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Processo n.º 738/2019
(Autos de recurso laboral)

Data: 10/Outubro/2019

Recorrentes:
- A (Autor)
- B, S.A. (2ª Ré)

Acordam os Juízes do Tribunal de Segunda Instância da RAEM:

I) RELATÓRIO
A intentou junto do Tribunal Judicial de Base da RAEM acção declarativa de processo comum do trabalho, pedindo a condenação da C SARL (1ª Ré) e da B, S.A. (2ª Ré) no pagamento do montante de MOP349.095,00, acrescido de juros legais até efectivo e integral pagamento.
Realizado o julgamento, foram as 1ª Ré e 2ª Ré condenadas a pagar ao Autor a quantia de MOP3.858,67 e MOP254.583,81 respectivamente, acrescida de juros moratórios à taxa legal a contar da sentença que procede à liquidação do quantum indemnizatório até efectivo e integral pagamento.
Inconformado, interpôs o Autor recurso jurisdicional para este TSI, em cujas alegações formulou as seguintes conclusões:
“1. Versa o presente recurso sobre a douta Sentença na parte relativa à condenação da 2ª Ré (B) na atribuição de uma compensação devida ao Autor pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal, e bem assim, pelo trabalho prestado em dias de feriado obrigatório remunerado, na medida em que as concretas fórmulas de cálculo utilizadas na Decisão Recorrida se mostram em oposição às que têm vindo a ser seguidas pelo Tribunal de Segunda Instância.
2. De onde, salvo o devido respeito, está o Recorrente em crer que a douta Sentença enferma de um erro de aplicação de direito quanto à concreta forma de cálculo devido pela prestação de trabalho em dia de descanso semanal e pelo trabalho prestado em dias de feriado obrigatório remunerado e, deste modo, em violação ao disposto nos artigos 17º, 19º e 20º do Decreto-Lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril.
Em concreto,
3. Entendeu o Tribunal a quo ser de sufragar o entendimento seguido pelo Tribunal de Última Instância e, em consequência, condenar a 2ª Ré (B) a pagar ao Autor apenas ao correspondente ao valor de um salário em singelo no que respeita ao trabalho prestado em dia de descanso semanal durante todo o período da relação laboral.
4. Porém, salvo melhor opinião, ao proceder à condenação da 2ª Ré (B) apenas em singelo, o Tribunal a quo terá procedido a uma interpretação menos correcta do disposto na al. a) do n.º 6 do art. 17º do Decreto-Lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril, pelo que a decisão deve ser julgada nula e substituída por outra que condene a 2ª Ré (B) em conformidade com o disposto na referida Lei Laboral.
5. Com efeito, resulta do referido preceito que o trabalho prestado em dia de descanso semanal deverá ser remunerado pelo dobro do salário normal, entendido enquanto duas vezes a retribuição normal por cada dia de trabalho prestado em dia de descanso semanal, para além do valor relativo ao próprio dia de trabalho prestado.
6. Trata-se, de resto, da interpretação que tem vindo a ser seguida de forma uniforme pelo Tribunal de Segunda Instância, onde se entende que a fórmula correcta para compensar o trabalho prestado em dia de descanso semanal deverá ser a seguinte: (salário diário X n.º de dias devidos e não gozados X 2).
7. De onde, resultando provado que o Recorrente, durante todo o período da relação laboral não gozou dos respectivos dias de descanso semanal (isto é, pelo trabalho prestado após seis dias de trabalho consecutivo em cada período de sete dias de trabalho), deve a Recorrida ser condenada a pagar ao Recorrente a quantia de MOP$119.480,00 a título do dobro do salário – e não só apenas de MOP$59.740,00 correspondente a um dia de salário em singelo conforme resulta da decisão ora posta em crise - acrescida de juros até efectivo e integral pagamento o que desde já e para todos os legais efeitos se requer.
Acresce que,
8. Entendeu o douto Tribunal a quo que na determinação da quantia devida pela 2ª Ré (B) ao Autor a título de trabalho prestado nos dias de feriados obrigatórios o Autor terá direito a receber da 2ª Ré (B) as compensações compostas pela remuneração em singelo, acrescida do dobro dessa remuneração.
