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Processo n.º 799/2019
(Autos do recurso de decisões jurisdicionais do TA)

Relator: Fong Man Chong
Data : 05/Setembro/2019

Assuntos:
     
- Interpretação do nº 7 do artigo 130º do CPAC
     
SUMÁRIO:

O nº 7 do artigo 130º do CPAC estabelece um prazo geral e único de caducidade, aplicável tanto às situações em que o acto suspendendo é nulo ou anulável.
     
     
     O Relator,
     
     ______________________
     Fong Man Chong




Processo n.º 799/2019
(Autos do recurso de decisões jurisdicionais do TA)

Data : 05/Setembro/2019

Recorrente : A (A)

Recorrida : Direcção da Associação dos Advogados de Macau (澳門律師公會理事會)


*
    ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA RAEM:
    
    I - RELATÓRIO
A (A), Recorrente, devidamente identificado nos autos, não se conformando com a decisão proferida pelo Tribunal Administrativo, datada de 26/06/2019, veio, em 04/07/2019, recorrer para este TSI com os fundamentos constantes de fls. 194 a 199, tendo formulado as seguintes conclusões :
I. O Recorrente instaurou providência cautelar contra a Deliberação da Direcção dos Advogados de Macau.
II. Em 25 de Junho do ano de 2019, a Direcção da Associação dos Advogados de Macau apresentou a sua Contestação onde foram imputados ao ora Recorrente a prática de diversas infracções,
III. Tendo a Direcção da Associação dos Advogados de Macau imputado ao ora Recorrente até uma hipotética violação disciplinar a ser praticada pelo ora Recorrente no futuro. (cfr. Art.35° da Contestação da Entidade Recorrida)
IV. Em 26 de Junho de 2019, o Tribunal a quo julgou improcedente o pedido do ora Recorrente respaldando-se no não cumprimento do ónus da prova por parte daquele.
V. Isto é, o Tribunal a quo considerou que o requisito imposto pela alínea a), nº1, art.121° do CPAC não preenchido.
VI. Ora, salvo o mui devido respeito o Tribunal a quo aplicou erroneamente tal normativo legal.
VII. Pois que na presente situação sub judice a norma aplicanda é nº3, art.121° do CPAC que consigna uma excepção à regra geral de cumulação dos três requisitos:
«Não é exigível a verificação do requisito previsto na alínea a) do n.º 1 para que seja concedida a suspensão de eficácia de acto com a natureza de sanção disciplinar.»
E,
VIII. ln casu, o Recorrente foi suspenso da sua actividade profissional ex abrupto, pois que o Recorrente não foi notificado de Acusação nem foi notificado para apresentara sua Defesa.
Ou seja,
IX. Apesar de inexistir um processo disciplinar e a Direcção da Associação dos Advogados de Macau não possuir competência disciplinar ao ora Recorrente foi aplicada uma pena disciplinar com efeitos imediatos...
Pelo que,
X. O nº3, art.121° do CPAC deveria ter sido aplicado pelo Tribunal a quo o qual, erroneamente, aplicou a alínea a), nº1, do art.121° do CPAC e imputou ao Recorrente o incumprimento do ónus da prova.
Por outro lado,
XI. Na douta sentença recorrida ficou expresso que «... se bem que a providência de suspensão fosse decretada pelo tribunal, impor-se-ia sempre sua caducidade nos termos do art.130°, nº7 do CPAC, pela falta de interposição de recurso contencioso no prazo legal previsto no art.25°, nº2 do CPAC.»
XII. Salvo o devido respeito, reputa-se que o Tribunal quo indicou erradamente esse normativo pois que «O direito de recurso de actos nulos ou juridicamente inexistentes não caduca, podendo ser exercido a todo o tempo.» (art.25°, nº do CPAC)
Pois que,
XIII. O acto administrativo praticado pela Direcção da Associação dos Advogados de Macau está viciada de nulidade pelas, nomeadamente, razões seguintes:
a) A Direcção da Associação dos Advogados de Macau não possui competência disciplinar pois que esta está reservada exclusivamente ao Conselho: «O Conselho Superior da Advocacia, abreviada mente designado por Conselho, exerce jurisdição disciplinar exclusiva sobre os advogados e advogados estagiários e verifica a falta de idoneidade moral nos termos e para os efeitos do artigo 23.º do Estatuto do Advogado.» (Art. 3.º Código Disciplinar dos Advogados)
b) O ora Recorrente nunca foi notificado de Acusação, por isso mesmo nunca teve oportunidade de apresentar defesa;
c) A actuação da Direcção da Associação dos Advogados de Macau constitui uma prática ad hominem (logo ilegal porquanto injusta) pois que há vários advogados que não se encontram há anos em Macau e nunca lhes foi movido qualquer processo disciplinar (tendo o ora Recorrente indicado por diversas vezes, a título de exemplo, o MI Senhor Dr. B)
d) A Direcção da Associação dos Advogados de Macau deu como provado a ausência do ora Recorrente por mais de seis meses através de simples presunção particular tendo, assim, deixado expresso a expressão: «... é pública e notório a ausência ... »...
Ora,
XIV. A «... a justeza (fairness) da administração da justiça, além de substantiva, se mostre aparente (justice must not only be dane, it must also be seen to be done». (sublinhado nosso)
Pelo que,
XV. Se reputa que o acto praticado pela Direcção da Associação dos Advogados de Macau está ferido de nulidade, se não mesmo, com o vício de inexistência jurídica.
Assim,
XVI. Salvo o devido respeito, o argumento da caducidade apresentado na sentença ora recorrida também não pode proceder.
In fine,
XVII. O Tribunal aplicou erroneamente os art.130º, nº7 e art.25°, nº2 do CPAC.,
XVIII. A punição disciplinar aplicada pela Direcção da Associação dos Advogados de Macau é sindicável a todo o tempo nos termos do nº1 do CPAC., porquanto ferida da mais profunda e patente nulidade.

