Processo n.º 823/2018
(Autos de recurso cível)
Data: 19/Setembro/2019
Descritores: Averbamento oficioso do despacho que declara a caducidade da concessão de terreno (artigo 181.º, n.º 5 da Lei de Terras)
SUMÁRIO
O n.º 5 do artigo 181.º da Lei de Terras manda que, “no prazo de 15 dias a contar da publicação no Boletim Oficial do despacho que declare a caducidade ou rescisão da concessão ou devolução do terreno, a DSSOPT deve comunicar o facto à CRP para efeitos de averbamento oficioso do mesmo no registo do respectivo terreno”.
Não obstante o Despacho do Chefe do Executivo que declarou a caducidade da concessão ainda não se ter formado caso resolvido ou decidido uma vez que foi interposto recurso contencioso, mas nada impede o registo daquela decisão administrativa por averbamento, antes é essa a solução contemplada e optada pelo legislador.
Ademais, é bom de ver que a intenção do legislador em mandar publicar o despacho que declarou a caducidade da concessão em 15 dias é precisamente assegurar a fé pública e a segurança do comércio imobiliário, para que o público possa ficar inteirado da situação jurídico-registral dos bens imóveis, por forma a evitar litígios desnecessários.
O Relator,
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Tong Hio Fong
Processo n.º 823/2018
(Autos de recurso cível)
Data: 19/Setembro/2019
Recorrente:
- A
Acordam os Juízes do Tribunal de Segunda Instância da RAEM:
I) RELATÓRIO
Inconformado com a sentença do Tribunal Judicial de Base que indeferiu o pedido de rectificação judicial no sentido de ordenar o cancelamento dos actos de registo efectuados a coberto das apresentações n.ºs 301, de 13.6.2016, 360, de 26.10.2016 e 195, de 18.11.2016, interpôs o recorrente A, com sinais nos autos, recurso jurisdicional para este TSI, em cujas alegações formulou as seguintes conclusões:
“I. O despacho do Chefe do Executivo com base no qual foi lavrado o averbamento 2 foi impugnado contenciosamente pelo ora Recorrente, correndo o respectivo processo os seus termos pelo Tribunal de Segunda Instância de Macau, sob o n.º 541/2016, sem que ainda tenha sido proferida decisão transitada em julgado.
II. Pelo que, desconhecendo o Exmo. Conservador se, à data da qualificação do facto sujeito a registo, o despacho do Chefe do Executivo de 26 de Abril de 2016 formara caso decidido ou resolvido, não podia ter efectuado o registo da caducidade parcial como definitivo, nem mantido tal registo face à prova plena da pendência da impugnação contenciosa desse despacho feita nas fls. 130 a 147 que instruiu o pedido de rectificação por cancelamento apresentado em 13/11/2017.
III. Acresce não dispor de relevância decisiva o, aliás douto argumento de que não tendo sido suspensa eficácia do acto administrativo (neste caso o referido despacho do Chefe do Executivo), dúvidas não há que o mesmo constitui um título válido.
IV. Isto por a eficácia do acto com base no qual foi averbado a caducidade parcial da concessão não ter o condão de o firmar na ordem jurídica com força de caso decidido ou resolvido.
V. Se assim fosse – e não é – o argumento expendido na decisão recorrida serviria também para consentir que fossem efectuados, com carácter definitivo, registos titulados por decisões judiciais que ainda não estivessem transitadas em julgado, por estas, tal como o despacho do Chefe do Executivo que declarou a caducidade parcial da concessão titulada pela escritura de 12/06/1987, constituírem título executivo antes do trânsito em julgado se os recursos contra elas interpostos tiverem efeito meramente devolutivo (art.º 678º, n.º 1 do CPC), como sucede por exemplo com os recursos interpostos para o Tribunal de Última Instância (art.º 643º, n.º 1 do CPC)!
VI. Devia ao invés ter o registo do averbamento da caducidade parcial sido recusado por o mesmo, pela sua natureza, não se poder fazer como definitivo, conforme se determina no n.º 3 do artigo 60º do CRP.
VII. Consequentemente, até à presente data, o despacho do Chefe do Executivo que declarou a caducidade parcial da concessão do terreno não constitui caso decidido ou resolvido, pelo que não se consolidou na ordem jurídica.