9. Ora, tendo o Tribunal a quo explicitado que pelo dobro da retribuição se deve entender o equivalente a mais um dia de salário em singelo (nos termos que têm vindo a ser seguidos pelo TUI nos Acs. 28/2007, 29/2007, 58/2007 e 40/2009) tal significa que, neste particular, a douta Sentença igualmente se afasta do entendimento que tem vindo a ser sufragado pelo Tribunal de Segunda Instância – nos termos do qual se entende que a fórmula mais correcta de interpretar o referido preceito será conceder ao Autor, ora Recorrente, um “acréscimo salarial nunca inferior ao dobro da retribuição normal, para além naturalmente da retribuição a que tem direito” – o que equivale matematicamente ao triplo da retribuição normal – e não somente o dobro da retribuição normal como parece ter decidido o Tribunal Judicial de Base.
10. Em concreto, resultando provado que durante o período da relação laboral o Recorrente prestou trabalho para a Recorrida durante 31 dias de feriados obrigatórios, deve a Recorrida ser condenada a pagar ao Recorrente a quantia de MOP$23.947,50 a título do triplo do salário – e não só apenas de MOP$15.965,00 conforme resulta da decisão ora posta em crise – acrescida de juros até efectivo e integral pagamento o que desde já e para todos os legais efeitos se requer.
11. De onde, também por aqui deve a douta Decisão ser substituída por outra que atenda ao pedido de condenação da Recorrida nos termos e com base nas fórmulas de cálculo avançadas pelo Autor na sua Petição Inicial e idênticas às que têm vindo a ser seguidas pelo Tribunal de Segunda Instância.
Nestes termos e nos de mais de Direito que V. Exas. encarregar-se-ão de suprir, deve a douta Sentença ser julgada nula e substituída por outra que atenda às fórmulas de cálculo tal qual formuladas pelo Autor na sua Petição Inicial e relativa ao trabalho prestado em dia de descanso semanal e feriado obrigatório, assim se fazendo a já costumada JUSTIÇA!”
*
A 2ª Ré também recorreu jurisdicionalmente para este TSI, formulando as seguintes conclusões alegatórias:
“I. Vem o presente recurso interposto da sentença proferida pelo douto Tribunal Judicial de Base que julgou a acção parcialmente procedente e condenou a 2ª Ré, ora Recorrente, no pagamento de uma indemnização ao Autor A, no valor de MOP$254.583,81 a título de (i) subsídio de efectividade, (ii) trabalho prestado em dias de feriado obrigatórios, (iii) devolução das quantias descontadas relativas a comparticipação no alojamento, (iv) compensação pela prestação de 30 minutos para além do período normal de trabalho por cada dia efectivo de trabalho e (v) compensação pelo trabalho prestado pelo Autor após 7 dias de trabalho consecutivo, versando o presente recurso só e apenas sobre a decisão proferido pela douto Tribunal a quo no que se refere à compensação a título do trabalho prestado pelo Autor após sete dias de trabalho consecutivo, no valor de MOP$59,740.00.
II. Entende a ora 2ª Ré que esta matéria foi incorrectamente julgada pelo Douto Tribunal a quo e também no plano do Direito aplicável ao caso concreto, a sentença proferida a final nunca poderia ter decidido como decidiu em violação e incorrecta aplicação das normas jurídicas que lhe servem de fundamento, estando em crer que a decisão assim proferida pelo douto Tribunal de Primeira Instância padece do vício de erro de julgamento e erro na aplicação do Direito.
III. Somos do entendimento que o Tribunal a quo não interpretou correctamente o sentido da norma ora em crise, ou seja o artigo 17º do DL n.º 24/89/M, nem a norma contida no artigo 18º do mesmo diploma.
IV. A Recorrente não aceita que tenha violado o preceituado no referido n.º 1 do artigo 17º o qual, salvo devido respeito, não impõe a regra do descanso ao 7º dia, isto porque dispõe o n.º 1 do artigo 17º do DL n.º 24/89/M que: “todos os trabalhadores têm o direito a gozar, em cada período de sete dias, um período de descanso de vinte e quatro horas consecutivas, (…)”, ou seja, o legislador refere-se a um período de sete dias, e não ao fim de sete dias, referindo-se, por seu lado, a um período de descanso de vinte e quatro horas sem se referir se o mesmo se refere a um dia, por exemplo, a uma segunda-feira, ou a parte de uma segunda-feira e parte da terça-feira seguinte, indo aliás neste sentido a nota n.º 3 do douto acórdão n.º 253/2002, citado pelo Tribunal a quo na decisão ora em crise, conforme se transcreve; “Nem estipula explícita e forçosamente que o trabalhador tem que descansar no domingo, mas sim apenas tem direito, em cada período de sete dias, a um dia de descanso, dia esse que poderia não ser o domingo, o que é estipulado explicitamente no artigo 17º, n.º 2.”
