Processo nº 589/2019
(Autos de Recurso Civil e Laboral)
Data: 12 de Setembro de 2019
Recorrentes: B (Autor)
Yyy Yyy Yyy, S.A. (Ré)
Recorridos: Os mesmos
ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
I - RELATÓRIO
Por sentença de 22/02/2019, julgou-se a acção parcialmente procedente e, em consequência, condenou-se a Ré Yyy Yyy Yyy, S.A. a pagar ao Autor B a quantia de MOP$169,676.41, acrescida de juros moratórios à taxa legal.
Dessa decisão vêm recorrer o Autor e a Ré, alegando, em sede de conclusões, os seguintes:
Do Autor:
1) Versa o presente recurso sobre a douta Sentença na parte relativa à condenação da Ré (XXXX) na atribuição de uma compensação devida ao Autor pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal, na medida em que a concreta fórmula de cálculo utilizada na Decisão Recorrida se mostra em manifesta oposição à que tem vindo a ser seguida pelo Tribunal de Segunda Instância;
2) De onde, salvo o devido respeito, está o Recorrente em crer que a douta Sentença enferma de um erro de aplicação de direito quanto à concreta forma de cálculo devido pela prestação de trabalho em dia de descanso semanal e pelo trabalho prestado em dias de feriado obrigatório remunerado e, deste modo, em violação ao disposto no artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril;
Em concreto,
3) Entendeu o Tribunal a quo ser de sufragar o entendimento seguido pelo Tribunal de Última Instância e, em consequência, condenar a Ré a pagar ao Autor apenas ao correspondente ao valor de um salário em singelo no que respeita ao trabalho prestado em dia de descanso semanal durante todo o período da relação laboral, a liquidar em execução de sentença;
4) Porém, salvo melhor opinião, ao proceder à condenação da Ré apenas em singelo, o Tribunal a quo terá procedido a uma interpretação menos correcta do disposto na al. a) do n.º 6 do art. 17.º do Decreto-Lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril, pelo que a decisão deve ser julgada nula e substituída por outra que condene a Ré em conformidade com o disposto na referida Lei Laboral;
5) Com efeito, resulta do referido preceito que o trabalho prestado em dia de descanso semanal deverá ser remunerado pelo dobro do salário normal, entendido enquanto duas vezes a retribuição normal por cada dia de trabalho prestado em dia de descanso semanal, para além do valor relativo ao próprio dia de trabalho prestado;
6) Trata-se, de resto, da interpretação que tem vindo a ser seguida de forma uniforme pelo Tribunal de Segunda Instância, onde se entende que a fórmula correcta para compensar o trabalho prestado em dia de descanso semanal deverá ser a seguinte: (salário diário X n.º de dias devidos e não gozados X 2);
7) De onde, provado que durante o período da relação laboral a Recorrida não garantiu ao Autor o gozo do descanso semanal no máximo ao 7.º dia após 6 dias consecutivos de trabalho, deve a mesma ser condenada a pagar ao Recorrente "o dobro da retribuição normal por cada um dos sétimos dias de trabalho prestado", isto é, a quantia de MOP$97.335,00 - e não apenas MOP$48.667,50 correspondente a um dia de salário em singelo - conforme resulta da douta Decisão recorrida, acrescida de juros até efectivo e integral pagamento o que desde já e para todos os legais efeitos se requer.
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A Ré respondeu à motivação do recurso do Autor, nos termos constantes a fls. 173 a 177, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, pugnando pela improcedência do mesmo.
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Da Ré:
I. O presente recurso vem colocar em crise a sentença proferida pelo douto Tribunal Judicial de Base que julgou a acção procedente e condenou a Ré, ora Recorrente, no pagamento de uma indemnização ao Autor, ora Recorrido, no valor de MOP48,667.50 a título de compensação pelo trabalho prestado pelo Autor no sétimo dia, em cada período de sete dias de trabalho consecutivo.
