Processo n.º 612/2019
(Autos de recurso em matéria laboral)
Relator: Fong Man Chong
Data: 26/Setembro/2019
ASSUNTOS:
- Autoridade de caso julgado em matéria de propriedade do imóvel
SUMÁRIO:
I - O reconhecimento do direito de propriedade da Autora, ainda que em metade, sobre aquele imóvel ínsito no veredicto dum processo (Proc. n.º CV3-14-0024-CAO), que reconheceu ao Réu a titularidade da plena propriedade sobre o mesmo imóvel, consubstancia uma decisão de questão fundamental com autoridade de caso julgado, nos termos dos artigos 574º/1 e 2 e 576º do CPC.
II - Verificada que está a autoridade do caso julgado material constituído pela decisão proferida no referido processo e sendo tal efeito incompatível com os efeitos prático-jurídicos, objecto da pretensão deduzida na presente acção, o seu alcance não pode deixar de se repercutir no próprio mérito da pretensão da Autora.
III - Significa isto que o reconhecimento do direito de propriedade do Réu sobre o imóvel em causa, nos termos em que foi julgado no referido processo, impõe-se, na presente acção, como efeito substantivo impeditivo de que o mesmo imóvel seja agora reconhecido como bem também da Autora em metade. Tal efeito, inscrevendo-se como se inscreve no plano do mérito da acção, implica necessariamente um juízo de improcedência desta com a consequente absolvição do Réu do pedido aqui formulado.
O Relator,
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Fong Man Chong
Processo nº 612/2019
(Autos de recurso em matéria cível)
Data : 26 de Setembro de 2019
Recorrente : A (Autora)
Objecto do Recurso : Despacho que julgou improcedente a acção (裁定訴訟請求理由不成立的批示)
Recorrido : B (Réu)
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Acordam os Juízes do Tribunal de Segunda Instância da RAEM:
I – RELATÓRIO
A, Recorrente, devidamente identificada nos autos, discordando do despacho proferido pelo Tribunal de primeira instância, datado de 10/01/2019 (fls. 122 e 123), dele veio, em 21/03/2019, interpor recurso para este TSI, com os fundamentos constantes de fls. 134 a 136, tendo formulado as seguintes conclusões:
1). 本上訴的標的為原審法院於2019年1月10日作出的批示,當中裁定上訴人針對被上訴人的請求明顯不成立,就此駁回請求。
2). 在尊重不同見解的前提下,上訴人認為原審法院在理解法律方面存有錯誤。
3). 被上訴批示主要是認為上訴人的訴因是以其丈夫取得時效方式取得涉案單位而主張該單位的1/2份額,但是由於上訴人的丈夫因CV3-14-0024-CAO的裁判承認被上訴人對涉案單位的所有權,因而上訴人的請求也明顯不能成立。
