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Processo n.º 640/2019
(Autos de recurso em matéria laboral)

Relator: Fong Man Chong
Data: 19/Setembro/2019

ASSUNTOS:

- Excepção (prescrição) suscitada na contestação, não conhecida pelo Tribunal a quo nem levantada no primeiro recurso ordinário, a mesma veio a ser suscitada no segundo recurso ordinário e força do caso julgado

SUMÁRIO:
A arguição das nulidades previstas no artigo 571º do CPC depende da observância do prazo para interposição do recurso ordinário (artigo 591º do CPC), à excepção da nulidade prevista na alínea a) do preceito legal citado. Decorrido o prazo em causa sem que tais nulidades fossem arguidas no respectivo recurso, formar-se-ia caso julgado e como tal a decisão não pode ser objecto de nova sindicância judicial mediante novo recurso, sob pena de violar o caso julgado.
O Relator,

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Fong Man Chong
Processo nº 640/2019
(Autos de recurso laboral)

Data : 19 de Setembro de 2019

Recorrente : Xxxx Xxxx Xxxx Xxxx, S.A.R.L. (1ª Ré)

Recorrido : B (Autor)

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Acordam os Juízes do Tribunal de Segunda Instância da RAEM:

I - RELATÓRIO
    B, Autor, intentou, em 10/11/2015, junto do Tribunal Judicial de Base da RAEM, acção declarativa de processo comum do trabalho (LB1-15-0145-LAC), pedindo condenar a 1.ª Ré e a 2.ª Ré a pagar a título de créditos laborais, a quantia total de MOP$462,040.25.
    Realizado o julgamento, foi proferida a sentença com o seguinte teor na parte decisiva:
    Pelo exposto, julga-se a acção parcialmente procedente e em consequência condena-se, nos termos supra referidos, a 1ª Ré a pagar ao Autor a quantia de MOP$336,529.70, respectivamente, acrescida dos juros de mora à taxa legal a contar da data da presente sentença até o efectivo e integral pagamento, absolvendo a Ré do restante pedido.

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    A Xxxx Xxxx Xxxx Xxxx, S.A.R.L., 1ª Ré, discordando da decisão, veio em 03/05/2019, recorrer para este TSI, com os fundamentos de fls. 577 a 585, em cujas alegações tendo formulado as seguintes conclusões:
     I. Vem o presente recurso interposto da sentença proferida pelo douto Tribunal Judicial de Base que julgou a acção parcialmente procedente e condenou a 1.ª Ré Xxxx Xxxx Xxxx Xxxx, ora Recorrente, no pagamento de uma indemnização no valor global MOP$336,529.70, acrescida de juros moratórios à taxa legal a contar do trânsito em julgado da sentença que procede à liquidação do quantum indemnizatório,
     II. Entende a Recorrente que a sentença assim proferida é nula por omissão de pronúncia.
     III. Nos presentes autos, o Autor e ora Recorrido alegou que prestou serviço para a aqui Recorrente entre 29 de Março de 1997 e 21 de Julho de 2003, peticionando créditos laborais ao longo de todo o período da relação laboral.
     IV. Devidamente citada para os termos da acção em contestação a aqui Recorrente invocou, em sede de contestação, a prescrição dos créditos vencidos até 18 de Fevereiro de 2001.
     V. Ate à data a sobredita excepção não foi apreciada.
     VI. Está a Recorrente em crer que o Tribunal a quo em sede de repetição de julgamento não poderia ter deixado de se pronunciar sobre a prescrição devidamente invocada nos autos pela Recorrente e em consequência retirar do cômputo das indemnizações os créditos vencidos até o dia 18 de Fevereiro de 2001 porque prescritos.
     VII. O Tribunal "a quo" não conheceu da excepção de prescrição, o que se mostrou de fulcral relevância para a decisão proferida a final terminando com a condenação da aqui Recorrente a pagar ao Autor créditos com muito mais de 15 anos, e por isso já prescritos tal como alegado em sede própria.
     VIII. Tivesse o Tribunal recorrido apreciado a prescrição nos termos alegados todos os créditos anteriores a 19 de Fevereiro de 2001 teriam sido julgados prescritos com as demais consequências legais.
     IX. Assim, a decisão recorrida é nula nos termos conjugados dos artigos 563º, nº 2 e 571º, nº 1 alínea d) do CPC ex vi art. 1º do CPT, devendo assim ser revogada e substituída por outra que julgando procedente a excepção de prescrição julgue prescritos todos os créditos reclamados anteriormente a 19 de Fevereiro de 2001 e em consequência absolva a ora Recorrente dos créditos peticionados pelo Autor entre 29 de Marco de 1997 e 18 de Fevereiro de 2001.

