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Proc. nº 575/2019
Relator: Cândido de Pinho
Data do acórdão: 5 de Dezembro de 2019
Descritores:
- Revisão de sentença do exterior de Macau
- Requisitos formais
- Concessão de crédito

SUMÁRIO:

I. Não se conhecendo do fundo ou do mérito da causa, na revisão formal, o Tribunal limita-se a verificar se a sentença estrangeira satisfaz certos requisitos de forma e condições de regularidade, pelo que não há que proceder a novo julgamento tanto da questão de facto como de direito.

II. Quanto aos requisitos relativos ao trânsito em julgado, competência do tribunal do exterior, ausência de litispendência ou de caso julgado, citação e garantia do contraditório, o tribunal verifica oficiosamente se concorrem as condições indicadas nas alíneas a) e f) do artigo 1200º, negando também oficiosamente a confirmação quando, pelo exame do processo ou por conhecimento derivado do exercício das suas funções, apure que falta algum dos requisitos exigidos nas alíneas b), c), d) e e) do mesmo preceito.


Proc. nº 575/2019

Acordam no Tribunal de Segunda Instância da RAEM

I – Relatório
Os administradores de falência da “A股份有限公司” B, Ce D, com respectivo domicílio profissional em XXXXXX, Taipei City, XXXXXX, Taipei City, e XXXXXX, Taoyuan City, ---
Instauram neste TSI acção de revisão e confirmação de sentença do exterior de Macau contra:
“E Limited”, com a representação permanente na XXXXXX, em Macau, registo comercial n.º XXXXX (SO).
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Não houve contestação e o digno Magistrado do MP não se opôs à revisão.
*
Cumpre decidir.
***
II – Pressupostos processuais
O tribunal é absolutamente competente.
O processo é o próprio e não há nulidades.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão bem representadas.
Não existem excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento de mérito.
***
III – Os Factos
1. Em 29/6/2018, o Tribunal Distrital de Shilin, Taiwan, através dos processos n.ºs 21 e 28, do ano 107 da era da república, declarou a falência de “A股份有限公司”.
2. No respectivo processo de declaração de falência, como existem as circunstâncias de - os credores da A股份有限公司 não conseguiram liquidar as dívidas, e além disso, os bens dos credores eram suficientes para liquidar a despesa do consórcio de falência e as dívidas do consórcio, têm assim o benéfico efectivo, nestes termos, nos termos do artigo 58º, n.º 1 da Lei de Falência, requereram a declaração de falência.
3. O mesmo Tribunal Distrital de Shilin, Taiwan nomeou B, Ce D como administradores de falência da A股份有限公司.
4. A sentença tem o seguinte teor:
Decisão Civil do Tribunal Distrital de Shilin, Taiwan
Ano 106 era da república, Caso de Falência, n.º 21
Ano 106 era da república, Caso de Falência, n.º 28
Requerente F股份有限公司
XXXXXX, Taipei City
Representante Legal B, com endereço idem à anterior
Requerente H股份有限公司
XXXXXX, Taipei City
Representante Legal I, com endereço idem à anterior
Entregou ao advogado J
Representante Advogado K
Requerente L有限公司
XXXXXX, Penghu County
Representante Legal M, endereço idem à anterior
Requerente N有限公司
XXXXXX, Penghu County
Representante Legal O, endereço idem à anterior
Requerente P有限公司
XXXXXX, Penghu County
Representante Legal Q, endereço idem à anterior
Requerente R有限公司
XXXXXX, Penghu County
Representante Legal X, endereço idem à anterior
Representante Advogado T
Sub-representante Advogado U
Advogado V
Requerente W股份有限公司
XXXXXX, Taipei City
Representante Legal X, endereço idem à anterior
Representante Y
XXXXXX, Taipei City
Declaratório A股份有限公司
XXXXXX, Taipei City
Representante Legal B, endereço idem à anterior
Z, endereço idem à anterior
Z1, endereço idem à anterior
Representante Advogado Z2
Advogado Z3
Advogada Z4
Advogado Z5
Os requerentes acima referidos requerem a declaração de falência do declaratório, o tribunal julga como seguinte:
  Dispositivo:
1. Declare a falência do declaratório A股份有限公司;