4). 從起訴狀所描述的事實可見,上訴人在本案的訴因不是源自其丈夫的權利,而是源自上訴人本身的權利。
5). 取得時效的前提取決於占有,而占有由兩個要素組成:一個是體素,即對物的事實支配;另一個是心素,即指意圖像擁有人一樣對物行使與事實支配相對應的物權。
6). 上訴人毫無疑問本案中具備體素,因其多年來一直實際支配著涉案單位。
7). 上訴人亦具備法律所要求的心素,因上訴人丈夫早於1992年與涉案單位的預約買受人簽署了預約買賣合同後,上訴人便認定自身為涉案單位的業權人之一,而這一認定本身無需取決於其丈夫的權利。
8). 因此,上訴人與其丈夫自1992年便共同占有涉案單位。
9). 雖然上訴人的丈夫因CV3-14-0024-CAO的裁判承認被上訴人對涉案單位的所有權,但根據《民事訴訟法典》第416條、第417條第2款及574條第1款的規定,因本案與卷宗CV3-14-0024-CAO所涉及的主體及訴因不同,並不對上訴人產生既決案的效力。
10). 雖然在卷宗CV3-14-0024-CAO中上訴人繼受了其丈夫C的訴訟地位,但該案中上訴人僅是以其丈夫的繼受人進行訴訟,而非以上訴人個人本身進行訴訟,因此上訴人有權以其個人的訴因針對被上訴人提起訴訟。
11). 故此,原審法院不應駁回請求,應繼續進行續後的程序。
12). 綜上所述,原審法院在理解法律方面存有錯誤,違反了《民法典》第1204條、第1212條、第1221條、《民事訴訟法典》第416條、第417條第2款及574條第1款的規定,並請求尊敬的 中級法院法官閣下裁定上訴理由成立,並廢止被上訴批示,命令原審法院繼續進行續後的程序。
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B, Recorrido, com os sinais identificativos nos autos, ofereceu a resposta constante de fls. 140 a 144, tendo formulado as seguintes conclusões:
I) 本案因上訴人不服初級法院法官閣下於2019年1月10日裁定原告針對被告而請求宣告原告為標示於澳門物業登記...號第…號簿冊第…頁“A1”獨立單位所有人1/2份額,理由明顯不成立,為此,駁回原告的請求。
II) 上訴人認為其丈夫(C)於1992年10月5日與涉案單位簽署了預約買賣合同(起訴狀文件7),又說由於丈夫需要資金週轉,故向其兄借貸償還債務。
III) 為此,C並將上述獨立單位的預約買受人地位轉予其兄B作為借款的擔保,從那時,上訴人認為其對預約買賣物具有對物占有的心素。
IV) 被上訴人不認同,認為上訴人的說法並沒有事實及證據支持,相反,其丈夫(C)因沒有資金購買預約的獨立單位,故將預約買賣合同的地位轉予被上訴人,倆人之關係實為預約買賣合同的地位讓與,並得到業權人(D和E)的認同,可參閱答辯狀的文件1,在此視為完全轉錄。
V) 於1999年5月21日,被上訴人與上述獨立單位的業權人(D和E)正式簽署了買賣公證書(起訴狀附件9)。
VI) 根據《物業登記法典》第7條由登記產生之推定之規定,即推定被上訴人為該登記獨立單位之權利人所有。
VII) 從1999年1月13日起簽署樓宇轉讓聲明及被上訴人於1999年5月21日簽署買賣不動產公證書時,上訴人對有關獨立單位的占有轉變為單純的持有,上訴人已欠缺取得時效的心素,正如CV3-14-0024-CAO中的裁決。
VIII) 即由原來認為自己為該獨立單位的占有人或所有人的心態,即時轉變成為單純的持有人,體現上訴人之情況與《民法典》第1177條b項之情況相符。
IX) 如上訴人提出有關預約買賣合同的獨立單位為借貸作物之擔保,那為何經過了數十年,上訴人不提供還款予被上訴人所簽署的借貸還款憑證呢或證明上訴人具有其他理由的心素呢?
X) 另一方面,被上訴人認為本案已基於CV3-14-0024-CAO的案件已對原告作出裁決,而上訴人應承認被上訴人對有關獨立單位的所有權,此屬《民事訴訟法典》第417條所規定之情況;以及
XI) 被上訴人完全認同初級法院法官 閣下的裁決,基於原告的訴因係以其丈夫取得時效方式取得涉案“A1”獨立單位而主張該單位的1/2份額。
XII) 上訴人的取得時效仍是基於其丈夫的權利,但是,在CV3-14-0024-CAO案中已有確定判決,既然已有確定判決裁定其丈夫承認被告對涉案單位的所有權,則上訴人(原告)訴因的基礎已不存在,理應被駁回原告有關訴訟的請求。
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Corridos os vistos legais, cumpre analisar e decidir.
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II – PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
Este Tribunal é o competente em razão da nacionalidade, matéria e hierarquia.
O processo é o próprio e não há nulidades.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária e são dotadas de legitimidade “ad causam”.
