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Processo nº 870/2019 Data: 26.09.2019
(Autos de recurso penal)

Assuntos : Crime de “tráfico de estupefacientes”.
Erro notório.
Pena.



SUMÁRIO

1. “Erro” é toda a ignorância ou falsa representação de uma realidade. Daí que já não seja “erro” aquele que possa traduzir-se numa “leitura possível, aceitável ou razoável, da prova produzida”.
Sempre que a convicção do Tribunal recorrido se mostre ser uma convicção razoavelmente possível e explicável pelas regras da experiência comum, deve a mesma ser acolhida e respeitada pelo Tribunal de recurso.

2. Na determinação da medida da pena, adoptou o Código Penal de Macau no seu art. 65°, a “Teoria da margem da liberdade”, segundo a qual, a pena concreta é fixada entre um limite mínimo e um limite máximo, determinados em função da culpa, intervindo os outros fins das penas dentro destes limites.

3. Com os recursos não se visa eliminar a margem de livre apreciação reconhecida ao Tribunal de 1ª Instância em matéria de determinação da pena, e que esta deve ser confirmada se verificado estiver que no seu doseamento foram observados os critérios legais atendíveis.

O relator,

______________________
José Maria Dias Azedo



Processo nº 870/2019
(Autos de recurso penal)






ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:





Relatório

1. Por Acórdão do T.J.B. de 27.06.2019, decidiu-se condenar B (B), (3°) arguido com os sinais dos autos, como autor da prática de 1 crime de “tráfico de estupefacientes”, p. e p. pelo art. 8°, n.° 1 da Lei n.° 17/2009, (alterada pela Lei n.° 10/2016), na pena de 6 anos de prisão, e em cúmulo jurídico com as penas parcelares de 6 meses e de 1 ano e 6 meses de prisão aplicada no âmbito do Proc. n.° CR2-18-0198-PCC, fixou-lhe o Tribunal a pena única de 7 anos de prisão; (cfr., fls. 754 a 767-v que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).

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Inconformado com o assim decidido, o arguido recorreu, imputando ao Acórdão recorrido o vício de “erro notório na apreciação da prova”, pedindo também a redução da pena aplicada; (cfr., fls. 801 a 808).

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Respondendo, diz o Ministério Público que o recurso não merece provimento; (cfr., fls. 840 a 842).

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Neste T.S.I., e em sede de vista, juntou o Ilustre Procurador Adjunto o seguinte douto Parecer:

