Processo nº 1011/2018
Data do Acórdão: 14NOV2019
Assuntos:
Registo de marca
Recurso jurisdicional na matéria do registo de marca
Nulidade da sentença
Omissão de pronúncia
Marca notória
Concorrência desleal
SUMÁRIO
1. Não obstante a natureza híbrida do recurso judicial previsto no RJPI, dada a sua função indeclinável de corrigir eventuais erros com vista à reposição da justiça, algumas regras próprias do recurso jurisdicional regido no CPC, devem aplicar-se mutatis mudantis ao recurso judicial previsto no RJPI que embora tenha por objecto apenas uma decisão administrativa e não judicial.
2. Uma dessas regras é justamente o artº 590º/1 do CPC, à luz do qual se forem vários os fundamentos da acção ou da defesa, o tribunal de recurso conhece do fundamento em que a parte vencedora decaiu, desde que esta o requeira, mesmo a título subsidiário, na respectiva alegação, prevenindo a necessidade da sua apreciação.
3. Aplicando mutatis mutandis esta norma, se a parte contrária do procedimento administrativo tiver invocado, em sede da reclamação por ela deduzida, vários fundamentos e tiver saído vencedora na decisão administrativa que acabou por recusar o pedido de registo, a parte contrária reclamante pode, na resposta ao recurso judicial interposto para o Tribunal Judicial de Base pela requerente, da decisão que lhe recusou o pedido de registo da marca registanda, requerer ao Tribunal o conhecimento daquele fundamento em que decaiu na decisão do procedimento administrativo, prevenindo a necessidade da sua apreciação, nos termos prescritos no artº 590º/1 do CPC, por aplicação analógica.
4. Para recusar o pedido de registo de uma marca com fundamento na concorrência desleal, é preciso que se reconheça que a requerente pretende fazer concorrência desleal, ou que a concorrência desleal é possível independentemente da sua intenção.
5. Se perante a matéria de facto tida por assente, nenhum facto dela constante habilita o Tribunal a reconhecer a presença da uma empresa no mercado de Macau, muito menos a sua dedicação ao ramo de actividade envolvendo os produtos a que se destina a marcar a marca registanda, não há lugar à recusa do pedido de registo com fundamento na concorrência desleal.
O relator
Lai Kin Hong
Processo nº 1011/2018
Acordam em conferência na Secção Cível e Administrativa no Tribunal de Segunda Instância da RAEM:
I