VIII. O despacho do Chefe do Executivo de 26 de Abril de 2016 (que declarou a caducidade parcial da concessão do terreno) por haver sido impugnado contenciosamente, não se tornou definitivo, pelo que todos os registos lavrados em consequência desse despacho são nulos, pois foram lavrados com base em título insuficiente para a prova legal dos factos registados (art.º 17º, alínea b), do Código do Registo Predial).
IX. É por isso insuficiente concluir, como se faz na decisão recorrida, que o facto registado consta de documento que legalmente o comprova nos termos do n.º 1 do artigo 37º do CRP e da al. 5) do n.º 1 do artigo 181º da Lei de Terras.
X. Isto porque o artigo 37º, n.º 1 do CRP não diz, nem quis dizer, que os actos administrativos contenciosamente impugnados são título suficiente para a prova legal dos factos registados.
XI. Também não o diz a al. 5) do n.º 1 do artigo 181º da Lei de Terras, a qual se limita a sujeitar a caducidade das concessões a registo, sendo mais ou menos evidente que o documento expedido pela DSSOPT para a CRP a que se refere o n.º 3 deste artigo e com base no qual o registo definitivo pode ser feito não poderá ser nunca uma decisão ainda controvertida em juízo.
XII. E bem se compreende que assim seja.
XIII. Desde logo, por um argumento a contrario e por maioria de razão: se do art.º 60/2 do CRP resulta a contrario que o Conservador deve recusar o registo que seja titulado por decisão judicial não transitada em julgado, então, por maioria de razão, deverá recusar o registo que seja titulado por acto administrativo sobre o qual não se tenha formado caso decidido ou resolvido.
XIV. Logo, não tendo o Conservador maneira de saber se se formara ou não caso decidido ou resolvido, deveria ter recusado o registo por não o poder lavrar por dúvidas ou por natureza.
XV. Isto por a possibilidade de anulação ou declaração de nulidade pelo Tribunal do acto decisório com base no qual fosse lavrado o registo ser susceptível de perturbar as finalidades do registo predial, ou seja, a fé pública e a segurança do comércio imobiliário previstas no artigo 1º do CRP, afectando a visibilidade do registo com prejuízo do índice probatório da presunção legal que dele resulta no art.º 7 e, por conseguinte, a própria coerência interna do sistema.
XVI. Logo, admitir e/ou manter o registo definitivo de um facto com base numa decisão ainda controvertida em juízo colocaria em perigo o interesse público inerente aos princípios da certeza do direito, da defesa de terceiros, da segurança do comércio jurídico e a própria necessidade (de natureza pública) de o registo não se encontrar desactualizado face ao cadastro. (vide Mouteira Guerreiro, in op. cit.)
XVII. Assim, não terá sido seguramente a pensar em “decisões ainda controvertidas em juízo” que foi redigido o n.º 1 do artigo 37º do CRP, nem tampouco a alínea 5) do n.º 1 do artigo 181º da Lei de Terras, pelo que deveriam ter sido rectificados por cancelamento os registos definitivos indevidamente lavrados a que se refere o requerimento de 13/11/2017.
XVIII. Estão nesta situação, as alterações feitas à descrição predial n.º 21.676 a fls. 198v do L.º B61, quanto à área, confrontações e composição do terreno.
XIX. Sendo que relativamente às novas confrontações dadas ao prédio, as mesmas não correspondem à verdade, sendo até ostensivo que o prédio não tem qualquer confrontação com o Mar!
XX. De resto, tais confrontações também não têm correspondência com aquelas que vêm mencionadas na planta cadastral n.º 29/189 de 14/10/2016, como sendo as da “Parcela A” do terreno concessionado!
XXI. Donde que, o registo da descrição predial em causa, neste particular, ainda é nulo, por enfermar de inexactidão quanto ao objecto da relação jurídica a que o facto registado se refere (art.º 17º, alínea c), do Código do Registo Predial).
XXII. No que respeita aos registos de alteração à inscrição n.º 1.685, a fls. 98 do L.º F23-A, os mesmos enfermam de nulidade:
- o de caducidade parcial da concessão do terreno, lavrado pelo averbamento n.º 2 e na sequência da ap. N.º 301 de 13/06/2016, porque assenta ao despacho do Chefe do Executivo de 26/04/2016, que foi impugnado contenciosamente e, como tal não se tornou definitivo, sendo, por isso, lavrado com base em título insuficiente para a prova legal do facto registado (art.º 17º, alínea b), do Código do Registo Predial).