“Na Motivação de fls.801 a 808 dos autos, o recorrente solicitou a revogação do douto Acórdão em escrutínio (cfr. fls.754 a 767 verso), assacando-lhe o erro notório na apreciação de prova e a excessiva severidade da pena única de sete anos de prisão efectiva aplicada a ele.
Antes de mais, subscrevemos inteiramente as criteriosas explanações do ilustre Colega na Resposta (cfr. fls.840 a 842 dos autos), no sentido de não provimento do presente recurso.
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Em nome do erro notório na apreciação de prova, o recorrente arrogou não haver prova capaz de constatar que ele vendera estupefaciente a outrem em 08/03/2017 e que “原審法院應採信的是:被拘捕當日,在其身上搜出的毒品是供個人與第1嫌犯一同吸食,當中沒有金錢利益”.
Ora, no ordenamento jurídico de Macau é consolidada a seguinte jurisprudência (cfr. a título meramente exemplificativo, arestos do Venerando TUI nos Processos n.º17/2000, n.º16/2003, n.º46/2008, n.º22/2009, n.º52/2010, n.º29/2013 e n.º4/2014): O erro notório na apreciação da prova existe quando se dão como provados factos incompatíveis entre si, isto é, que o que se teve como provado ou não provado está em desconformidade com o que realmente se provou ou não provou, ou que se retirou de um facto tido como provado uma conclusão logicamente inaceitável. O erro existe também quando se violam as regras sobre o valor da prova vinculada ou as legis artis. Tem de ser um erro ostensivo, de tal modo evidente que não passa despercebido ao comum dos observadores, ou seja, quando o homem de formação média facilmente dele se dá conta.
De outro lado, não se pode olvidar que o recorrente não pode utilizar o recurso para manifestar a sua discordância sobre a forma como o tribunal a quo ponderou a prova produzida, pondo em causa, deste modo, a livre convicção do julgador (cfr. aresto do TUI no Processo n.º13/2001). Pois, dado que o erro notório na apreciação da prova nada tem a ver com a eventual desconformidade entre a decisão de facto do Tribunal e a maneira de avaliação do Recorrente, irrelevante é, em sede de recurso, alegar-se como fundamento deste vício, que devia o Tribunal ter dado relevância a determinado meio probatório para formar a sua convicção e assim dar como assente determinados factos, visto que, desta forma, mais não se faz do que pôr em causa a regra da livre convicção do Tribunal. (cfr. Acórdão no Processo n.º470/2010)
À luz destas brilhantes jurisprudências, temos por incontestável que a invocação do erro notório na apreciação de prova não pode deixar de ser manifestamente descabida e, de outro lado, contende com o preceito no art.114° do CPP. Com efeito, o argumento do recorrente para abonar a existência in casu do erro notório na apreciação de prova patenteia que a sua invocação consiste em, no fundo, manifestar a sua discordância sobre a forma como o tribunal a quo ponderou a prova produzida e, deste modo, pretendeu ele sobrepor a sua valoração na realizada pelo tribunal.
E importa ter presente que não se descortina e, nomeadamente, o recorrente não apresenta qualquer circunstância capaz de demonstrar que a ilicitude da sua conduta é consideravelmente diminuída, por isso não existe in casu o pressuposto imprescindível para a aplicação do n.°1 do art.11.° da Lei n.°17/2009 na redacção dada pela Lei n.º10/2016.
Nos termos das disposições nos n.°1 do art.8° e n.°2 do art.14° da Lei n.°17/2009 na redacção introduzida pela Lei n.º10/2016, o peso líquido de 1.507g do estupefaciente apreendido na posse do recorrente, só por si, demonstra seguramente que são exactos e inatacáveis tanto o 12° facto provado como a subsunção na previsão do n.°1 do art.8° aludido.
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Repare-se que os dois Acórdãos citados pelo recorrente como fundamento do pedido da redução da pena foram proferidos pelo Venerando TUI ao abrigo da Lei n.°17/2009 na sua redacção originária, e ao caso sub judice se aplica esta Lei na redacção introduzida pela Lei n.º10/2016 cujo art.1° agrava o limite mínimo da moldura penal consagrada no n.°1 do art.8° referido, passando o qual de três anos a cinco anos. Daí resulta que a sua citação é despropositada e impertinente.
Bem, é solidamente adquirida a douta jurisprudência que vem asseverando que nos arts.64° e 65° do nosso Código pena, o legislador acolhe a teoria da margem de liberdade (a título meramente exemplificativo, vide. Acórdãos do TSI nos Processos n.º293/2004, n.º50/2005 e n.º51/2006). E entendemos ser prudente e aplausível o veredicto que afirma: “Não havendo injustiça notória na medida da pena achada pelo Tribunal a quo ao arguido recorrente, é de respeitar a respectiva decisão judicial recorrida.” (cfr. Acórdão do TSI no Processo n.º817/2016)
Em esteira e nos termos do n.°1 do art.8° na redacção aplicável ao vertente caso, não podemos deixar de concluir que o douto Acórdão em causa não colide com as disposições nos arts.40º e 65º do Código Penal e é descabido o pedido de redução da pena aplicada.
Por todo o expendido acima, propendemos pela improcedência do recurso em apreço”; (cfr., fls. 874 a 875-v).

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Passa-se a decidir.

Fundamentação

Dos factos

2. Estão “provados” os factos como tal elencados no Acórdão recorrido a fls. 756-v a 760, e que aqui se dão como integralmente reproduzidos, (não havendo factos por provar).

Do direito

3. Vem o arguido recorrer do Acórdão que o condenou como autor da prática de 1 crime de “tráfico de estupefacientes”, p. e p. pelo art. 8°, n.° 1 da Lei n.° 17/2009, (alterada pela Lei n.° 10/2016), na pena de 6 anos de prisão, e em cúmulo jurídico com as penas parcelares de 6 meses e de 1 ano e 6 meses de prisão aplicada no âmbito do Proc. n.° CR2-18-0198-PCC, fixou-lhe o Tribunal a pena única de 7 anos de prisão.