V. Por isso, é importante apurar se o descanso semanal tem de ser gozado sempre após seis dias de trabalho consecutivo, ou seja, no 7º dia, conforme defendia o Autor e veio a ser aceite pelo Tribunal a quo, ou se, atento o sobredito artigo 17º, o empregador pode escolher, dentro de cada período de sete dias, o momento em que deve ocorrer o descanso, sem necessidade de ter em conta o número de dias consecutivos de trabalho que ocorrem antes e depois do dia de descanso, considerando a Recorrente que apenas este último entendimento se compatibiliza com o espírito e com a letra da Lei, já que a norma diz é que todos os trabalhadores têm direito a gozar, em cada período de sete dias, um período de descanso de vinte e quatro horas consecutivas; O qual será fixado de acordo com as exigências de funcionamento da empresa (n.º 2).
VI. Ora, a lei laboral em Macau não proíbe que se trabalhe mais do que seis dias consecutivos – como defendia o Autor e veio a ser entendido pelo Tribunal – mas apenas impõe que em cada período de sete dias, 24 horas consecutivas sejam de descanso e esse descanso pode calhar em qualquer um dos dias desse período de 7 dias, independentemente do número de dias de trabalho consecutivos que lhe precedem ou que se seguem, sendo que o dia de descanso pode, então, ser no 1º dia desse “período de sete dias”, no 2º dia do “período de sete dias”, no 3º dia desse “período de sete dias” ou até mesmo no 7º dia desse “período de sete dias”.
VII. Isto é, se em três períodos consecutivos de sete dias for concedido ao trabalhador 1 dia de descanso no primeiro dia do primeiro período de sete dias, outro dia de descanso no segundo dia do segundo período de sete dias e ainda outro dia de descanso no terceiro dia do terceiro período de sete dias, mostra-se cumprida a exigência legal – a de se conceder “em cada período de sete dias” um dia de descanso, já que a expressão “em cada período de sete dias” não impõe o momento exacto em que o descanso deve ocorrer, isto é, não impõe que seja no 7º, apenas determina o intervalo de tempo – sete dias – em que esse mesmo descanso deve ser gozado. Veja-se aliás que no mencionado artigo 17º não se faz menção a dias de trabalho consecutivo mas apenas exige que o período de descanso seja de 24 horas consecutivas em cada período de sete dias sem cuidar de saber quantos dias o trabalhador trabalhou antes desse dia e quantos vai trabalhar depois.
VIII. Do que se vem dizendo e do que se retira da leitura atenta do preceito parece evidente que o princípio do descanso semanal não equivale a um princípio de descanso ao sétimo dia, ou seja, ao fim de 6 dias de trabalho e diga-se também que o artigo 17º, n.º 1 tem necessariamente de ser interpretado em conjugação como n.º 2 que reconhece que “de acordo com as exigências de funcionamento da empresa” o período de descanso semanal será organizado pelo empregador, o que reforça que a intenção do legislador não foi impor o dia de descanso ao sétimo dia.
IX. Por outro lado, o legislador não impôs qualquer limitação ao número de dias de trabalho seguidos desde que o trabalhador goze de um período de descanso em cada período de sete dias, tanto assim é que o artigo 18º do DL n.º 24/89/M expressamente prevê a possibilidade de não se gozar um período de descanso de 24 horas em cada período de 7 dias, caso em que ao trabalhador deve ser concedido um “descanso consecutivo de quatro dias por cada conjunto de quatro semanas ou fracção”, pois o legislador estando já ciente da realidade em Macau, fixou a excepção constante no artigo 18º do Decreto-Lei a qual veio a ser posteriormente confirmada no artigo 42º, n.º 2 da Lei 7/2008 (nova Lei das Relações de Trabalho), que prevê que “O gozo do período de descanso pode não ter frequência semanal em caso de acordo entre as partes ou quando a natureza da actividade da empresa o torne inviável, casos em que o trabalhador tem direito a gozar um período de descanso remunerado de quatro dias por cada quatro semanas.” Não sendo, por isso, imperativo que esse descanso ocorra no sétimo dia de trabalho, tal como alega o Autor e veio a ser entendido pelo douto Tribunal. No caso concreto, em cada período de sete dias o Autor descansou, não necessariamente ao sétimo dia, porque a Lei nem sequer o impõe.