- o de conversão da concessão em definitiva quanto à parcela “A” da planta cadastral n.º 29/1989 de 14/10/2016, lavrado pelo averbamento n.º 3 e na sequência da ap. N.º 360 de 26/10/2016, porque também assenta em título insuficiente para a prova legal do facto registado (art.º 17º, alínea b), do Código do Registo Predial).
XXIII. Aliás, no caso concreto e em bom rigor, o registo foi feito com base em título inexistente e consignando uma ilegalidade à luz da Lei de Terras.
XXIV. Com efeito, a conversão da concessão provisória do terreno em definitiva só seria possível findo o aproveitamento e favor do concessionário provisório, nunca de terceiros, pois a Lei de Terras não permite a transmissão de direitos resultantes da concessão de arrendamento fora dos casos previstos no seu articulado.
XXV. Além do mais, tendo o Chefe do Executivo declarado a caducidade parcial da concessão por falta de aproveitamento e não prevendo a Lei de Terras a cindibilidade das concessões, no caso não há qualquer título suficiente para permitir o registo de conversão parcial da concessão provisória em definitiva (nem a Lei de Terras o permite).
XXVI. E assim sendo, salvo melhor opinião, o registo feito pelo averbamento n.º 3 à inscrição sempre foi lavrado com base em título inexistente, sendo também por isso, nulo (art.º 17º, alínea a), do Código do Registo Predial).
XXVII. É também nulo o registo de renovação da concessão, lavrado pelo averbamento n.º 5 e na sequência da ap. N.º 195 de 26/10/2016, porque assenta em título insuficiente ou inexistente para a prova legal do facto registado (art.º 17º, alíneas a) e b), do Código do Registo Predial).
XXVIII. Na verdade, o requerimento/declaração de 16/11/2016 não é documento bastante para titular a renovação da concessão, face ao disposto no art.º 49º da Lei de Terras.
XXIX. Com efeito, a renovação da concessão foi registada pelo prazo de 10 anos a contar de 12/06/2012!
XXX. Sucede que, em 12/06/2012, qualquer que seja a tese defendida, não havia qualquer concessão definitiva susceptível de ser renovada, mas sim uma concessão provisória.
XXXI. E nem se alegue que anteriormente foi lavrado registo de conversão da concessão provisória em definitiva, que já vimos enfermar de nulidade, porquanto essa conversão não operou, muito menos em 12/06/2012, e o despacho do Chefe do Executivo impugnado contenciosamente, mesmo que fosse válido, não produzia efeitos retroactivos…
XXXII. Impunha-se, pois, a rectificação de todos os registos indevidamente lavrados por enfermarem de nulidade nos termos da alínea b) do art.º 17º do Código do Registo Predial, mediante o seu cancelamento (artigos 114º, n.º 1 e 117º).
XXXIII. Deverá, pois, ser revogada a decisão ora recorrida, com as legais consequências, assim se fazendo a habitual justiça!
Nestes termos, e nos mais de Direito aplicáveis que V. Exas, doutamente suprirão, deverá ser concedido provimento ao presente recurso e, em consequência, revogar-se a, aliás, douta decisão proferida no Tribunal a quo, ordenando-se a rectificação por cancelamento dos registos indevidamente lavrados a que se referem a Apresentação n.º 301 de 13/06/2016 (Averbamento n.º 2), a Apresentação n.º 360 de 26/10/2016 (Averbamento n.º 3) e a Apresentação n.º 195 de 18/11/2016 (Averbamento n.º 5), como as legais consequências.”
*
Corridos os vistos, cumpre decidir.
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II) FUNDAMENTAÇÃO
O recorrente insurge-se contra a seguinte sentença de primeira instância:
“A, os demais sinais identificados nos autos, inconformado com a decisão da Exma Sra. Convervatora que recusou o seu pedido de rectificação de registo por cancelamento que recai sobre:
1. a apresentação n.° 301 de 13/06/2016, averbamento n.° 2 à inscrição n.° 1XX5, do livro XX, que incide sobre o prédio descrito sob o n.° 2XXX6, do livro XX, relativo à declaração da caducidade parcial da concessão do respectivo terreno, que havia sido titulada pela escritura de 12/06/1987, lavada a fls. XX do livro n.° XX do notário privativo da DSF, autorizada pelo Despacho n.° 42/SAES/87, de 30/03/1987, e posteriormente revista pelo Despacho n.° 101/DSTPOP/92, de 03/08/1992. A caducidade foi declarada apenas na parte relativa às parcelas de terreno devidamente demarcadas e assinaladas com as letras B, C, D1, D2 e E na planta cadastral n.° 29/1989 da DSCC, com as áreas respectivamente de 2869 m2, 3304 m2, 152 m2, 1233 m2 e 32 m2, com as finalidades referidas na mesma planta. Serviu de base ao referido averbamento de declaração de caducidade parcial da concessão do Despacho do SATOP n.° 28/2016, publicado no Boletim Oficial da RAEM n.° 23, II, Série, de 08/06/2016, e o ofício n.° 237/DAT/2016, de 08/06/2016 da DSSOPT.
