Processo n.º 531/2016
(Autos de recurso contencioso)
Relator: Fong Man Chong
Data: 12/Setembro/2019
Assuntos:
- Conceitos de “terrenos pequenos” e “construção regular” utilizados no artigo 55º da Lei nº10/2013 (Lei de Terras) e tarefa interpretativa
SUMÁRIO:
I – Para efeito do disposto no artigo 55º/1-3) da Lei nº10/2013 (Lei de Terras), os conceitos aí utilizados “terrenos pequenos” e “construção regular” são de tipo indeterminado, cuja densificação implica uma certa margem de interpretação por parte de quem tem competência para decidir.
II – Nestes termos, a Administração goza de prerrogativa para densificar os referidos conceitos indeterminados, tendo em conta os pressupostos da lei e o interesse público envolvido em causa. No caso, é difícil ao Tribunal substituir-se à Administração sindicar a avaliação feita pela mesma na densificação do conceito de “pequenez”.
II - Se o acto administrativo recorrido visa prosseguir um dos interesses públicos, que é assegurar que os terrenos sejam utilizados nos limites fixados pelo legislador e à luz do procedimento normal, valores estes perante os quais devem ceder os interesses pessoais dos interessados, salvo nos casos muito excepcionais e que se imponham considerações de outra ordem, mas não é o caso dos autos.
O Relator,
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Fong Man Chong
Processo n.º 531/2016
(Autos de recurso contencioso)
Data : 12/Setembro/2019
Recorrentes : A, B, C, D, E, F, G, H, I, J, K, L
Entidade Recorrida : Secretário para os Transportes e Obras Públicas
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ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA RAEM:
I – RELATÓRIO
A e os demais Recorrentes, todos devidamente identificados nos autos, discordando do despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas, datado de 23/05/2016, exarado sobre a informação nº 120/DSODEP/2016, de 19/05/2016, veio, em 11/07/2016, interpor o competente recurso contencioso para este TSI, com os fundamentos constantes de fls. 2 a 11, tendo formulado as seguintes conclusões:
1. O art.º 55.°/1/3) da LEI DE TERRAS determina que a administração dispensar o concurso público como meio de selecção do concessionário, quando as parcelas a conceder reúnam as seguintes condições: a) serem pequenas, insuficientes para construção regular; b) serem confinantes com terreno concedido ao requerente; e c) que não possam aproveitar a qualquer outro proprietário ou concessionário confinante.
2. O despacho recorrido recorre aos conceitos "pequeno" e "insuficiente para construção regular", conceitos vagos e indeterminados, sem empreender qualquer esfoço de densificação daqueles conceitos.
3. Sem uma noção operativa útil do que seja "pequeno" e "insuficiente para construção regular", a decisão recorrida sofre de obscuridade, e não permite que os RECORRENTES a compreendam plenamente, bem como impede o controlo jurisdicional da sua conformidade com a lei.
4. Existe falta de fundamentação quando a administração se limita a remeter para os conceitos legais que definem os pressupostos ou condições de intervenção administrativa, ou quando indica conceitos vagos ou meros juízos conclusivos para relatar os interesses por que se motivou.
5. Quando o legislador utiliza conceitos indeterminados, confere à Administração um poder discricionário de conformar esses mesmos conceitos, interpretando-os e moldando-os às especificidades do caso concreto. Como contrapartida, exige que o intérprete-aplicador se empenhe num esforço argumentativo sério de convencer os particulares - por recurso ao critério da pessoa razoável colocada na pessoa do destinatário -, fornecendo-lhes uma justificação suficientemente clara, precisa e congruente da forma como preencheu aqueles conceitos indeterminados.
6. Por ignorar esse esforço, a decisão recorrida padece do vício de insuficiência de fundamentação.
7. A decisão recorrida padece de vício de violação de lei, ao fazer uma interpretação errada da norma do art.º 55.°/1/3) da LEI DE TERRAS, ao operar uma cisão entre a dimensão parcela a conceder e a sua aptidão para ser objecto de construção regular.
8. Não é essa a intenção subjacente à intenção do legislador, uma vez que a oração "insuficientes para construção regular" - é uma oração subordinada da primeira - "pequenas parcelas de terreno".
9. Do mesmo modo, a decisão recorrida erra ao operar uma interpretação restritiva da norma do art.º 55.°/2 da LEI DE TERRAS, e ao ignorar os argumentos invocados pelos RECORRENTES, não dando qualquer relevo aos princípios da sustentabilidade, do aproveitamento útil e efectivo dos terrenos, da promoção do desenvolvimento urbano harmonioso e sustentável, da promoção da melhoria do ambiente habitacional, normativamente pela LEI DE TERRAS e pela LEI DO PLANEAMENTO URBANÍSTICO, os quais, como princípios norteadores das leis em que se integram, espelham as opções de interesse público tomadas pelo legislador.
10. Pelos vícios apontados, a decisão recorrida violou as normas dos artigos 115.°/2 do CÓDIGO DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO, e os artigos 55.°/1/3) e 55.°/2 da LEI DE TERRAS.
