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Proc. nº 407/2019
Recurso Jurisdicional em matéria laboral
Relator: Cândido de Pinho
Data do acórdão: 10 de Outubro de 2019
Descritores:
- Descanso semanal
- Art. 17º, nº1, do DL nº 24/89/M

SUMÁRIO:

O artigo 17º, nº1, do DL nº 24/89/M impõe que o dia de descanso semanal seja gozado dentro de cada período de 7 dias, ao fim do 6º dia de trabalho consecutivo.





Proc. nº 407/2019

Acordam no Tribunal de Segunda Instância da RAEM

I – Relatório
A, casado, de nacionalidade nepalesa, residente habitualmente em Palpa, Nepal, titular do Passaporte da República Democrática Federal do Nepal nº XXX, emitido pela autoridade competente da República Democrática Federal do Nepal,
Instaurou no TJB (Proc. nº LB1-18-0062-LAC) contra -----
B, S.A., (adiante, B), com sede na XXX, Macau, ----
Acção de processo comum do trabalho, ----
Pedindo a condenação da ré no pagamento de créditos laborais, que computou em MOP$ 228.901,00.
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Na oportunidade foi proferida sentença, que condenou a ré no pagamento ao autor da quantia de MOP$ 210.170,07, bem como nos juros legais.
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Contra esta decisão, recorreu jurisdicionalmente a ré, em cujas alegações formulou as seguintes conclusões:
“I. Vem o presente recurso interposto da sentença proferida pelo douto Tribunal Judicial de Base que julgou a acção procedente e condenou a Ré, ora Recorrente, no pagamento de uma indemnização ao Autor no valor global de MOP$210.170,07 a título de (i) subsídio de efectividade, (ii) devolução das quantias descontadas relativas a comparticipação no alojamento, (iii) compensação pela prestação de 30 minutos para além do período normal de trabalho por cada dia efectivo de trabalho (iv) trabalho prestado em dias de feriado obrigatórios a liquidar em execução de sentença e (v) compensação pelo trabalho prestado pelo Autor após 7 dias de trabalho consecutivo,
II. Sendo que o presente recurso versa só e apenas sobre a decisão proferida pelo douto Tribunal a quo no que se refere à compensação a título do trabalho prestado pelo Autor após sete dias de trabalho consecutivo, no valor de MOP$88.065.00
III. Salvo devido respeito, que se adianta ser muito, está a Recorrente em crer que a sentença proferida a final nunca poderia ter decidido como decidiu em violação e incorrecta aplicação das normas jurídicas que lhe servem de fundamento, mostrando-se, por isso, inquinada de erro na aplicação do Direito.
IV. O Tribunal a quo não interpretou correctamente o sentido da norma ora em crise, ou seja o artigo 17.º do DL n.º 24/89/M, nem a norma contida no artigo 18.º do mesmo diploma.
V. Uma leitura atenta do disposto no artigo 17.º do DL n.º 24/89/M permite concluir que os trabalhadores têm direito a gozar em cada período de sete dias um período de descanso de vinte e quatro horas consecutivas - o qual será fixado de acordo com as exigências de funcionamento da empresa - sem referir se o mesmo se refere a um dia, por exemplo, a uma segunda - feira, ou a parte de uma segunda - feira e parte da terça - feira seguinte, (indo aliás neste sentido nota n.º 3 do douto acórdão n.º 253/2002, citado pelo Tribunal a quo na decisão ora em crise)

VI. Atento o Artigo 17º, o empregador pode escolher, dentro de cada período de sete dias, o momento em que deve ocorrer o descanso, sem necessidade de ter em conta o número de dias consecutivos de trabalho que ocorrem antes e depois do dia de descanso.
VII. A Lei não proíbe que se trabalhe mais do que seis dias consecutivos - como defendia o Autor e veio a ser entendido pelo Tribunal - mas apenas impõe que em cada período de sete dias, 24 horas consecutivas sejam de descanso, o qual pode calhar em qualquer um dos dias desse período de 7 dias, independentemente do número de dias de trabalho consecutivos que lhe precedem ou que se seguem.
VIII. A expressão “em cada período de sete dias” não impõe o momento exacto em que o descanso deve ocorrer, isto é, não impõe que seja no 7º, apenas determina o intervalo de tempo - sete dias - em que esse mesmo descanso deve ser gozado.
IX. Veja-se aliás que no mencionado artigo 17º não se faz menção a dias de trabalho consecutivo mas apenas exige que o período de descanso seja de 24 horas consecutivas em cada período de sete dias sem cuidar de saber quantos dias o trabalhador trabalhou antes desse dia e quantos vai trabalhar depois.