II. Salvo devido respeito, que se adianta ser muito, está a Recorrente em crer que a sentença proferida a final nunca poderia ter decidido como decidiu em violação e incorrecta aplicação das normas jurídicas que lhe servem de fundamento, mostrando-se, por isso, inquinada de erro na aplicação do Direito.
III. O Tribunal a quo não interpretou correctamente o sentido da norma ora em crise, ou seja o artigo 17.º do DL n.º 24/89/M.
IV. Uma leitura atenta do disposto no artigo 17º do DL n.º 24/89/M permite concluir que os trabalhadores têm direito a gozar em cada período de sete dias um período de descanso de vinte e quatro horas consecutivas - o qual será fixado de acordo com as exigências de funcionamento da empresa - sem referir se o mesmo se refere a um dia, por exemplo, a uma segunda - feira, ou a parte de uma segunda - feira e parte da terça - feira seguinte.
V. Atento o Artigo 17º, o empregador pode escolher, dentro de cada período de sete dias, o momento em que deve ocorrer o descanso, sem necessidade de ter em conta o número de dias consecutivos de trabalho que ocorrem antes e depois do dia de descanso.
VI. A Lei não proíbe que se trabalhe mais do que seis dias consecutivos - como defendia o Autor e veio a ser entendido pelo Tribunal - mas apenas impõe que em cada período de sete dias, 24 horas consecutivas sejam de descanso, o qual pode calhar em qualquer um dos dias desse período de 7 dias, independentemente do número de dias de trabalho consecutivos que lhe precedem ou que se seguem.
VII. A expressão "em cada período de sete dias" não impõe o momento exacto em que o descanso deve ocorrer, isto é, não impõe que seja no 7º, apenas determina o intervalo de tempo - sete dias - em que esse mesmo descanso deve ser gozado.
VIII. Veja-se aliás que no mencionado artigo 17º não se faz menção a dias de trabalho consecutivo mas apenas exige que o período de descanso seja de 24 horas consecutivas em cada período de sete dias sem cuidar de saber quantos dias o trabalhador trabalhou antes desse dia e quantos vai trabalhar depois.
IX. Do que se vem dizendo e do que se retira da leitura atenta do preceito parece evidente que o princípio do descanso semanal não equivale a um princípio de descanso ao sétimo dia, ou seja, ao fim de 6 dias de trabalho.
X. Aliás, a epígrafe do Artigo 17º é "Descanso Semanal" e não "Descanso ao Sétimo Dia".
XI. O legislador da RAEM não impôs qualquer limitação ao número de dias de trabalho seguidos desde que o trabalhador goze de um período de descanso em cada período de sete dias, e tanto assim é que o artigo 18º do DL 24/89/M expressamente prevê a possibilidade de não se gozar um período de descanso de 24 horas em cada período de 7 dias, caso em que ao trabalhador deve ser concedido um "descanso consecutivo de quatro dias por cada conjunto de quatro semanas ou fracção".
XII. O legislador estando já ciente da realidade em Macau, fixou a excepção constante no artigo 18.º do Decreto - lei a qual veio a ser posteriormente confirmada no artigo 42.º, n.º 2 da Lei 7/2008 (nova Lei das Relações de Trabalho), que prevê que "O gozo do período de descanso pode não ter frequência semanal em caso de acordo entre as partes ou quando a natureza da actividade da empresa o torne inviável, casos em que o trabalhador tem direito a gozar um período de descanso remunerado de quatro dias por cada quatro semanas."
XIII. Ao excepcionar a obrigatoriedade da frequência semanal do descanso, o legislador está a dar primazia à lógica do descanso do trabalhador e não à lógica do repouso obrigatório ao sétimo dia.
XIV. Não sendo, por isso, imperativo que esse descanso ocorra no sétimo dia de trabalho, tal como alega o Autor e veio a ser entendido pelo douto Tribunal.