2. A apresentação n.° 360 de 26/10/2016, averbamento n.° 3 à inscrição acima referida, relativo à conversão em definitiva da concessão, apenas quanto à parcela de terreno demarcada e assinalada pela letra A na planta cadastral n.° 29/1989.
3. A apresentação n.° 195 de 18/11/2016, averbamento n.° 5 à mesma inscrição, relativo à renovação da concessão, já então reduzida à parte restante do terreno.
Vem interpor a presente rectificação, requerendo que seja instruído a Exmª Srª Conservadora a que cumpra o disposto no artigo 120.° e ss do CRP e efectue a rectificação por cancelamento dos registos acima referidos.
A decisão da Exmª Srª Conservadora que recusou a rectificação requerida tem o seguinte teor:
“Recusado nos termos do art. 59.° e n.° 3 do art. 60.° do . O pedido de rectificação não se enquadra nas situações previstas nos art. 120.° e segs do citado diploma legal, o registo ora lavrado está em conformidade com os títulos apresentados e o averbamento n.° 2 da inscrição de concessão por arrendamento n.° 1XX5, a fls. XX do livro XX, referente à descrição predial n.° 2XXX6, é o registo de um facto constante de documento que legalmente o comprova (Despacho n.° 28/2016, publicado no Boletim Oficial da RAEM n.° 23, II Série, de 8/6/2016), com fundamento legal nos termos do n.° 1 do artigo 37.° do CRP e da al. 5) do n.° 1 do art. 181.° da LEI DE TERRAS em vigor, o que exclui de todo a arguida nulidade do averbamento, assim como a pertinência de rectificação intentada no presente processo.”.
Na presente rectificação judicial, o recorrente alega essencialmente que, em relação ao averbamento n.° 2, na sequência da apresentação n.° 301, de 13/06/2016, foi lavrado com base no título insuficiente ou inexistente, uma vez que o tal título - despacho do Chefe do Executivo de 26/04/2016 que declarou a caducidade parcial da concessão do terreno - ainda se encontra em fase de recurso contencioso no Venerando TSI sob o n.° 541/2016, sem que ainda tenha sido proferida decisão judicial, e por conseguinte, a decisão do Chefe do Executivo ainda não consolidou na ordem jurídica. Também, segundo o que alega, o mesmo acontece com o averbamento n.° 3, pelo qual foi averbada a conversão da concessão em definitiva, quanto à parcela A, o qual aliás, foi feito com base em título inexistente, configurando uma ilegalidade à luz de Lei de Terras, já que tal conversão só seria possível com a conclusão do complexo descrito na cláusula terceira do contrato de concessão, ou seja, com a construção de mais 7 moradias unifamiliares de 2 pisos cada e piscina, campo de ténis e instalações de apoio.
Dos elementos carreados nos autos verifica-se que por despacho do Chefe do Executivo declarou a caducidade parcial da concessão titulada pela escritura de 12/06/1987, lavrada a fls. XX do livro n.º XX do notariado privativo da Direcção dos Serviços de Finanças, autorizada pelo Despacho n.º 42/SAES/87, de 30/03/1987, e posteriormente revista pelo Despacho n.º 10l/SATPOP/92, de 03/08/1992.
Ainda que esse despacho foi objecto de recurso contencioso, ele não deixa de ser um título existente e suficiente para o averbamento lavrado.
É que, dos elementos carreados nos autos não constata que a eficácia do referido despacho do Chefe do Executivo houvesse sido suspensa, pois, nos termos do artigo 22.° do CPAC, o recurso contencioso não tem efeito suspensivo da eficácia do acto recorrido.
Não tendo sido suspensa eficácia do acto administrativo (neste caso o referido despacho do Chefe do Executivo), dúvidas não há que o mesmo constitui um título válido.