*
A Recorrida, Direcção da Associação dos Advogados de Macau (澳門律師公會理事會), veio, 18/07/2019, a apresentar as suas contra-alegações constantes de fls. 220 a 235, tendo formulado as seguintes conclusões:
1. Entende a recorrida que, por razões de lógica processual e de justiça material, aos recursos interpostos das "decisões proferidas nas acções de pedido de suspensão de eficácia" deve ser sempre atribuído efeito devolutivo e nunca efeito suspensivo;
2. O entendimento maioritário relativamente à interpretação do n.º 2) do art.° 155.º, do CPAC, não é o que ora se propugna, mas tal acontece porque a sua redacção utiliza a expressão "recurso da decisão de suspensão da eficácia", pelo que tal entendimento se fundamenta na interpretação proveniente de uma análise algo superficial sobre o sentido de tal redacção;
3. No entanto, tal redacção não se refere expressamente ao "recurso da decisão que suspende a eficácia do acto (...)" e o legislador assim o poderia ter redigido, sendo bem mais claro na sua intenção, caso esta fosse a de abranger somente as decisões que determinam em concreto a suspensão da eficácia de actos;
4. Em termos de direito comparado, existem normas semelhantes de ordenamentos jurídicos de matriz idêntica, em que tal solução se encontra claramente expressa;
5. A adopção do efeito devolutivo para a universalidade das decisões que versem sobre o pedido de suspensão de eficácia é uma solução protege os particulares quando o tribunal considera existirem razões para o deferimento do pedido de suspensão de eficácia;
6. Por outro lado, também a administração fica a salvo da tal utilização abusiva do recurso contra decisões que recusassem a suspensão de eficácia de actos administrativos dos particulares, que poderá impedir a execução atempada de actos administrativos legitimamente exarados com base em interesses públicos prementes;
7. E é também a solução que melhor protege a administração da justiça levada a cabo pelos tribunais, que assim dispõem de uma solução equilibrada no tratamento dos pedidos de suspensão de eficácia;
8. O recorrente alega que a deliberação da recorrida, ora em causa, é um acto administrativo de natureza disciplinar e, por esse motivo, não lhe seria exigível a prova do requisito da alínea a), do n.º 1, do art.º 121.°, do CPAC, conforme o dispõe o n.º 3 do mesmo artigo;
9. Ao contrário do que o recorrente alega, a recorrida não deliberou a sua suspensão por motivos de índole disciplinar, muito embora os comportamentos do recorrente que se encontram descritos no ofício que o notificou da deliberação de suspensão da sua inscrição, como advogado, sejam deontologicamente censuráveis;
10. O órgão competente para a disciplina dos advogados é o Conselho Superior da Advocacia, e não a recorrida, pelo que é a este a quem compete emanar decisões de carácter disciplinar;
11. Tal suspensão foi determinada por comando legal, por preenchimento dos requisitos do disposto no art.º 12.°, n.º 1, alínea e), do Regulamento do Acesso à Advocacia, na sua versão actualizada;
12. Os restantes comportamentos descritos em tal ofício tiveram apenas a finalidade de consciencializar o recorrente para a gravidade dos mesmos, praticados de forma ostensiva, apesar de o recorrente saber que os mesmos não lhe eram permitidos;
13. O recorrente pretende transmitir, falsamente, a este Tribunal, que tal decisão tem carácter disciplinar, apenas como forma de se tentar eximir do facto de não ter comprovado de alguma forma o preenchimento do requisito da alínea a), do n.º 1, do art.º 121.°, do CPAC;