A CO. LTD., devidamente identificada nos autos, interpôs o recurso judicial da decisão do Chefe do Departamento da Propriedade Intelectual dos Serviços de Economia que lhe indeferiu o pedido do registo da marca N/....
No âmbito dos autos desse recurso judicial na matéria de propriedade industrial, que foi registado sob o nº CV1-16-0043-CRJ, e correu os seus termos no 1º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Base, foi a final proferida a seguinte sentença julgando procedente o recurso, revogando a decisão administrativa recorrida e determinado o deferimento do pedido do registo da marca registanda:
I –案件概況
A CO. LTD(下稱 “上訴人”),詳細身份資料載於卷宗,現就經濟局知識產權廳廳長(下稱 “被上訴人”)於2016年5月6日拒絕上訴人N/...商標註冊申請的批示,向本院提起上訴。
上述批示主要基於上訴人的商標存在與對立當事人的商標構成不正當競爭的情事而拒絕商標註冊申請。
上訴人在上訴述書狀中主要主張對立當事人向經濟局知識產權廳廳長提出聲明異議時所提交的授權書,因欠缺《公證法典》要求的要式規定而成為非有效,因而不應受理有關的聲明異議。同時亦認為,雖然對立當事人曾於1997年9月3日向澳門經濟局申請商標N/...並獲批給,但因商標未有使用已於2004年7月30日起失效。此外,亦指對立當事人早已將有關商標作出轉讓,因而不具正當性針對被訴商標提出爭議。
上訴人還指出,上訴人現於對立當事人在澳門申請被爭議商標註冊,並沒有模仿對立當事人的商標,因此不存在不正當競爭的情事。
上訴人亦認為其在韓國以及其他地區從事涉及被爭議商標的產品至少二十年,並在韓國大力推廣其自家品牌,也吸引不少中國、日本、香港、台灣、澳門等國家及地區的遊客。此外,上訴人亦大力開拓中國市場,且在內地多個城市涉有站點以及透過多個網絡電商平台銷售自家品牌產品。
對立當事人答覆時認為,其擁有對…商標的權利,該商標是一馳名商標,對立當事人透過其集團或授權單位在中國、台灣及日本等國家均有經營帶有上述商標的產品,而澳門的遊客大部份是來自上述國家的,因此,被爭議商標僭用了對立當事人的上述馳名商標。
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II –訴訟前提
本院對此案有管轄權。
本訴訟形式恰當及有效。
訴訟雙方具有當事人能力及正當性。
不存在待解決之無效、抗辯或其他先決問題。
此外,亦沒有必要透過詢問證人以引證對實質裁決不具重要性的事實,又或有關事實根本無法透過詢問證人以獲引證。
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III – 本案須審理的問題
關於上訴人主張“對立當事人在行政程序中所提交的授權書不當及無效”
根據《工業產權法律制度》第275條的規定,上訴人僅得就關於工業產權的賦予或拒絕賦予的決定,又或涉及有關移轉、許可或失效的宣布的決定,又或涉及影響、變更或終止工業產權的其他宣布的決定,提起司法上訴。因此,在行政程序中或有的不當情事不能夠作為本司法上訴的上訴理由。
上訴人如認為存在上述所指的不當情事或瑕疵,其應透過其他適當方式提出,如《行程程序法典》所規定的聲明異議或訴願,又或《行政訴訟法典》所規定的司法上訴。
就上訴人關於上述的主張,本院裁定理由不成立。
對上述問題審理完畢後,接下來本案主要須審理的問題有﹕對立當事人所指的商標是否為一馳名商標,以及被爭議的商標是否對對立當事人構成不正當競爭。
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IV –理由說明
1. 事實部份
根據卷宗及行政卷宗所載資料,本院認定以下對案件審判屬重要的事實﹕
1). 2014年10月6日,上訴人A CO. LTD向經濟局遞交商標編號N/...的商標註冊申請書,指定類別為25類產品及服務,商標式樣為﹕…。
2). 上述申請刊登於2015年1月7日第1期第二組《澳門特別行政區公報》。
3). 2015年3月9日對立當事人提出聲明異議。
4). 經濟局知識產權廳廳長同意第108/DPI/2016號報告書內容,並於2016年5月6日在報告書上作出不批准N/...的商標註冊申請,主要認為存在不正當競爭情事。
5). 上述拒絕註冊商標批示公佈於2016年6月1日第22期《澳門特別行政區公報》第二組副刊內。
6). 2016年7月4日,上訴人向本院提起本上訴。
7). 對立當事人B Limited曾於澳門註冊N/...商標…,指定類別為第9類產品(眼鏡,太陽眼鏡,眼鏡框及放大鏡,眼鏡用盒及太陽眼鏡用盒,上述提及所有產品的零件及配件)。
8). 對立當事人的上述商標處於終止狀態,其有效期至2004年7月29日。
9). 對立當事人B Limited於1993年2月15日在韓國註冊…商標,並於1995年7月27日將上述就韓國之商標,出讓與XX國際株式會社。
10). 其後,XX國際株式會社將上述商標轉讓予C Co., Ltd.