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Citada a Entidade Recorrida, o Senhor Secretário para os Transportes e Obras Públicas veio contestar o recurso com os fundamentos constantes de fls. 83 a 93, tendo formulado as seguintes conclusões:
1. O objecto do presente recurso contencioso é o despacho de "concordo" do STOP, de 5 de Maio de 2016, exarado na proposta n.º 120/DSODEP/2016, de 19 de Maio, que indeferiu o pedido de modificação do aproveitamento do terreno sito na Rua X S/N em Coloane, com a área de 56m2 e ainda a concessão por arrendamento, com dispensa de concurso público, de duas parcelas do terreno contíguo, para serem anexadas e aproveitadas conjuntamente;
2. O acto recorrido recorre aos conceitos "pequeno" e "insuficiente para construção regular" por comparação com a área de terreno já concedida aos Recorrentes;
3. Comparando os 56m2 de cujo domínio útil os Recorrentes são titulares com os 57m2 que pretendam que a Administração lhes conceda resulta óbvio, para o homem médio, colocado na situação dos Recorrentes, que o terreno que pretendem lhes seja concedido não é pequeno e nem insuficiente para construção regular.
4. Deste modo, bem andou a Administração ao indeferir o pedido dos Recorrentes.
5. De facto, “pequeno” é um conceito relativo e afere-se por comparação ao terreno de cujo domínio útil os Recorrentes são titulares.
6. Donde é forçoso concluir que o despacho recorrido não faz uma interpretação errada da norma constante da alínea 3), do n.º 1 do artigo 55.º da Lei de terras.
7. O projecto que os Recorrentes apresentaram para os terrenos em que pretendem efectuar o aproveitamento conjunto não se enquadra no n.º 2 do artigo 55 da Lei de terras.
8. Com efeito, tal projecto visa a obtenção de lucro pela exploração de um ramo comercial o que, legítimo embora, não se enquadra nem se funda no interesse público que favoreça o desenvolvimento da sociedade da RAEM, nomeadamente não constitui a promoção do desenvolvimento urbano harmonioso e sustentável nem a promoção da melhoria do ambiente habitacional, mais do que o constituiria qualquer outro projecto especulativo passível de aprovação porquanto é o interesse público previsto no n.º 2 do artigo 55.º da Lei de terras que norteia a actuação da Administração.
9. A decisão administrativa recorrida não viola o n.º 2 do artigo 115.º do CPA e do mesmo modo não viola a alínea 3 do n.º 1 do artigo 55 da Lei de terras, não violando também o n.º 2 do artigo 55.º da Lei de terras.
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O Digno. Magistrado do Ministério Público junto do TSI emitiu o seguinte douto parecer (fls. 158 e 159):
Objecto do presente recurso contencioso é o acto de 23 de Maio de 2016, da autoria do Exm.° Secretário para os Transportes e Obras Públicas, que indeferiu pedido dos recorrentes, A e outros, em vista de modificação do aproveitamento de um terreno com a área de 56 m2, junto à Rua X, s/n, em Coloane, e de concessão por arrendamento, com dispensa de concurso público, de duas parcelas de terreno contíguo, com a área total de 57 m2, com vista a anexação e aproveitamento conjunto.
Os recorrentes acham que o acto padece de insuficiência de fundamentação e que viola, por erro de interpretação, as normas do artigo 55.°, n.ºs 1, alínea 3), e 2, da Lei de Terras.
Vejamos.
Começam os recorrentes por assinalar que o acto padece de insuficiência de fundamentação. Argumentam, com efeito, que a Administração lidou com conceitos indeterminados, tais como "pequenas parcelas" e "construção regular", sem os densificar de forma a que os destinatários do acto pudessem compreender o que se entende por "pequeno" e por "construção regular".
É verdade que a Administração, num segmento da fundamentação, utilizou aqueles conceitos indeterminados, o que, por norma, é de evitar, pois isso geralmente dificulta a apreensão dos motivos por que se decidiu duma certa forma e não doutra. Mas, no caso em análise, crê-se que essa dificuldade não ocorreu. Os recorrentes sabiam o que tinham requerido e conheciam a configuração rectilínea e a área das parcelas A1 e B1 em questão, conforme se pode ver da planta e legenda que juntaram a fls. 28 a 29. Daí que as questionadas expressões utilizadas no acto nenhuma obscuridade lhes tenham suscitado quanto ao sentido e alcance da decisão. Aliás, constata-se, a partir da petição de recurso, que os recorrentes compreenderam bem as razões do acto, tanto no plano fáctico, como no plano normativo, pelo que a fundamentação tem que se ter por suficiente.
Improcede o vício de falta de fundamentação.
Depois, a recorrente sustenta que o acto Incorreu em errada interpretação da norma do artigo 55.°, n.º 1, alínea 3), da Lei de Terras. A seu ver, o juízo acerca da pequenez ou não das parcelas tem que ser feito à luz da respectiva insuficiência ou suficiência para permitir construção regular, ou seja, mediante um critério funcional, o que não teria estado presente no raciocínio da Administração.