XV. Pode até acontecer, em face ao que ficou provado, que o Autor nem sempre tenha descansado "em cada período de sete dias" mas a ser assim, deverá fazer-se o apuramento no final do ano dos dias efectivos de descanso e se o Recorrido tiver que ser compensado será só e apenas dos dias de descanso em falta, ou seja, o mesmo é dizer que se se apurar que o Recorrido não descansou 52 dias no ano, mas apenas 46 dias, então só poderá ser compensado por 6 dias de descanso não gozado.
XVI. É que, tal como se vem defendendo, não se impunha à aqui Recorrente que na organização dos turnos dos seus trabalhadores o descanso fosse concedido ao 7º dia, mas apenas que, em cada período de sete dias, 24 horas consecutivas fosse de descanso.
XVII. Não importa que o trabalho seja organizado em turnos rotativos de 7 dias consecutivos findo os quais a entidade patronal concedia um dia de descanso, o que importa é determinar se dentro de cada período de sete dias - ou usando a expressão legal "em cada período de 7 dias" - e tendo em conta a organização dos turnos rotativos o trabalhador gozou de 24 horas consecutivas de descanso.
XVIII. Carece por completo de fundamento a decisão recorrida na parte em que condena a Recorrente a pagar ao Recorrido uma indemnização pelo trabalho prestado no sétimo dia como se se tratasse de trabalho prestado em dia de descanso semanal, tendo a sentença recorrida feito uma errada interpretação e aplicação do preceituado nos artigos 17º e 18º do Decreto-lei 24/89/M, devendo em consequência ser revogada e substituída por outra que absolva a Ré, aqui Recorrente, do pagamento da aludida indemnização.
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Foram colhidos os vistos legais.
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II - FACTOS
Vêm provados os seguintes factos pelo Tribunal a quo:
O Autor foi recrutado pela Sociedade Z – Serviço de Apoio e Gestão Empresarial Cia, Lda. – e, exerceu a sua prestação de trabalho ao abrigo do Contrato de Prestação de Serviços n.º 2/2003 (Cfr. fls.16 a 22, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido). (A)
O referido contrato de prestação de serviço foi objecto de apreciação, fiscalização e renovação por parte da Entidade Pública competente. (B)
Entre 25/01/2005 a 31/01/2009 o Autor exerceu as suas funções para a Ré (YYY) prestando funções de “guarda de segurança”, enquanto trabalhador não residente. (C)
Resulta do ponto 3.4. do Contrato de Prestação de Serviços ao abrigo do qual o Autor foi autorizado a prestar trabalho para a Ré, ser devido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes com ele contratados) “(…) um subsídio mensal de efectividade igual ao salário de 4 dias, sempre que no mês anterior não tenha dado qualquer falta ao serviço”. (D)
Aquando da contratação do Autor no Nepal, foi garantido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes de origem Nepalesa) alojamento gratuito em Macau. (E)
Desde o início da prestação de trabalho até 31/01/2009, a Ré procedeu a uma dedução no valor de HK$750.00 sobre o salário mensal do Autor, a título de “comparticipação nos custos de alojamento”. (F)
A referida dedução no salário do Autor era operada de forma automática, e independentemente de o trabalhador (leia-se, do Autor) residir ou não na habitação que lhe era providenciada pela Ré e/ou pela agência de emprego. (G)
Durante todo o período de trabalho, o Autor sempre prestou a sua actividade sob as ordens e instruções da Ré e ou dos seus directos responsáveis. (1º)
O Autor sempre respeitou os períodos, os horários e os locais de trabalho fixados pela Ré. (2º)
Até 31/01/2009, a Ré pagou ao Autor a quantia de HK$7.500,00, a título de salário de base mensal. (3º)
