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Processo nº 209/2018
Relator: Cândido de Pinho
Data do acórdão: 24 de Outubro de 2019
Descritores:
- Revisão de sentença
- Divórcio

SUMÁRIO

I. Não se conhecendo do fundo ou do mérito da causa, na revisão formal o Tribunal limita-se a verificar se a sentença estrangeira satisfaz certos requisitos de forma e condições de regularidade, pelo que não há que proceder a novo julgamento tanto da questão de facto como de direito.

II. Quanto aos requisitos relativos ao trânsito em julgado, competência do tribunal do exterior, ausência de litispendência ou de caso julgado, citação e garantia do contraditório, o tribunal verifica oficiosamente se concorrem as condições indicadas nas alíneas a) e f) do artigo 1200º, do CPC negando também oficiosamente a confirmação quando, pelo exame do processo ou por conhecimento derivado do exercício das suas funções, apure que falta algum dos requisitos exigidos nas alíneas b), c), d) e e) do mesmo preceito.


Proc. Nº 209/2018

Acordam no Tribunal de Segunda Instância da RAEM

I – Relatório
B, divorciada, de nacionalidade chinesa e portadora de Passaporte da República Popular da China, n.º E28******, emitida em 28/08/2014, pela Serviços Competentes da República Popular da China, com domicílio habitacional na Avenida de ...... n.º S/N ....º andar .../..., ----
Instaurou neste TSI a presente Acção de Revisão e Confirmação de Sentença Proferida no Exterior de Macau contra: ----
C (C), divorciado, de nacionalidade chinesa, titular do Bilhete de Identidade de Residente de Macau, n.º 1******(6), emitido pela Direcção dos Serviços de Identificação, residente em Macau, Taipa, na ......花園...苑, ....º andar Bloco “...”, ou /e, na República Popular da China, na Província de GuangDong, na cidade de Foshan, no distrito de Shunde, ......路...號, com telefone n.º 66****** e ******78.
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O réu não apresentou contestação.
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O digmo Magistrado do MP não se opôs ao deferimento do pedido.
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Cumpre decidir.
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II – Pressupostos Processuais
O tribunal é absolutamente competente.
O processo é o próprio e não há nulidades.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão devidamente representadas.
Não há outras excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento de mérito.
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III – Os Factos

1. Em 12 de Fevereiro de 2007, a Requerente B e o Requerido C constituíram matrimónio na província de Guangdong, na cidade de Foshan, no distrito de Shunde, da República Popular da China.
2. O matrimónio foi registado no mesmo dia, ou seja, no dia 12 de Fevereiro de 2007.
3. Em 24 de Setembro de 2014, a ora Requerente e o requerido, requereram o divórcio por mútuo consentimento, junto da Conservatória do Registo Civil da cidade de FOSHAN, da província de GUANGDONG, da República Popular da China;
4. O acordo tem o seguinte teor:
Escritura Pública
Cartório Notarial de Shun De, Cidade de Fo Shan, Província de Guang Dong, República Popular da China
Acordo de Divórcio
Nome da parte masculina: C C, nascido de XX de XX de 19XX, titular do Bilhete de Identidade de Residente da República Popular da China: ********841129201X.
Residência: n.º ... da Rua ......, Avenida ......, Distrito de Shun De, Cidade de Fo Shan, Província de Guang Dong.
Nome da parte feminina: B B, nascida de XX de XX de 19XX, titular do Bilhete de Identidade de Residente da República Popular da China: ********8412200324.
Residência: n.º ..., Rua ......, Zona de ......, Distrito de Huang Pu, Cidade de Cantão.
No dia 12 de Fevereiro de 2007, as partes contraíram matrimónio na Conservatória de Casamento na Zona de Lun Jiao, Distrito de Shun De, Cidade de Fo Shan, com o certificado de casamento 粵(Província de Guang Dong) 佛(Cidade de Fo Shan) 結(Casamento) 字順(número) n.º 10*******. Após o casamento, as personalidades das partes são tão incompatíveis, não existem afectos mútuos entre as partes. Agora, tendo em minuciosa conta os factores supracitados, ambas as partes decidem dissolver espontaneamente a relação conjugal através do acordo, e chegam ao seguinte acordo de divórcio:
1. Ambas as partes concordam com o divórcio por mútuo consentimento.
2. Após o casamento, as partes têm um filho dessa união, o nome do filho é D D, nasceu de X de XX de 20XX, a parte masculina será responsável pelo cuidado do filho, bem como a despesa diária, a pensão alimentícia, a despesa de educação e a despesa médica do filho, a parte feminina poderá visitar o filho a qualquer momento. Durante o período de tratamento das formalidades de divórcio das partes, a parte feminina não está gravida.
3. Bens: as partes não têm bens comuns.
4. No decurso da relação conjugal, as partes não têm créditos ou dívidas comuns, quanto aos seus próprios créditos e dívidas, as partes assumirão de forma respectiva; no caso de encontrar os créditos ou as dívidas no futuro, as partes suportarão os seus próprios créditos ou as dívidas, os créditos ou as dívidas não têm nada a ver com a parte contrária.
5. Ambas as partes concordam com o divórcio por mútuo consentimento, as partes têm capacidade civil plena, manifestam uma total concordância quanto às disposições no presente acordo, não têm outras oposições.
6. O presente acordo é lavrado em triplicado, ficando ambas as partes com uma cópia, a terceira cópia será arquivada na Conservatória de Casamento.
Depois de ambas as partes assinarem o acordo e adquirirem o certificado de casamento, o presente acordo entrará em vigor com força obrigatória judicial.
Assinatura da parte masculina: Assinatura da parte feminina:
Data: 2014-09-24 Data:2014-09-24
5. Nesse mesmo dia foi decretada a dissolução do casamento entre o Requerente e o requerido, pelo notário da Conservatória do Registo Civil da cidade de FOSHAN, da província de GUANGDONG, da República Popular da China
5. Para efeitos de prova, o mesmo notário entregaram-lhes, a cada um deles, o certificado de divórcio (離婚證):
Titular: B B
Data do Registo: 2014-09-24 Foto
N.º do Certificado de Divórcio: L440606003-2014-******
Observação

