Proc. nº 343/2019
Recurso jurisdicional em matéria laboral
Relator: Cândido de Pinho
Data do acórdão: 25 de Julho de 2019
Descritores:
- Prescrição
- Excepção peremptória e substancial
- Descanso semanal ao 7º dia
SUMÁRIO:
I - A prescrição é excepção peremptória e a sua natureza é material ou substantiva. Nessa medida, a sua procedência gera a extinção do direito do autor e determina a improcedência total ou parcial da acção (art. 407º, nº2, al. b), do CPC) com a consequente absolvição total ou parcial do pedido (art. 412º, nº3, do cit. código).
II - Quando o tribunal julga procedente uma excepção peremptória produz uma decisão de mérito, ao contrário do que sucede com as excepções dilatórias, que, quando procedem, obstam a que o tribunal conheça do mérito e dão lugar à absolvição da instância (art. 412º, nº2, do CPC).
III - A partir do momento em que o tribunal decide a excepção peremptória de prescrição, produz uma decisão com a qual esgota o seu poder jurisdicional sobre a respectiva matéria (cfr. art. 569º, nº1, do CPC) e já só pode rectificar erros materiais, suprir nulidades, esclarecer dúvidas e reforma-la quanto a custas e multa (art. 569º, nº2, do CPC).
IV - Essa decisão já só pode ser modificada, ou revogada, em sede de recurso, e não pode o tribunal declará-la nula, nem oficiosamente, nem em sede de reclamação.
V - O artigo 17º, nº1, do DL nº 24/89/M impõe que o dia de descanso semanal seja gozado dentro de cada período de 7 dias, ao fim do 6º dia de trabalho consecutivo.
Proc. nº 343/2019
Acordam no Tribunal de Segunda Instância da RAEM
I – Relatório
A, solteiro, maior, de nacionalidade nepalesa, residente habitualmente em Macau, no XX no.XX, Edifício XX, XXº andar, Flat XX, titular do Passaporte da República da Nepalesa nº 1XXXXX98 de 02 de Abril de 2017, emitido pela autoridade competente da República Democrática Federal do Nepal, ----
Instaurou no TJB (Proc. nº LB1-18-0047-LAC) contra:
1.º - B, com sede na Avenida de XX, Hotel XX, XX.º andar, Macau, ----
E ----
2.º - C, com sede na Avenida de XX, Hotel XX, XX.º andar, Macau,
Acção de processo comum do trabalho, ----
Pedindo a condenação das rés no pagamento de créditos laborais.
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No despacho saneador, o juiz titular do processo, conhecendo da excepção invocada pelas rés, julgou prescritos os créditos reclamados pelo autor contra a 1ª ré, desde o início da relação laboral até 2/04/2003.
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A fls. 109-110, o autor apresentou “reclamação” contra este despacho, na parte em que conheceu da prescrição, na sequência do que o Ex.mo Juiz, por despacho de fls. 116-118, declarou a nulidade do despacho “reclamado” e reapreciou a excepção de prescrição suscitada pelas rés na sua contestação, julgando-a, desta vez, improcedente.
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Foi contra este despacho que as rés interpuseram recurso jurisdicional (interlocutório), que foi admitido com subida diferida, e em cujas alegações as rés formularam as seguintes conclusões:
“I. Vem o presente recurso interposto do douto Despacho proferido a fls. 116 e 117 dos autos.
II. As Rés, ora Recorrentes, não se conformam com o aludido Despacho, por entenderem que o mesmo incorre em erro na aplicação de Direito, pugnando pela revogação do mesmo por banda desse Venerando Tribunal de Segunda Instância da RAEM.
III. Em 09/03/2018, o Autor, ora Recorrido, intentou contra as aqui Recorrentes a presente acção de processo comum do trabalho, peticionando a condenação da 1ª Ré B no pagamento de uma indemnização global de MOP$150.851.00, e da 2ª Ré C no valor global de MOP$232,758.00, a título de créditos laborais emergentes das relações laborais do Autor com as Rés, ora Recorrentes, alegando para tanto, entre outros factos, que o Autor prestou serviço à 1ª Ré B entre 22 de Junho de 2001 e 21 de Julho de 2003, e prestou serviço à 2ª Ré C desde 22 de Julho de 2003.
IV. Em sede de contestação, as Rés aduziram uma defesa por excepção, arguindo a prescrição parcial dos créditos laborais reclamados pelo Autor emergentes da relação laboral com a 1ª Ré B, nos termos do disposto nos artigos 311, n.º 1, alínea c) e 315.º, n.º 1, ambos do Código Civil.
V. O Autor apresentou resposta, alegando, em suma, que os créditos reclamados pelo Autor não se encontram prescritos.
VI. Em sede de Despacho Saneador, proferido a fls. 103 a 106 dos autos, foi a referida excepção peremptória julgada procedente, tendo sido declarados prescritos os créditos reclamados pelo Autor, nos termos invocados pela 1ª Ré, isto é, desde o início da relação laboral até 02/04/2003, data da notificação da 1ª Ré para a tentativa de conciliação.
VII. O Autor veio apresentar Reclamação desta decisão, a fls. 109 e 110 dos autos, a qual mereceu resposta por parte das ora Recorrentes, constante de fls. 112 e 115.
VIII. A Meritíssima Juiz por douto Despacho de fls. 116 e 117 dos autos, o Despacho ora recorrido, concordou com o teor da reclamação do Autor e julgou improcedente a excepção peremptória da prescrição.
IX. O Despacho recorrido carece de fundamento legal, não podendo acolher-se o entendimento sufragado pelo Autor na sua Reclamação de fls. 109 e 110 dos autos.
X. O Autor usou do meio processual impugnatório errado para o efeito, pelo que a Reclamação não deveria ter sido processualmente admitida pela Meritíssima Juiz.
XI. O douto Despacho Saneador a fls. 103 a 106, na parte em que decidiu da excepção peremptória invocada pelas Rés, transitou materialmente em julgado, não podendo a Meritíssima Juiz alterar tal decisão, vindo agora pugnar pela improcedência da mesma.