Por isso o argumento do recorrente de que a decisão da administração ainda não consolidou na ordem jurídica é de naufragar.
Quanto à alegada ilegalidade de conversão em definitiva, quanto à parcela A, vem o recorrente invocar a ilegalidade, entendendo que a tal só seria possível com a conclusão do complexo descrito na cláusula terceira do contrato de concessão, ou seja, com a construção de mais 7 moradias unifamiliares de 2 pisos cada e piscina, campo de ténis e instalações de apoio. Salvo o devido respeito, sempre diríamos que não cabe nesta sede de rectificação judicial a imiscuir no mérito da causa do objecto do recurso contencioso interposto pelo recorrente, pois é aí a sede oportuna para a sua arguição.
Porém, para dúvidas não há, não podemos deixar de referir que a conversão em definitiva da parcela “A” resulta do facto de ter já aproveitado com construção das 14 moradias unifamiliares de 3 pisos cada, que ficou concluída em 5 de Fevereiro de 1991, conforma a respectiva licença de utilização.
Por outro lado, também consta na cláusula décima primeira (n.° 2) do contrato de concessão (fls. 63v dos junto aos autos) que não carece de autorização as transmissões respeitantes às partes do terreno (moradias unifamiliares), cujo aproveitamento for ficando concluído, em conformidade com a execução do plano de aproveitamento do terreno.
Com tudo isso, parece-nos também não tem fundamento quanto à alegada incindibilidade do objecto da concessão.
Quanto à alegada nulidade do averbamento n.º 5 à inscrição n.º 1XX5 do livro XX, por insuficiência ou até inexistência do título para a prova legal da renovação da concessão, também não assiste razão o recorrente, porquanto nos termos do n.° 1 do artigo 49.° da Lei de Terras, o aproveitamento da concessão definitiva quanto à parcela A é automaticamente renovável por períodos de 10 anos, sem necessidade de formulação de pedido.
Por fim, não devemos olvidar é que a função principal do registo consiste em dar a publicidade à situação jurídica do terreno (ou imóvel), tendo em vista a segurança do comércio imobiliário. E uma vez que o referido despacho do Chefe do Executivo ainda não tenha sido anulado, declarado nulo ou inexistente pelo Tribunal Superior, serve como título para que sejam lavrados os referidos averbamentos n.° 2, 3 e 5.
Nestes termos, conclui-se que a decisão da senhora conservadora em indeferir a pretendida rectificação mediante o cancelamento dos actos de registo efectuados a coberto das apresentações n.os 301, de 13/06/2016, 360, de 26/10/2016, e 195, de 18/11/2016, foi correcta e que os referidos averbamentos n.° 2, 3 e 5 em sub judice foram lavrados com base em documentos legais e suficientes para a prova dos respectivos factos.
Nestes termos, é desde logo indeferido o pedido da rectificação judicial.
Custas a cargo do recorrente.
Registe e notifique.”
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Analisada a douta decisão de primeira instância que antecede, louvamos a acertada decisão com a qual concordamos e que nela foi dada a melhor solução ao caso, pelo que, considerando a fundamentação de direito aí exposta, cuja explanação sufragamos inteiramente, remetemos para os seus precisos termos ao abrigo do disposto o artigo 631.º, n.º 5 do CPC.
Apenas mais umas achegas.
É verdade que a decisão do Chefe do Executivo que declarou a caducidade da concessão, no momento em que aquela foi proferida, ainda não se formou caso resolvido ou decidido uma vez que foi interposto recurso contencioso, mas nada impede o registo daquela decisão administrativa por averbamento, antes é essa a solução contemplada e optada pelo legislador, ao abrigo do disposto no n.º 5 do artigo 181.º da Lei de Terras, em que se prevê que no prazo de 15 dias a contar da publicação no Boletim Oficial do despacho que declarou a caducidade da concessão do terreno, a Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes tem que comunicar o facto à Conservatória do Registo Predial para efeitos de averbamento oficioso no respectivo registo predial, e é o caso.
O recorrente invoca ainda o n.º 2 do artigo 60.º do Código do Registo Predial para defender a sua tese de que o Conservador deverá recusar o registo que seja titulado por acto administrativo sobre o qual não se tenha formado caso decidido ou resolvido.
Trata-se de um equívoco.