Parece-nos que é correcta a visão dos recorrentes quanto à norma em análise. Porém, a circunstância de o acto haver lidado com os conceitos "pequenas parcelas" e "(in)suficiência para construção regular" sem evidenciar ostensivamente esse critério funcional, não significa que haja violado a norma. Se atentarmos no ponto 5 da fundamentação que foi apropriada pelo acto e se a correlacionarmos com a geometria das duas parcelas em questão constatamos que a interpretação aí adoptada para a norma do artigo 55.°, n.º 1, alínea 3), da Lei de Terras, coincide, ao cabo e ao resto, com a que é proposta pelos recorrentes.
De resto, não havendo plano válido e eficaz para a zona, a disciplinar as áreas mínimas de implantação admissíveis, a interpretação adoptada tem que se aceitar, pois é público e notório que, em Macau, um terreno rectangular com uma área de 57m2, é suficiente para implantar uma construção.
Soçobra também este vício.
Por fim, os recorrentes aduzem que o acto incorreu em errada interpretação do artigo 55.°, n.º 2, da Lei de Terras. Isto porque sustentam que as situações aí elencadas não são taxativas, como se retira da utilização do advérbio "designadamente", tendo o acto omitido a ponderação do interesse público de índole urbanística representado pelo projecto que se propunham implementar. Concordando-se embora que as situações elencadas na alínea 1) do n. ° 2 do referido artigo não são taxativas, pois isso mesmo é sugerido pela utilização do advérbio "designadamente", não se crê que assista razão aos recorrentes. Na verdade, parece seguro que a norma em questão não pretende contemplar pequenos empreendimentos privados, como é o caso, ainda que possam contribuir para a melhoria do ordenamento urbanístico e promover, dessa forma, o interesse público. É que o interesse público prosseguido pela norma é aquele que favoreça o desenvolvimento da sociedade da Região Administrativa Especial de Macau, o que aponta para empreendimentos de monta, de grande impacto público e social, como resulta da letra da alínea 1) do n.º 2 e é reforçado pelo n.º 3 do aludido artigo 55.°.
Não se detecta, pois, o aventado erro de interpretação, pelo que também este vício improcede.
Termos em que o recurso não merece provimento.
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Foram colhidos os vistos legais.
Cumpre analisar e decidir.
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II – PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
Este Tribunal é o competente em razão da nacionalidade, matéria e hierarquia.
O processo é o próprio e não há nulidades.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária e são dotadas de legitimidade “ad causam”.
Não há excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
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III – FACTOS
São os seguintes elementos, extraídos do processo principal e do processo administrativo com interesse para a decisão da causa:
14. Os RECORRENTES são titulares do domínio útil do prédio rústico sito em Macau, na Ilha de Coloane, sem número, da Rua X, com a área de 56,000 m2, omisso na matriz mas descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º ... (cfr. certidão do Registo Predial, que protesta juntar).
15. O terreno é formado por três parcelas, denominadas "A2", "B2" e "C", com as áreas, respectivamente, de 20 m2, 14 m2 e 22 m2 (cfr. Doc. 6, planta da DSCC).
16. Perfazendo uma área total de 56 m2.
17. O domínio directo deste terreno encontra-se registado a favor do Território de Macau, pela inscrição n.º …, a fls. …. do L.º ...
18. Nesse terreno encontra-se edificada uma pequena moradia, edificada por X, pai e avô dos RECORRENTES, para habitação da família.
19. Além do terreno mencionado, essa moradia ocupa também duas parcelas de terreno, denomina “A1” e “B1”, com as áreas, respectivamente, de 44 m2 e 13 m2,
20. Que perfazem uma área total de 57,000 m2,
21. Parcelas essas que se se encontram concedidas, e que se encontram omissas na Conservatória do Registo Predial da RAEM.
22. A área total das parcelas e terreno "A1", "A2", "B1", "B2" e "C'' é, assim, de 113 m2.
23. A dita casa possui uma área coberta de 64,000 m2, uma área descoberta de 27,000 m2, e ainda um anexo abarracado com a área de 22,000 m2, ocupando uma área total de 113,000 m2.
24. Preenchendo, assim, a totalidade das parcelas de terreno acima descritas.
25. Esta edificação encontra-se em adiantado estado de deterioração, e, no estado em que se encontra, não permite a sua utilização em condições de segurança e conforto mínimos (cfr. registos fotográficos que protesta juntar).
26. Os RECORRENTES pretendem proceder à demolição daquela casa, e, em seu lugar, erguer uma nova unidade habitacional e comercial, que proporcione melhores condições de habitabilidade e aproveitamento do espaço.