Considera que o mesmo padece de “erro notório na apreciação da prova”, pedindo também a redução da pena aplicada.

–– Pois bem, no que toca ao “erro notório na apreciação da prova”, temos entendido que o mesmo apenas existe quando “se dão como provados factos incompatíveis entre si, isto é, que o que se teve como provado ou não provado está em desconformidade com o que realmente se provou, ou que se retirou de um facto tido como provado uma conclusão logicamente inaceitável. O erro existe também quando se violam as regras sobre o valor da prova vinculada, as regras de experiência ou as legis artis. Tem de ser um erro ostensivo, de tal modo evidente que não passa despercebido ao comum dos observadores”.
De facto, “É na audiência de julgamento que se produzem e avaliam todas as provas (cfr. artº 336º do C.P.P.M.), e é do seu conjunto, no uso dos seus poderes de livre apreciação da prova conjugados com as regras da experiência (cfr. artº 114º do mesmo código), que os julgadores adquirem a convicção sobre os factos objecto do processo.
Assim, sendo que o erro notório na apreciação da prova nada tem a ver com a eventual desconformidade entre a decisão de facto do Tribunal e aquela que entende adequada o Recorrente, irrelevante é, em sede de recurso, alegar-se como fundamento do dito vício, que devia o Tribunal ter dado relevância a determinado meio probatório para formar a sua convicção e assim dar como assente determinados factos, visto que, desta forma, mais não se faz do que pôr em causa a regra da livre convicção do Tribunal”; (cfr., v.g., os recentes Acs. deste T.S.I. de 25.10.2018, Proc. n.° 803/2018, de 17.01.2019, Proc. n.° 812/2018 e de 07.03.2019, Proc. n.° 93/2019).

Como também já tivemos oportunidade de afirmar:

“Erro” é toda a ignorância ou falsa representação de uma realidade. Daí que já não seja “erro” aquele que possa traduzir-se numa “leitura possível, aceitável ou razoável, da prova produzida”.
Sempre que a convicção do Tribunal recorrido se mostre ser uma convicção razoavelmente possível e explicável pelas regras da experiência comum, deve a mesma ser acolhida e respeitada pelo Tribunal de recurso.
O princípio da livre apreciação da prova, significa, basicamente, uma ausência de critérios legais que pré-determinam ou hierarquizam o valor dos diversos meios de apreciação da prova, pressupondo o apelo às “regras de experiência” que funcionam como argumentos que ajudam a explicar o caso particular com base no que é “normal” acontecer.
Com o mesmo, consagra-se um modo não estritamente vinculado na apreciação da prova, orientado no sentido da descoberta da verdade processualmente relevante pautado pela razão, pela lógica e pelos ensinamentos que se colhem da experiência comum, e limitado pelas excepções decorrentes da “prova vinculada”, (v.g., caso julgado, prova pericial, documentos autênticos e autenticados), estando sujeita aos princípios estruturantes do processo penal, entre os quais se destaca o da legalidade da prova e o do “in dubio pro reo”.
Enformado por estes limites, o julgador perante o qual a prova é produzida – e que se encontra em posição privilegiada para dela colher todos os elementos relevantes para a sua apreciação crítica – dispõe de ampla liberdade para eleger os meios de que se serve para formar a sua convicção e, de acordo com ela, determinar os factos que considera provados e não provados.
E, por ser assim, nada impede que dê prevalência a um determinado conjunto de provas em detrimento de outras, às quais não reconheça, nomeadamente, suporte de credibilidade.
O acto de julgar é do Tribunal, e tal acto tem a sua essência na operação intelectual da formação da convicção.
Tal operação não é pura e simplesmente lógico-dedutiva, mas, nos próprios termos da lei, parte de dados objectivos para uma formação lógico-intuitiva.
Esta operação intelectual não é uma mera opção voluntarista sobre a certeza de um facto, e contra a dúvida, nem uma previsão com base na verosimilhança ou probabilidade, mas a conformação intelectual do conhecimento do facto (dado objectivo) com a certeza da verdade alcançada (dados não objectiváveis).
Para a operação intelectual contribuem regras, impostas por lei, como sejam as da experiência, a percepção da personalidade do depoente (impondo-se por tal a imediação e a oralidade), a da dúvida inultrapassável, (conduzindo ao princípio in dubio pro reo).
A lei impõe princípios instrumentais e princípios estruturais para formar a convicção. O princípio da oralidade, com os seus corolários da imediação e publicidade da audiência, é instrumental relativamente ao modo de assunção das provas, mas com estreita ligação com o dever de investigação da verdade jurídico-prática e com o da liberdade de convicção; com efeito, só a partir da oralidade e imediação pode o juiz perceber os dados não objectiváveis atinentes com a valoração da prova.
A oralidade da audiência, (que não significa que não se passem a escrito os autos, mas que os intervenientes estejam fisicamente perante o Tribunal), permite ao Tribunal aperceber-se dos traços do depoimento, denunciadores da isenção, imparcialidade e certeza que se revelam, v.g., por gestos, comoções e emoções, da voz.
A imediação que vem definida como a relação de proximidade comunicante entre o tribunal e os participantes no processo, de tal modo que, em conjugação com a oralidade, se obtenha uma percepção própria dos dados que haverão de ser a base da decisão.
É pela imediação, também chamado de princípio subjectivo, que se vincula o juiz à percepção à utilização à valoração e credibilidade da prova.
Não basta uma “dúvida pessoal” ou uma mera “possibilidade ou probabilidade” para se poder dizer que incorreu o Tribunal no vício de erro notório na apreciação da prova; (cfr., v.g., os recentes Acs. deste T.S.I. de 24.01.2019, Proc. n.° 905/2018, de 21.02.2019, Proc. n.° 34/2019 e de 06.06.2019, Proc. n.° 476/2019).

