-CAO? (facto alegado na Contestação - art.º 59.º - e suportado pelo doc. n.º 16, junto com requerimento de 2/12/2013).
25.º
   A celebração da escritura pública de compra e venda do imóvel, através da qual o imóvel, a que se referem os autos, foi transmitido da "D Macau" à "E Limitada", ocorreu no dia 10 de Janeiro de 2009, tendo sido intervenientes no acto os respectivos representantes das partes contratantes e sem recurso a qualquer outra procuração conferindo poderes ao 1.º Réu, A?
Quid júris?
Cremos que assiste razão ao 1º Réu.
Antes de mais, não podemos sufragar a posição do Tribunal a quo no sentido de que o “acto de disposição praticado com uma procuração que lhe outorga poderes para fazer negócio consigo mesmo, permite-nos concluir que a condição referida no nº 4 do acordo de 17 de Novembro de 2006 – cf. al. p) – se verificou”.
O Acordo de 17/11/2006 tem as seguintes cláusulas:
1. Concordam, na desistência, por parte da C, Limitada, dos direitos e deveres emergentes da aquisição do terreno sito em Macau, Estrada XX n.ºs XX, efectuada pelo antigo sócio J a 29 de Outubro de 2005, em representação desta companhia, incluindo o “registo provisório” procedido a título de J na CRP de Macau;
2. Concordam em transferir a A (ora Réu) todos os direitos e deveres emergentes dos montantes pagos, assim como documentos referentes ao aludido do terreno celebrados entre a C, Limitada e D Macau, passando a ser A a responsabilizar-se, a título individual, pelo respectivo direito de fruição e prosseguição do cumprimento;
3. O 1º Réu A declara, a título de sócio da 2ª Ré, que concorda em compensar ao sócio I HKD240,000,000.00 (incluindo o montante pago de cento e dez milhões de dólares de Hong Kong, as despesas de desalojamento provisoriamente descontadas de vinte milhões, os honorários de dez milhões, o montante em dívida de L de dez milhões), uma vez que o remanescente de HKD90,000,000.00 terá que ser pago ao sócio I na data em que o 1º Réu A celebra, a título individual, com D Macau a escritura de compra e venda respeitante ao aludido terreno;
4. O 1º Réu A declara, a título de sócio da 2ª Ré, que concorda em compensar ao sócio B (ora Autor) HKD20,000,000.00, uma vez que o montante terá que ser pago na data em que o 1º Réu A celebra, a título individual, com D Macau a escritura de compra e venda respeitante ao aludido terreno; e
5. A C, Limitada, concorda que após o vencimento ou vencimento parcial da acção processual de hipoteca alusiva à D Macau e Banco F de Macau, S.A., o valor será distribuído em 50% para o sócio A (ora Réu), 25% para o sócio I, 25% para o sócio B (ora Autor).
A condição em referência foi estabelecida na cláusula nº 4 do Acordo.
Como se vê, só há lugar o pagamento da compensação no valor de HKD$20.000.000,00 na data da celebração da escritura pública de compra e venda do terreno.
Ora, uma coisa é conferir uma procuração com poder especial de celebrar negócio consigo mesmo, outra é a celebração da escritura compra e venda.
Munido da procuração com aquele poder especial não significa necessariamente que houve celebração da escritura pública de compra e venda.
Pois, a procuração pode ser livremente revogada a não ser que tiver sido conferida no interesse do procurador. Mesmo neste último, é ainda revogável com justa causa (cfr. nºs 2 e 3 do artº 258º do C.C.).
Também pode ser extinta com a renúncia do procurador (cfr. nº 1 do artº 258º do C.C.).
Nesta conformidade, não é correcto afirmar que a condição em referência verifica-se com a simples emissão da dita procuração.
No caso em apreço, o 1º Réu invocou na contestação, além da inverificação da condição, a excepção de incumprimento e a resolução do Acordo de 17/11/2006 por alteração anormal das circunstâncias.
Para o efeito, alegou, no essencial, que:
- Os pagamentos estabelecidos no Acordo de 17/11/2006 são feitos no pressuposto de que o preço da venda do terreno é de HKD$188.300.000, acrescida da responsabilidade decorrente da hipoteca sobre o terreno no montante máximo de MOP$493.520.000,00.