2. Eleja o advogado B (com escritório em XXXXXX, Taipei City), a contabilista C (com escritório em XXXXXX, Taipei City) e o advogado D (com escritório em XXXXXX, Taoyuan City) como administradores de falência;
3. O prazo de declaração de créditos é do presente dia até ao dia 28 de Setembro do ano 107 da era da república;
4. A 1ª conferência dos credores é fixada às 10h30 em dia 12 de Outubro do ano 107 da era da república (sexta-feira), será convocada no 9º juízo do Escritório Civil Nei Hu do presente tribunal (No.91, Sec. 6, Minquan E. Rd., Neihu Dist., Taipei City).
Fundamentos:
1. Se os devedores não sejam capazes de liquidar as dívidas, segundo o processo de falência previsto pela Lei de Falência, saneie as suas dívidas; quanto às dívidas não liquidadas, declare a falência dos devedores; no tocante à falência, além da outra norma, a falência deve ser declarada conforme o requerimento dos credores ou dos devedores; nos termos do artigo 1º, alínea 1), do artigo 57º, do artigo 58º, alínea 1) e do artigo 83º, alínea 1) da Lei de Falência, deve-se eleger os administradores de falência das contabilistas ou dos outros indivíduos que são adequados para realizar a administração do consórcio de falência.
2. O conteúdo do requerimento é: os requerentes são credores do destinatário, em caso de existe no destinatário as circunstancia de não conseguir liquidar as dívidas, e além disso, os seus bens são suficientes para liquidar a despesa do consórcio de falência e as dívidas do consórcio, têm assim o benéfico efectivo, nestes termos, nos termos do artigo 58º, n.º 1 da Lei de Falência, requereram a declaração de falência do destinatário.
3. O presente tribunal verifica-se que:
Os requerentes do presente caso requereram a declaração de falência do destinatário, após a verificação, não se encontra qualquer incompatibilidade, nesta situação, deve-se actuar conforme o conteúdo da primeira alínea do dispositivo. Para além disso, o consórcio de falência no caso vertente tem a bastante escala, para além de comportar o saneamento dos bens do destinatário, para que os credores possam ser equitativamente indemnizados, envolve também o tratamento dos respectivos créditos de litígio, nesta situação, é necessário de eleger a contabilista combinada com o advogado para exercerem juntamente as funções dos administradores de falência, a fim de realizar a complementaridade, a colaboração e distribuição de tarefas, devendo ter em consideração a eficiência. Por outro lado, vários credores estrangeiros são envolvidos no presente caso, importa ainda ponderar a especialidade dos administradores de falência no tratamento dos assuntos relativos às relações externas. Depois da ponderação da vontade, do conhecimento e da especialidade dos candidatos recomendados, do grau de familiaridade quanto à condição de tratamento da finança e do litígio do destinatário, da experiência no tratamento dos assuntos de falência, da capacidade de tratar os assuntos relativos à relações externas, o tribunal entende que o advogado B, a contabilista C e o advogado D são administradores de falência de maior competência do destinatário, para se tratar dos assuntos de falência, elejam assim os três indivíduos supracitados como administradores de falência, vide a alínea 2) do dispositivo. Mais, nos termos do artigo 64º da Lei de Falência, tendo em consideração as circunstâncias do presente caso, o prazo de declaração das dívidas e a data da 1ª conferência dos credores são registados na alínea 3 e na alínea 4) do dispositivo.
4. Julgue legalmente conforme o dispositivo.
República da China Ano 107 da era da república, 29 de Junho
2º Juízo Civil O MM.º Dr. Juiz XXX
O supracitado dispositivo é feito conforme o original.
Caso agravado contra o acórdão supracitado, deve-se apresentar a petição de agravo dentro do prazo de 10 dias após a entrega do acórdão, e pagar a despesa de agravo no valor de TWD$1.000,00.
Data de Anúncio: República da China, Ano 107 da era da república, 29 de Junho, Pelas 17h30 da tarde.