11). 上訴人於2014年在韓國取得上述商標的權利。
12). 上訴人的商標…除在韓國註冊外,在緬甸、新加坡等國家也有註冊。
13). 對立當事人在其他地區(中國、日本等地區)曾註冊了有關商標。
14). 對立當事人在中國註冊的部份商標被宣告無效,部份處於無效宣告中。
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法院根據載於卷宗及行政卷宗內的書證對上述事實進行認定。
第8項事實,除卷宗及行政卷宗所載資料外(尤其行政卷宗第90頁),還可透過查閱經濟局官網的查詢系統,獲得引證。網址如下﹕(http://www.economia.gov.mo/zh_TW/web/public/Pg_ES_AE_QE_TRADEMARK?_refresh=true#briefResultPanel)。
第9項至第11項事實有載於卷宗第127頁至第138頁文件支持。
第12項及第13項事實主要是根據載於卷宗第116頁至第126頁以及附於行政卷宗的文件資料獲得證實。
第14項事實主要有載於卷宗第156頁至第158頁文件。
載於起訴狀的其餘事實,部份對審理本案屬不具重要性,部份屬結論性事實,因此不能夠列為已證事實。
2. 事實的法律框架
由於被訴批示以不正當競爭為由不批准上訴的商標註冊,因此,我們首先來審理此一問題。
被訴批示主要認為由於對立當事人在中國註冊了同一商標,因此如上訴人使用同一標誌的話,會使澳門消費者混淆有關產品究竟是屬於對立關係人來自中國及香港的產品,還是屬於上訴人來自韓國的產品﹗﹖
對立當事人還認為,由於澳門是一旅遊城市,旅客多數來自中國、台灣、日本等地,因此讓上訴人註冊有關商標的話,會令消費者對產品的來源產生混淆。
事實上,從卷宗資料、行政卷宗資料以及上述獲證事實,我們可以發現上訴人主要在韓國、緬甸、新加坡等地方發展其商標,而對立當事人則在中國、日本、台灣等地方發展。
雖然上訴人的商標起初是間接地從對立當事人處獲得商標的轉讓,但上訴人在韓國開始發生其商標之後,甚至將其版圖延伸至新加坡、緬甸等地方。
在澳門,對立當事人曾註冊了有關商標,但是基於沒有使用,於2004年7月29日有關商標已處於終止狀態。
對立關係人認為由於其在中國、台灣、日本等擁有相當知名度,而澳門的旅客大部份來自這些地區,因而會令他們對產品的來源產生混淆,從而存在不正當競爭。
但是,我們也不能忘記,上訴人在韓國、新加坡及緬甸也發展了其商標,而澳門的旅客中也有(大)部份是來自韓國及新加坡的,甚至澳門也有不少來自緬甸的華僑。
因此,對立當事人的上述理據,實在有點兒差強人意。
我們認為,更最重要的是,對立關係人曾在澳門註冊有關商標,但是由於長期沒有使用,於2004年7月29日已處於終止狀態。
我們知道,不正當競爭是指作出違反法規及有違誠實習慣的任何經濟活動,尤其能夠適當地對不同經濟業者的產品或服務產生混淆,利用他人企業的聲譽等經濟活動。1
既然在澳門以外的地方,不論是上訴人還是對立當事人各自都有自己發展商標的“版圖”,而且澳門的消費者來自五湖四海,我們不能夠就此斷定上訴人使用擬註冊的商標即對對立當事人構成不正當競爭的情事。
基於此,被訴批示拒絕擬註冊商標註冊的依據並站不住腳。
就關於對立當事人擬透過馳名商標獲保護的理據方面,學說上認為,馳名商標是指取得具有名譽的商標,該名譽被所有與產品接觸最密切者(包括製造商、商人或倘有之消費者)所熟知且承認(見Carlos Olavo著,《知識產權》,第55頁及續後數頁)2。
基於地域原則(《工業產權法律制度》第4條規定),商標的馳名情況應反映在澳門,澳門以外地區的情況不甚具重要性。
確實,經審理查明,未發現在澳門存在任何與對立當事人有聯係的商標的宣傳或廣告,因此,實在難以認定對立當事人的商標是馳名的說法。
此外,對立當事人的N/...商標,自2004年7月29日已經處於終止狀態。這是基於對立當事人長期沒有使用有關商標緣故。
眾所週知,商標權利人具有實際使用商標的負擔,只有透過使用商標,才能確保權利人具有對有關商標的專屬使用權。
這樣,既然對立當事人自由選擇了不使用商標,在商標被終止後,也不應禁止他人發展商標。
Oliveira Ascensão曾指出,工業產權(包括商標)不應淪為用作霸佔“版圖”的一種投機遊戲,相反,工業產權應充當著特定的功能3。事實上,工業產權是為商業提供服務,為商品提供識別,而不應用作霸佔版圖的工具。
如權利人沒有履行其應履行的“使用商標”的負擔,那麼在商標失效之後,不能夠再受到商標的保護,應騰出“地方”,讓其他經濟參與者使用。
不論是學說4 還是司法見解5均一直認為商標的使用是必須的,而使用是指認真的使用,即透過具體的、持續的、公開的行為在市場上實際使用商標,而非一種偶爾或象征式的使用。.