Não há excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
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III – OBJECTO DO RECURSO:
É o seguinte despacho que constitui o objecto deste recurso, proferido pelo Tribunal de primeira instância:
本院對此案有管轄權。
本訴訟形式恰當及有效。
訴訟雙方具有當事人能力及正當性。
關於被告提出的對裁判已確定的案件的抗辯及原告惡意訴訟的主張:
本案中,原告A(A),透過本通常宣告案針對被告B(B)請求以取得時效方式宣告取得涉案“A1”獨立單位二份之一份額的所有權。
根據起訴狀內容,原告請求取得時效的訴因是基於原告作為其已故丈夫C的配偶,因丈夫於1992年11月05日與涉案單位的預約出賣人F簽署了一份“樓宇買賣合約”承諾以港幣420,000元購入涉案“A1”獨立單位,故基於丈夫對上述不動產所擁有的權利,原告作為配偶也擁有其中之1/2份額。
至於原告的丈夫C生前把涉案“A1”獨立單位的預約買受人地位轉讓予被告,實際上並不是轉讓,只是作為擔保對被告的借款,因而被告並不擁有該不動產的所有權。
被告在答辯中指出,在CV3-14-0024-CAO案中,被告曾針對原告的丈夫C(案件期間基於C去世,由原告及子女代替C的訴訟地位繼續訴訟)。由於該案件判處C等人承認B(即本案被告)對涉案“A1”獨立單位的所有權,因此基於對裁判已確定,應判處原告請求理由不成立。
此外,亦基於原告曾在CV3-14-0024-CAO案中參與訴訟,但是卻沒有提出本案所涉及的請求,因而認為存在惡意訴訟的情事。
現就此作出審理。
原告的訴因是基於其丈夫C於1992年11月05日與涉案單位的預約出賣人F簽署了一份“樓宇買賣合約”,而一直與丈夫及家人占有“A1”獨立單位至少25年因而透過時效而取得該不動產,而原告作為其丈夫C的配偶,所以也取得該不動產1/2份額。
原告的主張是基於其丈夫的權利,但是,在CV3-14-0024-CAO案中已有確定判決裁定其丈夫等人應承認被告對涉案“A1”獨立單位的所有權。
既然已有確定判決裁定其丈夫承認被告對涉案“A1”獨立單位的所有權,如此,原告的訴因基礎而不存在,何來原告還可以基於其丈夫的原因而透過時效取得權利呢!?
綜上,基於原告的訴因係以其丈夫取得時效方式取得涉案“A1”獨立單位而主張該單位的1/2份額,但是,由於其丈夫因CV3-14-0024-CAO的裁判承認被告B對涉案“A1”獨立單位的所有權,因而原告的請求也明顯不能成立。
至於被告主張的惡意訴訟,根據《民事訴訟法典》第385條第2款的規定,因故意或嚴重過失而提出無依據之主張或反對,而其不應不知該主張或反對並無依據﹔歪曲對案件裁判屬重要之事實之真相,或隱瞞對案件裁判屬重要之事實者,為惡意訴訟人。
司法見解一直認為,作為惡意訴訟中的故意,其行為必須帶有可恥性質,在道德、操守及訴訟法律層面上是極度備受譴責的,屬於一種單純備受譴責的訴訟行為,因其行為脫離了辯論的範疇,使用了臭名昭著的手段(詳見中級法院第294/2013號合議庭裁判)。
在本案中,原告只是為捍衛其利益,認為其擁有涉案不動產之一半權利而提出請求,從原告提訴之目的及所提出的訴因及請求,似乎並沒有歪曲對案件裁判屬重要之事實之真相,或隱瞞對案件裁判屬重要之事實。至於為何在參與CV3-14-0024-CAO案件中不主張其權利,這是原告的個人選擇。因此,不存在原告惡意訴訟的情事。
綜上所述,裁定原告針對被告而請求宣原告為標示於澳門物業登記...號第…號簿冊第…頁“A1”獨立單位所有人1/2份額,理由明顯不成立,就此駁回請求。
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訴訟費用由原告支付。
作出通知及必要措施。
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IV – FUNDAMENTAÇÃO
Ora, antes de mais, importa saber o que aconteceu entre as partes tendo em conta os elementos probatórios juntos aos autos com interesse para a decisão da causa:
- Em 13/01/1992, C (marido da Autora desta acção, falecido) cedeu a sua posição de promitente-comprado de compra e venda para o seu irmão, Réu desta acção, B, tendo-se alegado que ambas as partes não tinham verdadeira intenção de cessão da posição contratual, nem tendo havido a entrega da quantia de MOP$288,280.00;
- C (marido da Autora desta acção, falecido) fez aquilo para garantir o empréstimo contraído junto do seu irmão B. Ou seja, por causa de dificuldades financeiras do C, o B concordou que o C ficava a viver temporariamente na referida casa.