14. Encontrando-se o recorrente inscrito como advogado em Portugal e em Timor-Leste, seu país de origem, o exercício de tal actividade naqueles países, suporta bem os custos que o mesmo tem, como o próprio assim o dá a entender na sua PI;
15. Não é preciso que o recorrente esteja inscrito, como advogado, em Macau, para poder tratar de interesses de clientes em Portugal e em Timor-Leste; antes, é necessário que o mesmo se encontre inscrito, como advogado, em tais jurisdições;
16. Face ao exposto, é claro que a actividade principal do recorrente se desenrola naqueles países e não em Macau, pelo que a deliberação ora em causa não acarreta prejuízos de difícil reparação para o requerente;
17. Caso seja decidida a suspensão da eficácia da deliberação ora em causa, a advocacia em Macau, e a imagem da AAM enquanto entidade reguladora da mesma, ficará seriamente afectada, porque descredibilizada face aos comportamentos abusivos do recorrente, bem conhecidos por todos no meio forense;
18. Tal poderá dar azo à possibilidade de que outros cometam mais abusos e violações das regras que regulam a advocacia, em prejuízo de terceiros, o que se traduziria numa grave lesão do interesse público, porquanto afectaria os interesses e direitos dos cidadãos de Macau;
19. É facto público e notório, especialmente nos tribunais, que o requerente falta constantemente a diligências, como audiências de julgamento, por se encontrar constantemente ausente de Macau;
20. Por este motivo, foram apresentadas várias participações ao Conselho Superior da Advocacia, por parte de vários juízos, chegando o recorrente a ser condenado em vários processos disciplinares por tais faltas, a penas que chegaram à suspensão do exercício da advocacia;
21. Tais faltas prejudicaram gravemente os interesses dos cidadãos que confiaram ao mesmo a luta pelos seus direitos, obrigação que o requerente desprezou, e causaram demoras injustificadas e indesculpáveis na aplicação da justiça, que se quer célere, tendo sido violados alguns dos princípios mais elementares do Direito com tais comportamentos;
22. Pelo exposto, não se encontra preenchido nenhum dos pressupostos em que deve assentar uma decisão de suspensão de eficácia, nem a suspensão da inscrição, como advogado, do recorrente, tem carácter preventivo ou disciplinar;
23. O recorrente vem agora invocar a nulidade ou a inexistência do acto em causa, algo que nunca antes havia invocado nos autos, para tentar defender-se da sua própria inacção, ao não ter interposto recurso contencioso do mesmo, em devido tempo;
24. No entanto, na sua petição inicial, o recorrente defende a anulabilidade da deliberação recorrida e não a sua nulidade e muito menos a sua inexistência;
25. Ao invocar pretensos fundamentos estranhos à presente acção, em sede de recurso, o recorrente não está a por em causa a decisão proferida nos autos, antes pretende apresentar uma teoria jurídica sobre a mesma situação, que é totalmente inovadora, e sobre a qual tal decisão não se pronunciou, porque nunca antes invocada nos autos;
26. Segundo o princípio do dispositivo, "quod non est in acta non est in mundo", pelo que tais fundamentos não podem ser utilizados agora para por em causa a deliberação que constitui objecto dos presentes autos, nem a decisão que versou sobre o alegado pelas partes na acção;
27. Pelo que, deve ser tomada em conta a caducidade do direito de acção do recorrente, e declarada a inutilidade superveniente do seu pedido de suspensão de eficácia.