- No entanto, em vez de pagar a quantia de MOP$493.520.000,00 como responsabilidade máxima da hipoteca, pagou a quantia de MOP$581.000.000,00.
- A procuração com poderes especiais foi emitida a favor do 1º Réu para garantir o risco que ele assumiu com o pagamento do montante de MOP$493.520.000,00 no processo de execução sob o nº CV3-05-0042-CEO, decorrente da responsabilidade hipoteca bancária sobre o terreno.
- Após o pagamento da quantia exequenda no valor de MOP$581.000.000,00 em 14/03/2007, a Companhia D Limitada, em 09/11/2007, revogou unilateralmente a aludida procuração.
- Além disso, em 22/02/2008, acordou com a Companhia H (também conhecida por M), Autora no Proc. nº CV3-07-0049-CAO, uma transacção nos termos da qual D assumiu a responsabilidade de pagar à H, quantia de HKD$597.617.324,00, não obstante o pedido no referido processo era apenas no valor de HKD$206.000.000,00.
- Com esta transacção homologada por sentença, H conseguiu registar em 03/03/2008 a hipoteca judicial sobre o terreno, prejudicando assim o 1º Réu e a Companhia E Limitada.
- A referida acção sob o nº CV3-07-0049-CAO foi interposta em 20/07/2007, uns meses depois do depósito da quantia exequenda no Proc. nº CV3-05-0042-CEO pela Companhia E em nome da Companhia D.
- A causa de pedir da referida acção CV3-07-0049-CAO consiste na violação culposa por parte da Companhia D do contrato promessa de compra e venda do terreno de 06/12/1991.
- No entanto, já em 23/01/2005, a Autora do referido processo CV3-07-0049-CAO (Companhia H), juntamente com a Companhia N, subscreveram e enviaram uma carta à D, confessando que não podiam cumprir o contrato promessa de compra e venda de 06/12/1991 e do acordo suplementar de 15/03/1993, pedindo a resolução dos mesmos com a condição de que D assumia a hipoteca efectuada junto do Banco F (o que originou o processo de execução nº CV3-05-0042-CEO, sendo as Companhias H e N devedores e D hipotecante).
- As companhias H, N e D assinaram, no dia 02/03/2005, um acordo e na cláusula nº 2 desse acordo as partes acordaram resolver o contrato promessa de compra e venda do terreno referido nos autos e do acordo suplementar de 15/03/1995.
- Contudo, após o depósito da quantia exequenda no processo de execução em referência pela E em nome de D, surgiu então a acção nº CV3-07-0049-CAO e posterior a aludida “transacção”.
- O Autor teve pleno conhecimento de todas as actuações dolosas acima referidas da Companhia D e contribuiu ainda para o efeito.
- O Autor a partir de dada altura (pelo menos em Janeiro de 2012), veio em representação da companhia D anunciar através de meios de comunicação social -
tanto nos jornais como nas televisões - que a companhia D nunca tinha vendido o prédio do nº XX da XX a quem quer que seja e que ainda hoje o prédio está a ser administrado pela companhia D e que os lucros do futuro desenvolvimento do prédio deveriam ser repartidos na proporção de 50% para cada uma das companhias D e E, em conformidade com o plano de desenvolvimento do ano de 2005 que está ainda em pleno vigor.
- No depoimento do passado dia 25/07/2013, no âmbito da Acção ordinária onde se discute a simulação de compra e venda do mesmo imóvel (CV3-10-0005-CAO), o Autor disse que o plano de desenvolvimento do prédio nº XX da XX entre a sua companhia representada D e a companhia E ainda em pleno vigor e que nunca houve desistência do plano nem havia qualquer intenção da venda por parte da companhia D.
- No dia 11/07/2008, a companhia D intentou contra a companhia E acção judicial com vista à obtenção de declaração de nulidade do contrato-promessa de compra e venda celebrado com a companhia E e datada de 18/01/2007, a qual correu termos sob o número de processo CV2-08-0048-CAO).
Dispõe o nº 1 do artº 430º do CPC que o juiz deve, no despacho saneador, seleccionar a matéria de facto relevante, segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito, indicando os factos que considera assentes e os factos que, por serem controvertidos, integram a base instrutória.