綜上所述,由於上訴人的擬註冊商標不構成任何不正當競爭情事,且對立當事人指出的受馳名商標保護的依據不充份,因此,應裁定上訴人的上訴理由成立,在沒有其他理由可妨礙給予N/...商標註冊的情況下,應給予上述商標註冊。
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V –判決(Decisão)
綜上所述,本院裁定本司法上訴理由成立,廢止經濟局不給予N/...商標註冊的批示,在沒有其他理由可妨礙給予N/...商標註冊的情況下,經濟局應給予上述商標註冊(Nos termos e pelo tudo o exposto, o Tribunal julga o recurso procedente, revogando a decisão de não concessão do registo da marca N/..., devendo a DSE conceder o registo dessa marca se não havendo outro motivo que o obste)。
沒有訴訟費用因獲豁免(Sem custas por estar isento)。
作出登錄及通知(Registe e notifique)。
適時履行《工業產權法律制度》第283條的規定(Oportunamente cumpra o disposto no art. 283º do RJPI)。
Notificada e não conformada com o decidido, vem parte contrária B Limited recorrer para este TSI e motivar o seu recurso concluindo e pedindo que:
A. Duas questões materiais foram analisadas pelo Tribunal a quo, a saber, a questão da concorrência desleal e a reprodução ou imitação de marca notória em Macau, mas a sentença recorrida não fez uma interpretação e aplicação correcta das normas que estabelecem os motivos de recusa do registo de marcas, designadamente com base em concorrência desleal e imitação ou reprodução de marca notória em Macau (nos artigos 9.º, n.º 1, alínea c) e 214.º, n.º 1, alínea b), do RJPI).
B. O Tribunal a quo absteve-se de apreciar o fundamento de recusa invocado pela ora Recorrente - a violação de direitos de autor -, o que constitui omissão de pronúncia e, nos termos do artigo 571.º, n.º 1, alínea d) ex vi artigo 633.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, constitui causa de nulidade da sentença.
C. Como demonstrado pela Recorrente nas fases administrativa e judicial, a Recorrente adquiriu ao criador original, X, os direitos patrimoniais de autor sobre o desenho da águia no topo da letra "…" do elemento "…".
D. Ora, o artigo 1.º do Regime dos Direitos de Autor e Direitos Conexos ("RDADC") dispõe que "a protecção concedida pelo direito de autor pressupõe a exteriorização da obra, mas é independente da sua divulgação, publicação, utilização ou exploração económica", e a alínea g) do n.º 1 do artigo 2.° do mesmo diploma acrescenta que "são obras protegidas, desde que originais, nomeadamente: (...) g) as obras de desenho (...)", nas quais se enquadra o desenho da águia no topo da letra "…" do elemento "…".
E. Estabelece a alínea a) do n.º 2 do artigo 7.º do RDADC que "o direito patrimonial de autor compreende os poderes exclusivos de: a) utilizar e explorar economicamente a obra e de autorizar a sua utilização e exploração económica, total ou parcial, por terceiro" - não tendo a Recorrida quaisquer direitos directos ou licenciados não pode utilizar e explorar economicamente tal criação nem pode a marca registanda ser concedida por violar direitos de autor.
F. A Direcção dos Serviços de Economia entendeu não existir violação de direitos de autor com base (i) no sumário do acórdão do TSI de 12/01/2012 (proc. n.º 494/2011) e (ii) pelo facto de o "desenho" ter sido utilizado pelo Império Romano, no uniforme do exército Nazi, por D - E.
G. A DSE limitou-se a transcrever o sumário do acórdão do TSI sem o contextualizar nem aplicar à situação concreta, pois à data da sua reclamação a Recorrente não tinha nenhum registo válido de marca em Macau (e o pedido de registo pendente não equivale à titularidade de uma marca registada), pelo que a Recorrente não detem outro direito a que se possa subsumir o direito de autor e este não perdeu a sua autonomia.
H. Não estamos perante uma entidade que criou a sua própria marca, sem dimensão artística, para efeitos de a utilizar no mercado e identificar os seus produtos ou serviços - a Recorrente é apenas a titular dos direitos patrimoniais de autor sobre a obra original de X, o qual conserva os direitos pessoais (ou morais) sobre a obra.
I. É o próprio criador original da obra, X, que, exercendo os seus direitos pessoais, se opõe à utilização ilegítima pela Recorrida da sua criação - o desenho da águia no topo da letra "O" do elemento "BOY".
J. O desenho que, alegadamente, foi utilizado pelo Império Romano, no uniforme do exército Nazi e por D - E foi quiçá o desenho da "águia" mas não foi o desenho da águia no topo da letra "…" do elemento "…", tendo a DSE feito uma análise muito superficial da marca da Recorrente, com uma ainda mais rápida comparação com "outras águias".