XII. A Meritíssima Juiz julgou procedente a excepção peremptória de prescrição arguida pelas Rés, qual seja a prescrição parcial dos créditos laborais reclamados pelo Autor emergentes da relação laboral com a 1ª Ré B, decisão que ficou consolidada e sedimentada na ordem jurídica, para todos os efeitos legais, não mais podendo ser alterada, seja por quem for.
XIII. A Meritíssima Juiz julgou procedente a aludida excepção peremptória de prescrição, por douto Despacho Saneador proferido a fls. 103 a 106.
XIV. Desta decisão proferida pela Meritíssima Juiz caberia recurso ordinário para o Tribunal de Segunda Instância, previsto nos artigos 600.º e seguintes do CPC, e não Reclamação.
XV. O Autor não recorreu desta decisão, reclamou.
XVI. O douto Despacho Saneador a fls. 103 a 106 transitou em julgado, i.e., fez caso julgado material, na parte em que se decidiu da excepção peremptória invocada pelas Rés, cfr. dispõe o artigo 574.º, n.ºs 1 e 2 e 582.º, ambos do CPC.
XVII. A procedência desta excepção peremptória conduz à improcedência da acção nesta parte e à absolvição da Ré B dos concretos pedidos contra si peticionados, nos termos do disposto nos artigos 412.º, n.º 3 e 407.º n.º 2, alínea b) in fine, ambos do CPC.
XVIII. Proferido que está este Despacho fica imediatamente esgotado o poder jurisdicional da Meritíssima Juiz a este respeito e sobre esta matéria, cfr. decorre do artigo 569.º, n.º 3 do CPC.
XIX. A Meritíssima Juiz carecia de competência e poderes processuais para “rectificar omissões” constantes do douto Despacho Saneador de fls. 103 a 106, e com isto alterar a decisão que proferiu relativamente à excepção peremptória invocada pelas Rés, a prescrição parcial dos créditos laborais do Autor emergentes da relação laboral com a 1ª Ré.
XX. O douto Despacho Saneador a fls. 103 a 106 transitou em julgado, i.e., fez caso julgado material, na parte em que decidiu da excepção peremptória invocada pelas Rés, cfr. dispõe o artigo 574.º, n.ºs 1 e 2 e 582.º, ambos do CPC, e, em consequência, imediatamente ficou extinto o poder jurisdicional da Meritíssima Juiz sobre esta matéria, cfr. decorre do artigo 569.º, n.º 3 do CPC.
XXI. Deverá este Venerando Tribunal de Segunda Instância da RAEM revogar a decisão constante do douto Despacho proferido a fls. 116 e 117 dos autos, isto é, a decisão de julgar improcedente a excepção peremptória da prescrição invocada pelas Rés, ora Recorrentes, mantendo-se na íntegra a decisão constante do douto Despacho Saneador proferido a fls. 103 a 106, a qual já transitou em julgado, o que desde já se requer para todos os efeitos legais.
XXII. Esta nova decisão constante do douto Despacho de fls. 116 a 117 dos autos carece de razão de sustento.
XXIII. Verificou-se, in casu, uma efectiva cessação - termo - do contrato de trabalho, o que conduz à prescrição dos créditos laborais emergentes da relação laboral subjacente a esse contrato de trabalho, nos termos do disposto no artigo 27.º, n.º 3 do CPT, e artigos 302.º, 311.º, n.º 1, alínea c) e 315.º, n.º 1, todos do CC.
XXIV. Não se pode concluir que “o contrato de trabalho originariamente celebrado se manteve”, isto é, que o Autor manteve-se ao serviço agora de outra entidade patronal, a 2ª Ré C, “sob a égide de um só contrato de trabalho”.
XXV. Consta expressamente do Despacho n.º 01949/SEF/2003, proferido pelo Exmo. Senhor Secretário para a Economia e Finanças: “Cancelo, nos termos do n.º 10 do mesmo Despacho, as autorizações anteriormente concedidas ao CASINO XX - B para a contratação de 280 (duzentos e oitenta) trabalhadores não residentes, bem como os respectivos contratos de prestação de serviços”.
XXVI. Por força do Despacho n.º 01949/SEF/2003 não só foi autorizada a transferência das autorizações anteriormente concedidas à 1ª Ré B, para a contratação dos 280 trabalhadores não residentes, como efectivamente foram as mesmas canceladas, impondo-se a celebração, por banda da nova entidade patronal, qual seja a 2ª Ré C, de novos contratos de prestação de serviços, ex novo.
XXVII. Não é verdade que “ainda hoje o Autor permanece ao serviço da 2ª Ré (C) por força da relação de trabalho que iniciou com a 1ª Ré (B)”, conforme vem alegado pelo Autor na sua Reclamação.
XXVIII. No presente caso verificou-se o efectivo termo da relação laboral entre Autor e 1ª Ré B.
XXIX. O Autor formulou pedidos de indemnização diferentes contra cada uma das suas entidades patronais, 1ª e 2ª Rés, reclamando créditos laborais relativos e emergentes de relações laborais distintas, de contratos de trabalho distintos.
XXX. Deve improceder a fundamentação aduzida pela Meritíssima Juiz para justificar a sua nova decisão de julgar improcedente a excepção peremptória da prescrição.
XXXI. O artigo 111.º, n.º 1 do Código Comercial carece de aplicação ao caso sub judice.
XXXII. O artigo 111.º do Código Comercial regula a sucessão nos contratos de trabalho aquando da ocasião de uma transmissão em definitivo da propriedade de uma empresa comercial, o que na gíria comercial se denomina de “trespasse”,
XXXIII. O artigo 111.º do Código Comercial nada tem que ver com as relações laborais outorgadas entre Autor e Rés, entre Recorrido e Recorrentes.