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    Foram colhidos os vistos legais.
    Cumpre analisar e decidir.

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II - PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
    Este Tribunal é o competente em razão da nacionalidade, matéria e hierarquia.
    O processo é o próprio e não há nulidades.
    As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária e são dotadas de legitimidade “ad causam”.
    Não há excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
* * *
III – FACTOS ASSENTES:
    A sentença recorrida deu por assente a seguinte factualidade:
     ‒ Entre 29 de Março de 1997 e 21 de Julho de 2003, o Autor esteve ao serviço da 1.ª Ré, prestando funções de “guarda de segurança”, enquanto trabalhador não residente. (A)
     ‒ O Autor foi recrutado pela sociedade Z- Serviço de Apoio e Gestão Empresarial Cia, Lda. – e exerceu a sua prestação de trabalho ao abrigo do Contracto de Prestação de Serviços n.º 5/96, aprovado pelo Despacho n.º 687/IMO/SAEF/96, de 25/03/96. (B)
     ‒ O referido contracto de prestação de serviço foi objecto de apreciação, fiscalização e aprovação por parte da Entidade Pública competente. (C)
     ‒ Resultada do ponto 3.1 do Contracto de Prestação de Serviços n.º 5/96, ser devido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes com ele contractados) a quantia de “ (…) $20,00 patacas diárias por pessoa, a título de subsídio de alimentação. (D)
     ‒ Resultada do ponto 3.4 do Contrato de Prestação de Serviço nº 5/96, ser devido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes com ele contratados) “(…) um subsídio mensal de efectividade igual ao salário de 4 dias, sempre que no mês anterior não tenha dado qualquer falta ao serviço. (E)
     ‒ Por força do Despacho n.º 01949/IMO/SEF/2003, do Senhor Secretário para Economia e Finanças da RAEM, de 17/07/2003, foi autorizada a transferência das autorizações concedidas para a contratação dos 280 trabalhadores não residentes por parte da 1.ª Ré para a 2.ª Ré, com efeitos a partir de 21/07/2003 (cf. fls. 42 a 45, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido). (F)
     ‒ Entre 22/07/2003 e 13/11/2003, o Autor esteve ao serviço da 2.ª Ré, prestando funções de “guarda de segurança”, enquanto trabalhador não residente. (G)
     ‒ Durante todo o tempo que prestou trabalho, o Autor sempre prestou a sua actividade nos locais (postos de trabalho) indicados pelas Rés. (H)
     ‒ Durante todo o tempo que prestou trabalho, o Autor sempre prestou a sua actividade sob as ordens e as instruções das Rés. (I)
     ‒ Durante o período que prestou trabalho, as Rés pagaram ao Autor a quantia de HKD7.500,00 a título de salário de base mensal. (J)
     ‒ Durante todo o tempo que prestou trabalho, o Autor sempre respeitou os períodos e horários de trabalho fixados pelas Rés. (1º)
     ‒ Os locais de trabalho do Autor eram fixados de acordo com as suas exclusivas e concretas necessidades. (2º)
     ‒ Ao longo do período que prestou trabalho, as Rés apresentaram ao Autor contractos individuais de trabalho, previamente redigidos e cujo conteúdo o Autor se limitou a assinar, sem qualquer negociação. (3º)
     ‒ Os contractos individuais de trabalho apresentados ao Autor eram idênticos para os demais trabalhadores não residentes, guardas de segurança do Nepal. (4º)
     ‒ Entre 29/03/1997 e 21/07/2003, a 1.ª Ré nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de alimentação. (5º)
     ‒ Entre 29/03/1997 e 21/07/2003, a 1.ª Ré nunca entregou ao Autor qualquer tipo de alimentos e/ou géneros. (6º)
     ‒ Entre 22/07/2003 e 13/11/2003, a 2.ª Ré nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de alimentação. (7º)
     ‒ Entre 22/07/2003 e 13/11/2003, o Autor prestou a sua actividade nos Casinos que não disponibilizavam comida nas cantinas. (8º)
     ‒ Durante todo o período em que o Autor prestou trabalho, o Autor nunca deu qualquer falta ao trabalho sem conhecimento e autorização prévia por parte das Rés. (9º)
     ‒ Entre 29/03/1997 e 21/07/2003, a 1.ª Ré nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de efectividade. (10º)
     ‒ Entre 22/07/2003 e 13/11/2003, a 2.ª Ré nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de efectividade. (11º)
     ‒ Entre 29/03/1997 e 31/12/2002, a 1.ª Ré nunca fixou ao Autor, em cada período de sete dias, um período de descanso de vinte e quatro horas consecutivas, nem um período de descanso consecutivo de quatro dias por cada conjunto de quatro semanas ou fracção, sem prejuízo da correspondente retribuição. (12º)