L. O Tribunal a quo considerou não ser a marca da Recorrente uma marca notória com base em dois argumentos: no facto de a Recorrente não ter demonstrado que a respectiva marca tem sido objecto de promoção e publicidade em Macau (!?!) e no facto de o registo do qual a Recorrente foi titular em Macau (i.e. marca N/...) ter caducado a 29 de Julho de 2004 (!?!).
M. O Tribunal a quo referiu também que a notoriedade de uma marca deve ser aferida em relação a Macau, não sendo relevante o facto de uma marca ser notória em outras jurisdições - o que não está em linha com a doutrina e a jurisprudência dos tribunais locais, sendo que segundo o acórdão do Tribunal de Segunda Instância de 25 de Abril de 2013 (Proc. n° 842/2012), "notória é a marca que adquiriu um tal renome que se tornou geralmente conhecida por todos aqueles, produtores, comerciantes ou eventuais consumidores, que estão mais em contacto com o produto, e como tal reconhecida".
N. Ao contrário do que afirmou o Tribunal a quo, a notoriedade da marca da Recorrente em outras jurisdições (em particular, na China continental, Taiwan, Japão e Hong Kong) releva, obviamente, para se aferir a notoriedade dessa marca em Macau, pois uma marca que é simultaneamente notória na China continental, Taiwan, Japão e Hong Kong não pode, como é óbvio, deixar de ser notória em Macau.
O. Os próprios tribunais da China continental já reconheceram - também em relação a registos prévios de terceiros sobre a mesma marca "BOY" - que a marca em questão pertence à Recorrente, conforme sentenças proferidas pelo Supremo Tribunal da Cidade de Pequim nos processos n.ºs 3193(2016), a 17 de Julho de 2017, e 2657(2017), a 11 de Janeiro de 2018.
P. O facto de o referido registo ter caducado não significa que a marca não era usada pela Recorrente (sendo essa conclusão absurda) - simplesmente, o registo caducou porque não foi renovado e, assim, expirou nos termos da alínea a), do n.º 1 do artigo 51.º, RJPI.
Q. Como decidido por esse Tribunal no acórdão de 16 de Fevereiro de 2017 (Proc. n° 655/2016), "o eixo da marca notória é o seu conhecimento pelos destinatários, não o seu registo - que nem precisa de estar feito - num determinado universo mais ou menos alargado", acrescentando que "não é pelo facto de uma marca não estar registada em Macau que deixa de poder ser notória" e enaltecendo que "pensar o contrário é, esvaziar, precisamente, de conteúdo a noção de marca notória, é retirar-lhe a sua própria essência".
R. A marca da Recorrente cujo registo caducou (N/...) assinalava produtos da classe 9, sendo que o que está em causa no presente processo é o registo de marca na classe 25,que abrange os produtos comercializados pela Recorrente e para os quais a Recorrente adquiriu marca notória.
S. Entendeu o Tribunal a quo não dar por verificado o fundamento de concorrência desleal pelo facto de a Recorrida ter desenvolvido a marca na Coreia do Sul, Singapura e Myanmar (?!?), origem de muitos visitantes de Macau; e pelo facto de o registo do qual a Recorrente foi titular em Macau (i.e. marca N/...) ter caducado a 29 de Julho de 2004.
T. Tais fundamentos são incompreensíveis e não devem proceder, quando estamos perante a prática flagrante de actos de concorrência desleal pela Recorrida - ou, pelo menos, caso assim não se entenda por mera cautela de patrocínio, quando existe a possibilidade abstracta (ou o perigo ou risco) dessa prática.
U. O Tribunal Judicial de Base já decidiu, num outro processo (CV2-16-0040-CRJ) relativo a pedido de registo pela Recorrida para a mesma marca “ ” (mas para a classe 14), que tal pedido comporta o "risco de, com a atribuição do exclusivo pretendido pela recorrente [ora Recorrida], ocorrerem desvios de clientela contra o que dita a consciência ética de um empresário médio e o princípio da prestação, ou seja, há risco de ocorrência de concorrência em violação das normas e usos honestos da actividade económica" (cfr. sentença do Tribunal Judicial de Base, proferida nos autos com o nº CV2-16-0040-CRJ a 22 de Março de 2018).