X. Do que se vem dizendo e do que se retira da leitura atenta do preceito parece evidente que o princípio do descanso semanal não equivale a um princípio de descanso ao sétimo dia, ou seja, ao fim de 6 dias de trabalho.
XI. Aliás, a epígrafe do Artigo 17º é “Descanso Semanal” e não “Descanso ao Sétimo Dia”.
XII. O legislador da RAEM não impôs qualquer limitação ao número de dias de trabalho seguidos desde que o trabalhador goze de um período de descanso em cada período de sete dias, e tanto assim é que o artigo 18º do DL 24/89/M expressamente prevê a possibilidade de não se gozar um período de descanso de 24 horas em cada período de 7 dias, caso em que ao trabalhador deve ser concedido um “descanso consecutivo de quatro dias por cada conjunto de quatro semanas ou fracção”.

XIII. O legislador estando já ciente da realidade em Macau, fixou a excepção constante no artigo 18.º do Decreto - Lei a qual veio a ser posteriormente confirmada no artigo 42.º, n.º 2 da Lei 7/2008 (nova Lei das Relações de Trabalho), que prevê que “O gozo do período de descanso pode não ter frequência semanal em caso de acordo entre as partes ou quando a natureza da actividade da empresa o torne inviável, casos em que o trabalhador tem direito a gozar um período de descanso remunerado de quatro dias por cada quatro semanas.”
XIV. Ao excepcionar a obrigatoriedade da frequência semanal do descanso, o legislador está a dar primazia à lógica do descanso do trabalhador e não à lógica do repouso obrigatório ao sétimo dia.
XV. Não sendo, por isso, imperativo que esse descanso ocorra no sétimo dia de trabalho, tal como alega o Autor e veio a ser entendido pelo douto Tribunal.
XVI. Pode até acontecer, em face ao que ficou provado, que o Autor nem sempre tenha descansado “em cada período de sete dias” mas a ser assim, deverá fazer-se o apuramento no final do ano dos dias efectivos de descanso e se o Recorrido tiver que ser compensado será só e apenas dos dias de descanso em falta, ou seja, o mesmo é dizer que se se apurar que o Recorrido não descansou 52 dias no ano, mas apenas 46 dias, então só poderá ser compensado por 6 dias de descanso não gozado, mas nunca por 171 dias tal como decidido pelo Tribunal a quo.
XVII. É que, tal como se vem defendendo, não se impunha à aqui Recorrente que, na organização dos turnos dos seus trabalhadores, o descanso fosse concedido ao 7º dia, mas apenas que, em cada período de sete dias, 24 horas consecutivas fosse de descanso.
XVIII. Não importa que o trabalho seja organizado em turnos rotativos de 7 dias consecutivos findo os quais a entidade patronal concedia um dia de descanso, o que importa é determinar se dentro de cada período de sete dias - ou usando a expressão legal rem cada período de 7 dias” - e tendo em conta a organização dos turnos rotativos o trabalhador gozou de 24 horas consecutivas de descanso.

XIX. Carece por completo de fundamento a decisão recorrida na parte em que condena a Recorrente a pagar ao Recorrido uma indemnização pelo trabalho prestado no sétimo dia como se se tratasse de trabalho prestado em dia de descanso semanal, tendo a sentença recorrida feito uma errada interpretação e aplicação do preceituado nos artigos 17.º e 18.º do Decreto-lei 24/89/M, devendo em consequência ser revogada e substituída por outra que absolva a Ré, aqui Recorrente, do pagamento da indemnização no valor de MOP$86.520,00 a título de “trabalho prestado pelo Autor após seus dias de trabalho consecutivo em cada período de sete dias”
XX. Mas mais se aponta que o Tribunal a quo entra em contradição quando afirma na decisão posta em crise e na parte que diz respeito aos feriados obrigatórios que não consegue determinar as datas exactas em que foram gozados os descansos semanais e por isso não consegue determinar os feriados obrigatórios gozados pelo Autor e se assim é, como pode afirmar com toda a confiança que os descansos semanais não gozados durante a relação de trabalho do recorrido foram de 171 dias? Esta decisão, por essa razão, padece também de vício de contradição entre os fundamentos e a decisão da sentença, sendo, por isso, nula, sendo o desfecho a anulação do julgamento, por imposição do estatuído no art. 571º, c) do CPC.