*
O Digno. Magistrado do Ministério Público junto do TSI emitiu o seguinte douto parecer (fls. 250 e 251):
A, identificado nos autos, recorre da sentença de 26 de Junho de 2019, do Tribunal Administrativo, que recaiu sobre o procedimento cautelar de suspensão de eficácia da deliberação de 09 de Janeiro de 2019, da Direcção da Associação dos Advogados de Macau, acto através do qual foi determinada a suspensão da sua inscrição como advogado.
Na douta sentença recorrida veio a julgar-se inverificado o requisito "prejuízo de difícil reparação" previsto no artigo 121.°, n.º 1, alínea a), do Código de Processo Administrativo Contencioso, e aventou-se a hipótese de caducidade da suspensão, nos termos do artigo 131.°, n.º 7, do mesmo diploma, o que levou ao indeferimento da pretendida suspensão.
Na sua alegação de recurso e respectivas conclusões, o recorrente diz ter havido erro de julgamento, porquanto está em causa um acto de cariz disciplinar, o que, nos termos do artigo 121.°, n.º 3, do Código de Processo Administrativo Contencioso, dispensa a verificação daquele requisito, ao que acresce que o acto padece de invalidades que o tomam impugnável a todo o tempo.
Vejamos.
A suspensão da inscrição não faz parte das penas previstas no Código Disciplinar dos Advogados - cf. artigo 41.° - estando aí prevista, sim, a suspensão do exercício da advocacia. Todavia, é inegável que a suspensão da inscrição pode funcionar, na prática, como verdadeira pena de suspensão do exercício da advocacia. Mas, com excepção da suspensão da inscrição motivada pela aplicação de penas disciplinares de suspensão, parece que os demais casos previstos no artigo 12.° do Regulamento de Acesso à Advocacia são estabelecidos primordialmente no interesse dos próprios advogados, cessando a suspensão da inscrição logo que finde o motivo que a determinou. No caso em análise, dados os seus contornos, onde pontuam a referência à violação de diversos deveres, que não apenas à ausência por mais de 6 meses - pois se fosse apenas isto que estivesse em causa, a inscrição teria sido reactivada com o termo da alegada ausência, ausência que aparenta ter cessado - inclinámo-nos para considerar que, substancialmente, está em causa uma punição de cariz disciplinar.
Isto implica a desnecessidade de demonstração do requisito da alínea a) do artigo 121.°, n.º 1, do Código de Processo Administrativo Contencioso, nessa medida não sendo de sufragar a decisão proferida.
Só que, como en passant se refere na douta sentença recorrida, este procedimento de suspensão deve considerar-se caducado porquanto, independentemente do tipo das invalidades que venham a ser assacadas ao acto, não foi observado o prazo de caducidade previsto no artigo 130.°, n.º 7 do Código de Processo Administrativo Contencioso. Ora, desde que seja lançada mão da suspensão de eficácia, este prazo é obrigatoriamente aplicável, sejam quais forem as invalidades a imputar ao acto.
Ante o exposto, o nosso parecer vai no sentido de se considerar caducada a providência, com a inerente desnecessidade/inutilidade do conhecimento do outro fundamento do recurso.
* * *
Foram colhidos os vistos legais.
Cumpre analisar e decidir.
* * *
    II – PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
Este Tribunal é o competente em razão da nacionalidade, matéria e hierarquia.
O processo é o próprio e não há nulidades.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária e são dotadas de legitimidade “ad causam”.
*
Foi suscitada uma questão prévia que é o efeito deste recurso.
O Tribunal a quo fixou o efeito suspensivo, enquanto a Recorrida veio a defender que o presente recurso deve ter efeito meramente devolutivo.
Quid Juris?
É uma questão prévia “falsa”.
Está em causa um recurso contra a decisão proferida pelo TA num processo de suspensão da eficácia do acto administrativo. Ao receber o recurso, o Tribunal a quo fixou o efeito suspensivo (fls. 200), tendo sido mantido o mesmo efeito pelo Tribunal ad quem mediante o despacho de fls. 244/v dos autos.
Tal despacho foi notificado às partes em 29/07/2019 (fls. 246), nenhuma delas veio reclamar ou recorrer desta decisão. Formou-se assim caso julgado e consequentemente não pode agora em alegações a Recorrida veio a suscitar questão sobre esta matéria.
Pelo expendido, não tomamos conhecimento desta questão levantada.