X. Pode até acontecer, em face ao que ficou provado, que o Autor nem sempre tenha descansado “em cada período de sete dias” mas a ser assim, deverá fazer-se o apuramento no final do ano dos dias efectivos de descanso e se o Recorrido tiver que ser compensado será só e apenas dos dias de descanso em falta, ou seja, o mesmo é dizer que se se apurar que o Recorrido não descansou 52 dias no ano, mas apenas 46 dias, então só poderá ser compensado por 6 dias de descanso não gozado, mas nunca por 232 dias tal como decidido pelo Tribunal a quo.
XI. É que, tal como se vem defendendo, não se impunha à aqui Recorrente que na organização dos turnos dos seus trabalhadores o descanso fosse concedido ao 7º dia, mas apenas que, em cada período de sete dias, 24 horas consecutivas fosse de descanso e com isto se quer dizer que não importa que o trabalho seja organizado em turnos rotativos de 7 dias consecutivos findo os quais a entidade patronal concedia um dia de descanso, importando sim determinar se dentro de cada período de sete dias – ou “em cada período de 7 dias” – e tendo em conta a organização dos turnos rotativos o trabalhador gozou de 24 horas consecutivas de descanso.
XII. Pelo que carece por completo de fundamento a decisão recorrida na parte em que condena a Recorrente a pagar ao Recorrido uma indemnização pelo trabalho prestado no 7º dia como se se tratasse de trabalho prestado em dia de descanso semanal, verificando-se assim, salvo melhor opinião, uma errada aplicação do Direito e erro no julgamento por parte do Tribunal a quo na condenação da Recorrente nas quantias peticionadas a título de trabalho prestado em dia de descanso semanal em violação do princípio do dispositivo consagrado no art.º 5º do CPC e, bem assim, o disposto nos artigos 17º e 18º do DL 24/89/M.
Nestes termos e nos demais de direito que V. Exas. doutamente suprirão, deve ser dado provimento ao presente Recurso e, em conformidade, deverá ser revogada a sentença recorrida nos termos supra explanados, com as demais consequências da lei,
Termos em que farão V. Exas. a costumada JUSTIÇA!”
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II) FUNDAMENTAÇÃO
A sentença recorrida deu por assente a seguinte factualidade:
O Autor foi recrutado pela Sociedade D – Serviço de Apoio e Gestão Empresarial Cia, Lda. para exercer funções de “guarda de segurança” para a 1ª Ré (C), ao abrigo do Contrato de Prestação de Serviços n.º 1/2002, aprovado pelo Despacho n.º 00310/IMO/SEF/2002, de 07/02/2002. (A)
O referido Contrato de Prestação de Serviços foi sucessivamente objecto de apreciação, fiscalização e aprovação por parte da Entidade Pública competente. (B)
Desde 8 de Junho de 2003 o Autor esteve ao serviço da 1.ª Ré (C) prestando funções de “guarda de segurança”, na qualidade de trabalhador não residente. (C)
Por força do Despacho do Senhor Secretário para a Economia e Finanças da RAEM n.º 01949/IMO/SEF/2003, de 17/07/2003, a autorização de contratação e de permanência do Autor (e dos demais 280 trabalhadores “guardas de segurança” de nacionalidade nepalesa que prestavam funções para a 1.ª Ré (C)) foi transferida para a 2.ª Ré (B), com efeitos a partir de 21 de Julho de 2003. (D)
Desde de 22/07/2003 até 31/07/2017 o Autor – (e os demais 280 trabalhadores de nacionalidade nepalesa) – passou a estar ao serviço da 2.ª Ré (B), mantendo na 2.ª Ré (B) a mesma categoria profissional, antiguidade e salário que detinha na 1.ª Ré (C). (E)
Desde o início da relação de trabalho, o Autor sempre respeitou os períodos e os horários de trabalho (em regime de turnos rotativos) fixados expressamente pelas Rés. (F)
Desde o início da relação de trabalho até Julho de 2010, o Autor recebeu das Rés a quantia de HK$7,500.00, a título de salário de base mensal. (G)