V. O acórdão do Tribunal de Segunda Instância (Proc. nº 657/2017) de 7 de Dezembro de 2017 referiu que "a concorrência desleal não é o mesmo que conflito marcário; são coisas inconfundíveis. Ou seja, pode haver concorrência desleal mesmo que um dos "concorrentes" não tenha marca registada na RAEM, da mesma maneira que a existência de um conflito entre marcas registadas não envolve necessariamente a ideia de concorrência desleal".
X. Como referido na sentença to Tribunal Judicial de Base (Proc. n° CV2-16-0040-CRJ), de 22 de Março de 2018, "A consciência ética de um comerciante médio há-de ditar-lhe que não queira utilizar nem denegrir, em seu proveito, os instrumentos criados por outrem e há-de ditar-lhe também que não prescinda de esgrimir na concorrência pela clientela os instrumentos que ele próprio criou".
Z. Quanto ao princípio da prestação, a ideia é a de que as prestações dos vários operadores se devem defrontar no mercado com o mínimo de constrangimentos, para que vença o melhor, caso contrário a concorrência é falseada - também aqui, o mérito próprio surge como fiel da balança.
AA A Recorrida não criou a marca registanda (apenas a copiou).
BB. O facto de a Recorrida ter vindo a explorar a marca na Coreia do Sul, Singapura e Myanmar, além de não relevar para a decisão sobre concorrência desleal, vem demonstrar, e de forma bem vincada, o carácter desleal e contrário às normas e usos honestos da actividade económica da conduta da Recorrida.
CC. Se para utilizar a marca na Coreia do Sul a Recorrida adquiriu esse direito a quem tinha adquirido à Recorrente o licenciamento de utilização da marca (limitado à Coreia do Sul), não está conforme às normas e usos honestos da actividade económica que, posteriormente a Recorrida, procure utilizar a mesma marca licenciada, sem autorização da Recorrente, em outras jurisdições.
DD. Também não se aceita - à luz da consciência ética do comerciante médio - que a Recorrida, que entendeu ser necessário adquirir licença para utilizar a marca na Coreia do Sul, não o tivesse considerado necessário para utilizar a marca em Macau.
EE. O facto de a Recorrida, para sustentar o seu pedido, vir invocar a utilização da marca em Singapura e Myanmar à luz da violação de uma alegada licença de utilização de marca que adquiriu para a Coreia do Sul, constitui abuso de direito na modalidade de proibição do comportamento contraditório, isto é, venire contra factum proprium (nos termos do artigo 326.º, Código Civil).
FF. Quanto ao argumento de que o registo do qual a Recorrente foi titular em Macau (i.e. marca N/...) caducou a 29 de Julho de 2004, o facto de o referido registo ter caducado não significa que a marca não era usada pela Recorrente.
Nestes termos e nos mais de direito aplicáveis, deve o presente recurso ser julgado procedente e, em consequência, ser confirmada a decisão da Direcção dos Serviços de Economia de recusa de registo da marca N/91365.
Notificadas a Direcção dos Serviços de Economia e a A CO. LTD, ora recorrida, da interposição do recurso e das motivações do recurso, veio apenas esta última a responder pugnando pela improcedência do recurso – vide as fls. 463 a 484 dos p. autos.
II
Foram colhidos os vistos, cumpre conhecer.
Conforme resulta do disposto nos artºs 563º/2, 567º e 589º/3 do CPC, ex vi do disposto no artº 282º do «Regime Jurídico da Propriedade Industrial», doravante abreviadamente denominado RJPI, são as conclusões do recurso que delimitam o seu objecto, salvas as questões cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras e as que sejam de conhecimento oficioso.
In casu, não há questões que requeiram o conhecimento oficioso.
De acordo com o alegado nas conclusões do recurso, constituem o objecto da nossa apreciação as seguintes questões:
1. Da nulidade da sentença por omissão de pronúncia;
2. Da notoriedade da marca; e
3. Da concorrência desleal.
Apreciemos.
1. Da nulidade da sentença por omissão de pronúncia
A ora recorrente B Limited veio, em sede do presente recurso, arguir a nulidade da sentença ora recorrida, por omissão de pronúncia sobre uma questão já suscitada em sede reclamação no procedimento administrativo, reiterada na contestação ao recurso judicial.