27. Com base nestes factos, apresentaram à DSSOPT um requerimento, acompanhado de um estudo prévio de arquitectura, em 4 de Novembro de 2014, no qual pediam:
a) A autorização da modificação do aproveitamento em conformidade com o Estudo Prévio anexo, e com as adaptações que viessem a ser exigidas por aquele Serviço;
b) A autorização da alteração da finalidade para habitação e comércio;
c) A autorização da doação à RAEM, pelos RECORRENTES, do terreno que ocupa as parcelas "A2", "B2" e "C";
d) Seguida da concessão por arrendamento, com dispensa de concurso público, a seu favor, do terreno ocupado pelas parcelas "A1", "A2", "B1", "B2" e "C", presentemente ocupado por eles mesmos (cfr. Doc. 4, e projecto de arquitectura que consta do processo administrativo).
28. Em 12 de Dezembro de 2012, depois de notificados para o efeito, fizeram juntar ao processo mais quatro exemplares do Estudo Prévio e cinco exemplares da Planta Cadastral do terreno descrito sob o n.º 19983.
29. Através do ofício n.º 0170/8394.01/DSODEP/2016, foram os RECORRENTES notificados da intenção do Exm.º Sr. Secretário para as Obras Públicas de indeferir os pedidos por eles formulados, convidando-os ainda a pronunciarem-se em sede de audiência dos interessados (Doc. 6).
30. Os RECORRENTES ofereceram os seus argumentos em audiência prévia, por escrito, submetida em 15 de Fevereiro de 2016 (Doc. 7).
31. Em 2 de Junho de 2016, foram os RECORRENTES notificados da decisão de indeferimento, através do ofício n.º 0537/8394.01/DSODEP/2016, na qual se afirmava (que o pedido formulado ia indeferido
"(...) por motivo de não enquadrar em qualquer uma das situações de dispensa de concurso público a que se refere o artigo 55.º da Lei n.º 10/2013 «Lei de Terras»."
32. Por entenderem que a notificação não continha os elementos impostos pela norma do art.º 70.°/ a) do CÓDIGO DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO (CPA), os RECORRENTES requereram à DSSOPT que procedesse a nova notificação do acto de indeferimento que contivesse o texto integral do acto administrativo (Doc. 3)
33. Por carta expedida com registo e aviso de recepção, foram os Recorrentes notificados do ofício n.º 82132/2016 da DSSOPT, o qual se fazia acompanhar do texto integral do acto ora em crise (Doc. 4).
- Na sequência do pedido dos Recorrentes, foi elaborada a seguinte proposta pela DSSOPT:
Assunto: Pedido, efectuado por A e outros, de modificação do aproveitamento do terreno junto à Rua X S/N em Coloane, com a área de 56 m2, e de concessão por arrendamento e com dispensa de concurso público de duas parcelas de terreno contíguo com a área total de 57 m2, para serem anexados e aproveitados conjuntamente. (Proc. n.º 8394.01)
Proposta
N.º: 120/DSODEP/2016
Data: 19/05/2016
1. Em conformidade com o Despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas de 27/01/2016, exarado na proposta n.º 019DSODEP/2016, pretende indeferir o pedido de concessão por arrendamento e com dispensa do concurso público de duas parcelas de terreno com a área total de 57 m2, efectuado por A e os seus mandantes, pelas seguintes razões:
1.1 O parecer do Departamento de Planeamento Urbanístico sugere que mantenha o terreno solicitado como reserva, bem como do ponto da vista urbanística, opor de conceder este terreno aos terceiros para o aproveitamento conjuntamente;
1.2 As parcelas de terreno solicitadas (57m2) não são insuficientes para construção regular, por outro lado, em comparação com o terreno deles (55m2), as mesmas não são pequenas, assim, não se enquadra na previsão do artigo 55.º, n.° 1, alínea 3) «Lei de Terras»;
1.3 Não se enquadra as disposições da alínea 1) do n.º 2 do artigo 55.° da mesma Lei, nomeadamente, não se funde no interesse público que favoreça o desenvolvimento da sociedade da RAEM.
2 Posteriormente, pelo ofício n.º 170/8394.01/DSODEP/2016 de 01/02/2016, foram notificados os requerentes o sentido da decisão referido, bem como nos termos dos artigos 93.° e seguintes do «Código do Procedimento Administrativo», dispõem de 10 dias, contados a partir da data de recepção da presente notificação, para dizer, por escrito, o que se lhes oferecer sobre o assunto.
3 De acordo com o aviso de recepção, foi recebido o ofício em 03/02/2016. O Advogado Sr. Vasco Passeira apresentou a audiência escrita n.º 23392/2016 em 15/02/2016, na qualidade de substabelecimento dos requerentes, resumiu-se os seguintes:
3.1 Sobre 1.1:
i. As «reservas» são "terrenos que, excluídos do regime geral de uso e ocupação, se destinam a fins especiais, de acordo com os objectivos que determinarem a sua constituição"( art11.º da "Lei de Terras»)
ii. O ofício não esclarecer em que tipo de reserva o terreno solicitado se enquadra: se numa reserva total, se numa reserva parcial, o mesmo refere se a uma outra reserva, que a não a total da Ilha de Coloane, então essa só poderá ser uma reserva parcial.
iii. De acordo com n.º3 do art. 14.° da "Lei de Terras», as reservas parciais são susceptíveis de uso ou ocupação, conquanto estas não colidam com os fins de utilidade pública visados na sua constituição. A edificação que ali se pretende erguer colide com os fins de utilidade pública visados na sua constituição.
iv. Assim, a decisão sofrerá inevitavelmente de um vício de anulabilidade, por erro sobre os pressupostos de direito.