     ‒ Entre 29/03/1997 e 31/12/2002, o Autor prestou a sua actividade de segurança por forma a garantir o funcionamento contínuo e diário dos vários Casinos operados pela 1.ª Ré. (13º)
     ‒ Entre 29/03/1997 e 31/12/2002, a 1.ª Ré nunca fixou ao Autor um outro dia de descanso compensatório em consequência do trabalho prestado em dia de descanso semanal. (14º)
     ‒ Aquando da contratação do Autor no Nepal, foi garantido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes de origem Nepalesa) alojamento gratuito em Macau. (15º)
     ‒ Durante o período em que o Autor prestou trabalho, as Rés procederam a uma dedução no valor de HKD750,00 sobre o salário mensal do Autor, a título de “comparticipação nos custos de alojamento. (16º)
     ‒ A referida dedução no salário do Autor era operada de forma automática, e independentemente do Autor residir ou não na habitação que lhe era providenciada pelas Rés e/ou pela agencia de emprego. (17º)
     ‒ Entre 29/03/1997 e 21/07/2003, o Autor prestou a sua actividade de segurança durante alguns dias não identificados em dias de feriados obrigatórios, por forma a garantir o funcionamento contínuo e diário dos vários Casinos operados pela 1.ª Ré. (18º)
     ‒ Durante o referido período de tempo, a 1.ª Ré nunca pagou ao Autor um qualquer acréscimo salarial pelo trabalho prestado nos referidos dias de feriado obrigatórios. (19º)
     ‒ Entre 22/07/2003 e 13/11/2003, o Autor prestou a sua actividade de segurança durante alguns dias não identificados em dias de feriados obrigatórios, por forma a garantir o funcionamento contínuo e diário dos vários Casinos operados pela 2.ª Ré. (20º)
     ‒ Durante o referido período de tempo, a 2.ª Ré nunca pagou ao Autor qualquer acréscimo salarial pelo trabalho prestado nos referidos dias de feriado obrigatório. (21º)
     ‒ Durante todo o período da relação de trabalho, o Autor exerceu a sua actividade para a 1.ª Ré num regime de 3 turnos rotativos de 8 horas por dia (22º): 
Turno A : (das 08h às 16h)
Turno B : (das 16h às 00h)
Turno C : (das 00h às 08h).
     ‒ Durante todo o período da relação de trabalho com a 1.ª Ré, o Autor sempre respeitou o regime de ternos especificamente fixados pela 1.ª Ré. (23º)
     ‒ Os turnos respeitavam sempre uma mesma ordem sucessiva de rotatividade (A-C)-(B-A)-(C-B), após a prestação pelo Autor (e pelos demais trabalhadores) de sete dias de trabalho contínuo e consecutivo. (24º)
     ‒ Em cada ciclo de 21 dias de trabalho contínuo e consecutivo, o Autor prestava trabalho durante dois períodos de 8 horas cada num período de 24 horas, sempre que se operasse uma mudança entre os tunos (C-B) e (B-A). (25º)
     ‒ A 1.ª Ré nunca pagou ao Autor qualquer quantia (em singelo e/ou adicional) pelo trabalho prestado pelo Autor durante os dois períodos de 8 horas cada prestado num período de 24 horas, em cada ciclo de 21 dias de trabalho contínuo e consecutivo. (26º)
     ‒ Por ordem das Rés, o Autor estava obrigado a comparecer no seu local de trabalho devidamente uniformizado com, pelo menos, 30 minutos de antecedência relativamente ao início de cada turno. (27º)
     ‒ Durante os 30 minutos que antecediam o início de cada turno, os superiores hierárquicos do Autor distribuíram o trabalho pelos guardas de segurança (leia-se do Autor), v.g., indicando-lhe o seu concreto posto (local dentro do casino onde o mesmo se devia colocar), os clientes tidos por “suspeitos”, sendo ainda feito um relato sobre todas as questões de segurança a ter em conta no interior do Casino, ou mesmo da necessidade de qualquer participação em ventos especiais. (28º)
     ‒ O Autor sempre compareceu no início de cada turno com a antecedência de, pelo menos, 30 minutos. (29º)
     ‒ Cumprindo as ordens e as instruções que lhe eram emendas pelos seus superiores hierárquicos. (30º)
     ‒ 兩名被告的訴訟代理人在2015年06月12日曾與原告訴訟代理人達成13宗案件的和解協議 (37º - 43º)
     ‒ O Autor trabalhou efectivamente entre 29/03/1997 e 21/03/2003 junto da 1ª Ré, incluindo 1 de Janeiro, Ano Novo Chinês (3 dias), 1 de Maio e 1 de Outubro, excepto 24 dias de férias anuais por cada ano civil e dispensas de trabalho não remuneradas, nomeadamente entre 14/7/1998 e 7/8/1998 (25 dias), entre 2/9/1998 e 3/9/1998 (2 dias), entre 13/7/1999 e 5/8/1999 (24 dias), entre 21/3/2000 e 13/4/2000 (24 dias), entre 30/6/2001 e 21/7/2001 (22 dias), entre 23/3/2002 e 16/4/2002 (25 dias) e entre 6/3/2003 e 29/3/2003 (24 dias). (44º)
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IV - FUNDAMENTAÇÃO
    Como o recurso tem por objecto a sentença proferida pelo Tribunal de 1ª instância, importa ver o que o Tribunal a quo decidiu. Este afirmou na sua douta decisão:
I – RELATÓRIO