*
Não há excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
* * *
    III – FACTOS
São os seguintes elementos considerados assentes, extraídos do processo principal e do processo administrativo com interesse para a decisão da causa:
1) - O Requerente (ora Recorrente) é advogado inscrito na Associação dos Advogados de Macau.
2) - Por deliberação da Direcção da Associação dos Advogados de Macau (AAM), tomada em 9 de Janeiro de 2019, determinou-se a suspensão com efeitos imediatos da sua inscrição como advogado, com fundamento no seu desprezo pelas normas e deontologia que regem a advocacia e no não preenchimento dos requisitos para o exercício da profissão (conforme a notificação da deliberação junta a fls. 12 a 14 dos autos).
3) - A referida deliberação foi notificada ao Recorrente/Requerente e que tem o seguinte teor:
     Vimos, pelo presente, informar V. Exa. de que, em obediência ao disposto nos art.ºs 30.°, n.º 1, alíneas a), c) e d), e n.º 2, do Estatuto do Advogado, e art.º 29.°, n.º 1, alíneas b), c) e i), dos Estatutos da AAM, foi deliberado, em reunião da Direcção da Associação de Advogados de Macau (AAM), de 9 de Janeiro último, suspender, com efeitos imediatos, a sua inscrição, como advogado, tendo em conta o seguinte:
     a) Ausência da RAEM., por período superior a seis meses no espaço de um ano, o que determina a suspensão da inscrição, como advogado, nos termos da alínea e) do n.º 1, do artigo 12.º do Regulamento do Acesso à Advocacia.
     E facto público que V. Exa. se encontra há vários anos ausente de Macau, seja por se encontrar radicado em Portugal, a exercer a advocacia, seja, agora, também em Timor-Leste, onde inclusivamente foi eleito Secretário Geral da associação dos advogados local.
     Para efeitos da aplicação da norma acima referida, foi-lhe notificado, por oficio com a referência n.º 1726/18 e datado de 5 de Outubro de 2018, que informasse esta Direcção, no prazo de 10 (dez) dias, sobre as datas das suas entradas e saídas do território da RAEM, nos últimos dois anos.
     Tendo invocado não o poder fazer por circunstâncias alheias à sua vontade, comprometeu-se V. Exa a, no prazo de um mês, apresentar as referidas datas. No entanto, nunca o veio a fazer
     Para o mesmo efeito, por nosso ofício com a referência n.º 1930/18, datado de 5 de Novembro de 2018, foi-lhe exigido que emitisse uma declaração de autorização de obtenção de certidão e consulta do registo de entradas e saídas da RAEM, durante os anos de 2017 e de 2018, junto dos Serviços de Migração do CPSP, e que entregasse a mesma na AAM, com a assinatura devidamente reconhecida por notário, no prazo de 10 (dez) dias.
     Tal como a anterior, também esta exigência não foi cumprida.
     b) Abertura de escritório de advocacia distinto do domicílio profissional, apesar de exercer sozinho a advocacia, em morada e com denominação não autorizada, diferentes do escritório original, à revelia da AAM.
     Tal situação viola o disposto no art.º 11.°, n.ºs 2 e 4, do Regulamento do Acesso à Advocacia, e nas regras n.º 1 - Parte B, e n.º 1 - Parte C, das "Regras para o uso de nomes profissionais de advogados e de denominações para os escritórios de advogados", aprovadas em Assembleia Geral de 18 de Outubro de 2012, cuja cópia se anexa.
     A mesma situação indicia ainda a possibilidade da violação do disposto no art.º 18.°, n.º 3, do Estatuto do Advogado, que implica a aplicação de pena de suspensão da inscrição, como advogado, ao visado.
     c) Adopção de um novo nome profissional não aprovado pela AAM, apesar de notificado sobre a não aceitação dos vários nomes por si propostos, e dos motivos invocados para a adopção dos mesmos, em violação do disposto nos n.ºs 2 e 3, do artigo 5.°, do Regulamento do Acesso à Advocacia, bem como das referidas "Regras para o uso de nomes profissionais de advogados e de denominações para os escritórios de advogados".
     Para além do desprezo pelas normas e deontologia que regem a advocacia, os factos acima descritos implicam o não preenchimento dos requisitos básicos para o exercício da profissão por parte de V. Exa.
     Desta deliberação cabe recurso contencioso, a interpor no prazo de 30 (trinta) dias, para o Tribunal Administrativo.
4) - No dia 21 de Janeiro de 2019, o Requerente requereu a suspensão da eficácia da referida suspensão da inscrição como advogado junto do TA.
* * *
    IV - FUNDAMENTOS
Como o presente recurso tem por objecto a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo, importa ver o que este decidiu. Este afirmou:
I. Relatório