Com efeito, importa ter em conta que “Quando a atribuição de credibilidade ou falta de credibilidade a uma fonte de prova pelo julgador se basear em opção assente na imediação e na oralidade, o tribunal de recurso só a poderá criticar se ficar demonstrado que essa opção não tem uma justificação lógica e é inadmissível face às regras da experiência comum”; (cfr., o Ac. da Rel. de Coimbra de 13.09.2017, Proc. n.° 390/14).

E como se consignou no Ac. da Rel. de Évora de 21.12.2017, Proc. n.° 165/16, “A censura quanto à forma de formação da convicção do Tribunal não pode consequentemente assentar de forma simplista no ataque da fase final da formação dessa convicção, isto é, na valoração da prova; tal censura terá de assentar na violação de qualquer dos passos para a formação de tal convicção, designadamente porque não existem os dados objectivos que se apontam na motivação ou porque se violaram os princípios para a aquisição desses dados objectivos ou porque não houve liberdade na formação da convicção.
Doutra forma, seria uma inversão da posição dos personagens do processo, como seja a de substituir a convicção de quem tem de julgar, pela convicção dos que esperam a decisão”.

E, atentando-se no que dos autos consta, e na fundamentação pelo Tribunal a quo exposta no Acórdão ora recorrido, apresenta-se-nos de concluir que nenhum “erro”, (muito menos, notório), existe.

Desde logo, porque não se vislumbra que o Tribunal a quo tenha formado a sua convicção e proferido decisão sobre a matéria de facto com inobservância ou desrespeitando qualquer regra sobre o valor das provas tarifadas, regras de experiência ou legis artis.

Pelo contrário, a decisão da referida matéria de facto em questão apresenta-se em (total) sintomia com o “princípio da livre apreciação da prova” (consagrado no art. 114° do C.P.P.M.) e com a prova produzida e apreciada em audiência, tendo o Colectivo a quo exposto de forma adequada as razões da sua convicção, indicando, expressa e nomeadamente, as declarações do 1° arguido prestadas no Ministério Público e lidas em audiência, que sustentam a decisão proferida que nenhuma censura merece; (cfr., fls. 760 a 762).

Dest’arte, e concluindo-se também que mais não faz o recorrente que tentar controverter a “factualidade dada como provada”, impõe-se decidir pela improcedência do presente recurso na parte em questão.

–– Nesta conformidade, correcta se nos apresentado a “qualificação jurídica” da factualidade apurada, vejamos da pena.

Pois bem, ao crime de “tráfico” pelo arguido cometido, cabe a pena de 5 a 15 anos de prisão; (cfr., art. 8°, n.° 1 da Lei n.° 17/2009, alterada pela Lei n.° 10/2016).