XXXIV. A decisão constante do douto Despacho proferido a fls. 116 e 117 dos autos, isto é, a decisão de julgar improcedente a excepção peremptória da prescrição invocada pelas ora Recorrentes, deverá ser revogada, por violação do disposto nos artigos 311, n.º 1, alínea c) e 315.º, n.º 1, ambos do CC, bem assim das normas adjectivas supra citadas.
Nestes termos e nos mais de Direito que V. Exas. doutamente suprirão, deverá o presente recurso ser julgado procedente, revogando-se o douto Despacho proferido a fls. 116 e 117 dos autos, nos termos e à luz dos fundamentos supra aduzidos, assim se fazendo a costumada JUSTIÇA!”
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Sem concluir, o autor respondeu ao recurso pugnando pelo improvimento do recurso.
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Na oportunidade foi proferida sentença, que julgou a acção parcialmente procedente e condenou, em consequência, as duas rés, a primeira a pagar ao autor a quantia global de MOP$ 143.548,45, e a segunda, a quantia de MOP$ 325.289,16, e juros respectivos.
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Contra esta sentença, veio a 2ª ré recorrer jurisdicionalmente para este TSI, na parte referente à condenação no pagamento da quantia de MOP$ 130.810,00 a título de trabalho em dias de descanso semanal, em cujas alegações formulou as seguintes conclusões:
“I. O presente recurso vem interposto da sentença proferida pelo douto Tribunal Judicial de Base que julgou a acção parcialmente procedente e condenou a Ré, ora Recorrente, no pagamento de uma indemnização ao Autor A, no valor total de MOP$325,289.16 (trezentas e vinte e cinco mil duzentas e oitenta e nove patacas e dezasseis avos) a título de (i) alimentação, (ii) subsídio de efectividade, (iii) devolução das quantias descontadas relativas a comparticipação no alojamento, (iv) compensação pela prestação de 30 minutos para além do período normal de trabalho por cada dia efectivo de trabalho e (v) compensação pelo trabalho prestado pelo Autor após 7 dias de trabalho consecutivo, versando o presente recurso só e apenas sobre a decisão proferida pelo douto Tribunal a quo no que se refere à compensação a título do trabalhe prestado pelo Autor após sete dias de trabalho consecutivo, no valor de MOP$130,810.00 (cento e trinta mil oitocentas e dez patacas).
II. Esta matéria foi incorrectamente julgada pelo Douto Tribunal a quo e também no plane do Direito aplicável ao caso concreto, a sentença proferida a final nunca poderia ter decidido como decidiu em violação e incorrecta aplicação das normas jurídicas que lhe servem de fundamento, estando em crer que a decisão assim proferida pelo douto Tribunal de Primeira Instância padece dos vícios de erro de julgamento e erro nê aplicação do Direito.
III. O Tribunal a quo não interpretou correctamente o sentido da norma ora em crise, DL seja, o artigo 17.º do DL n.º 24/89/M, nem a norma contida no artigo 18.º do mesmo diploma.
IV. A Recorrente não violou o preceituado no referido n.º 1 do artigo 17.º o qual não impõe a regra do descanso ao 7º dia.
V. O legislador refere-se a um período de sete dias, e não ao fim de sete dias, referindo-se, por seu lado, a um período de descanso de vinte e quatro horas sem se referir se e mesmo se refere a um dia, por exemplo, a uma segunda-feira, ou a parte de uma segunda-feira e parte da terça-feira seguinte.
VI. É necessário apurar se o descanso semanal tem de ser gozado sempre após seis dias de trabalho consecutivo, ou seja, no 7º dia, conforme defendia o Autor e veio a ser aceite pelo Tribunal a quo, ou se, atento o sobredito artigo 17.º, o empregador pode escolher, dentro de cada período de sete dias, o momento em que deve ocorrer o descanso, sem necessidade de ter em conta o número de dias consecutivos de trabalho que ocorrem antes e depois do dia de descanso.
VII. Apenas este último entendimento se compatibiliza com o espírito e com a letra da Lei.
VIII. A lei laboral em Macau não proíbe que se trabalhe mais do que seis dias consecutivos mas apenas impõe que em cada período de sete dias, 24 horas consecutivas sejam de descanso e esse descanso pode calhar em qualquer um dos dias desse período de 7 dias, independentemente do número de dias de trabalho consecutivos que lhe precedem ou que se seguem, sendo que o dia de descanso pode, então, ser no 1º dia desse “período de sete dias”, no 2º dia do “período de sete dias”, no 3º dia desse “período de sete dias” ou até mesmo no 7º dia desse “período de sete dias”.
IX. Se em três períodos consecutivos de sete dias for concedido ao trabalhador 1 dia de descanso no primeiro dia do primeiro período de sete dias, outro dia de descanso no segundo dia do segundo período de sete dias e ainda outro dia de descanso no terceiro dia do terceiro período de sete dias, mostra-se cumprida a exigência legal - a de SE conceder “em cada período de sete dias” um dia de descanso.
X. A expressão “em cada período de sete dias” não impõe o momento exacto em que c descanso deve ocorrer, isto é, não impõe que seja no 7º, apenas determina o intervalo de tempo - sete dias - em que esse mesmo descanso deve ser gozado.
XI. No artigo 17.º não se faz menção a dias de trabalho consecutivo mas apenas exige que o período de descanso seja de 24 horas consecutivas em cada período de sete dias sem cuidar de saber quantos dias o trabalhador trabalhou antes desse dia e quantos vai trabalhar depois.
XII. O princípio do descanso semanal não equivale a um princípio de descanso ao sétimo dia ou seja, ao fim de 6 dias de trabalho.
XIII. O artigo 17.º, n.º 1 tem necessariamente de ser interpretado em conjugação com o n.º 2 que reconhece que “de acordo com as exigências de funcionamento da empresa” o período de descanso semanal será organizado pelo empregador, o que reforça que a intenção do legislador não foi impor o dia de descanso ao sétimo dia.
XIV. O legislador não impôs qualquer limitação ao número de dias de trabalho seguidos desde que o trabalhador goze de um período de descanso em cada período de sete dias.