Nestes termos,
E nos demais de direito que V. Exas. doutamente suprirão, deve ser dado provimento ao presente Recurso e, em conformidade, deverá ser revogada a sentença recorrida nos termos supra explanados, com as demais consequências da lei,
Termos em que farão V. Exas. a costumada JUSTIÇA!”
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Não houve resposta ao recurso.
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II – Os Factos
A sentença deu por assente a seguinte factualidade:
1) Entre 07/07/2005 e 31/07/2010 o Autor exerceu as suas funções para a Ré (B), enquanto trabalhador não residente. (A)
2) Aquando da contratação do Autor no Nepal, foi garantido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes de origem Nepalesa) alojamento gratuito em Macau. (B)
3) Desde o início da prestação de trabalho até 31/03/2010, a Ré (B) procedeu a uma dedução no valor de HKD$750,00 sobre o salário mensal do Autor, a título de “comparticipação nos custos de alojamento”. (C)
4) A referida dedução no salário do Autor era operada de forma automática, e independentemente de o trabalhador (leia-se, do Autor) residir ou não na habitação que lhe era providenciada pela Ré e/ou pela agência de emprego. (D)
5) O Autor foi recrutado pela Sociedade D - Serviço de Apoio e Gestão Empresarial Cia, Lda. - e, exerceu a sua prestação de trabalho ao abrigo do Contrato de Prestação de Serviços n.º 2/2003. (1.º)
6) O referido contrato de prestação de serviço foi objecto de apreciação, fiscalização e renovação por parte da Entidade Pública competente. (2.º)
7) Durante todo o período de trabalho, o Autor sempre prestou a sua actividade sob as ordens e instruções da Ré e/ou dos seus directos responsáveis. (3.º)
8) O Autor sempre respeitou os períodos, os horários e os locais de trabalho fixados pela Ré. (4.º)
9) Até Março de 2010, a Ré pagou ao Autor a quantia de HKD$7.500,00, a título de salário de base mensal. (5.º)
10) Resulta do ponto 3.4 do Contrato de Prestação de Serviços ao abrigo do qual o Autor foi autorizado a prestar trabalho para a Ré, ser devido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes com ele contratados) “(...) um subsídio mensal de efectividade igual ao salário de 4 dias, sempre que no mês anterior não tenha dado qualquer falta ao serviço”. (6.º)
11) Durante todo o período em que o Autor prestou trabalho, o Autor nunca deu qualquer falta ao trabalho sem conhecimento e autorização prévia por parte da Ré. (7.º)
12) Entre 07/07/2005 e 02/02/2010, a Ré (SIM) nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de efectividade. (8.º)
13) Entre 07/07/2005 e 31/12/2008, o Autor prestou a sua actividade de segurança durante alguns dias não identificados em dias de feriados obrigatórios, por forma a garantir o funcionamento contínuo e diário dos vários Casinos operados pela Ré, e, a Ré nunca pagou ao Autor uma qualquer quantia adicional (leia-se um qualquer acréscimo salarial) pelo trabalho prestado nos dias de feriado obrigatórios. (9.º)
14) Durante o referido período de tempo, a Ré (SIM) nunca pagou ao Autor uma qualquer quantia adicional (leia-se, um qualquer acréscimo salarial) pelo trabalho prestado durante alguns dias não identificados de feriado obrigatório. (10.º)
15) Entre 07/07/2005 e 31/03/2010 por ordem da Ré, o Autor estava obrigado a comparecer no seu local de trabalho devidamente uniformizado com 30 minutos de antecedência relativamente ao início de cada turno, no total de 713.5 horas. (11.º)
16) Durante os 30 minutos que antecediam o início de cada turno, os superiores hierárquicos do Autor distribuíam o trabalho pelos guardas de segurança (leia-se do Autor), V.g., indicando-lhe o seu concreto posto (local dentro do casino onde o mesmo se devia colocar), os clientes tidos por “suspeitos”, sendo ainda feito um relato sobre todas as questões de segurança a ter em conta no interior do Casino, ou mesmo da necessidade de qualquer participação em eventos especiais. (12.º)
17) O Autor sempre compareceu no início de cada turno com a antecedência de, pelo menos, 30 minutos. (13.º)
18) Durante todo o período da relação de trabalho, o Autor nunca se ausentou do trabalho (isto é, dos locais de reunião) que antecediam em, pelo menos, o início de cada turno. (14.º)
19) A Ré nunca pagou ao Autor qualquer quantia pela prestação de mais 30 minutos que antecediam o início de cada turno. (15.º)