B (cuja identificação consta dos autos), veio intentar a presente Acção de Processo Comum do Trabalho contra 1ª Ré-XXXX XXXX XXXX XXXX, SARL, (adiante, XXXX) e 2ª Ré-YYY YYY YYY, S.A., (adiante, YYY) (cuja identificação consta dos autos), concluiu pedindo que seja julgada procedente por provada a presente acção e, em consequência ser a 1ª Ré condenada a pagar ao Autor:
a) MOP$42.520,00, a título de subsídio de alimentação, acrescido de juros legais até integral e efectivo pagamento;
b) MOP$30.400,00, a título de subsídio de efectividade, acrescido de juros legais até integral e efectivo pagamento;
c) MOP$139.000,00, pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal, nos termos da al. a) do n.º 6 do art. 17.º do DL n.º 24/89/M, acrescida de juros até efectivo e integral pagamento;
d) MOP$69.500,00, por falta de marcação e gozo de um dia de descanso compensatório pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal, nos termos do n.º 4 do art. 17.º do DL n.º 24/89/M, acrescida de juros até efectivo e integral pagamento;
e) MOP$57.000,00 a título de devolução das quantias de comparticipação no alojamento descontadas pela 1.ª Ré (SDTM);
f) MOP$27.750,00 a título de trabalho prestado em dia de feriado obrigatório remunerado, nos termos do n.º 3 do art. 18.º do DL n.º 24/89/M, acrescida de juros até efectivo e integral pagamento;
g) O montante correspondente às bonificações ou remunerações adicionais incluindo as gorjetas que a Ré pagou aos operários residentes, a determinar nos termos do artigo 392.º, n.º 1, alínea c) ou alínea b) a liquidar em execução de sentença, por força do disposto no artigo 564.º, n.º 2 do Código de Processo Civil, ex vi art. 1.º do CPT;
h) MOP$35.000,00, pelas 16 horas de trabalho prestadas para além do período normal de trabalho em cada ciclo de 21 dias de trabalho;
i) MOP$38.000,00, pela prestação de 30 minutos de trabalho para além do período normal diário por cada dia de trabalho efectivo;
j) Em custas e procuradoria condigna.
E, em consequência ser a 2ª Ré condenada a pagar ao Autor:
a) MOP$2.300,00, a título de subsídio de alimentação, acrescido de juros legais até integral e efectivo pagamento;
b) MOP$1.600,00, a título de subsídio de efectividade, acrescido de juros legais até integral e efectivo pagamento;
c) MOP$3.000,00, a título de devolução das quantias de comparticipação no alojamento descontadas pela 2.ª Ré (YYY);
d) MOP$750,00 a título de trabalho prestado em dia de feriado obrigatório remunerado, nos termos do n.º 3 do art. 18.º do DL n.º 24/89/M, acrescida de juros até efectivo e integral pagamento;
e) MOP$2.000,00, pelas 16 horas de trabalho prestadas para além do período normal diário em cada ciclo de 21 dias de trabalho;
f) MOP$2.000,00, pela prestação de 30 minutos de trabalho para além do período normal diário por cada dia de trabalho efectivo;
g) Em custas e procuradoria condigna.
Juntou os documentos constantes de fls. 31 a 46.
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Realizada a tentativa de conciliação pelo MP, não chegou a acordo entre as partes.
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As Rés contestaram a acção com os fundamentos constantes de fls. 98 a 134 dos autos.
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Realiza-se a audiência de discussão e de julgamento com observação de todo o formalismo legal, proferindo o presente Tribunal a sentença constante das fls. 406 a 416.
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Tendo interposto o recurso, veio o Venerando Tribunal de Segunda da Instância proferiu o douto acórdão das fls. 507 a 516, decidindo, entre outros, anular parcialmente o julgamento de forma a apurar os concretos dias de trabalho efectivamente prestado para fixar-se a compensação relativa aos subsídios de alimentação e às importâncias devidas a título de trabalho prestado em dias de feriados obrigatórios, de descanso semanal (nos termos definidos nesse aresto), descanso compensatório e trabalho extraordinário por turnos.
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     II – PRESSSPOSTOS PROCESSUAIS
     O Tribunal é competente em razão da matéria, hierarquia e internacional.
     O processo é próprio.
     As partes gozam de personalidade e capacidade jurídicas e são legítimas.