Requerente A, melhor identificado nos autos, requer,
A Suspensão de Eficácia
Da deliberação da Direcção da Associação dos Advogados de Macau (AAM), tomada em 9 de Janeiro de 2019, que determinou a suspensão com efeitos imediatos da sua inscrição como advogado,
Com os fundamentos constantes a fls. 2 a 11 dos autos.
*
Contesta a entidade requerida, pugnando pela improcedência da providência, com os fundamentos constantes a fls. 141 a 152 dos autos.
*
O Digno Magistrado do Ministério Público pronuncia-se contra o deferimento da pretensão, por não ser verificado o requisito da alínea a) do n.º 1 do art.º 121.º do CPAC, com os fundamentos a fls. 186 e v dos autos.
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Este Tribunal é o competente em razão da matéria e da hierarquia.
As partes são dotadas de personalidade e capacidade judiciária e de legitimidade “ad causam”.
O processo é o próprio.
Inexistem nulidades, ou questões prévias que obstem a apreciação “de meritis”.
***
II. Fundamentação

1. De facto

Considera-se documentalmente provada a seguinte factualidade pertinente:
(…)

2. De direito

Face aos factos apurados, cumpre agora aplicar o direito.

Estando em causa o acto que determinou a suspensão da inscrição do requerente na AAM, acto este, com conteúdo positivo, enquadra-se no disposto do art.º 120.º, alínea a) do CPAC, cuja eficácia pode ser suspensa.

No que respeita aos requisitos da suspensão, o disposto da referida norma do art.º 121.º estatui o seguinte:
“1. A suspensão de eficácia dos actos administrativos, que pode ser pedida por quem tenha legitimidade para deles interpor recurso contencioso, é concedida pelo tribunal quando se verifiquem os seguintes requisitos:
a) A execução do acto cause previsivelmente prejuízo de difícil reparação para o requerente ou para os interesses que este defenda ou venha a defender no recurso;
b) A suspensão não determine grave lesão do interesse público concretamente prosseguido pelo acto; e
c) Do processo não resultem fortes indícios de ilegalidade do recurso.
2. Quando o acto tenha sido declarado nulo ou juridicamente inexistente, por sentença ou acórdão pendentes de recurso jurisdicional, a suspensão de eficácia depende apenas da verificação do requisito previsto na alínea a) do número anterior.
3. Não é exigível a verificação do requisito previsto na alínea a) do n.º 1 para que seja concedida a suspensão de eficácia de acto com a natureza de sanção disciplinar.
4. Ainda que o tribunal não dê como verificado o requisito previsto na alínea b) do n.º 1, a suspensão de eficácia pode ser concedida quando, preenchidos os restantes requisitos, sejam desproporcionadamente superiores os prejuízos que a imediata execução do acto cause ao requerente.
5. Verificados os requisitos previstos no n.º 1 ou na hipótese prevista no número anterior, a suspensão não é, contudo, concedida quando os contra-interessados façam prova de que dela lhes resulta prejuízo de mais difícil reparação do que o que resulta para o requerente da execução do acto.”

No caso vertente, não se tendo verificado as situações excepcionais previstas nos n.ºs 2, 3 e 4 da norma citada, a solução consiste em saber se o requerente alegue e prove os requisitos cumulativos das três alíneas do n.º 1 da mesma norma.

No que concerne ao “prejuízos de difícil reparação” aludido no n.º 1, alínea a) do referido preceito legal, importa lembrar que, em vários acórdãos seus, o Tribunal de Última Instância densificou tal conceito indeterminado nos seguintes termos:
“…o dano susceptível de quantificação pecuniária pode ser considerado, em certas situações, de difícil reparação para o requerente, tais como os casos ‘em que a avaliação dos danos e a sua reparação, não sendo de todo em todo impossíveis, podiam tornar-se muito difíceis’, os prejuízos ‘decorrentes de actos que determinem a cessação do exercício da indústria, comércio ou actividades profissionais livres’ bem como consistentes ‘na privação de rendimentos geradora de uma situação de carência quase absoluta e de impossibilidade de satisfação das necessidades básicas e elementares’…” (cfr. Acórdãos de 27 de Setembro de 2018, proc. n.º 69/2018 e de 25 de Abril de 2001, proc. n.º 6/2001 ).

“…Mesmo que o interessado sofra danos com a execução de um acto administrativo, se lograr obter a anulação do acto no respectivo processo, pode, em execução de sentença, ser indemnizado dos prejuízos sofridos. E se esta via não for suficiente pode, ainda, intentar acção de indemnização para ressarcimento dos prejuízos. Por isso, só se os prejuízos forem de difícil reparação, isto é, que não possam ser satisfeitos com a utilização dos falados meios processuais, é que a lei admite a suspensão da eficácia do acto…” (cfr. Acórdão de 4 de Novembro de 2009, proc. n.º 33/2009).

“Só os prejuízos que não possam ser satisfeitos com a utilização dos meios legais (em execução de sentença ou por via de acção de indemnização) é que se devem considerar de difícil reparação.” (cfr. Acórdão de 29 de Junho de 2016, proc. n.º 35/2016).

Além do mais, o ónus de prova quanto aos “prejuízos de difícil reparação” compete ao requerente (cfr. Código de Processo Administrativo Contencioso Anotado, Viriato Lima e Álvaro Dantas, CFJJ, p.348).

No caso vertente, lamentavelmente, o requerente não logrou demonstrar a existência dos “prejuízos de difícil reparação”, que adviria da execução imediata do acto suspendendo.