Ora, a maioria dos factos acima referidos e alegados pelo 1º Réu não foram considerados pelo Tribunal a quo, o que nos se afigura ter violado o disposto do nº 1 do artº 430º do CPC, gerando a insuficiência da matéria de facto para a boa decisão da causa, o que implica a anulação da sentença recorrida.
Pois, tais factos, uma vez assentes ou provados, são susceptíveis de constituir uma solução plausível da questão de direito, nomeadamente para a eventual excepção de incumprimento e/ou a resolução do acordo por alteração anormal das circunstâncias.
Face ao expendido, o recurso não deixará de se julgar provido nesta parte, e, em consequência, há-de revogar a sentença recorrida e mandar baixar os autos ao Tribunal a quo para nova selecção da matéria de facto em falta e se proceder ao novo julgamento para o efeito, sem prejuízo da decisão da matéria de facto entretanto já fixada que não foi qualquer objecto de impugnação.
3. Da impugnação da decisão da matéria de facto por obscuridade, deficiência e contradição entre factos provados e não provados:
O 1º Réu impugna a matéria de facto, por incontornável obscuridade, nos seguintes pontos:
- O quesito 12.º com a seguinte formulação: "O acordado em M) está sujeito à condição de que A vai continuar com todos os direitos e deveres do contrato-promessa de aquisição do prédio nº XX da XX de J, celebrado em 29.10.2005?" teve como resposta "Provado".
- Ora, a alínea M) dos factos assentes tem a seguinte formulação: "Em 08 de Maio de 2006, o 1.º Réu adquiriu, separadamente, parte das quotas sociais da C, Limitada, detidas por I, K e J, isto e, uma quota de MOP$2.000,00, uma quota de MOP$10.000,00 e uma quota de MOP10.000,00, respectivamente".
- Como se pode constatar, da alínea M) dos factos assentes, não consta qualquer acordo; consta sim um facto real que ocorreu numa determinada data, isto é, o 1.º Réu adquiriu, em 08 de Maio de 2006, parte das quotas da "C, Limitada", tal como já adquirira, "em 7 de Março de 2006, o 1.º Réu A adquiriu parte da quota social da C, Limitada, detida por I, isto é, uma quota de MOP$2.000,00" (cfr. alínea L) dos factos assentes) e em "Novembro de 2006, o 1.º Réu A acabou por adquirir uma quota da C, Limitada, de MOP$34.000,00, tomando-se no sócio maioritário" (cfr. alínea N) dos factos assentes).
- Então, é legítimo que qualquer destinatário da decisão questione a que acordo se refere a matéria vertida no quesito 12.º, dando-se como certo que a alínea M) dos factos assentes não se refere a qualquer acordo.
- E como interpretar o quesito 13.º cuja resposta foi "provado", com a seguinte formulação: "A situação/condição acima referida nunca foi concretizada?", atendendo a que "acima referida" pode ser entendida como a referida no quesito 12.º que, por sua vez, está relacionada com a alínea M) dos factos assentes?
- E como conjugar as duas respostas positivas, isto é, que está provado que "o acordado em M) está sujeito à condição de que A vai continuar com todos os direitos e deveres do contrato-promessa de aquisição do prédio n.ºs 14-17 da Ilha Verde de J, celebrado em 29.10.2005" (quesito 12.º) mas tal "situação/condição nunca foi concretizada" (quesito 13.º), atendendo a que a alínea M) dos factos assentes tem a formulação "em 08 de Maio de 2006, o 1.º Réu adquiriu, separadamente, parte das quotas sociais da C, Limitada, detidas por I, K e J, isto e, uma quota de MOP$2.000,00, uma quota de MOP$10.000,00 e uma quota de MOP10.000,00, respectivamente"?