     Não existem excepções, nulidades ou outras questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
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     III – FACTO
     Discutida a causa, resultam provados os seguintes factos:
     (…)
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IV – FUNDAMENTO DE DIREITO
No douto acórdão do Venerando Tribunal de Segunda da Instância dos presentes autos, acordam-se em:
     a) anular parcialmente o julgamento de facto de forma a apurar os concretos dias de trabalho efectivamente prestado e a poder fixar-se a compensação relativa aos subsídios de alimentação, bem como as importâncias devidas a título de trabalho prestado em dias de descanso semanal, descanso compensatório, trabalho extraordinário e por turnos e feriados obrigatórios, determinando a repetição do mesmo; e
     b) julgar não provido o recurso na parte restante, em consequência do que se mantém a sentença recorrida, nomeadamente na parte concernente à liquidação a que já procedeu quanto ao subsídio de efectividade e à comparticipação no alojamento.
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Essa repetição do julgamento compreende o apuramento os concretos dias de trabalho efectivamente prestado, destinando-se a fixar a compensação relativa aos subsídios de alimentação e às importâncias devidas a título de trabalho prestado em dias de feriados obrigatórios, de descanso semanal, descanso compensatório e trabalho extraordinário por turnos.
Para os efeitos, definem-se nos fundamentos do mesmo acórdão os termos seguintes:
1. Da nulidade da sentença por falta de fundamentação:
Entendem a 1ª Ré que a sentença recorrida é nula por falta de fundamentação uma vez que não contém todos os factos necessários para a sua condenação dos créditos reclamados a título dos subsídios de alimentação, da compensação da prestação das horas extraordinárias, dos dias de descanso semanal, incluindo os respectivos dias de descano compensatório, e dos feriados obrigatórios não gozados, especialmente não tendo alegado e provado o nº de dias de trabalho efectivo e o nº de dias do descanso semanal e dos feriados obrigatórios não gozados.
Sobre a questão suscitada, a jurisprudência (Ac. de 29/06/2017, Proc. nº 326/2017) recente deste TSI é no sentido seguinte:
“…Invoca-se uma insuficiente fundamentação e afigura-se-nos que a Ré, ora recorrente, tem razão, na medida em que o Mmo Juiz se terá baseado num cômputo de dias que vêm alegados pelo A., não se alcançando em que bases se louvou para o seu cálculo.
A recorrente coloca bem a questão, ao imputar o vício à sentença proferida - independentemente do enquadramento jurídico efectuado – nos seguintes termos:
“(…) a decisão em crise padece do vício de falta de fundamentação decorrente da violação do ónus da alegação por parte do Recorrido já que mantém na íntegra as conclusões incoerentes feitas na petição inicial, mantendo por responder a questões/vícios tais como: (i) ter o Autor trabalhado todos os dias da semana, embora reconheça ter faltado algumas vezes com autorização prévia da 1ª Ré; (ii) Quantos foram esses dias de faltas justificadas e quando foram gozados os 24 dias de férias anuais? (iii) Deverá ser atendida a "média" de 30 dias por ano de faltas autorizadas, como o autor concede na nota 1 ao art. 22° da petição inicial? Que factos suportam esta conclusão?” 
De certa forma pode-se dizer que o Mmo Juiz terá efectuado o seu cálculo com base na alegação do A. que ressalva na nota ao art. 27º da p.i. de que o A. não trabalhou 30 dias por cada ano civil, após o desconto do tempo relativo à prescrição. Mas se se se baseia nesse pressuposto de facto, logo a douta sentença peca por não se saber em que bases assentou essa fixação da matéria de facto – presumida apenas a partir da fundamentação de direito na sentença proferida, já que essa factualidade não está concretizada no capítulo em que se dá por assente a matéria de facto -, sendo certo que se trata de matéria que foi impugnada pelo A. e é certo que o A. não trabalhou durante todo o período em que esteve ao serviço da A., de forma ininterrupta, pois foi autorizado a ausentar-se. Dir-se-á que que o período de ausência era de 30 dias por ano. Mas onde está a comprovação de que assim era e que assim era de facto? O A. alegou e formulou o pedido nessa base, mas comprovou-o? 