Como se pode constatar na sua petição inicial, o requerente apenas referiu-se à impossibilidade de receber honorários por causa da suspensão da sua actividade profissional em Macau, bem como, vagamente, à sua necessidade de enfrentar as despesas diárias, sem no entanto juntar documentos comprovativos que nos patenteiam sua afirmação conclusiva de que“A impossibilidade de receber honorários provenientes da actividade de advocacia iriam provocar graves prejuízos e de difícil reparação…”. Não sabemos qual é o honorário que o requerente costumava receber, se este tem ou não outras fontes de rendimento, nem conhecemos as perdas efectivas que o requerente poderia sofrer, o que seria fundamental para avançar com o juízo de probabilidade sobre a gravidade dos prejuízos.

Com efeito, julgamos que o requisito não se pode ter por verificado, quer por falta da prova daquilo que alega, quer pela irrelevância daquilo que alega para sustentar a sua pretensão.

Posto isto, a ausência do referido requisito basta para julgar improcedência a providência, embora sempre se diga que a providência seria inútil pela ocorrência superveniente da circunstância em que, em relação ao acto suspendendo, o requerente não chegou a interpor o recurso contencioso da anulação.

Com isto quer dizer, se bem que a providência de suspensão fosse decretada pelo tribunal, impor-se-ia sempre a sua caducidade nos termos do art.º 130.º, n.º 7 do CPAC, pela falta da interposição do recurso contencioso no prazo legal previsto no art.º 25.º, n.º 2 do CPAC. E afigura-se-nos que esta falta cometida pelo requerente por causa da sua inércia, tendo sido verificada na pendência desta providência, determinaria também o naufrágio da sua pretensão pela inutilidade da lide.

Concluindo, deve-se julgar improcedente a providência.
***

III. Decisão

Assim, pelo exposto, decide-se:
Julgar improcedente o pedido do requerente.
*
Custas pelo requerente, com taxa de justiça em 5 UC.
*
Registe e notifique.
*
Quid Juris?
Neste recurso são colocadas a este Tribunal ad quem essencialmente as seguintes duas questões:
1) – Preenchimento ou não dos requisitos exigidos pelo artigo 121º do CPAC para decretar, a pedido do Recorrente/Requerente, a suspensão da eficácia da referida deliberação tomada pela Direcção da Associação dos Advogados de Macau?
2) – Verificação ou não da caducidade da suspensão motivada pela não interposição do recurso contencioso contra a respectiva deliberação no prazo legalmente fixado?