Em sede de reclamação a que se refere o artº 211º do RJPI, a ora recorrente, B Limited, avançou com vários fundamentos para rogar a recusa do pedido de registo da marca registanda formulado pela requerente, ora recorrida, A CO. LTD.
Alegou B Limited como fundamentos da reclamação a violação dos seus direitos de autor, ser ela titular de uma marca notória, ora imitada pela requerente A CO. LTD., assim como a pretensão da requerente de fazer concorrência desleal ou pelo menos a possibilidade de concorrência desleal.
A Administração apreciou todos estes fundamentos invocados pela reclamante e concluiu pela procedência de apenas do fundamento da concorrência desleal e com base nessa conclusão decidiu recusar o pedido de registo da marca formulado pela A CO. LTD.
Inconformada a A CO. LTD., recorreu judicial para o Tribunal Judicial de Base.
Na resposta à motivação desse recurso judicial, a parte contrária, B Limited, ora recorrente, não obstante a sua concordância com a decisão administrativa na parte respeitante à concorrência desleal, invocou que a fundamentação da decisão administrativa errou quanto às questões da violação dos direitos de autor e da notoriedade da marca reclamada por ela, tendo dado por integralmente reproduzido tudo quanto alegou nos artigos 18º a 28º da reclamação deduzida em sede do procedimento administrativo.
O Tribunal a quo não apreciou a questão da violação dos seus direitos de autor.
Então pergunta-se, há ou não omissão de pronúncia?
Ora, a propósito da natureza e da finalidade do recurso judicial previsto nos artº 275º e s.s do RJPI, este TSI chegou a ditar que “o recurso de recusa de registo de marca tem a natureza de acção com similitude ao recurso contencioso de anulação. Apenas se vêm três, únicos, importantes desvios: o primeiro em sede de competência, que é do foro comum; o segundo por se tratar de um contencioso de jurisdição, que não de mera anulação; finalmente, são aplicáveis as normas adjectivas comuns, não o Código de Processo Administrativo Contencioso – vide Acordão do TSI datado de 07MAR2002, no processo nº 230/2001.
A propósito da razão de ser do recurso judicial propriamente dito, Amâncio Ferreria ensina que a admissibilidade dos meios de impugnação, incluindo o recurso ordinário, funda-se na falibilidade humana e na possibilidade de erro por parte dos juízes. …..O recurso ordinário visa atacar a decisão judicial por ser errada ou injusta.…… – in Manual dos Recursos em Processo Civil, 6ª edição, pág. 69 e s.s..
In casu, estamos perante um recurso judicial a que se aludem os artºs 275º e s.s do RJPI, que é um recurso algo impróprio, isto é, impróprio porque não tem por objecto uma decisão judicial, mas sim uma decisão administrativa.
Não obstante a natureza híbrida do recurso judicial previsto no RJPI, dada a sua função indeclinável de corrigir eventuais erros com vista à reposição da justiça, cremos que, algumas regras próprias do recurso ordinário regido no CPC, se devem aplicar mutatis mudantis ao este tipo de recurso judicial previsto no RJPI que tem por objecto uma decisão administrativa.
Uma dessas regras é justamente o artº 590º/1 do CPC, à luz do qual se forem vários os fundamentos da acção ou da defesa, o tribunal de recurso conhece do fundamento em que a parte vencedora decaiu, desde que esta o requeira, mesmo a título subsidiário, na respectiva alegação, prevenindo a necessidade da sua apreciação.
Aplicando mutatis mutandis esta norma, temos presente que a parte contrária B Limited, em sede da reclamação deduzida no procedimento administrativo, invocou vários fundamentos, quais são o da violação dos direitos de autor, a notoriedade da sua marca e a pretensão da requerente de fazer concorrência desleal.
Apesar de ter saído vencedora na decisão administrativa que acabou por recusar o pedido de registo formulado pela A CO. LTD., a B Limited, parte contrária, decaiu nos dois fundamentos, dos quais um é justamente o da violação dos seus direitos de autor.
Já na resposta ao recurso judicial para o TJB, interposto pela requerente A CO. LTD., da decisão que lhe recusou o pedido de registo da marca registanda, a B Limited “impugnou” a decisão administrativa na parte respeitante aos direitos de autor e defendendo que a violação dos seus direitos de autor deveria ter sido igualmente um dos fundamentos de recusa do registo.