Nos termos do art. 40° do C.P.M.:

“1. A aplicação de penas e medidas de segurança visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade.
2. A pena não pode ultrapassar em caso algum a medida da culpa.
3. A medida de segurança só pode ser aplicada se for proporcionada à gravidade do facto e à perigosidade do agente”.

Por sua vez, e atento o teor art. 65° do mesmo código, onde se fixam os “critérios para a determinação da pena”, tem este T.S.I. entendido que “Na determinação da medida da pena, adoptou o Código Penal de Macau no seu art.º 65.º, a “Teoria da margem da liberdade”, segundo a qual, a pena concreta é fixada entre um limite mínimo e um limite máximo, determinados em função da culpa, intervindo os outros fins das penas dentro destes limites”; (cfr., v.g., os recentes Acs. deste T.S.I. de 11.04.2019, Proc. n.° 289/2019, de 30.05.2019, Proc. n.° 453/2019 e a Decisão Sumária de 16.07.2019, Proc. n.° 667/2019).

Temos vindo a entender que com os recursos não se visa eliminar a margem de livre apreciação reconhecida ao Tribunal de 1ª Instância em matéria de determinação da pena, e que esta deve ser confirmada se verificado estiver que no seu doseamento foram observados os critérios legais atendíveis; (cfr., v.g., os Acs. do Vdo T.U.I. de 03.12.2014, Proc. n.° 119/2014 e de 04.03.2015, Proc. n.° 9/2015).

Como igualmente decidiu o Tribunal da Relação de Évora:

“I - Também em matéria de pena o recurso mantém o arquétipo de remédio jurídico, pelo que o tribunal de recurso deve intervir na pena (alterando-a) apenas e só quando detectar incorrecções ou distorções no processo de determinação da sanção.
II - Por isso, o recurso não visa nem pretende eliminar alguma margem de apreciação livre reconhecida ao tribunal de 1ª instância nesse âmbito.
III - Revelando-se, pela sentença, a selecção dos elementos factuais elegíveis, a identificação das normas aplicáveis, o cumprimento dos passos a seguir no iter aplicativo e a ponderação devida dos critérios legalmente atendíveis, justifica-se a confirmação da pena proferida”; (cfr., o Ac. de 22.04.2014, Proc. n.° 291/13, in “www.dgsi.pt”, aqui citado como mera referência, e Acórdão do ora relator de 17.01.2019, Proc. n.° 1138/2018, de 28.03.2019, Proc. n.° 133/2019 e de 09.05.2019, Proc. n.° 403/2019).

No mesmo sentido se decidiu também que: “Não havendo injustiça notória na medida da pena achada pelo Tribunal a quo ao arguido recorrente, é de respeitar a respectiva decisão judicial ora recorrida”; (cfr., o Ac. deste T.S.I. de 24.11.2016, Proc. n.° 817/2016).

E, como se tem igualmente decidido:

“O recurso dirigido à medida da pena visa tão-só o controlo da desproporcionalidade da sua fixação ou a correcção dos critérios de determinação, atentos os parâmetros da culpa e as circunstâncias do caso.
A intervenção correctiva do Tribunal Superior, no que diz respeito à medida da pena aplicada só se justifica quando o processo da sua determinação revelar que foram violadas as regras da experiência ou a quantificação se mostrar desproporcionada”; (cfr., o Ac. da Rel. de Lisboa de 24.07.2017, Proc. n.° 17/16).

“O tribunal de recurso deve intervir na pena, alterando-a, apenas quando detectar incorrecções ou distorções no processo de aplicação da mesma, na interpretação e aplicação das normas legais e constitucionais que a regem. Nesta sede, o recurso não visa nem pretende eliminar alguma margem de actuação, de apreciação livre, reconhecida ao tribunal de primeira instância enquanto componente individual do ato de julgar.
A sindicabilidade da pena em via de recurso situa-se, pois, na detecção de um desrespeito dos princípios que norteiam a pena e das operações de determinação impostas por lei. E esta sindicância não abrange a determinação/fiscalização do quantum exacto da pena que, decorrendo duma correcta aplicação das regras legais e dos princípios legais e constitucionais, ainda se revele proporcionada”; (cfr., o Ac. da Rel. de Guimarães de 25.09.2017, Proc. n.° 275/16).