Estamos em crer que essa incompleição não pode deixar de ser suprida, havendo que aditar, se necessário, o ou os quesitos necessários referentes à concretização dos dias de trabalho efectivo prestado e desconto dos 30 dias em cada ano, tal como alegado na nota ao artigo 27º da p.i.
Embora se acolha a linha jurisprudencial mais permissiva, no sentido de que sempre que o tribunal verificar o dano ou a prestação devida, mas não tiver elementos para fixar o seu valor, quer se tenha pedido um montante determinado ou formulado um pedido genérico, lhe cumpre relegar a fixação do montante indemnizatório para liquidação em execução de sentença, ao abrigo do disposto no art. 564º/2 do CPC1 - mesmo que se possa afirmar que se está a conceder uma nova oportunidade ao autor que tenha deduzido pedido líquido de provar o quantitativo devido, não se vislumbra qualquer ofensa do caso julgado, material ou formal, na medida em que a existência de danos já está provada e apenas não está determinado o seu exacto valor e só no caso de se não ter provado a existência de prestação devida é que se forma caso julgado material sobre tal objecto, impedindo nova prova do facto no posterior incidente de liquidação, estando subjacente a esta jurisprudência a ideia de que razões de justiça e de equidade impedem que se absolva a demandada uma vez demonstrada a sua obrigação -, a situação presente não consentirá essa via, na exacta medida em que houve já uma liquidação e o apuramento de uma base de cálculo, não se tendo o Mmo Juiz limitado a uma enunciação genérica de trabalho prestado não apurado.
Ainda que que não se enjeite essa possibilidade, numa recondução a um completamento de matéria de facto, estamos em crer que a presente solução aponta para uma necessidade de exigência e de rigor, desde logo, para as próprias partes - muitas nem sequer aqui permanecendo, porventura desinteressando-se dos seus direitos aquando da cessação dos contratos, visto até o tempo entretanto decorrido -, não podendo elas facilitar na concretização e prova das prestações que dizem estar em dívida. Quanto se diz não retira de forma nenhuma o reconhecimento à tutela dos direitos dos trabalhadores que tenham sido violados, apenas se pretendendo a sua cooperação e responsabilização na realização da Justiça.
Perante esta insuficiência, perante esta incompreensão sobre a forma como se atingiu aquele facto com que se jogou no cálculo efectuado, mais do que a falta a que alude o art. 571º, b) do CPC estaremos perante a situação prevista no art. 629º, n.º 4 do mesmo Código, o que implica a anulação da decisão proferida na parte relativa à concretização de quais e quantos os dias considerados no cálculo efectuado pelo Mmo Juiz, tendo em conta a necessidade de saber os dias concretos de trabalho e ausência para se poderem determinar as diferentes compensações. Ou seja, por exemplo, para efeitos de compensação de feriados obrigatórios, como está bem de ver, só há compensação se houve trabalho nesses dias. Mas independentemente dessa necessidade concretização, contemplada aliás, na decisão proferida, há uma outra quantificação que se tem de provar.
Compreende-se que possa não ser fácil, mas aí o A. tem o ónus de provar, não se podendo remeter para uma alegação conclusiva de que trabalhou todos os dias menos 30 por ano. Tem de provar que assim foi e esmerar-se na prova que produz. Admite-se que essa alegação seja pobre, mas não se deixa de considerar que ela ainda consubstancia um facto que se mostra essencial e como tal tem de ser comprovado, na certeza de que o tribunal não pode suprir de todo a insuficiência de alegação das partes. 
Daqui decorre que, em todos os momentos em que ao longo da fundamentação expendida fazíamos alusão à necessidade de apurar o número de dias, se conclui que esse apuramento deve ser efectuado em sede de repetição do julgamento na parte pertinente e já não em sede de liquidação em execução de sentença, na medida em que se fica por perceber como se encontrou o número de dias de base do cálculo, descontados os dias de ausência, matéria que não foi levada à base instrutória, mas, ainda que incipientemente, foi alegada.”