3.2 Sobre 1.2;
i. A verdade é que um terreno de 57 m2, com forma de um polígono irregular, como aquele cuja concessão se requereu, apenas permite uma construção de muito pequena escala, com uma área bruta e cerca de 50 m2, ou menos, o que corresponde a uma área útil na ordem dos 35 m2, o que permite um aproveitamento manifestamente desadequado, quer para comércio, quer para habitação.
ii. Aliás, do ponto de vista urbanístico, um prédio com tais dimensões seria inestético e pouco ou nada funcional; o que feriria a organização urbanística existente na vila de Coloane, em contradição com o princípio do aproveitamento útil e efectivo dos solos, plasmado no art.º 5°/6) da Lei n.º 12/2013 «Lei do Planeamento Urbanístico», a qual determina dever ser assegurado o aproveitamento oportuno e racional e dos solos e a optimização do seu uso.
iii. A norma do art.º 55.°/1/3) da «Lei de Terras» apenas determina que as parcelas a conceder devem ser "pequenas, insuficientes para a construção regular", e em momento algum determina que seja tida em consideração a dimensão comparativa dos terrenos.
iv. Razão pela qual entendem os requerentes que tais argumentos não devem colher.
3.3 Sobre 1.3
i. A verdade é que as alíneas que compõem o n.º 2 do art.º55.º/2 da «Lei de Terras» compreendem uma enumeração não exaustiva das causas que podem fundamentar a dispensa de concurso público, como resulta da aposição do advérbio de modo designadamente, o que implica uma intenção deliberada do legislador em conceder ao intérprete uma leitura concretizadora da previsão normativa, norteada pelo critério orientador do corpo do artigo, i.e. o "interesse público que favoreça o desenvolvimento da sociedade da RAEM".
ii. E nele se inclui, necessariamente, a organização do território e o aproveitamento oportuno e racional e dos solos e a optimização do seu uso, tal como ordenado pelo art.° 5.°/6) da «Lei do Planeamento Urbanístico», norma que, formulando um princípio, acolhe, com primazia sobre as normas meramente concretizadoras, a ideia de interesse público territorial e urbanístico do legislador.
iii. O que os requerentes pediram foi que lhes fosse deferida, com dispensa de concurso público, a concessão por arrendamento de duas parcelas de terreno contíguas a uma outra que já lhes pertence por direito próprio, e que, conjuntamente com esta, vêm ocupando há dezenas de anos.
iv. Porém, as construções que nessas parcelas em tempos foram erguidas não correspondem ao perfil urbanístico da vila de Coloane, nem àquele que se deseja para uma zona histórica da RAEM.
v. A organização do território e o aproveitamento oportuno e racional e dos solos e a optimização do seu uso constituem, como se disse, interesse público da RAEM, por força do mencionado art.° 5.°/6 da «Lei do Planeamento Urbanístico», e, portanto, subsumível ao interesse público que forneça o desenvolvimento da sociedade da RAEM, constante da previsão do art.º 55.°/2/1) da «Lei de Terras»
Analise
4 Analisada a audiência escrita, o que está em causa é que, se ou não, o pedido dos requerentes enquadra-se a disposição do artigo 55.° sobre a dispensa de concurso público.
5 De acordo com a alínea 3) do n.º 1 do artigo 55.° da Lei n.º 10/2013, relativamente à dispensa obrigatória, só as pequenas parcelas de terreno insuficientes para construção regular podem ser concedidas com dispensa de concurso público. Contudo, como a área do terreno solicitado é de 57 m2, é óbvio que o terreno não é pequeno, nem insuficiente para construção regular. Assim, a situação dos requerentes não se trata da situação prevista na alínea 3) do n.º 1 do artigo 55.° da «Lei de Terras».
6 Por outro lado, a dispensa facultativa de concurso público rege-se, nomeadamente, pelas seguintes situações previstas no n.º 2 do artigo 55.° da «Lei de Terras».
“1) Se funde no interesse público que favoreça o desenvolvimento da sociedade da RAEM, designadamente:
(1) Desenvolvimento de actividades sem fins lucrativos nas áreas de educação, cultura, saúde, desporto ou serviço social;
(2) Construção de instalações de utilidade pública;
(3) Empreendimentos que se articulem com as políticas do governo já tornadas públicas, designadamente pelas formas seguintes:
i) Menção nas linhas de acção governativa anuais;
ii) Divulgação na reunião plenária da Assembleia Legislativa com a presença do governo para responder às perguntas relacionadas com as linhas de acção governativa e o seu relatório;
iii) Divulgação em conferências de imprensa relativas às políticas, promovidas pelo governo.