Durante todo o período em que o Autor prestou trabalho, o Autor nunca deu qualquer falta ao trabalho sem conhecimento e autorização previa por parte da Ré, sem prejuízo de 24 dias de férias anuais por cada ano civil e dispensas de trabalho não remuneradas, nomeadamente entre 25/03/2006 e 18/04/2006 (25 dias), entre 03/04/2007 e 27/04/2007 (25 dias), entre 21/06/2007 e 22/06/2007 (2 dias), entre 31/01/2008 e 01/02/2008 (2 dias), entre 20/02/2008 e 22/02/2008 (3 dias), entre 21/11/2008 e 22/11/2008 (2 dias) e entre 25/12/2008 e 24/01/2009 (31 dias), bem como um dia de descanso no oitavo dia após cada sete dias de trabalho consecutivos durante ao serviço da Ré. (4º)
Entre 25/01/2005 a 31/01/2009, a Ré (YYY) nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de efectividade. (5º)
Entre 25/01/2005 a 31/12/2008, o Autor prestou a sua actividade de segurança durante em 01 de Janeiro, Ano Novo Chinês (3 dias), 01 de Maio e 01 de Outubro, por forma a garantir o funcionamento contínuo e diário dos vários Casinos operados pela Ré (YYY), sem prejuízo da resposta ao quesito 4º. (6º)
Durante o referido período de tempo, a Ré (YYY) nunca pagou ao Autor uma qualquer acréscimo salarial pelo trabalho prestado nos referidos dias de feriado obrigatórios. (7º)
Os turnos de trabalho prestado pelo Autor ao serviço da Ré eram de 8 horas. (8º)
Por ordem da Ré, o Autor estava obrigado a comparecer no seu local de trabalho devidamente uniformizado com, pelo menos, 30 minutos de antecedência relativamente ao início de cada turno. (9º)
Durante os 30 minutos que antecediam o início de cada turno, os superiores hierárquicos do Autor distribuíam o trabalho pelos guardas de segurança (leia-se do Autor), v.g., indicando-lhe o seu concreto posto (local dentro do casino onde o mesmo se devia colocar), os clientes tidos por “suspeitos”, sendo ainda feito um relato sobre todas as questões de segurança a ter em conta no interior do Casino, ou mesmo da necessidade de qualquer participação em eventos especiais. (10º)
O Autor sempre compareceu no início de cada turno com a antecedência de, pelo menos, 30 minutos. (11º)
Durante todo o período da relação de trabalho, o Autor nunca se ausentou do trabalho (isto é, dos locais de reunião) que antecediam em, pelo menos, o início de cada turno. (12º)
A Ré nunca pagou ao Autor qualquer quantia pela prestação de mais 30 minutos que antecediam o início de cada turno. (13º)
Desde o início da relação de trabalho até 31/12/2008, o Autor prestou a sua actividade de segurança para a Ré (YYY) num regime de turnos rotativos de sete dias de trabalho consecutivos. (14º)
A que se seguia um período de vinte e quatro horas de descanso compensatório, em regra no oitavo dia, que antecedia a mudança de turno. (15º)
Desde o início da relação de trabalho e até 31/12/2008, a Ré (YYY) não fixou ao Autor um período de descanso de vinte e quatro horas consecutivas, em cada período de sete dias. (16º)
A Ré pagou sempre ao Autor o salário correspondente aos dias de descanso semanal. (17º)
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III – FUNDAMENTAÇÃO
A. Do recurso da Ré:
O recurso da Ré versa apenas sobre a decisão proferida pelo Tribunal a quo quanto à compensação a título do trabalho prestado pelo Autor após sete dias de trabalho consecutivo, no valor de MOP$48,667.50.
Para a Ré, o descanso semanal legalmente previsto não tem de ser gozado sempre após 6 dias consecutivos de trabalho, ou seja, no 7º dia, pois a entidade patronal pode escolher, dentro de cada período de sete dias, o momento em que deve ser ocorrer o descanso, sem necessidade de ter em conta o número de dias consecutivos de trabalho que ocorrem antes e depois do dia de descanso.
Sobre esta questão, este TSI já tem oportunidade de se pronunciar em vários processos congéneres da ora Recorrente.