E, nesta conformidade, atento o que se deixou exposto, tendo presente a factualidade dada como provada, não constituindo uma “situação pontual”, ponderando também nas “quantidades” e “qualidade” do estupefaciente que lhe foi apreendido, (1,507 gramas de “Metanfetamina”), atenta a moldura penal aplicável, (5 a 15 anos de prisão), e fortes sendo as necessidades de prevenção criminal, (face aos antecedentes criminais do arguido e aos graves malefícios e prejuízos que o crime de “tráfico de estupefacientes” causa para a saúde pública), cremos que a decisão do Colectivo do T.J.B. não merece censura, sendo assim, de se confirmar a pena ao arguido, ora recorrente, aplicada, (tão só) a 1 ano de mínimo legal.

Em relação à pena única, há que atentar no estatuído no art. 71° do C.P.M., que dispõe que:

“1. Quando alguém tiver praticado vários crimes antes de transitar em julgado a condenação por qualquer deles, é condenado numa única pena, sendo na determinação da pena considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente.
2. A pena aplicável tem como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes, não podendo ultrapassar 30 anos tratando-se de pena de prisão e 600 dias tratando-se de pena de multa, e como limite mínimo a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes.
3. Se as penas concretamente aplicadas aos crimes em concurso forem umas de prisão e outras de multa, é aplicável uma única pena de prisão, de acordo com os critérios estabelecidos nos números anteriores, considerando-se as de multa convertidas em prisão pelo tempo correspondente reduzido a dois terços.
4. As penas acessórias e as medidas de segurança são sempre aplicadas ao agente, ainda que previstas por uma só das leis aplicáveis”; (sub. nosso).

Abordando idêntica questão à ora em apreciação, e tendo em consideração o teor do n.° 1 do transcrito art. 71°, teve já este T.S.I. oportunidade de afirmar que:

“Na determinação da pena única resultante do cúmulo jurídico são considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente.
Na consideração dos factos, ou melhor, do conjunto dos factos que integram os crimes em concurso, está ínsita uma avaliação da gravidade da ilicitude global, que deve ter em conta as conexões e o tipo de conexão entre os factos em concurso.
Por sua vez, na consideração da personalidade – que se manifesta na totalidade dos factos – devem ser avaliados e determinados os termos em que a personalidade se projecta nos factos e é por estes revelada, ou seja, importa aferir se os factos traduzem uma tendência desvaliosa, uma tendência para a prática do crime ou de certos crimes, ou antes, se reconduzem apenas a uma pluriocasionalidade que não tem razão na personalidade do agente”; (cfr., v.g., os recentes Acs. deste T.S.I. de 11.10.2018, Proc. n.° 716/2018, de 17.01.2019, Proc. n.° 1160/2018 e de 11.04.2019, Proc. n.° 289/2019).

Atento ao que até aqui se deixou exposto, (e que é de manter), e certo sendo que, in casu, em causa está uma moldura penal com um “limite mínimo de 6 anos” e um “limite máximo de 8 anos de prisão”, (tendo-se aqui em conta as penas parcelares de 6 meses e de 1 ano e 6 meses de prisão aplicada no Proc. n.° CR2-18-0198-PCC), cremos que censura também não merece a pena única de 7 anos de prisão fixada que, em nossa opinião, para além de não se vislumbrar nenhuma desproporção manifesta, situando-se, ao meio da moldura aplicável, reflecte, correctamente, as fortes necessidades de prevenção criminal, especial e geral que, no caso, se impõe.

Decisão

4. Nos termos e fundamentos expostos, em conferência, acordam negar provimento ao recurso.

Pagará o arguido a taxa de justiça de 6 UCs.

Registe e notifique.

Nada vindo de novo, e após trânsito, remetam-se os autos ao T.J.B. com as baixas e averbamentos necessários.

Macau, aos 26 de Setembro de 2019

(Relator)
José Maria Dias Azedo

(Primeiro Juiz-Adjunto)
Chan Kuong Seng

(Segunda Juiz-Adjunta)
Tam Hio Wa
Proc. 870/2019 Pág. 2

Proc. 870/2019 Pág. 1