20) Desde o início da relação de trabalho até 31/12/2008, o Autor prestou a sua actividade de segurança para a Ré (B) num regime de turnos rotativos de sete dias de trabalho consecutivos. (16.º)
21) A que se seguia um período de vinte e quatro horas de descanso compensatório, em regra no oitavo dia, que antecedia a mudança de turno. (17.º)
22) O Autor gozou 24 dias de férias nos anos 2006 (1-24/8), 2007 (5-28/6), 26 dias no ano 2008 (1-26/7) e 25 dias no ano 2009 (4-28/7), concedidas e organizadas pela Ré, no total de 99 dias. (18.º)
23) Entre 07/07/2005 a 31/12/2008, o Autor prestou 171 dias de trabalho ao sétimo dia, após a prestação de 6 dias consecutivos de trabalho e a Ré não pagou ao Autor qualquer quantia pelo referido trabalho. (19.º)
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III – O Direito
1- O presente recurso jurisdicional versa exclusivamente sobre a questão de saber como deve ser apurado o dia de descanso semanal por parte dos trabalhadores ao abrigo do art. 17º do DL nº 24/89/M. Será que ele deve ser gozado pelos trabalhadores ao 7º dia (i.é., ao fim de seis dias de trabalho consecutivo), ou deve entender-se que ao fim desse período de dias o trabalhador tem direito a um dia de descanso, a gozar, porém, em dia a determinar pela entidade patronal de acordo com as exigências da empresa?
É para esta segunda hipótese que a recorrente B se inclina.
Mas, este TSI, em diversos arestos obtidos por unanimidade, vem sendo uniforme na posição que julgam a mais correcta.
Assim, foi exarado no Ac. do TSI, de 24/01/2019, Proc. nº 1094/2018, que “O artigo 17° do DL n.º 24/89/M, de 3 de Abril, dispõe que “todos os trabalhadores têm o direito a gozar, em cada sete dias, um período de descanso de vinte e quatro horas consecutivas (…)”, sendo o período de descanso motivado por razões de ordem física e psicológica, o trabalhador não pode prestar mais do que seis dias de trabalho consecutivos, devendo o dia de descanso ter lugar, no máximo, no sétimo dia, e não no oitavo, nono ou noutro dia do mês, salvo acordo das partes em sentido contrário, no que toca ao momento de descanso a título de “compensação”, mas o critério para este efeito é sempre o período de sete dias como uma unidade.”
Repare-se, ainda, no que foi dito no Ac. de 9/05/2019, Proc. nº 211/2019:
   “Alega a recorrente que a lei laboral não impõe que o descanso semanal ocorra necessariamente no sétimo dia de trabalho, sendo assim, entende que deveria fazer-se o apuramento no final do ano dos dias efectivos de descanso e se o trabalhador tiver que ser compensado será apenas dos dias de descanso em falta.
Ora bem, dispõe o n.º 1 do artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 24/89/M que “Todos os trabalhadores têm o direito a gozar, em cada período de sete dias, um período de descanso de vinte e quatro horas consecutivas, sem prejuízo da correspondente retribuição, calculada nos termos do disposto sob o artigo 26.º”.
Melhor dizendo, dentro do período de 7 dias, o trabalhador tem direito a gozar vinte e quatro horas consecutivas de descanso, podendo este ser no primeiro, segundo, terceiro ou no sétimo dia, mas nunca no oitavo dia ou seguintes.
Como observa José Carlos Bento da Silva e Miguel Pacheco Arruda Quental1, “as razões que justificam a existência de um dia de descanso prendem-se com motivos de ordem física e psíquica (recuperar do desgaste provocado por uma semana de trabalho), de ordem familiar (aproveitar esse dia para conviver com a própria família) e também por razões de ordem social e cultural (esse período permite o convívio com amigos, a participação em manifestações de carácter público, ou para que o trabalhador possa tratar de assuntos do seu próprio interesse junto, por ex. de repartições públicas, etc.).”
Sendo assim, dúvidas de maior não restam de que impende sobre a entidade patronal a obrigação de facultar aos seus trabalhadores um dia, mais precisamente, vinte e quatro horas consecutivas de descanso dentro de cada período de sete dias, sob pena de violação da referida disposição legal.
No caso dos autos, provado está que entre 22.7.2003 e 31.12.2008, a Ré só atribuía um dia de repouso ao Autor após decorridos sete dias de trabalho contínuo e consecutivo, tendo, assim, prestado 261 dias de trabalho nos respectivos dias de descanso semanal.