- Durante 2010 a 2014, o réu B pediu várias vezes ao C e a sua família para desocupar a casa, não tendo estes cumprido, nem devolvido a respectiva casa para o Réu B.
- Em Março de 2014, o réu B interpôs uma acção de reivindicação contra C (Proc nº CV3-14-0024-CAO), o filho K e interessados incertos, por ocuparem a referida casa, em Macau, na Travessa dos Lirios nº7, Edifício Weng Hei, 1°andarA.
- Em 19/07/ 2014, C morreu em Macau.
- Depois, os herdeiros do C, a mulher A, G, H, I, J por habilitação, e por substituição do réu (C) no processo CV3-14-0024-CAO, vieram pedir a usucapião da referida casa.
- Nos termos da sentença proferida no Processo CV3-14-0024-CAO, datada de 7 de Março de 2017, foram condenados os réus, K e interessados incertos a reconhecer o autor B como dono e legítimo proprietário da fracção autónoma sita na …, e a entregar a facção autónoma ao autor L (fls. 57 a 63);
- Em 01/06/2017, contra esta sentença interpuseram o recurso K, A, G, H, I, J.
- Decidido o recurso pelo TSI, tendo sido proferido o respectivo acórdão no âmbito do processo nº737/2017, datado de 23/04/2018, pelo qual foi negado o recurso e confirmada a decisão recorrida (fls. 65 a 87).
- Depois de trânsito em julgado do acórdão, o Réu pediu à Autora e sua família para desocuparem da casa, mas estes não devolveram a referida casa.
- Em 25 de Julho de 2018, com a ajuda do advogado, o Réu recebeu a chave da fracção autónoma em causa.
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Veio agora a Autora a propor esta acção com vista a usucapir a metade da propriedade da fracção autónoma em causa, alegando que, enquanto esposa do promitente-comprador do acordo (ex-marido dela), vivia conjuntamente com o seu falecido marido e filhos no imóvel mais de 25 anos, reunindo os pressupostos de usucapião!
Quid Juris?
Ora, o Tribunal a quo entendeu que a Autora formulou um pedido manifestamente improcedente e como tal julgou improcedente a acção logo no saneador com os fundamentos acima transcritos!
Lidos todos os elementos juntos aos autos, concordamos basicamente com a argumentação do Tribunal recorrido, e, nesta sede, acrescentamos o seguinte:
1) - A Autora vem agora afirmar que ela tinha poder de facto sobre a fracção autónoma, com base na sua relação conjugal com o seu falecido marido, enquanto pactuante do respectivo contrato-promessa de compra e venda;
2) – Nesta óptica, a Autora confundiu duas realidades: uma é a relação conjugal, outra é a relação patrimonial. No caso, a fracção autónoma nunca se tornou como um bem comum deles, porque o seu ex-marido assinou apenas um contrato-promessa de compra e venda, não foi outorgada a respectiva escritura pública. Acrescenta ainda um outro motivo: celebrado o respectivo contrato-promessa, o seu ex-marido cedeu, mais tarde, a sua posição contratual para um irmão dele. Por isso, a alegada relação conjugal é irrelevante para avaliar a relação entre a Autora e o bem imóvel em causa.
3) – Por outro lado, todos estes argumentos invocados pela Autora/Recorrente já foram apreciados no âmbito do processo CV3-14-0024-CAO, cuja parte mais relevante transcrevemos aqui de propósito:
“(…)
Vejamos se no caso do 1° Réu se ocorrem esses dois requisitos.