(4) Participação em planos de construção urbanística promovidos pela Administração.”
7 Uma vez que os requerentes pedem a concessão do terreno, com dispensa de concurso público, para a construção de uma nova unidade habitacional e comercial, não se trata de qualquer situação (ou situação semelhante) mencionada no ponto anterior, ou seja, não se encontra nenhum interesse público que favoreça o desenvolvimento da sociedade da RAEM.
8 Por tudo o que foi exposto, considerando que não se trata de qualquer situação que consiste na dispensa de concurso público a que se refere o artigo 55.º da Lei n.º 10/2013 «Lei de Terras», submete-se superiormente a presente proposta a fim de:
8.1 Manter o sentido de decisão do Exmo. Sr. Secretário para os Transportes e Obras Públicas de 27/01/2016, de indeferir o pedido, efectuado por A e outros, de modificação do aproveitamento do terreno junto à Rua X S/N em Coloane, com a área de 56 m2, e de concessão por arrendamento e com dispensa de concurso público de duas parcelas de terreno contíguo com a área total de 57 m2, para serem anexados e aproveitados conjuntamente;
8.2 Comunicar o despacho desta proposta aos requerentes e dar conhecimento ao DPU.
À consideração superior
O Técnico,
Chan Leong Fat
- Tal proposta mereceu o despacho de concordância do Secretário competente, datado de 23/05/2016 (fls. 13 dos autos);
- Contra este despacho foi proposto o presente recurso em 11/07/2016.
* * *
IV – FUNDAMENTOS
Neste recurso contencioso interposto pelos Recorrentes são suscitadas essencialmente as seguintes questões que importa analisar e resolver:
1) – Vício de insuficiência de fundamentação da decisão ora recorrida;
2) – Vício da violação da lei – erro na interpretação do artigo 55º/1-3) e nº 2 da Lei das Terras, aprovada pela Lei nº 10/2013, de 2 de Setembro.
Começando pelo 2º vício invocado pelos Recorrentes, que se traduz no erro interpretativo do artigo 55º da Lei citada.
Este normativo tem o seguinte teor:
Dispensa de concurso público
1. O concurso público é dispensado:
1) Na renovação;
2) Na transmissão de situações resultantes de concessão;
3) Na concessão de pequenas parcelas de terreno, insuficientes para construção regular, que confinem com terreno concedido ao requerente e que não possam aproveitar a qualquer outro proprietário ou concessionário confinante;
4) Na concessão do terreno, cuja concessão anterior tenha caducado nos termos das alíneas 1) ou 2) do n.º 1 do artigo 166.º, a favor da instituição de crédito legalmente autorizada a exercer actividade na RAEM, desde que se encontrem preenchidos cumulativamente os seguintes requisitos:
(1) Ter sido constituída a hipoteca, por parte do concessionário a favor dessa instituição de crédito, do domínio útil ou dos direitos resultantes da concessão por arrendamento do terreno em causa, com vista a garantir o financiamento para a concretização do seu aproveitamento ou reaproveitamento;
(2) Ter havido incumprimento, por parte do concessionário, das obrigações assumidas em relação ao financiamento referido na subalínea anterior;
(3) Estarem concluídas as obras de fundação do edifício, incluindo, quando aplicável, as obras de estruturas da cave e pavimentos do rés-do-chão, no aproveitamento do terreno;
(4) Ter a instituição de crédito declarado que apresenta, no prazo a indicar pela RAEM, pedido de transmissão das situações resultantes da concessão a favor de terceiro e que este aproveita o terreno de acordo com as finalidades e o aproveitamento previstos no contrato de concessão anterior, assumindo as respectivas obrigações e encargos nele definidos.
2. O concurso público pode ser dispensado quando a concessão:
1) Se funde no interesse público que favoreça o desenvolvimento da sociedade da RAEM, designadamente:
(1) Desenvolvimento de actividades sem fins lucrativos nas áreas de educação, cultura, saúde, desporto ou serviço social;
(2) Construção de instalações de utilidade pública;
(3) Empreendimentos que se articulem com as políticas do governo já tornadas públicas, designadamente pelas formas seguintes:
i) Menção nas linhas de acção governativa anuais;
ii) Divulgação na reunião plenária da Assembleia Legislativa com a presença do governo para responder às perguntas relacionadas com as linhas de acção governativa e o seu relatório;
iii) Divulgação em conferências de imprensa relativas às políticas, promovidas pelo governo.
(4) Participação em planos de construção urbanística promovidos pela Administração.
2) Se destine à construção de edifício cuja finalidade dominante seja a de habitação e afecto exclusivamente a utilização dos trabalhadores, no activo ou aposentados, da Administração Pública da RAEM.