No caso em apreço, o Tribunal a quo considerou que o Autor no período entre 29/07/1997 a 21/07/2003 gozou 146 férias anuais e deu 2 dias de faltas justificadas, a saber (pág. 11 da sentença recorrida):
Férias anuais
14/07/1998 – 07/08/1998 25 dias
13/07/1999 – 05/08/1999 24 dias
21/03/2000 – 13/04/2000 24 dias
30/06/2001 – 21/07/2001 22 dias
23/03/2002 – 16/04/2002 25 dias
06/03/2003 – 29/03/2003 24 dias
Faltas justificadas 
02/09/1998 – 03/09/1998 2 dias
Contudo, não conseguimos encontrar tais factos no elenco dos factos assentes e provados constantes da sentença recorrida.
Assim, somos a reiterar o que já anteriormente decidimos sobre esta matéria no sentido de anular parcialmente o julgamento de facto de forma a apurar os concretos dias de trabalho efectivamente prestado e a poder fixar-se a compensação relativa aos subsídios de alimentação, bem como as importâncias devidas a título de trabalho prestado em dias de descanso semanal, descanso compensatório, trabalho extraordinário e por turnos e feriados obrigatórios, determinando a repetição do mesmo1.
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Com a mesma doutrina, o Venerando Tribunal de Segunda da Instância acordaram em repetir, e só, o julgamento de forma a apurar os concretos dias de trabalho efectivamente prestado pelo Autor, confirmando os créditos, só na sua qualidade mas não na sua quantidade, relativos aos subsídios de alimentação e às importâncias devidas a título de trabalho prestado em dias de feriados obrigatórios, de descanso semanal, descanso compensatório e trabalho extraordinário por turnos.
Após a repetição do julgamento, fica provado:
­ O Autor trabalhou efectivamente entre 29/03/1997 e 21/03/2003 junto da 1ª Ré, incluindo 1 de Janeiro, Ano Novo Chinês (3 dias), 1 de Maio e 1 de Outubro, excepto 24 dias de férias anuais por cada ano civil e dispensas de trabalho não remuneradas, nomeadamente entre 14/7/1998 e 7/8/1998 (25 dias), entre 2/9/1998 e 3/9/1998 (2 dias), entre 13/7/1999 e 5/8/1999 (24 dias), entre 21/3/2000 e 13/4/2000 (24 dias), entre 30/6/2001 e 21/7/2001 (22 dias), entre 23/3/2002 e 16/4/2002 (25 dias) e entre 6/3/2003 e 29/3/2003 (24 dias).
Assim, tendo em conta o período da relação de trabalho entre o Autor e a 1 ª Ré, os números de dias em que aquele prestou trabalho efectivo junto destas são de 2138 dias (2306 dias2 – 168 dias3).
Conforme as fórmulas fixadas no douto acórdão acima alegado, tem o Autor direito de receber os montantes seguintes:
Quanto aos subsídios de alimentação, a 1ª Ré deve pagar-lhe o MOP$42,760.00 (2138 dias X MOP$20). Conforme o princípio dispositivo, é a 1ª Ré condenadas a pagar o MOP$42,520.00.
Quanto às compensações pelos dias de descanso semanal e pelos dias de descanso compensatório não gozados, a 1ª Ré deve pagar-lhe o MOP$216,300.00 [HKD$7500/30 X 1.03 X 2 X 1960 dias/7 + HKD$7500/30 X 1.03 X 1 X 1960 dias/7]. Conforme o princípio dispositivo, é a 1ª Ré condenadas a pagar o MOP$208,500.00.
Quanto às compensações pelo trabalho prestado nos dias de feriado obrigatório remunerado, a 1ª Ré deve pagar-lhe o MOP$28,582.50 (HKD$250 X 1.03 X 3 X 37 dias). Conforme o princípio dispositivo, é a 1ª Ré condenada a pagar o MOP$27,750.00, respectivamente.
Quanto às compensações pelo trabalho extraordinário de 8 horas em cada ciclo de 21 dias de trabalho, a 1ª Ré deve pagar ao Autor essas compensações com o montante do MOP$26,215.95 [HKD$7500/ (30 X 8) X 1.03 X 8 X 2138 dias/21].
Quanto às compensações pelo trabalho extraordinário no início de cada turno com antecedência de 30 minutos, a 1ª Ré deve pagar ao Autor essas compensações com o montante do MOP$31,543.75 [HKD$7,500.00 / (30 dias X 8 horas) X 1.03 X 0.5 horas X 2138 dias].
As quantias são acrescidas ainda de juros de mora nos termos definidos na jurisprudência fixada no Douto Acórdão do TUI, de 2 de Março de 2011, no processo n. 69/2010.
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V - DECISÃO
Pelo exposto, julga-se a acção parcialmente procedente e em consequência condena-se, nos termos supra referidos, a 1ª Ré a pagar ao Autor a quantia de MOP$336,529.70, respectivamente, acrescida dos juros de mora à taxa legal a contar da data da presente sentença até o efectivo e integral pagamento, absolvendo a Ré do restante pedido.
As custas serão a cargo do Autor e da 1ª Ré na proporcão do decaimento.
Registe e notifique.