XV. O artigo 18.º do DL 24/89/M expressamente prevê a possibilidade de não se gozar um período de descanso de 24 horas em cada período de 7 dias, caso em que ao trabalhador deve ser concedido um “descanso consecutivo de quatro dias por cada conjunto de quatro semanas ou fracção”.
XVI. Não é imperativo que esse descanso ocorra no sétimo dia de trabalho.
XVII. É necessário apurar no final do ano os dias efectivos de descanso e se o Recorrido tiver que ser compensado será só e apenas dos dias de descanso em falta.
XVIII. Não se impunha à Recorrente que na organização dos turnos dos seus trabalhadores o descanso fosse concedido ao 7º dia, mas apenas que, em cada período de sete dias, 24 horas consecutivas fosse de descanso.
XIX. Não importa que o trabalho seja organizado em turnos rotativos de 7 dias consecutivos findo os quais a entidade patronal concedia um dia de descanso.
XX. Importa determinar se dentro de cada período de sete dias - ou “em cada período de 7 dias” - e tendo em conta a organização dos turnos rotativos, o trabalhador gozou de 24 horas consecutivas de descanso.
XXI. A decisão recorrida na parte em que condena a Recorrente a pagar ao Recorrido uma indemnização pelo trabalho prestado no 7º dia, como se se tratasse de trabalho prestado em dia de descanso semana” está inquinada dos vícios de erro na aplicação do Direito e erro de julgamento, tendo sido violado o princípio do dispositivo consagrado no artigo 5.º do CPC e o disposto nos artigos 17.º e 18.º do DL 24/89/M.
Nestes termos e nos demais de direito que V. Exas. doutamente suprirão, deve ser dado provimento ao presente Recurso e, em consequência, ser revogado o segmento decisório referente à condenação da Ré numa compensação ao Autor no montante de MOP$130,810.00, a título do trabalho prestado pelo após sete dias de trabalho consecutivo, nos termos supra explanados, com as demais consequências legais,
Termos em que farão V. Exas. a costumada JUSTIÇA!”
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Não houve resposta ao recurso.
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Cumpre decidir.
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II – Os Factos
A sentença deu por assente a seguinte factualidade:
“1. O Autor foi recrutado pela D, Lda. para exercer funções de “guarda de segurança” para a 1.ª Ré (B), ao abrigo do Contrato de Prestação de Serviços n.º 2/99, aprovado pelo Despacho n.º 01621/IMO/SACE/99, de 25/06/99. (A)
2. O referido Contrato de Prestação de Serviços foi sucessivamente objecto de apreciação, fiscalização e aprovação por parte da Entidade Pública competente. (B)
3. Desde 27 de Junho de 2001 o Autor esteve ao serviço da La Ré (B) prestando funções de “guarda de segurança”, na qualidade de trabalhador não residente. (C)
4. Por força do Despacho do Senhor Secretário para a Economia e Finanças da RAEM n.º 01949/IMO/SEF/2003, de 17/07/2003, a autorização de contratação e de permanência do Autor (e dos demais 280 trabalhadores “guardas de segurança” de nacionalidade nepalesa que prestavam funções para a 1.ª Ré (B)) foi transferida para a 2.ª Ré (C), com efeitos a partir de 21 de Julho de 2003. (D)
5. Desde de 22/07/2003 até ao presente o Autor - (e os demais 280 trabalhadores de nacionalidade nepalesa) - passou a estar ao serviço da 2.ª Ré (C). (E)
6. Mantendo na 2.ª Ré (C) a mesma categoria profissional, antiguidade e salário que detinha na 1.ª Ré (B). (F)
7. Desde o início da relação de trabalho até Julho de 2010, o Autor recebeu das Rés a quantia de HK$7.500,00, a título de salário de base mensal. (G)
8. Desde o início da relação de trabalho, o Autor sempre respeitou os períodos e os horários de trabalho (em regime de turnos rotativos) fixados expressamente pelas Rés. (1.º)
9. Resulta do ponto 3.1. do Contrato de Prestação de Serviço ao abrigo do qual o Autor exerceu a sua prestação de trabalho para as Rés, ser devido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes com ele contratados) a quantia de “(...) $20,00 patacas diárias por pessoa, a titulo de subsídio de alimentação”. (2.º)
10. Entre 03/04/2003 e 21/07/2003, a 1.ª Ré (B) nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de alimentação. (3.º)
11. Entre 22/07/2003 a 31/12/2006, a 2.ª Ré (C) nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de alimentação. (4.º)
12. Resulta do ponto 3.4. do Contrato de Prestação de Serviços ao abrigo do qual o Autor foi autorizado a prestar trabalho para as Rés, ser devido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes com ele contratados) “(...) um subsídio mensal de efectividade igual ao salário de 4 dias, sempre que no mês anterior não tenha dado qualquer falta ao serviço” (5.º)
13. Durante todo o período em que o Autor prestou trabalho, o Autor nunca deu qualquer falta ao trabalho sem conhecimento e autorização prévia por parte das Rés. (6.º)
14. Entre 03/04/2003 a 21/07/2003, a 1.ª Ré (B) nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de efectividade. (7.º)
15. Entre 22/07/2003 a 31/03/2010, a 2.ª Ré (C) nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de efectividade. (8.º)
16. Entre 27/6/2001 e 21/07/2003, o Autor prestou trabalho nos dias 1 de Outubro de 2001, 1 de Janeiro de 2002, 12 a 14 de Fevereiro de 2002, 1 de Maio de 2002, 1 de Outubro de 2002, 1 de Janeiro de 2003, 1 a 3 de Fevereiro de 2003 e 1 de Maio de 2003 para a 1.ª Ré no total de 12 dias dos feriados obrigatórios. (9.º)
17. A 1.ª Ré (B) não pagou ao Autor uma qualquer quantia adicional (leia-se, um qualquer acréscimo salarial) pelo trabalho prestado nesse referido dia de feriado obrigatório. (10.º)