3. Para efeitos do disposto na alínea 1) do número anterior, é considerada a existência de encargos inerentes à concessão requerida, designadamente obras de resgate e aterro do terreno, sua urbanização e saneamento e remoção de construções porventura aí implantadas.
Neste aspecto, os Recorrentes invocaram o seguinte:
7. A decisão recorrida padece de vício de violação de lei, ao fazer uma interpretação errada da norma do art.º 55.°/1/3) da LEI DE TERRAS, ao operar uma cisão entre a dimensão parcela a conceder e a sua aptidão para ser objecto de construção regular.
8. Não é essa a intenção subjacente à intenção do legislador, uma vez que a oração "insuficientes para construção regular" - é uma oração subordinada da primeira - "pequenas parcelas de terreno".
9. Do mesmo modo, a decisão recorrida erra ao operar uma interpretação restritiva da norma do art.º 55.°/2 da LEI DE TERRAS, e ao ignorar os argumentos invocados pelos RECORRENTES, não dando qualquer relevo aos princípios da sustentabilidade, do aproveitamento útil e efectivo dos terrenos, da promoção do desenvolvimento urbano harmonioso e sustentável, da promoção da melhoria do ambiente habitacional, normativamente pela LEI DE TERRAS e pela LEI DO PLANEAMENTO URBANÍSTICO, os quais, como princípios norteadores das leis em que se integram, espelham as opções de interesse público tomadas pelo legislador.
10. Pelos vícios apontados, a decisão recorrida violou as normas dos artigos 115.°/2 do CÓDIGO DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO, e os artigos 55.°/1/3) e 55.°/2 da LEI DE TERRAS.
Terão razão?
Não nos parece.
A Administração Pública competente abordou, a este propósito, a questão da seguinte forma:
9 Analisada a audiência escrita, o que está em causa é que, se ou não, o pedido dos requerentes enquadra-se a disposição do artigo 55.° sobre a dispensa de concurso público.
10 De acordo com a alínea 3) do n.º 1 do artigo 55.° da Lei n.º 10/2013, relativamente à dispensa obrigatória, só as pequenas parcelas de terreno insuficientes para construção regular podem ser concedidas com dispensa de concurso público. Contudo, como a área do terreno solicitado é de 57 m2, é óbvio que o terreno não é pequeno, nem insuficiente para construção regular. Assim, a situação dos requerentes não se trata da situação prevista na alínea 3) do n.º 1 do artigo 55.° da «Lei de Terras».
11 Por outro lado, a dispensa facultativa de concurso público rege-se, nomeadamente, pelas seguintes situações previstas no n.º 2 do artigo 55.° da «Lei de Terras».
“1) Se funde no interesse público que favoreça o desenvolvimento da sociedade da RAEM, designadamente:
(1) Desenvolvimento de actividades sem fins lucrativos nas áreas de educação, cultura, saúde, desporto ou serviço social;
(2) Construção de instalações de utilidade pública;
(3) Empreendimentos que se articulem com as políticas do governo já tornadas públicas, designadamente pelas formas seguintes:
i) Menção nas linhas de acção governativa anuais;
ii) Divulgação na reunião plenária da Assembleia Legislativa com a presença do governo para responder às perguntas relacionadas com as linhas de acção governativa e o seu relatório;
iii) Divulgação em conferências de imprensa relativas às políticas, promovidas pelo governo.
(4) Participação em planos de construção urbanística promovidos pela Administração.”
12 Uma vez que os requerentes pedem a concessão do terreno, com dispensa de concurso público, para a construção de uma nova unidade habitacional e comercial, não se trata de qualquer situação (ou situação semelhante) mencionada no ponto anterior, ou seja, não se encontra nenhum interesse público que favoreça o desenvolvimento da sociedade da RAEM.
13 Por tudo o que foi exposto, considerando que não se trata de qualquer situação que consiste na dispensa de concurso público a que se refere o artigo 55.º da Lei n.º 10/2013 «Lei de Terras», submete-se superiormente a presente proposta a fim de:
13.1 Manter o sentido de decisão do Exmo. Sr. Secretário para os Transportes e Obras Públicas de 27/01/2016, de indeferir o pedido, efectuado por A e outros, de modificação do aproveitamento do terreno junto à Rua X S/N em Coloane, com a área de 56 m2, e de concessão por arrendamento e com dispensa de concurso público de duas parcelas de terreno contíguo com a área total de 57 m2, para serem anexados e aproveitados conjuntamente;
É de ver que a decisão ora atacada demonstra claramente que, na óptica da Administração Pública, os Recorrentes não reuniram os requisitos exigidos pelo artigo 55º/1-3) da citada Lei das Terras, nomeadamente não preencheram os conceitos de “terrenos pequenos” e para “construção regular”.
É certo que o legislador não densificou o conceito de “pequenez” nem de “construção regular”, não é menos certo que tal implica uma certa margem de interpretação, a realizar-se por quem tem a competência para decidir a matéria em causa.