Trata-se de um recurso em que se suscita uma questão interessante, que consiste em saber se uma excepção peremptória (prescrição de direitos laborais alegados pelo Autor) invocada pela Ré na primeira instância, ora Recorrente, que não fora resolvida pelo Tribunal de 1ª instância, não obstante haver recurso ordinário, em que tal omissão não foi suscitada por nenhuma das partes nesse primeiro recurso interposto.
Na sequência do provido parcial o 1º recurso ordinário, foi mandado repetir o julgamento a fim de esclarecer determinada matéria fáctica, o qual foi feito.
Contra a nova decisão a Ré veio a interpor um novo recurso ordinário (2º recurso), em que vem suscitar tal questão de omissão por parte do Tribunal a quo sobre a excepção peremptória que nunca foi conhecida pelo Tribunal recorrido.

Pergunta-se, é legal fazê-lo agora?
Se é certo que o artigo 571º do CPC consagra as situações que conduzam à nulidade da sentença (ou decisões equivalentes), não é menos certo que tais nulidades não são do conhecimento oficioso por parte do tribunal, à excepção da prevista na alínea a) do preceito legal citado, sujeitando a sua invocação ao prazo para interposição do recurso ordinário (artigo 591º do CPC). O que significa que, decorrido o prazo em causa sem que tais nulidades fossem invocadas, formar-se-ia caso julgado e como tal não pode ser objecto de sindicância judicial, salvo se se accionar o mecanismo de recurso extraordinário caso estejam reunidos os requisitos exigidos pelo artigo 653º e seguintes do CPC.
Ou seja, na óptica do legislador, o valor de caso julgado sobrepôr-se sobre o valor nulidade da decisão!
A insusceptibilidade de impugnação de uma decisão decorrente do seu trânsito em julgado é uma exigência de boa administração da justiça, da funcionalidade dos tribunais e da salvaguarda da paz social, dado que dá expressão aos valores da segurança e certeza imanentes a qualquer ordem jurídica: a res judicata obsta a que uma mesma acção seja instaurada várias vezes, impede que sobre a mesma situação recaiam soluções contraditórias e garante uma composição, tendencialmente definitiva, dos litígios que os tribunais são chamados a resolver: a intangibilidade (tendencial) do caso julgado é um princípio do nosso ordenamento jurídico com que se pretende evitar, não uma colisão teórica de decisões, mas a contradição de julgados, a existência de decisões, em concreto, incompatíveis.
A força e autoridade do caso julgado tem por finalidade evitar que a relação jurídica material, já definida por uma decisão com trânsito, possa vir a ser apreciada diferentemente por outra decisão, com ofensa da segurança jurídica.
No caso, quando foi interposto o 1º recurso, nenhuma das partes chegou a invocar a questão da omissão de pronúncia sobre a excepção peremptória, só agora, neste recurso (já foi repetido o julgamento na sequência de anular parcialmente a decisão) é que a Recorrente/Ré voltou a levantar tal questão de omissão de decisão. Ora salvo o melhor respeito, entendemos que não pode fazer, sob pena de se violar o artigo 571º/3-última parte do CPC.
Pelo que, na falta de fundamentos legais para sustentar o pedido da Recorrente neste recurso, é de negar provimento ao presente recurso, mantendo-se a sentença recorrida.
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Síntese conclusiva:
A arguição das nulidades previstas no artigo 571º do CPC depende da observância do prazo para interposição do recurso ordinário (artigo 591º do CPC), à excepção da nulidade prevista na alínea a) do preceito legal citado. Decorrido o prazo em causa sem que tais nulidades fossem arguidas no respectivo recurso, formar-se-ia caso julgado e como tal a decisão não pode ser objecto de nova sindicância judicial mediante novo recurso, sob pena de violar o caso julgado.

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    Tudo visto e analisado, resta decidir.
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V - DECISÃO
    Em face de todo o que fica exposto e justificado, os juízes do Tribunal de 2ª Instância acordam em negar provimento ao recurso, mantendo-se a decisão recorrida.
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    Custas pela Recorrente.
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    Registe e Notifique.
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RAEM, 19 de Setembro de 2019.

(Relator)
Fong Man Chong

(Primeiro Juiz-Adjunto)
Ho Wai Neng

(Segundo Juiz-Adjunto)
José Cândido de Pinho
1 Salvo o devido respeito, o Tribunal mantém a posição de que as compensações de trabalho em dia de descanso semanal e em dia de feriado obrigatório devem incluir o próprio salário daqueles dias. No entanto, esta posição nada impede o cumprimento do douto acórdão do Venerando TSI nos termos do art. 5º, n. 2º da LBOJ.
2 Dias de calendário.
3 Férias anuais e dispensas não remuneradas.
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