No que diz respeito ao corpus, resulta-se dos factos assentes que, desde 1992, o 1° Réu, a sua esposa e um dos filhos do casal, habitam na fracção autónoma em discussão, tendo sido o 1° Réu, ao longo dos anos, quem procedeu ao pagamento dos consumos de electricidade, água, gás, televisão e demais despesas inerentes à referida fracção e realizou reparações e obras de conservação da fracção.
A ocupação, o suportamento das despesas inerentes, assim como a realização das obras de conservação da fracção são actos materiais tipicamente praticados por um dono do imóvel. Parece que não deverão haver dúvidas, que existe “corpus” no caso vertente.
A mesma conclusão já não poderá retirar no que tocante ao elemento “animus,”.
Não obstante de o 1° Réu ter alegado que praticou os actos materiais acima referidos na convicção de ser proprietário e foi reconhecido por todos como sendo o seu proprietário, porém, não logrou os Réus provar esses factos. Frustraram também os mesmos Réus provar a matéria fáctica relativa ao sentido subjacente do acordo de cessão da posição contratual do 1° Réu ao Autor, isto é apenas destina-se para a garantia do reembolso do dinheiro emprestado e não a verdadeira transmissão do direito sobre a fracção.
Estatui-se no n°2 do art°1176° do C.C99 que “Em caso de dúvida, presume-se a posse naquele que exerce o poder de facto.”
Decide-se o Acórdão do TSI n° 292/2004, de 17 de Março de 2005, “O animus mais não é que essa intenção jurídico-real. Admite-se até que a intenção de domínio não tenha de explicitar-se e muito menos por palavras: o que importa é que se deduza do próprio modo de actuação ou de utilização da coisa”.
Conforme os factos assentes, vem comprovado que no dia 13 de Janeiro de 1999, o 1° Réu cedeu a sua posição contratual na qualidade de promitente-comprador ao Autor. Desse acto se deduz que a partir da cessão, o 1° Réu deixou de ter ánimus de ser proprietário da fracção autónoma que até à altura possuía, ainda que se entendesse esse acto não é sinal claro. Já é inequívoco com o facto provado de que no momento da escritura, dado o 1° Réu tinha dificuldades financeiras, o Autor concordou que o 1° Réu ficasse a viver na fracção
Portanto, mesmo que se entendesse que o 1° Réu tinha posse sobre a fracção autónoma desde 1992, desde a cessão da sua posição de promitente-comprador ao Autor e este formalizou a aquisição através da celebração da escritura pública com o ex-proprietário em 21/05/1999, a posse do 1° Réu devia ser considerada transferida para o Autor. (…)” (fls. 61/v a 62 dos autos)
4) – É certo que a Autora procurou, na sua PI, demonstrar o seu poder de facto sobre o imóvel (em metade), de modo a negar (ou tirar) a metade de propriedade titulada pelo Réu. Mas o que a Autora conseguiu apenas demonstrar o seu direito ao uso do imóvel, como casa de morada da família que era na altura, a título provisório e com consentimento de quem era titular da propriedade. Se procedesse a pretensão da Autora, forçosamente seria proferida uma “nova decisão” sobre o que está decidido no âmbito da sentença do processo CV3-14-0024-CAO e confirmada pelo TSI.
5) - Nestas circunstâncias, afigura-se que o reconhecimento do direito de propriedade da Autora, ainda que em metade, sobre aquele imóvel ínsito no veredicto do processo n.º CV3-14-0024-CAO consubstancia decisão de questão fundamental com autoridade de caso julgado, nos termos dos artigos 574º/1 e 2 e 576º do CPC.
6) - No alcance desse caso julgado devem considerar-se também compreendidas as questões levantada e, como, no caso, a pertença da propriedade do imóvel em causa.