18. Entre 22/7/2003 e 31/12/2008, o Autor prestou a sua actividade de segurança durante alguns dias não identificados em dias de feriados obrigatórios, por forma a garantir o funcionamento contínuo e diário dos vários Casinos operados pela 2 Ré e, a 2 Ré nunca pagou ao Autor uma qualquer quantia adicional (leia-se um qualquer acréscimo salarial) pelo trabalho prestado nos dias de feriado obrigatórios. (11.º)
19. Durante o referido período de tempo, a 2.ª Ré (C) nunca pagou ao Autor uma qualquer quantia adicional (leia-se, um qualquer acréscimo salarial) pelo trabalho prestado durante alguns dias não identificados de feriado obrigatório. (12.º)
20. Aquando da contratação do Autor no Nepal, foi garantido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes de origem Nepalesa) alojamento gratuito em Macau. (13.º)
21. Desde o início da prestação de trabalho até 31 de Março de 2010, as Rés procederam a uma dedução no valor de HK$750.00 sobre o salário mensal do Autor, a título de “comparticipação nos custos de alojamento”. (14.º)
22. A referida dedução no salário do Autor era operada de forma automática, e independentemente de o trabalhador (leia-se, do Autor) residir ou não na habitação que lhe era providenciada pelas Rés e/ou pela agência de emprego. (15.º)
23. Durante o período da relação de trabalho, o Autor prestou a sua actividade num regime de turnos rotativos. (16.º)
24. Durante todo o período da relação de trabalho, o Autor sempre respeitou o regime de turnos especificamente fixados pelas Rés. (17.º)
25. Durante todo o período da relação de trabalho com a 1.ª Ré (B), o Autor exerceu a sua actividade num regime de 3 turnos rotativos de 8 horas por dia, Turno A: (das 08h às 16h), Turno B: (das 16h as 00h) e Turno C: (das 00h ás 08h). (18.º)
26. Os turnos respeitavam sempre uma mesma ordem sucessiva de rotatividade (A-C)-(B-A)-(C-B), após a prestação pelo Autor (e pelos demais trabalhadores) de sete dias de trabalho continuo e consecutivo. (19.º)
27. Entre o fim da prestação de trabalho no turno C (00h as 08h) e o início da prestação de trabalho no turno B (16h às 00h), o Autor prestava a sua actividade num total de 16 horas de trabalho (correspondente a dois períodos de 8 horas cada) num período de 24 horas. (20.º)
28. De onde resulta que, em cada ciclo de 21 dias de trabalho consecutivos, o Autor prestava trabalho durante um período de 8 horas cada num período de 24 horas, sempre que se operasse uma mudança entre os turnos de C-B. (20.º)
29. O que corresponde à prestação pelo Autor de 8 horas de trabalho para além do seu período normal de trabalho (de 8 horas por ida e 48h por semana), em cada ciclo de 21 dias de trabalho contínuo e consecutivo. (23.º)
30. Por ordem das Rés, o Autor estava obrigado a comparecer no seu local de trabalho devidamente uniformizado com 30 minutos de antecedência relativamente ao início de cada turno, no total de 365.5 horas no período de 27/6/2001 e 21/7/2003 e no total de 964 horas no período de 22/7/2003 e 31/12/2008. (24.º)
31. Durante os 30 minutos que antecediam o início de cada turno, os superiores hierárquicos do Autor distribuíam o trabalho pelos guardas de segurança (leia-se do Autor), v.g., indicando-lhe o seu concreto posto (local dentro do casino onde o mesmo se devia colocar), os clientes tidos por “suspeitos”, sendo ainda feito um relato sobre todas as questões de segurança a ter em conta no interior do Casino, ou mesmo da necessidade de qualquer participação em eventos especiais. (25.º)
32. O Autor sempre compareceu no início de cada turno com a antecedência de, pelo menos, 30 minutos. (26.º)
33. Durante todo o período da relação de trabalho, o Autor nunca se ausentou do trabalho (isto é, dos locais de reunião) que antecediam em, pelo menos, o início de cada turno. (27.º)
34. As Rés nunca pagaram ao Autor qualquer quantia pela prestação de mais 30 minutos que antecediam o início de cada turno. (28.º)
35. Desde 22/07/2003 até 31/12/2008, o Autor prestou a sua actividade de segurança para a 2 Ré (C) num regime de turnos rotativos de sete dias de trabalho consecutivos. (29.º)
36. A que se seguia um período de 24 horas de descanso compensatório, em regra no oitavo dia, que antecedia a mudança de turno, no total de 275 dias entre 22/7/2003 e 31/3/2010. (30.º)
37. Durante o período de 27/6/2001 e 21/7/2003, o Autor gozou 24 dia de férias no ano 2002 (6-29/8) concedidas e organizadas pela 1.ª Ré no total de 24 dias. Durante o período de 22/7/2003 e 31/03/2010, o Autor gozou 24 dias de férias nos anos 2003 (4-27/12) e 2007 (7-27/4), 70 dias no ano 2004 (19/9-27/11), 38 dias no ano 2005 (6/10-12/11), 25 dias nos anos 2006 (26/8-19/9) e no 2008 (4-28/9) e 36 dias no ano (5/9-10110) no total de 242 dias, concedidas e organizadas pela 2.ª Re. (31.º)
38. Entre 27/6/2001 e 21/7/2003, o Autor prestou 731 dias de trabalho efectivo à 1.ª Ré. Entre 22/7/2003 e 31/12/2008, o Autor prestou 1784 dia de trabalho efectivo à 2.ª Ré, dentro do qual prestou 254 dias de trabalho ao sétimo dia, após a prestação de 6 dias consecutivos de trabalho. (32.º)
39. Entre 27/6/2001 e 31/12/2002, a 1.ª Ré nunca fixou ao Autor, em cada período de sete dias, um período de descanso de 24 horas consecutivas, sem prejuízo da correspondente contribuição. (33.º)
40. A 1ª Ré também não pagou qualquer compensação. (34.º)”
***
III – O Direito
1. Do recurso interlocutório
Insurgem-se as rés contra o despacho saneador de fls. 116-117 que julgou improcedente a excepção de prescrição por ambas invocada no que respeita aos créditos laborais concernentes ao período de trabalho prestado pelo autor entre 27/06/2001 e 3/04/2003.