Desde o início da prestação de trabalho até 31 de Março de 2010, as Rés procederam a uma dedução no valor de HK$750.00 sobre o salário mensal do Autor, a título de “comparticipação nos custos de alojamento”. (H)
A referida dedução no salário do Autor era operada de forma automática, e independentemente de o trabalhador (leia-se, do Autor) residir ou não na habitação que lhe era providenciada pelas Rés e/ou pela agência de emprego. (I)
Durante o período da relação de trabalho, o Autor prestou a sua actividade num regime de turnos rotativos. (J)
Durante todo o período da relação de trabalho, o Autor sempre respeitou o regime de turnos especificamente fixados pelas Rés. (K)
Durante todo o período da relação de trabalho com a 1.ª Ré (C), o Autor exerceu a sua actividade num regime de 3 turnos rotativos de 8 horas por dia: Turno A: (das 08h às 16h), Turno B: (das 16h às 00h) e Turno C: (das 00h às 08h). (L)
Os turnos respeitavam sempre uma mesma ordem sucessiva de rotatividade (A-C)-(B-A)-(C-B), após a prestação pelo Autor (e pelos demais trabalhadores) de sete dias de trabalho contínuo e consecutivo. (M)
Resulta do ponto 3.4. do Contrato de Prestação de Serviços ao abrigo do qual o Autor foi autorizado a prestar trabalho para as Rés, ser devido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes com ele contratados) “(…) um subsídio mensal de efectividade igual ao salário de 4 dias, sempre que no mês anterior não tenha dado qualquer falta ao serviço”. (1.º)
Durante todo o período em que o Autor prestou trabalho, o Autor nunca deu qualquer falta ao trabalho sem conhecimento e autorização prévia por parte das Rés. (2.º)
Entre 08/06/2003 a 21/07/2003, a 1.ª Ré (C) nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de efectividade. (3.º)
Entre 22/07/2003 a 31/03/2010, a 2.ª Ré (B) nunca pagou ao Autor qualquer quantia a título de subsídio de efectividade. (4.º)
Entre 22/07/2003 a 31/12/2008, o Autor prestou a sua actividade de segurança durante os 6 dias de feriados obrigatórios (1 de Janeiro, Ano Novo Chinês (3 dias); 1 de Maio e 1 de Outubro) – no total de 31 dias, por forma a garantir o funcionamento contínuo e diário dos vários Casinos operados pela 2.ª Ré (B). (5.º)
Durante o referido período de tempo, a 2.ª Ré (B) nunca pagou ao Autor uma qualquer quantia adicional (leia-se, um qualquer acréscimo salarial) pelo trabalho prestado nos referidos dias de feriado obrigatórios. (6.º)
Aquando da contratação do Autor no Nepal, foi garantido ao Autor (e aos demais trabalhadores não residentes de origem Nepalesa) alojamento gratuito em Macau. (7.º)
Entre o fim da prestação de trabalho no turno C (00h às 08h) e o início da prestação de trabalho no turno B (16h às 00h), o Autor prestava a sua actividade num total de 16 horas de trabalho (correspondente a dois períodos de 8 horas cada) num período de 24 horas. (8.º)
Entre o fim da prestação de trabalho no turno B (16h às 00h) e o início da prestação de trabalho no turno A (8h às 16h) o Autor prestava a sua actividade num total de 16 horas de trabalho (correspondente a dois períodos de 8 horas cada) num período limitado de 24 horas. (9.º)
Durante o período que prestou trabalho, a 1.ª Ré (C) nunca pagou ao Autor qualquer quantia (em singelo e/ou adicional) pelo trabalho prestado durante os dois períodos de 8 horas cada prestado num período de 24 horas, em cada ciclo de 21 dias de trabalho contínuo e consecutivo. (10.º)
Por ordem das Rés, o Autor estava obrigado a comparecer no seu local de trabalho devidamente uniformizado com, pelo menos, 30 minutos de antecedência relativamente ao início de cada turno. (11.º)