República da China, Ano 107 da era da república, 29 de Junho
O Escrivão XXX
5. A decisão já transitou em julgado em 16 de Julho do ano 107 da R.O.C.
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IV – O Direito
1 - Prevê o artigo 1200º do C. Processo Civil:
“1. Para que a decisão proferida por tribunal do exterior de Macau seja confirmada, é necessária a verificação dos seguintes requisitos:
a) Que não haja dúvidas sobre a autenticidade do documento de que conste a decisão nem sobre a inteligibilidade da decisão;
b) Que tenha transitado em julgado segundo a lei do local em que foi proferida;
c) Que provenha de tribunal cuja competência não tenha sido provocada em fraude à lei e não verse sobre matéria da exclusiva competência dos tribunais de Macau;
d) Que não possa invocar-se a excepção de litispendência ou de caso julgado com fundamento em causa afecta a tribunal de Macau, excepto se foi o tribunal do exterior de Macau que preveniu a jurisdição;
e) Que o réu tenha sido regularmente citado para a acção, nos termos da lei do local do tribunal de origem, e que no processo tenham sido observados os princípios do contraditório e da igualdade das partes;
f) Que não contenha decisão cuja confirmação conduza a um resultado manifestamente incompatível com a ordem pública. 2. O disposto no número anterior é aplicável à decisão arbitral, na parte em que o puder ser.”
Neste tipo de processos não se conhece do fundo ou do mérito da causa, na revisão formal, uma vez que o Tribunal se limita a verificar se a sentença estrangeira satisfaz certos requisitos de forma e condições de regularidade, pelo que não há que proceder a novo julgamento, nem da questão de facto, nem de direito (Ac. do TSI, de 25/09/2014, Proc. nº 209/2014). Ou seja, no âmbito do presente meio processual não é possível fazer uma revisão de mérito.
Vejamos, então, os requisitos do art. 1200º, do CPC.
Antes de mais, cumpre salientar que é sobre a parte requerida que recai o ónus de prova da inexistência dos requisitos de confirmação estabelecidos no art. 1200º do CPC (entre outros, na jurisprudência comparada, o Ac. STJ, de 21/02/2006,Proc. nº 05B4168; tb Ac. do TSI, de 28/06/2018, Proc. nº 819/2017).
Quer dizer, relativamente àqueles requisitos, geralmente basta ao requerente a sua invocação, ficando dispensado o requerente de fazer a sua prova positiva e directa, já que os mesmos se presumem (neste sentido, Ac. TSI, de 3/07/2014, Proc. nº 142/2013).
Ora, os documentos constantes dos autos revelam e certificam a situação invocada pelos requerentes/administradores de falência, mostrando, para além da sua autenticidade, a sua inteligibilidade (al. a), do nº1, do art. 1200º do CPC).
E quanto ao trânsito da sentença revidenda, nada disse o requerido que ponha em causa o referido trânsito, nem os autos apresentam elementos que permitam duvidar da sua ocorrência. Pelo contrário, resulta dos autos (cfr. fls. 18 dos autos e 18-19 do apenso “traduções”) que a sentença já transitou.
Também não está em causa a falta de competência do tribunal onde foi proferida a sentença revidenda e o assunto tratado não versa sobre matéria que seja da exclusiva competência dos tribunais de Macau (art. 20º e al. c), do nº1, do art. 1200º, do CPC).
Também não se vê que tenha havido violação das regras de litispendência ou que tivessem sido violadas as regras de citação no âmbito daquele processo ou que não tivessem sido observados os princípios do contraditório ou da igualdade das partes.
Por tudo isto, nada obsta à procedência do pedido (art. 1204º do CPC).
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V – Decidindo
Nos termos expostos, acordam em conceder a revisão e confirmar a decisão proferida pelo Tribunal Distrital de Shilin, Taiwan, nos seus precisos termos, tal como acima transcritos.
Custas pela requerente.
T.S.I., 5 de Dezembro de 2019
José Cândido de Pinho
Tong Hio Fong
Lai Kin Hong


Proc. nº 575/2019 10