Advogam as recorrentes que o juiz do processo não podia lavrar um tal despacho, por contrariar o anterior despacho saneador, (declarado nulo na sequência de reclamação do autor), que tinha julgado procedente a mesma excepção, e que se deveria ter por transitado em julgado.
Vejamos.
A prescrição é excepção peremptória e a sua natureza é material ou substantiva. Nessa medida gera, a sua procedência gera a extinção do direito do autor e determina a improcedência total ou parcial da acção (art. 407º, nº2, al. b), do CPC) com a consequente absolvição total ou parcial do pedido (art. 412º, nº3, do cit. código).
Portanto, quando o tribunal julga procedente uma excepção peremptória produz uma decisão de mérito, ao contrário do que sucede com as excepções dilatórias, que, quando procedem, obstam a que o tribunal conheça do mérito e dão lugar à absolvição da instância (art. 412º, nº2, do CPC).
Ora sendo assim, a partir do momento em que o tribunal decide a excepção peremptória de prescrição, produz uma decisão com a qual esgota o seu poder jurisdicional sobre a respectiva matéria (cfr. art. 569º, nº1, do CPC) e já só pode rectificar erros materiais, suprir nulidades, esclarecer dúvidas e reforma-la quanto a custas e multa (art. 569º, nº2, do CPC). E uma tal decisão tem esse efeito constitutivo, quer ela seja proveniente de um despacho-saneador (diz-se frequentemente “saneador-sentença” quando julga de mérito), quer de uma sentença propriamente dita (cfr. art. 569º, nº3, do CPC).
Ora, das decisões judiciais recorre-se (art. 581º), não se reclama, salvo em casos excepcionais, como sucede com a arguição de nulidades (arts. 148º e 152º, do CPC) ou com a impugnação da selecção da matéria de facto (arts. 430º e 431º, do CPC), entre outras situações especiais previstas no CPC.
Serve isto para dizer que do despacho-saneador de fls. 103-104 - que julgou procedente a prescrição relativamente aos créditos peticionados contra a 1ª ré, B, desde o início da relação laboral até 2/04/2003 - não cabia “reclamação”. Então, se não havia lugar a reclamação, nem o caso era de nulidade que pudesse ser conhecida oficiosamente, dessa decisão apenas caberia recurso jurisdicional.
Porém, não foi interposto recurso jurisdicional. Isto significa quatro coisas:
- Em primeiro lugar, a reclamação, por inadmissível, não permitia que o juiz do processo a conhecesse;
- Em segundo lugar, mesmo que o juiz do processo pensasse que teria cometido alguma omissão (assim o declarou no despacho de fls. 116), nem isso lhe permitia declarar a respectiva nulidade. A decisão sobre a prescrição estava tomada e só em recurso jurisdicional poderia a questão ser remediada (art. 571º, nº3, do CPC);
- Em terceiro lugar, também não podia ser alterada a 1ª decisão, porque o caso nunca podia ser conotado com uma “reparação”. Ou seja, mesmo que o juiz do processo convolasse a “reclamação” para recurso, nunca poderia proceder a uma reparação, porque o caso não era subsumível a uma mera questão de ordem formal ou processual, como por exemplo, a excepção dilatória de legitimidade, mas era antes, como já se disse, uma excepção peremptória (cfr. art. 617º, nº2, do CPC);
- Em quarto lugar, por não ter havido recurso jurisdicional do referido despacho saneador de fls. 103-104, a respectiva decisão consolidou-se pela via do trânsito em julgado. Quer isto significar que se tem que manter a decisão de prescrição tomada no 1º despacho, relativamente ao período da relação laboral compreendido entre 27/06/2001 e 2/04/2003.
Para dizer, em suma, que o despacho subsequente de fls. 116-118 não pode manter-se e tem que ser revogado.
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1.1. A revogação daquele despacho implicará a revogação da sentença na correspondente parte afectada. Ou seja, se a sentença condenou a 1ª ré em relação a créditos laborais respeitantes a todo o período de duração da relação laboral, por efeito do dito despacho que julgou improcedente a excepção de prescrição, cumpre-nos agora conhecer do pedido em relação à parte não coberta pela prescrição, ou seja ao período compreendido entre 3/04/2003 e 21/07/2003 (109 dias ou 3,58 meses).
Vejamos, então.
a) - Subsídio de alimentação
Está provado que o autor nunca deu qualquer falta ao trabalho sem conhecimento e autorização prévia por parte da ré B (facto 13, resposta ao art. 6º da BI) Ora, isto não significa que nunca deu qualquer falta. Significa que para faltar obteve previamente autorização prévia da ré. É de admitir, portanto, como sempre este TSI admitido a este respeito, que algumas faltas terá dado.
Não estando alegada qualquer matéria na petição inicial para além do que consta do art. 17º, não se nos afigura possível a anulação da sentença para ampliação da matéria de facto.
Mas, face então àquele facto provado, como igualmente já decidiu inúmeras vezes, a quantificação deste crédito terá que ser relegado para execução de sentença.
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b) - Subsídio de efectividade
Este TSI tem entendido que a sua atribuição carece de uma prestação de trabalho regular e sem faltas (v.g., Acs. proferidos nos Procs. Nºs 376/2012; 189/2014).
E diz mais este tribunal: “Em relação a este subsídio, vista a sua natureza e fins - já não se manifestam as razões que levam a considerar que a sua atribuição esteja excluída numa situação de não assiduidade justificada ao trabalho. Se o patrão autoriza uma falta seria forçado retirar ao trabalhador uma componente retributiva da sua prestação laboral, não devendo o trabalhador ser penalizado por uma falta em que obteve anuência para tal e pela qual o patrão também assumiu a sua responsabilidade” (Ac. de 25/07/2013, Proc. nº 322/2013).