Portanto, em vez de gozar um dia (ou vinte e quatro horas consecutivas) de descanso dentro de cada período de 7 dias, o trabalhador só tinha direito a repouso, pelo menos, no oitavo dia.
Desta forma, no dia em que deveria ter gozado descanso semanal, o Autor prestou trabalho à Ré, pelo que o seu direito terá que ser compensado, improcedem, pois, as razões da Ré nesta parte.”.
Fazemos nossa a fundamentação acabada de transcrever para todos os efeitos.
No mesmo sentido, ver:
- Ac. de 21/02/2019, Proc. nº 1116/2018;
- Ac. de 21/02/2019, Proc. nº 1118/2018;
- Ac. de 28/03/2019, Proc. nº 103/2019;
- Ac. de 2/05/2019, Proc. nº 216/2019;
- Ac. de 2/05/2019, Proc. nº 214/2019;
- Ac. de 2/05/2019, Proc. nº 192/2019;
- Ac. de 16/05/2019, Proc. nº 106/2019;
- Ac. de 16/05/2019, Proc. nº 109/2019.
Ao nível da doutrina em direito comparado, podemos citar Bernardo da Gama Lobo Xavier (Regime Jurídico do Contrato Individual de Trabalho, Anotado, Atlântida, 1972, pág. 123-124), Fernanda Agria e Maria Luísa Cardoso Pinto (Manual Prático de Direito do Trabalho, Contrato Individual de Trabalho, Almedina, 1972, pág. 93), autores que consideram expressamente (loc. cit.) ser ilegal a atribuição do descanso semanal ao cabo de 7 dias consecutivos de trabalho.
Em idêntico sentido, é referido por Jorge Leite e Coutinho de Abreu (Colectânea de Leis do Trabalho, Coimbra Editora, 1985, pág. 139) ou por Luis Miguel Monteiro (Código do Trabalho Anotado, Almedina, Coordenação de Pedro Romano Martinez, 4ª ed., 2005, pág. 372) que o descanso deve ser observado ao termo de cada série de 6 dias de trabalho efectivo.2
No direito local, esta é a posição igualmente de Augusto Teixeira Garcia, Lições de Direito do Trabalho (II Parte), Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Macau, nº 25, pág. 185, apara quem a regra será a de que o dia de descanso semanal deve seguir-se imediatamente ao sexto dia de trabalho.
Cremos ser esta, efectivamente, a melhor interpretação a dar ao art. 17º, nº1 do DL nº 24/89/M, tendo em conta a sua génese, motivada que está em defesa da situação jurídica da parte mais frágil da relação laboral, e não vemos motivo para alterá-la.
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2- Do princípio do dispositivo
Acha a recorrente que a sentença, ao ter decidido contra a posição que manifesta no presente recurso, violou o princípio do dispositivo consagrado no art. 5º do CPC.
Em boa verdade, a recorrente não explica a razão de para tal afirmação.
Cremos, ainda assim, que o princípio em causa só poderia ser dado por violado se o tribunal ultrapassasse os limites estabelecidos no aludido preceito, o que no caso não aconteceu.
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IV – Decidindo
Face ao exposto, acordam em negar provimento ao recurso, mantendo e confirmando a sentença recorrida,
Custas pela recorrente.
T.S.I., 10 de Outubro de 2019
José Cândido de Pinho
Lai Kin Hong
Tong Hio Fong
(Vencido quanto à fórmula adoptada na compensação do trabalho prestado em dias de descanso semanal, por entender que, sendo o trabalho prestado nesses dias pago pelo “dobro da retribuição” (cfr. se refere na alínea a) do nº 6 do artigo 17º do DL nº 24/89/M), este “dobro” é constituído por um dia de salário normal (ao qual o trabalhador teria sempre direito mesmo que não prestasse trabalho) mais um dia de acréscimo. Provado que o Autor já recebeu da Ré ora sua entidade patronal o salário diário em singelo, teria apenas mais um dia de salário pelo trabalho prestado em dias de descanso semanal, sob pena de, salvo o devido respeito, estar o Autor a ser pago, não pelo dobro, mas pelo triplo do valor diário, ao que acresce ainda o dia de descanso compensatório, o Autor estar a auferir o quádruplo do valor diário se trabalhar em dias de descanso semanal)
1 Manual de Formação de Direito do Trabalho em Macau, CFJJ, 2006, pág. 92
2 Na jurisprudência comparada, podemos encontrar esta mesma posição no Ac. do STJ, de 6/07/1976, Proc. nº 8527, ou no Ac. da Relação do Porto, de 11/07/2016, Proc. nº 5286/15
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