7) - Assim, o reconhecimento do direito de propriedade do Réu em causa, coberto como está pelo efeito da autoridade do caso julgado material decorrente da decisão proferida no processo n.º CV3-14-0024-CAO, mostra-se incompatível com o reconhecimento solicitado pela Autora nesta acção (metade da propriedade lhe pertenceria).
8) - Verificada que está a autoridade do caso julgado material constituído pela decisão proferida no processo n.º CV3-14-0024-CAO e sendo tal efeito incompatível com os efeitos prático-jurídicos, objecto da pretensão deduzida na presente acção, o seu alcance não pode deixar de se repercutir no próprio mérito da pretensão da Autora.
9) – Ora, de realçar que entre os efeitos decorrentes da autoridade do caso julgado e os emergentes da excepção de caso julgado encontra-se bem traçada por Teixeira de Sousa (Cfr. In Estudo intitulado O objecto da sentença e o caso julgado material (O Estudo sobre a Funcionalidade Processual), publicado no BMJ n.º 325, 1983, pp. 49 e seguintes, mais precisamente a p. 168) quando, a tal propósito, refere que:
«[…] os efeitos do caso julgado material projectam-se em processo subsequente necessariamente como autoridade de caso julgado material, em que o conteúdo da decisão anterior constitui uma vinculação à decisão de distinto objecto posterior, ou como excepção de caso julgado, em que a existência da decisão anterior constitui um impedimento à decisão de idêntico objecto posterior.»
10) - Significa isto que o reconhecimento do direito de propriedade do Réu sobre o imóvel em causa, nos termos em que foi julgado no referido processo, impõe-se, na presente acção, como efeito substantivo impeditivo de que o mesmo imóvel seja agora reconhecido como bem também da Autora em metade.
11) - Assim, tal efeito, inscrevendo-se como se inscreve no plano do mérito da acção, implica necessariamente um juízo de improcedência desta com a consequente absolvição do Réu do pedido aqui formulado.
12) - Nestes termos, não vemos como é que a Autora/Recorrente podia ver procedente a sua pretensão nesta acção formulada, já que o direito da propriedade do Réu sobre a mesma fracção autónoma já se encontra consolidada e confirmada por sentença transitada em julgado!
Pelo expendido, nos termos fáctica e legalmente vistos, é de sustentar e manter a posição assumida no despacho recorrido, julgando-se deste modo improcedente o recurso interposto pela Recorrente.
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Síntese conclusiva:
I - O reconhecimento do direito de propriedade da Autora, ainda que em metade, sobre aquele imóvel ínsito no veredicto dum processo (Proc. n.º CV3-14-0024-CAO), que reconheceu ao Réu a titularidade da plena propriedade sobre o mesmo imóvel, consubstancia uma decisão de questão fundamental com autoridade de caso julgado, nos termos dos artigos 574º/1 e 2 e 576º do CPC.
II - Verificada que está a autoridade do caso julgado material constituído pela decisão proferida no referido processo e sendo tal efeito incompatível com os efeitos prático-jurídicos, objecto da pretensão deduzida na presente acção, o seu alcance não pode deixar de se repercutir no próprio mérito da pretensão da Autora.
III - Significa isto que o reconhecimento do direito de propriedade do Réu sobre o imóvel em causa, nos termos em que foi julgado no referido processo, impõe-se, na presente acção, como efeito substantivo impeditivo de que o mesmo imóvel seja agora reconhecido como bem também da Autora em metade. Tal efeito, inscrevendo-se como se inscreve no plano do mérito da acção, implica necessariamente um juízo de improcedência desta com a consequente absolvição do Réu do pedido aqui formulado.
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Tudo visto e analisado, resta decidir.
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V ‒ DECISÃO
Em face de todo o que fica exposto e justificado, os juízes do Tribunal de 2ª Instância acordam em negar provimento ao recurso, mantendo-se a decisão recorrida.
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Custas pela Recorrente.
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Registe e Notifique.
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RAEM, 26 de Setembro de 2019.
Fong Man Chong
Ho Wai Neng
José Cândido de Pinho
2019-612- usucapião-pedido-impossível 16