Perante tal, a Administração goza de prerrogativa para densificar os referidos conceitos indeterminados, tendo em conta os pressupostos da lei e o interesse público envolvido em causa. No caso, é difícil ao Tribunal substituir-se à Administração sindicar a avaliação feita pela mesma na densificação do conceito de “pequenez”.
Nesta óptica, face aos argumentos acima tecidos, não nos parece que a interpretação da Entidade Recorrida merece censura.
Se o acto administrativo recorrido visa prosseguir um dos interesses públicos, que é assegurar que os terrenos sejam utilizados nos limites fixados pelo legislador e à luz do procedimento normal, valores estes perante os quais devem ceder os interesses pessoais dos interessados, salvo nos casos muito excepcionais e que se imponham considerações de outra ordem, mas não é o caso dos autos.
Pelo que, não se verifica violação do preceito legal acima citado, caindo por terra os argumentos invocados pelos Recorrentes nesta ordem invocados, julgando-se, deste modo, improcedente o recurso nesta parte.
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Relativamente ao vício de falta de fundamentação da decisão ora recorrida, igualmente não achamos que os Recorrentes têm razão.
Ora, na sequência do analisado, é de concluir que a decisão está suficientemente fundamentada, porque estamos perante conceitos indeterminados, eles só podem ser densificados em cada caso concreto tendo em conta as circunstâncias concretas do mesmo. É ilógico pretender-se ter uma resposta uniforme para todas as situações. Não se pode afirmar categoricamente que um terreno com área de 10 metros quadrados ou 20 metros quadrados é forçosamente um terreno pequeno, pois, a resposta é condicionada por um conjunto de factores, ex.: natureza do terreno e o plano circundante, os limites do plano urbanístico… etc.
Em matéria de fundamentação da decisão administrativa, o artigo 115.º (Requisitos da fundamentação) do Código do Procedimento Administrativo (CPA) prescreve:
1. A fundamentação deve ser expressa, através de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão, podendo consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas que constituem neste caso parte integrante do respectivo acto.
2. Equivale à falta de fundamentação a adopção de fundamentos que, por obscuridade, contradição ou insuficiência, não esclareçam concretamente a motivação do acto.
3. Na resolução de assuntos da mesma natureza, pode utilizar-se qualquer meio mecânico que reproduza os fundamentos das decisões, desde que tal não envolva diminuição das garantias dos administrados
Nestes termos, a fundamentação deve ser contextual e integrada no próprio acto (ainda que o possa ser de forma remissiva), expressa e acessível (através de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão), clara (de modo a permitir que, através dos seus termos, se apreendam com precisão os factos e o direito com base nos quais se decide), suficiente (permitindo ao destinatário do acto um conhecimento concreto da motivação deste) e congruente (a decisão deverá constituir a conclusão lógica e necessária dos motivos invocados como sua justificação), equivalendo à falta de fundamentação a adopção de fundamentos que, por obscuridade, contradição ou insuficiência, não esclareçam concretamente a motivação do acto.
A fundamentação formal distingue-se da fundamentação material. À fundamentação formal interessa a enunciação dos motivos que determinaram o autor a proferir a decisão com um concreto conteúdo; à fundamentação material interessa a correspondência dos motivos enunciados com a realidade, bem como a sua suficiência para legitimar a actuação administrativa no caso concreto.
Como ensina Vieira de Andrade (O dever de fundamentação expressa de actos administrativos, Almedina, 2003, p. 231.), o dever formal cumpre-se «... pela apresentação de pressupostos possíveis ou de motivos coerentes e credíveis; enquanto a fundamentação material exige a existência de pressupostos reais e de motivos correctos susceptíveis de suportarem uma decisão legítima quanto ao fundo».
Nesta matéria, a doutrina e a jurisprudência têm vindo a defender a relatividade do conceito da fundamentação da decisão administrativa, destacando que o que releva é que, perante o acto, um destinatário médio fique inteirado da motivação da decisão, das razões que levaram a Administração a decidir da forma como decidiu e não doutra.
No caso dos autos, atendendo à matéria sobre que versou a decisão em causa, uma pessoa de diligência normal percebe perfeitamente por que razões é que foi tomada uma decisão naquele sentido, coisa diferente é a que os Recorrentes não concordam com as razões invocadas pela entidade decisora. O que não é uma questão de fundamentação, mas sim de discordância de determinado ponto de vista.
Pelo que, julga-se improcedente o argumento da existência do vício de forma por falta de fundamentação.
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Tudo visto, resta decidir.
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V ‒ DECISÃO
Em face de todo o que fica exposto e justificado, os juízes do TSI acordam em julgar improcedente o presente recurso, mantendo-se o despacho recorrido.
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Custas pelos Recorrentes que se fixam em 4 UCs para cada um.
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Notifique e Registe.
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RAEM, 12 de Setembro de 2019.
Fong Man Chong
Ho Wai Neng
José Cândido de Pinho
Fui Presente
Joaquim Teixeira de Sousa
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