A nosso ver, o n.º 2 do artigo 60.º do CRP prescreve que não pode ser recusado o registo quando é titulado por decisão judicial transitada em julgado, mas ao contrário do que entende o recorrente, a norma não diz que o Conservador deve recusar o registo se for titulado por decisão judicial não transitada em julgado, sabendo que há situações em que, mesmo não havendo ainda trânsito em julgado da decisão judicial, pode haver lugar a registo.
Ademais, é bom de ver que a intenção do legislador em mandar publicar o despacho que declarou a caducidade da concessão em 15 dias é precisamente assegurar a fé pública e a segurança do comércio imobiliário, para que o público possa ficar inteirado da situação jurídico-registral dos bens imóveis, por forma a evitar litígios desnecessários.
No que respeita à questão de (in)cindibilidade das concessões, como bem observa o Tribunal recorrido, trata-se de uma questão de mérito objecto de recurso contencioso, e que, por Acórdão do TUI, proferido no âmbito do Processo n.º 107/2018, entendeu que a declaração de caducidade do terreno em causa nas parcelas que estão delimitadas e que não foram aproveitadas no prazo da concessão, apesar de não se ter declarado a caducidade na parcela que foi aproveitada e cuja utilização está licenciada, é uma solução justa e legal.
Diz ainda o recorrente que as alterações feitas à descrição predial 21.676 a fls. XX do L.º XX, quanto à área, confrontações e composição do terreno não correspondem à verdade.
Sobre o assunto em apreço, damos por reproduzido o teor do parecer emitido pelo Conservador dos Serviços de Assuntos de Justiça, com o qual concordamos, nos seguintes termos transcritos:
“Não podemos ainda deixar passar em claro a afirmação do recorrente de que existe inexactidão na identificação do terreno que resta na descrição predial n.º 21.676, por no seu entender não poder ser feita a actualização da sua área e composição e que as confrontações que nela ficaram a constar não correspondem à verdade por divergirem das mencionadas na parcela A da planta cadastral n.º 29/1989, sendo até ostensivo que o prédio não confronta com o Mar.
Quanto à primeira afirmação, é óbvio que ela não tem fundamento, quer porque a identificação do terreno que foi averbada à descrição é a que corresponde efectivamente à parcela A da referida planta cadastral, anexa ao Despacho do Chefe do Executivo, quer porque foi sobejamente demonstrado que ela constitui a parte restante do terreno concessionado, e que foi devidamente aproveitado; e, quanto à segunda afirmação sempre diremos que nada há a censurar ao conteúdo dos averbamentos n.ºs 2 e 3, quer quanto à desanexação das parcelas B, C, D1, D2 e E, quer quanto à declaração da edificação das 14 moradias, o que foi devidamente comprovado pela exibição da referida planta cadastral e da respectiva licença de utilização, quer ainda porque, nos termos da lei (alínea f) do n.º 1 do art.º 74º do Código do Registo Predial), constando da descrição o número e data da emissão da planta cadastral (vide averbamento n.º 1 à descrição), é dispensada a menção às confrontações, sendo, por isso, despicienda a menção que delas consta no corpo (inicial) da descrição, que se deverão considerar ultrapassadas com a menção feita ao número e data da planta cadastral constante do averbamento n.º 1 à descrição (efectuado em 03/03/1995).
E, a este propósito, cabe aqui referir que, nos termos dos arts. 13º e segs. do Decreto-Lei n.º 3/94/M, de 17 de Janeiro, a planta cadastral definitiva de qualquer terreno constitui prova plena da respectiva identidade física quanto à sua localização, área e confrontações, constituindo até requisito de menção obrigatória, quer da descrição predial, quer dos títulos, o número e data da respectiva planta cadastral (cfr., além da citada alínea f) do n.º 1 do art. 74º do Código do Registo Predial, os arts. 14º e segs, do citado Decreto-Lei n.º 3/94/M, e 76º, n.º 1, e 79º do Código do Notariado).”
Por tudo quanto deixou exposto, somos a entender que não merece reparo a sentença recorrida, havendo que negar provimento ao recurso.
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III) DECISÃO
Face ao exposto, acordam em negar provimento ao recurso interposto pelo recorrente A, confirmando a sentença recorrida.
Custas pelo recorrente.
Registe e notifique.
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RAEM, 19 de Setembro de 2019
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Tong Hio Fong
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Lai Kin Hong
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Fong Man Chong
Recurso Cível 823/2018 Página 17