Durante os 30 minutos que antecediam o início de cada turno, os superiores hierárquicos do Autor distribuíam o trabalho pelos guardas de segurança (leia-se do Autor), v.g., indicando-lhe o seu concreto posto (local dentro do casino onde o mesmo se devia colocar), os clientes tidos por “suspeitos”, sendo ainda feito um relato sobre todas as questões de segurança a ter em conta no interior do Casino, ou mesmo da necessidade de qualquer participação em eventos especiais… (12.º)
O Autor sempre compareceu no início de cada turno com a antecedência de, pelo menos, 30 minutos. (13.º)
Entre 08/06/2003 a 21/07/2003, o Autor prestou 44 turnos de trabalho efectivo junto da 1.ª Ré. (14.º)
Entre 22/07/2003 a 31/03/2010, o Autor prestou 2003 dias/turnos de trabalho efectivo junto da 2.ª Ré. (15.º)
As Rés nunca pagaram ao Autor qualquer quantia pela prestação de mais 30 minutos que antecediam o início de cada turno. (16.º)
Desde 22/07/2003 até 31/12/2008, o Autor prestou a sua actividade de segurança para a 2ª Ré (B) num regime de turnos rotativos de sete dias de trabalho consecutivos, a que se seguia um período de vinte e quatro horas de descanso compensatório, em regra no oitavo dia, que antecedia a mudança de turno. (17.º)
Desde 22/07/2003 até 31/12/2008, o Autor prestou 232 dias de trabalho efectivo junto da 2.ª Ré no sétimo dia em cada período de sete dias de trabalho consecutivo. (18.º)
A 2.ª Ré nunca atribuiu ao Autor um qualquer acréscimo salarial pelo trabalho prestado no sétimo dia em cada período de sete dias de trabalho consecutivo. (19.º)
A 2.ª Ré B pagou sempre ao Autor o salário correspondente ao trabalho prestado nos dias de descanso semanal em singelo, caso este tenha trabalhado em tal dia. (22.º)
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Corridos os vistos legais, cumpre decidir.
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Começamos pelo recurso da Ré.
Do repouso semanal no oitavo dia
Alega a Ré B que a lei laboral não impõe que o descanso semanal ocorra necessariamente no sétimo dia de trabalho, sendo assim, entende que deveria fazer-se o apuramento no final do ano dos dias efectivos de descanso e se o trabalhador tiver que ser compensado será apenas dos dias de descanso em falta.
Ora bem, dispõe o n.º 1 do artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 24/89/M que “Todos os trabalhadores têm o direito a gozar, em cada período de sete dias, um período de descanso de vinte e quatro horas consecutivas, sem prejuízo da correspondente retribuição, calculada nos termos do disposto sob o artigo 26.º”.
Melhor dizendo, dentro do período de 7 dias, o trabalhador tem direito a gozar vinte e quatro horas consecutivas de descanso, podendo este ser no primeiro, segundo, terceiro ou no sétimo dia, mas nunca no oitavo dia ou seguintes.
Como observa José Carlos Bento da Silva e Miguel Pacheco Arruda Quental1, “as razões que justificam a existência de um dia de descanso prendem-se com motivos de ordem física e psíquica (recuperar do desgaste provocado por uma semana de trabalho), de ordem familiar (aproveitar esse dia para conviver com a própria família) e também por razões de ordem social e cultural (esse período permite o convívio com amigos, a participação em manifestações de carácter público, ou para que o trabalhador possa tratar de assuntos do seu próprio interesse junto, por ex. de repartições públicas, etc.).”
Sendo assim, dúvidas de maior não restam de que impende sobre a entidade patronal a obrigação de facultar aos seus trabalhadores um dia, mais precisamente, vinte e quatro horas consecutivas de descanso dentro de cada período de sete dias, sob pena de violação da referida disposição legal.
No caso dos autos, provado está que entre 22.7.2003 e 31.12.2008, a Ré B só atribuía um dia de repouso ao Autor após decorridos sete dias de trabalho contínuo e consecutivo, tendo, assim, prestado 232 dias de trabalho nos respectivos dias de descanso semanal.