Comecemos pela 2ª questão acima indicada, ou seja, procuremos saber se está verificada ou não a caducidade da suspensão em causa.
A este propósito, o artigo 130º (mormente o seu nº 7) (Decisão e seu regime) do CPAC manda:
1. Quando considere manifesta a verificação de circunstâncias que obstem ao conhecimento do pedido, a decisão pode ser proferida apenas pelo relator.
2. A suspensão pode ser sujeita a termo ou condição.
3. A decisão que suspenda a eficácia é urgentemente notificada ao órgão administrativo para cumprimento.
4. A decisão que suspenda a eficácia deve ser imediatamente cumprida.
5. Para efeitos do disposto no número anterior, o órgão administrativo competente não pode iniciar ou prosseguir a execução do acto, deve impedir, com urgência, que os serviços ou os interessados procedam ou continuem a proceder à execução e encontra-se obrigado a adoptar as providências necessárias à neutralização da execução já realizada e à eliminação dos efeitos já produzidos.
6. Excepto determinação em contrário, a suspensão subsiste até ao trânsito em julgado da decisão do recurso contencioso.
7. Quando seja pedida previamente à interposição do recurso, a suspensão caduca com o termo do prazo de que o requerente dispõe para interpor recurso de actos anuláveis sem que aquela interposição tenha tido lugar.
Em torno do nº 7 do preceito legal citado, pode suscitar-se alguma dúvida ao nível da interpretação.
Anotou-se (cfr. in Notas e Comentários ao CPAC, José Cândido de Pinho, CFJJ, 2018, Vol. II, pág. 297):
“7 – O nº 6 não constitui a única fonte de caducidade da suspensão.
O nº 7, quanto a este aspecto, também dispõe que se a suspensão tiver sido pedida antes da interposição do recurso contencioso (cfr. art.123º, nº 1, al. a)), haverá lugar à sua caducidade se o interessado não deduzir a impugnação contenciosa dentro do prazo de que dispõe para recorrer dos actos anuláveis, nos termos do art.25º, nº 2.
Dito isto, é bom perguntar se a mesma regra funcionará nos casos de actos nulos ou inexistentes, que, como se sabe, são impugnáveis a todo o tempo (art.25º, nº 1). Quanto a eles, a regra da caducidade do nº 7 não funcionará? (Sublinhado nosso)
Pareceria que sim, à partida. Todavia, essa solução, segundo alguma corrente de opinião, poderia levar o interessado – munido de uma decisão favorável – a perder o interesse em recorrer contenciosamente do acto, remetendo-se à inacção. E isso seria o mesmo que deixar nas suas mãos, e a seu bel-prazer, a decisão sobre a regulação judicial-substantiva do acto, o que se poderia tornar intolerável do ponto de vista do interesse público em causa. (Sublinhado nosso)Por isso é que alguma jurisprudência comparada se foi afinando pela ideia de que o prazo para recorrer contenciosamente mesmo nos casos de actos nulos e inexistentes, para efeito de caducidade da providência, deve ser o mesmo que para o recurso de actos anuláveis (v.g. Ac. do STA, de 28/07/1999, Proc. nº 045234; Ac. STA, de 11/10/2001, Proc. nº 047968).
Não se trata, contudo, de uma posição consensual. Já por isso, não se deixa de registar que outra jurisprudência se tenha inclinado para a ausência de prazo concernente ao pedido das providências em casos de actos nulos e inexistentes (Sublinhado nosso) (v.g., Ac do TCA, de 22/03/2007, Proc. nº 02323/07), tese que igualmente mereceu a adesão de alguma doutrina (Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, Comentário… cit., pág.832-833; Fernando Brandão Ferreira Pinto e Guilherme Pereira da Fonseca, Direito Processual Administrativo Contencioso, 1991, pág. 165, nota 616).
O que oferecemos a dizer?
1) – Em primeiro lugar, coerentemente interpretada a norma em causa, inclinamo-nos para a ideia de que o nº 7 do artigo 130º do CPAC estabelece um prazo único, aplicável quer às situações de acto administrativos nulos, quer de actos anuláveis. E isto até se compreende pelo facto de não ser possível apurar na suspensão se o acto suspendendo padece de nulidade ou de anulabilidade. Ou seja, nesta situação, o legislador manda observar apenas o prazo fixado para atacar os actos anuláveis (não se curando de saber se se trata de acto que padeça de vício invalidante de nulidade ou anulabilidade), porque é uma medida mais segura para proteger os interesses dos particulares, pois, tantas vezes que ao acto atacado foi inicialmente imputado o vício invalidante de nulidade, mas o Tribunal acabou vir a decidir que o acto atacado era anulável. Uma vez interposto o competente recurso contencioso dentro do prazo legislativamente fixado, o recorrente fica mais protegido neste aspecto.
2) – Em segundo lugar, no nº 7 do artigo em análise, o legislador utilizou cautelosamente a expressão de “ a suspensão caduca” (…) e não a medida caduca, o que nos permite concluir, com alguma segurança, que tal suspensão, tanto pode decorrer directamente do efeito do artigo 126º/1 do CPAC (suspensão provisória decorrente da mera interposição do recurso), como da decisão judicial que decretou a suspensão. Seja como for, o respectivo contencioso há-de ser proposto dentro do prazo referido no artigo 130º/7 que remete para o artigo 25º/2 do CPAC.
Ora, os autos demonstram que o pedido de suspensão do Requerente (ora Recorrente) foi apresentado no TA em 21/01/2019 e a decisão foi proferida em 26/06/2019. Porém, como não foi interposto o recurso contencioso nos termos do disposto no artigo 130º/7 do CPAC que remete para o prazo fixado no artigo 25º/2 do CPAC, gera-se caducidade da providência requerida, com a inerente desnecessidade/inutilidade do conhecimento do outro fundamento do recurso.
Ou seja, face ao decidido, torna-se inútil apreciar a primeira questão, que consiste em saber o Requerente reuniu ou não os pressupostos exigidos pelo artigo 121º do CPAC.
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Tudo visto, resta decidir.
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    V - DECISÃO
Em face de todo o que fica exposto e justificado, os juízes do TSI acordam em negar provimento ao presente recurso jurisdicional, mantendo-se a sentença recorrida proferida pelo Tribunal Administrativo.
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Custas pelo Recorrente que se fixam em 5 UCs.
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Notifique e Registe.
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RAEM, 05 de Setembro de 2019.

(Relator) Fong Man Chong

(Primeiro Juiz-Adjunto) Ho Wai Neng

(Segundo Juiz-Adjunto) José Cândido de Pinho

Mai Man Ieng
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