Assim, “… se o trabalhador falta porque autorizado, por razões de descanso ou de férias, tal não implica que se considere que o trabalhador não foi assíduo e se lhe retire uma componente retributiva que resulta da própria redacção que atribui uma retribuição extra em função do mês anterior e já não de um determinado número de dias de trabalho efectivo.” (cit. ac.).
Ora sendo assim, face à matéria do facto 13º (resposta ao art. 6º da BI), segundo a qual “durante todo o período em que o Autor prestou trabalho, o Autor nunca deu qualquer falta ao trabalho sem conhecimento e autorização prévia por parte das Rés”, parece ser claro que as eventuais ausências, porque consentidas, não podem relevar negativamente na esfera do trabalhador.
Assim sendo, atendendo ao período a relevar (3/04/2003 a 21/07/2003), e considerando o valor do salário mensal (257,50), o subsídio a atribuir será de MO$ 3.605,00 (257,5 X 3,5 meses X 4).
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c) - Do descanso semanal
Vale aqui o que dissemos em a), supra.
Também aqui não é possível liquidar o valor deste crédito atendendo às possíveis faltas dadas naquele período (neste sentido, tb. Ac. do TSI, de 27/04/2017, Proc. nº 167/2017).
Assim, e sem prejuízo do método de cálculo do crédito correctamente aplicado na sentença recorrida (que neste aspecto mantemos, não só porque corresponde à posição deste TSI nesta matéria, mas também porque não tal método não foi impugnado no recurso jurisdicional), quanto a este item indemnizatório relegar-se-á a sua quantificação para liquidação em execução de sentença.
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d) - Descanso compensatório
Pelas mesmas razões anteriormente expostas, também a liquidação deste crédito será relegado para execução de sentença.
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e) - Feriados obrigatórios
Quanto a feriados obrigatórios, naquele período apenas trabalhou o dia 1 de Maio de 2003 (cfr. facto 16, em resposta ao art. 9º da BI).
Sendo assim, tal como foi decidido na sentença e este TSI tem considerado, o factor multiplicativo a aplicar sobre o salário é 3, para além do valor em singelo que tiver sido já pago.
Assim, a importância a atribuir é MOP$ 772,50 (257,5 X3).
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f) - Comparticipação nos custos do alojamento
O período a considerar, repetimos, é somente o que vai entre 3/04/2003 e 21/07/2003 (o período anterior desde o início da relação laboral com a 1ª ré está prescrito).
No entanto, como a sentença considerou que o mês de Julho/2003 já entraria no campo da responsabilidade da 2ª ré (C), não relevaremos os 21 dias decorridos desse mês de Julho de 2003.
Tendo em conta, pois, o período de 3 meses, e o valor da comparticipação descontada no valor de MOP$ 2.317,50 (772,50 X 3).
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g) - Trabalho extraordinário por turnos
Remetemos para o que se disse na alínea a).
Relega-se, pois, a quantificação deste crédito para execução em liquidação de sentença.
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h) - Da presença do autor 30 minutos antes do início da prestação do trabalho
Remetemos para o que se disse na alínea a).
Relega-se, pois, a quantificação deste crédito ara execução em liquidação de sentença.
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2. Do recurso da sentença
Este recurso vem interposto pela 2ª ré, limitado à questão tratado no ponto 9 da sentença: trabalho prestado pelo autor após o 6 dia de trabalho consecutivo em cada período de sete dias.
A questão nuclear a tratar no presente recurso consiste em saber como deve ser apurado o dia de descanso semanal por parte dos trabalhadores ao abrigo do art. 17º do DL nº 24/89/M. Será que ele deve ser gozado pelos trabalhadores ao 7º dia, ou deve entender-se que ao fim desse período de dias o trabalhador tem direito a um dia de descanso, a gozar, porém, pela entidade patronal de acordo com as exigências da empresa?
É para esta segunda hipótese que a recorrente C se inclina.
Mas, este TSI, em diversos arestos obtidos por unanimidade, vem sendo uniforme na posição que julgam a mais correcta.
Assim, foi exarado no Ac. do TSI, de 24/01/2019, Proc. nº 1094/2018, que “O artigo 17° do DL n.º 24/89/M, de 3 de Abril, dispõe que “todos os trabalhadores têm o direito a gozar, em cada sete dias, um período de descanso de vinte e quatro horas consecutivas (…)”, sendo o período de descanso motivado por razões de ordem física e psicológica, o trabalhador não pode prestar mais do que seis dias de trabalho consecutivos, devendo o dia de descanso ter lugar, no máximo, no sétimo dia, e não no oitavo, nono ou noutro dia do mês, salvo acordo das partes em sentido contrário, no que toca ao momento de descanso a título de “compensação”, mas o critério para este efeito é sempre o período de sete dias como uma unidade.”
Repare-se, ainda, no que foi dito no Ac. de 9/05/2019, Proc. nº 211/2019:
“Alega a recorrente que a lei laboral não impõe que o descanso semanal ocorra necessariamente no sétimo dia de trabalho, sendo assim, entende que deveria fazer-se o apuramento no final do ano dos dias efectivos de descanso e se o trabalhador tiver que ser compensado será apenas dos dias de descanso em falta.
Ora bem, dispõe o n.º 1 do artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 24/89/M que “Todos os trabalhadores têm o direito a gozar, em cada período de sete dias, um período de descanso de vinte e quatro horas consecutivas, sem prejuízo da correspondente retribuição, calculada nos termos do disposto sob o artigo 26.º”.
Melhor dizendo, dentro do período de 7 dias, o trabalhador tem direito a gozar vinte e quatro horas consecutivas de descanso, podendo este ser no primeiro, segundo, terceiro ou no sétimo dia, mas nunca no oitavo dia ou seguintes.
Como observa José Carlos Bento da Silva e Miguel Pacheco Arruda Quental1, “as razões que justificam a existência de um dia de descanso prendem-se com motivos de ordem física e psíquica (recuperar do desgaste provocado por uma semana de trabalho), de ordem familiar (aproveitar esse dia para conviver com a própria família) e também por razões de ordem social e cultural (esse período permite o convívio com amigos, a participação em manifestações de carácter público, ou para que o trabalhador possa tratar de assuntos do seu próprio interesse junto, por ex. de repartições públicas, etc.).”