Nome: B B Sexo: F
Nacionalidade: Chinesa Data do Nascimento: 19XX-XX-XX
N.º do Bilhete de Identidade de Residente da República Popular da China: ********8412200324

Nome: C C Sexo: M
Nacionalidade: Chinesa Data do Nascimento: 19XX-XX-XX
N.º do Bilhete de Identidade de Residente da República Popular da China: ********841129201X
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IV – O Direito
1. Prevê o artigo 1200º do C. Processo Civil:
“1. Para que a decisão proferida por tribunal do exterior de Macau seja confirmada, é necessária a verificação dos seguintes requisitos:
a) Que não haja dúvidas sobre a autenticidade do documento de que conste a decisão nem sobre a inteligibilidade da decisão;
b) Que tenha transitado em julgado segundo a lei do local em que foi proferida; 342/2009 28/34
c) Que provenha de tribunal cuja competência não tenha sido provocada em fraude à lei e não verse sobre matéria da exclusiva competência dos tribunais de Macau;
d) Que não possa invocar-se a excepção de litispendência ou de caso julgado com fundamento em causa afecta a tribunal de Macau, excepto se foi o tribunal do exterior de Macau que preveniu a jurisdição;
e) Que o réu tenha sido regularmente citado para a acção, nos termos da lei do local do tribunal de origem, e que no processo tenham sido observados os princípios do contraditório e da igualdade das partes;
f) Que não contenha decisão cuja confirmação conduza a um resultado manifestamente incompatível com a ordem pública. 2. O disposto no número anterior é aplicável à decisão arbitral, na parte em que o puder ser.”
Neste tipo de processos não se conhece do fundo ou do mérito da causa, na revisão formal, uma vez que o Tribunal se limita a verificar se a sentença estrangeira satisfaz certos requisitos de forma e condições de regularidade, pelo que não há que proceder a novo julgamento, nem da questão de facto, nem de direito.
Vejamos, então, os requisitos previstos no artigo 1200º do CPC.
Os documentos constantes dos autos reportam e certificam o divórcio por mútuo consentimento e a respectiva homologação e certificação pelo departamento governamental competente da República Popular da China.
Revelam, além da autenticidade, a inteligibilidade da cessação da união conjugal por divórcio com observância dos preceitos legais em vigor aplicáveis à situação.
Por outro lado, a decisão em apreço não conduz a um resultado manifestamente incompatível com a ordem pública (cfr. art. 20º e 273º do C.C.). Com efeito, o direito substantivo de Macau prevê a dissolução do casamento, igualmente com fundamento na cessação dos laços e convivência conjugal, bem como a regulação do exercício do poder paternal.
Reunidos estão, pois, os requisitos de verificação oficiosa do art. 1200º, n.º 1, als. a) e f), do CPC.
Além destes, não se detecta que os restantes (alíneas b), d) e e)) constituam aqui qualquer obstáculo ao objectivo a que tendem os autos.
Também não se vê que tivesse havido violação das regras de litispendência e caso julgado ou que tivessem sido violadas as regras da citação no âmbito daquele processo ou que não tivessem sido observados os princípios do contraditório ou da igualdade das partes.
Posto isto, tudo se conjuga para a procedência do pedido (cfr. art. 1204º do CPC).
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V – Decidindo
Face ao exposto, acordam em conceder a revisão e confirmar a o acordo de divórcio, entre B e C, nos precisos termos acima transcritos.
Custas pela requerente.
T.S.I., 24 de Outubro de 2019
(Relator)
José Cândido de Pinho

(Primeiro Juiz-Adjunto)
Tong Hio Fong

(Segundo Juiz-Adjunto)
Lai Kin Hong




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