A título exemplificativo, citamos o acórdão de 24/01/2019, proferido no Proc. nº 1094/2018, no qual entendeu-se que:
“…
1ª questão: erro na aplicação de Direito (artigo 17º do DL nº 24/89/M, de 3 de Abril)
A questão suscitada pela Recorrente/Ré pode ser colocada nos termos seguintes:
Em face do normativo do artigo 17.° do DL n.º 24/89/M, de 3 de Abril, que “Todos os trabalhadores têm o direito a gozar, em cada sete dias, um período de descanso se vinte e quatro horas consecutivas (...)”, pergunta-se, ao fim de quantos dias consecutivos de trabalho deve ter lugar o referido período de descanso?
Ou seja, que limite assinala a Lei à série de dias consecutivos máximos de trabalho prestado? Ou ainda, após quantos dias de trabalho consecutivo tem o trabalhador direito a usufruir de um período de vinte e quatro horas de descanso consecutivo?
Entende a Recorrente que “o legislador da RAEM não impôs qualquer limitação ao número de dias de trabalho seguidos desde que o trabalhador goze de um período de descanso semanal em cada período de sete dias (...) sem cuidar de saber quantos dias o trabalhador trabalhou antes desse dia e quantos vai trabalhar depois”. Nesta lógica, conclui a Recorrente que “a Lei desta Região não proíbe que se trabalhe mais do que seis dias consecutivos (...)” podendo o empregador fixar e atribuir esse(s) dia(s) de descanso semanal não no 7.°, dia, mas sim ao 8.º, ao 9.º, ou noutro dia do mês.
Diferentemente, no entender do Recorrido/Autor, sendo o período de descanso motivado por razões de ordem física e psicológica, o trabalhador não pode prestar mais do que seis dias de trabalho consecutivos, devendo o dia de descanso ter lugar, no máximo, no sétimo dia, e não no oitavo, nono ou noutro dia do mês, salvo acordo em sentido contrário. Mas tal sétimo dia é sempre compensado nos termos legalmente permissíveis.
É este entendimento que vem sendo defendido pela jurisprudência e doutrina de Macau, e sem excepção em relação ao ordenamento jurídico português, aqui invocado em termos de direito comparado.
Vejam-se, entre outras, as posições de Bernardo da Gama Lobo Xavier, Fernanda Agria e Maria Luísa Cardoso Pinto, Barros Moura, Jorge Leite e Coutinho de Almeida e Luis Miguel Monteiro para quem: o descanso semanal deve, nos termos do n.º 2 do art. 51.º da LCT, ter lugar dentro de cada período de sete dias: deve ter lugar no sétimo dia e nunca no oitavo; ou que, a lei é bem clara: o descanso é semanal ‒ o trabalhador tem direito a um dia de descanso em cada 7; isto é, em cada sete dias consecutivos, seis são dedicados ao serviço efectivo e um ao repouso", constituindo uma ilegalidade atribuir aos trabalhadores que prestam serviços em empresas de laboração contínua, o repouso semanal depois de sete dias, isto é, no 8.º dia;
Com especial interesse, veja-se a posição de Catarina Carvalho e de Liberal Fernandes, quando concluem que: “(...) o dia de descanso em cada turno não pode ser precedido por mais de seis dias consecutivos de trabalho; quando tal se verifique, a actividade prestada no sétimo dia deverá ser considerada trabalho suplementar realizado em dia de descanso obrigatório”.
Na jurisprudência de Portugal e para um preceito similar ao art. 17.° n.º 1 do DL n.º 24/89/M, veja-se, entre outros, o Ac. do STA, de 19/10/1076, nos termos do qual de decidiu que: O descanso semanal deve, assim, ter lugar ao fim de de seis dias de trabalho. Deve ter lugar no «sétimo, e nunca no oitavo» dia”;
Mais recentemente, veja-se, o Ac. do Tribunal da Relação do Porto, Recurso n.º 5286/15.3T8MTS.P1, 11/07/2016, nos termos do qual se decidiu que: (...) o dia de descanso em cada turno não pode ser precedido por mais de seis dias consecutivos de trabalho; quando tal se verifique, a actividade prestada no sétimo dia deverá ser considerada trabalho suplementar realizado em dia de descanso obrigatório. (...) não podendo a trabalhadora trabalhar mais de seis dias consecutivos sem descansar no sétimo, o trabalho prestado neste terá de ser considerado trabalho suplementar e, como tal, retribuído, porque prestado em dia de descanso.