- Sendo legítimo que qualquer destinatário da decisão em impugnação questione a falta de clareza nas respostas dadas a estes dois quesitos, quando, na fundamentação de facto do douto Acórdão da Matéria de facto, os Exm.ºs Julgadores fizeram constar: "(…) No que concerne às respostas aos itens 12.º e 13.º a resposta dada resulta da interpretação do contrato-promessa de compra e venda de 29.10.2005 a fls. 122/123 e o acordo que consta do documento a fls. 124/126, juntamente, com os factos assentes das alíneas M) e P). Conforme a cláusula 2.1. do Acordo de Desenvolvimento do Terreno e Cooperação a fls 124/126, D vai contribuir com o terreno. A contribuição será feita da seguinte forma: D já tinha celebrado o contrato-promessa de compra e venda com J, como representante da 2.ª Ré e esse terreno vai ser vendido à 2.ª Ré passando a pertencer-lhe. Do mesmo modo o acordo dado por assente em M) com base no documento de fls 129, podemos concluir que o 1.º Réu apenas comprou as quotas sociais detidas por K, J e O, porque J cedeu a sua posição de promitente-comprador à 2.ª Ré. Na acta referida no facto assente sob a alínea P) ficou expressamente acordado que a 2.ª Ré desiste da promessa de aquisição feita pelo J e o contrato-promessa de compra e venda do terreno fica para o 1.º Réu. Logo a resposta a ambos os itens apenas pode ser positiva." (cfr. último parágrafo de fls 15 e fls 16 do Acórdão da matéria de facto de 27 de Fevereiro de 2018, a fls 1307 dos autos).
- Resulta desta fundamentação, que os Exm.ºs Julgadores da matéria de facto, para responderem aos quesitos 12.º e 13.º - dois quesitos interligados entre si e com uma remissão para a alínea M) dos factos assentes -, tomaram em consideração toda a matéria de facto dada por assente, no despacho saneador, constante das alíneas E), F), J), K), M) e P) dos factos assentes.
- Foi, pois, feita, pelo Ilustre Colectivo que julgou a matéria de facto, a interpretação de vários acordos celebrados entre a pessoa colectiva, a sociedade comercial "D Macau" e várias pessoas singulares, tudo indicando que, efectivamente, lá onde se fez constar, no quesito 12.º, "o acordado em M) (…)", talvez se pretendesse escrever "O acordado em K) (…)", atendendo a que, esta alínea dos factos assentes tem a seguinte formulação: "No dia 08 de Maio de 2005, na presença do Dr. H Miguel de Senna Fernandes de Macau, J, a 2.ª Ré C, Limitada, e D Macau, as três partes celebraram em conjunto o documento de "Alienação dos Direitos e Interesses emergentes do Contrato Promessa de Compra e Venda". A 2.ª Ré C, Limitada, assume a posição contratual de promitente-comprador do terreno sito em Macau, Estrada XX n.ºs XX, adquirida por J, bem como os relacionados direitos e interesses - vide documento 16 da p.i.".
- Decididamente, não é linear esta interpretação feita pelo ora Recorrente, podendo, dada a complexidade dos acordos feitos, ser mencionada, em tal quesito, qualquer outra alínea dos factos assentes - E), F), J), K), M) e P) - ou todas elas; com a ressalva de todo o respeito pelo Ilustre Colectivo que julgou a matéria de facto, aqui está identificada uma obscuridade nas respostas aos quesitos 12.º e 13.º, que não foi eliminada pela respectiva fundamentação (acima transcrita).
Tem razão o Recorrente, uma vez que a al. M) dos Factos Assentes não contém qualquer acordo, o que torna ininteligível a resposta dada aos quesitos 12º e 13º da Base Instrutória.
Nesta conformidade, é de revogar a decisão da matéria de facto em relação aos quesitos e o Tribunal a quo tem de reformular os quesitos 12º e 13º e responder de novo.
4. Da contradição insanável/errada interpretação dos factos:
O conhecimento desta parte do recurso já fica prejudicado com a decisão no ponto nº 2, pelo que não é apreciado recurso nesta parte.
*
IV – Decisão
Nos termos e fundamentos acima expostos, acordam em conceder provimento ao recurso interposto, revogando a sentença recorrida, determinando a baixa dos autos ao Tribunal a quo para os efeitos acima consignados.
*
Custas do recurso pelo Autor.
Notifique e registe.
*
RAEM, aos 27 de Junho de 2019.

_________________________
Ho Wai Neng
_________________________
José Cândido de Pinho
_________________________
Tong Hio Fong



32
1096/2018