Sendo assim, dúvidas de maior não restam de que impende sobre a entidade patronal a obrigação de facultar aos seus trabalhadores um dia, mais precisamente, vinte e quatro horas consecutivas de descanso dentro de cada período de sete dias, sob pena de violação da referida disposição legal.
No caso dos autos, provado está que entre 22.7.2003 e 31.12.2008, a Ré só atribuía um dia de repouso ao Autor após decorridos sete dias de trabalho contínuo e consecutivo, tendo, assim, prestado 261 dias de trabalho nos respectivos dias de descanso semanal.
Portanto, em vez de gozar um dia (ou vinte e quatro horas consecutivas) de descanso dentro de cada período de 7 dias, o trabalhador só tinha direito a repouso, pelo menos, no oitavo dia.
Desta forma, no dia em que deveria ter gozado descanso semanal, o Autor prestou trabalho à Ré, pelo que o seu direito terá que ser compensado, improcedem, pois, as razões da Ré nesta parte.”.
Fazemos nossa a fundamentação acabada de transcrever para todos os efeitos.
No mesmo sentido, ver:
- Ac. de 21/02/2019, Proc. nº 1118/2018;
- Ac. de 28/03/2019, Proc. nº 103/2019;
- Ac. de 2/05/2019, Proc. nº 216/2019;
- Ac. de 2/05/2019, Proc. nº 214/2019;
- Ac. de 2/05/2019, Proc. nº 192/2019;
- Ac. de 16/05/2019, Proc. nº 106/2019;
- Ac. de 16/05/2019, Proc. nº 109/2019;
- Ac. de 13/06/2019, Proc. nº 102/2019
Ao nível da doutrina em direito comparado, podemos citar Bernardo da Gama Lobo Xavier (Regime Jurídico do Contrato Individual de Trabalho, Anotado, Atlântida, 1972, pág. 123-124), Fernanda Agria e Maria Luísa Cardoso Pinto (Manual Prático de Direito do Trabalho, Contrato Individual de Trabalho, Almedina, 1972, pág. 93), autores que consideram expressamente (loc. cit.) ser ilegal a atribuição do descanso semanal ao cabo de 7 dias consecutivos de trabalho.
Em idêntico sentido, é referido por Jorge Leite e Coutinho de Abreu (Colectânea de Leis do Trabalho, Coimbra Editora, 1985, pág. 139) ou por Luis Miguel Monteiro (Código do Trabalho Anotado, Almedina, Coordenação de Pedro Romano Martinez, 4ª ed., 2005, pág. 372) que o descanso deve ser observado ao termo de cada série de 6 dias de trabalho efectivo.2
No direito local, esta é a posição igualmente de Augusto Teixeira Garcia, Lições de Direito do Trabalho (II Parte), Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Macau, nº 25, pág. 185, apara quem a regra será a de que o dia de descanso semanal deve seguir-se imediatamente ao sexto dia de trabalho.
Cremos ser esta, efectivamente, a melhor interpretação a dar ao art. 17º, nº1 do DL nº 24/89/M, tendo em conta a sua génese, motivada que está em defesa da situação jurídica da parte mais frágil da relação laboral, e não vemos motivo para alterá-la.
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IV – Decidindo
Face ao exposto, acordam em:
1. Conceder provimento ao recurso jurisdicional interlocutório
Em consequência:
a) - Revogamos o saneador sentença de fls. 116-117, na parte em que declarou nulo o anterior despacho saneador sentença (quanto ao segmento em que julgou procedente a prescrição) e em que julgou improcedente a excepção de prescrição;
b) - Revogamos também a sentença na parte em que apreciou e decidiu acerca dos créditos laborais reclamados referentes ao período da relação laboral do autor com a 1ª ré entre 27/06/2001 e 21/07/2003;
c) - Julgamos parcialmente procedente a acção, em consequência do condenamos a ré B a pagar ao autor as quantias de MOP$ 3.605,00, MOP$ 772,50 e MOP$ 2.317,50, a título de subsídio de efectividade, de serviço prestado em feriado obrigatório, e de comparticipação nos custos de alojamento, respectivamente. Tudo no total de MOP$ 6.695,00.
d) - Quanto aos demais créditos, condenamos no que vier a ser liquidado em execução de sentença.
e) - Vai ainda a Ré B ainda condenada nos juros de mora, nos termos definidos no Ac. do TUI, de 2/03/2011, no Proc. nº 69/2010.
Custas pelo autor e 1ª ré, em função do decaimento.
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2. Negar provimento ao recurso interposto da sentença pela ré C.
Custas pela recorrente.
T.S.I., 25 de Julho de 2019
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José Cândido de Pinho
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Lai Kin Hong
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Tong Hio Fong
(Vencido quanto à fórmula adoptada no cálculo da compensação do trabalho prestado em dias de feriado obrigatório, por entender que, conforme o previsto no n.º 1 do artigo 20.º do Decreto-Lei n.º 24/89/M, para o trabalho prestado em dias de feriado obrigatório, o trabalhador tem direito a um acréscimo de dois dias de salário, para além do singelo. Tendo o Autor recebido, durante toda a relação laboral, o salário diário em singelo, terá agora apenas direito a receber mais 2 dias de salário.
Pelo que não merece, a meu ver, reparo a fórmula aplicada pelo Tribunal recorrido para cálculo da compensação do trabalho prestado em feriados obrigatórios.)
1 Manual de Formação de Direito do Trabalho em Macau, CFJJ, 2006, pág. 92
2 Na jurisprudência comparada, podemos encontrar esta mesma posição no Ac. do STJ, de 6/07/1976, Proc. nº 8527, ou no Ac. da Relação do Porto, de 11/07/2016, Proc. nº 5286/15.
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343/2019 3