Entre nós, Augusto Teixeira Garcia, desde há muito sublinha que: “(...) o dia de descanso deve sempre seguir-se aos dias de trabalho prestado que são a sua razão de ser e não, portanto e em princípio, precedê-los. A regra deve ser a de que o dia de descanso semanal deve seguir-se imediatamente ao sexto dia de trabalho”.
Pelo que, conclui-se forçosamente que: o período de vinte e quatro horas consecutivas de descanso a que se refere o n.º 1 do artigo 17.° do DL n.º 24/89/M, deve necessariamente ocorrer dentro de um período de sete dias e, no máximo, após seis dias de trabalho consecutivo, não sendo lícito que o mesmo apenas ocorra ao oitavo, ao nono ou em qualquer outro dia posterior, contrariamente ao que vem alegado pela Recorrente.
Se assim não suceder, o trabalho efectuado no sétimo dia de trabalho, após a prestação de seis dias de trabalho consecutivos corresponde a trabalho prestado em dia que deveria ter sido destinado a descanso semanal e, como tal, deve ser pago pelo dobro da retribuição normal, tal qual acertadamente concluiu o Tribunal de Primeira Instância.
Pelo que, não se verifica erro na aplicação de Direito. Pelo contrário, o Tribunal a quo fez uma correcta interpretação das normas aplicáveis e como tal não merece censura a decisão, julga-se deste modo improcedente o recurso interposto pela Ré nesta parte.
…”
Por ora, não se vê qualquer razão plausível para alterar a posição já assumida.
Nesta conformidade, o recurso não deixará se julgar improvido.
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B. Do recurso do Autor:
O recurso do Autor não deixará de se julgar provido face à jurisprudência unânime deste TSI nos processos congéneres em que a Ré também é parte.
Assim, a fórmula para a compensação do descanso semanal é: dias não gozados X salário diário X 2, para além do salário-base já recebido.
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Tudo visto, resta decidir.
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IV – DECISÃO
Pelas apontadas razões, acordam em:
1. negar provimento ao recurso interposto pela Ré, confirmando a sentença recorrida na parte correspondente.
2. conceder provimento ao recurso do Autor, em consequência, revogar a sentença na parte respectiva e condenar a Ré a pagar ao Autor, a título da compensação pelo não gozo dos dias de descanso semanal, a quantia de MOP$97,335.00, com juros de mora à taxa legal a partir da data do presente aresto (cfr. Ac. do TUI, de 02/03/2011, Proc. nº 69/2010).
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Custas pela Ré.
Notifique e D.N..
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RAEM, aos 12 de Setembro de 2019.
(Relator)
Ho Wai Neng
(Primeiro Juiz-Adjunto)
José Cândido de Pinho
(Segundo Juiz-Adjunto)
Tong Hio Fong
(Vencido quanto à fórmula adoptada na compensação do trabalho prestado em dias de descanso semanal, por entender que, sendo o trabalho prestado nesses dias pago pelo “dobro da retribuição” (cfr. se refere na alínea a) do nº 6 do artigo 17º do DL nº 24/89/M), este “dobro” é constituído por um dia de salário normal (ao qual o trabalhador teria sempre direito mesmo que não prestasse trabalho) mais um dia de acréscimo. Provado que o Autor já recebeu da Ré ora sua entidade patronal o salário diário em singelo, teria apenas mais um dia de salário pelo trabalho prestado em dias de descanso semanal, sob pena de, salvo o devido respeito, estar o Autor a ser pago, não pelo dobro, mas pelo triplo do valor diário, ao que acresce ainda o dia de descanso compensatório, o Autor estar a auferir o quádruplo do valor diário se trabalhar em dias de descanso semanal)
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