Portanto, em vez de gozar um dia (ou vinte e quatro horas consecutivas) de descanso dentro de cada período de 7 dias, o trabalhador só tinha direito a repouso, pelo menos, no oitavo dia.
Desta forma, no dia em que deveria ter gozado descanso semanal, o Autor prestou trabalho à Ré B, pelo que o seu direito tem que ser compensado, improcede, pois, o recurso da Ré.
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Da compensação do trabalho prestado em dias de descanso semanal
Entende o Autor que, nos termos da alínea a) do n.º 6 do artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 24/89/M, o trabalho prestado em dias de descanso semanal deverá ser remunerado pelo dobro do salário normal, para além do singelo já recebido e do dia de descanso compensatório.
Embora não seja entendimento unânime deste TSI, mas julga-se assistir razão ao Autor.
De acordo com a interpretação que tem vindo a ser adoptada de forma maioritária neste TSI, tem-se entendido que o trabalho prestado em dias de descanso semanal é pago pelo dobro da retribuição normal aos trabalhadores que aufiram salário normal, para além do singelo já recebido e do dia de descanso compensatório.
No mesmo sentido, veja-se ainda os Acórdãos deste TSI, proferidos no âmbito dos Processos 778/2010, 376/2012 e mais recentemente, Processos 61/2014 e 582/2014.
Nesta conformidade, por o Autor ter direito a receber, por cada dia de descanso semanal não gozado, o dobro da retribuição normal, para além do salário em singelo e do dia de descanso compensatório, é revogada a decisão quanto a esta parte, ficando a Ré B condenada a pagar ao Autor a quantia de MOP119.480,00, devida a título de trabalho prestado em dias de descanso semanal.
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Da compensação do trabalho prestado em dias de feriado obrigatório
Sobre a questão em apreço, entende-se que o trabalhador que tenha prestado serviço nos dias de feriado obrigatório terá direito a receber três dias de valor pecuniário, para além do já recebido a título de salário.
Aliás é esta também a posição jurisprudencial maioritária neste TSI.
Desta forma, por o Autor ter direito a receber, por cada dia de feriado obrigatório não gozado, o triplo da retribuição normal, para além do salário em singelo já recebido, é revogada a decisão quanto a esta parte, ficando a Ré B condenada a pagar ao Autor a quantia de MOP23.947,50, devida a título de trabalho prestado em dias de feriado obrigatório.
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III) DECISÃO
Face ao exposto, acordam em negar provimento ao recurso interposto pela B, S.A., e conceder provimento ao recurso interposto pelo recorrente A e, em consequência, revogar a sentença na parte respeitante à condenação da Ré no pagamento do trabalho prestado em dias de descanso semanal e feriado obrigatório, nos termos acima consignados.
Custas pela B, S.A., em ambos os recursos.
Registe e notifique.
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RAEM, 10 de Outubro de 2019
Tong Hio Fong
Declaração de voto vencido
(Para o trabalho prestado em dias de descanso semanal, o trabalhador tem direito a receber o dobro da retribuição (“dobro” esse que consistiria na soma do salário diário e um dia de acréscimo). Sendo assim, provado que durante a vigência da relação laboral o Autor já recebeu da Ré o salário diário em singelo, para efeitos de cálculo do valor da compensação do trabalho prestado em dias de descanso semanal, terá direito a receber apenas mais um dia de acréscimo, sob pena de o Autor, incluindo o dia de descanso compensatório previsto no n.º 4 do artigo 17.º a que tem direito, estar a receber um acréscimo salarial correspondente ao “triplo” da retribuição normal.
Quanto ao trabalho prestado em dias de feriado obrigatório, o trabalhador tem direito a um acréscimo de dois dias de salário, para além do singelo. Assim, tendo o Autor recebido, durante toda a relação laboral, o salário diário em singelo, terá agora apenas direito a receber mais 2 dias de salário.
Pelo que não merece, a meu ver, reparo as fórmulas adoptadas pelo Tribunal recorrido para cálculo da compensação do trabalho prestado em dias de descanso semanal e feriados obrigatórios, devendo negar-se provimento ao recurso interposto pelo Autor.)

Lai Kin Hong
Fong Man Chong
1 Manual de Formação de Direito do Trabalho em Macau, CFJJ, 2006, pág. 92
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Recurso Laboral 738/2019 Página 22