Ante estas circunstâncias todas, a posição reiterada da B Limited quanto a este fundamento já invocado na reclamação em sede do procedimento administrativo deve ser habilmente considerada como um requerimento dirigido ao TJB, para onde foi devolvido o poder de decidir, com a plena jurisdição, o pedido de registo da marca registanda, do conhecimento desse fundamento em que decaiu no procedimento administrativo.
Portanto, é de concluir que o TJB, em sede do recurso judicial, deveria apreciar este fundamento.
Não o tendo feito, a sentença recorrida padece da nulidade por omissão de pronúncia – artº 571º/1-d), primeira parte, do CPC.
Por força da regra da substituição estabelecida no artº 630º do CPC, ex vi do 282º do RJPI, este Tribunal de recurso deve, em regra, substituir-se ao Tribunal a quo conhecendo este fundamento.
Todavia, não se nos afigura conveniente, senão possível operar aqui o sistema da substituição, uma vez que, não foi seleccionada nenhuma matéria de facto, no que diz respeito aos invocados direitos de autor, e a falta da matéria tida assente sobre este fundamento impede-nos a substituir-nos ao Tribunal na apreciação e na decisão sobre este fundamento.
Ademais, dada complexidade de eventuais questões que podem suscitar quanto aos invocados direitos de autor, o conhecimento desse fundamento pode conduzir a um incidente, até requer a instauração de uma acção autónoma, pois a boa solução à questão fica condicionado pela resolução da uma questão prejudicial, que é justamente a de saber se a ora recorrente, B Limited, é titular dos direitos de autor sobre o desenho integrado na marca registanda, tal como ela assim alegou.
Tudo isto leva-nos a crer que não podemos senão mandar remeter os presentes autos ao Tribunal a quo, a fim de ali seleccionar matéria de facto com relevância à boa decisão desse fundamento, e eventualmente resolver incidentalmente, ou por via de uma acção autónoma a instaurar por quem tem interesse, a questão prejudicial da titularidade dos invocados direitos de autor sobre o desenho integrado na marca registanda.
2. Da notoriedade da marca
Na óptica do Tribunal a quo,
Entende a recorrente que:
就關於對立當事人擬透過馳名商標獲保護的理據方面,學說上認為,馳名商標是指取得具有名譽的商標,該名譽被所有與產品接觸最密切者(包括製造商、商人或倘有之消費者)所熟知且承認(見Carlos Olavo著,《知識產權》,第55頁及續後數頁)6。
基於地域原則(《工業產權法律制度》第4條規定),商標的馳名情況應反映在澳門,澳門以外地區的情況不甚具重要性。
確實,經審理查明,未發現在澳門存在任何與對立當事人有聯係的商標的宣傳或廣告,因此,實在難以認定對立當事人的商標是馳名的說法。
No fundo, foi com base na falta dos factos demonstrativos da notoriedade em Macau da marca alegadamente pertencente à B Limited, ora recorrente, que o Tribunal a quo não aceitou como fundamento válido para a recusa do pedido de registo da marca registanda da A CO. LTD.
Ao passo que diz a recorrente que:
…..
L. O Tribunal a quo considerou não ser a marca da Recorrente uma marca notória com base em dois argumentos: no facto de a Recorrente não ter demonstrado que a respectiva marca tem sido objecto de promoção e publicidade em Macau (!?!) e no facto de o registo do qual a Recorrente foi titular em Macau (i.e. marca N/...) ter caducado a 29 de Julho de 2004 (!?!).
M. O Tribunal a quo referiu também que a notoriedade de uma marca deve ser aferida em relação a Macau, não sendo relevante o facto de uma marca ser notória em outras jurisdições - o que não está em linha com a doutrina e a jurisprudência dos tribunais locais, sendo que segundo o acórdão do Tribunal de Segunda Instância de 25 de Abril de 2013 (Proc. n° 842/2012), "notória é a marca que adquiriu um tal renome que se tornou geralmente conhecida por todos aqueles, produtores, comerciantes ou eventuais consumidores, que estão mais em contacto com o produto, e como tal reconhecida".
N. Ao contrário do que afirmou o Tribunal a quo, a notoriedade da marca da Recorrente em outras jurisdições (em particular, na China continental, Taiwan, Japão e Hong Kong) releva, obviamente, para se aferir a notoriedade dessa marca em Macau, pois uma marca que é simultaneamente notória na China continental, Taiwan, Japão e Hong Kong não pode, como é óbvio, deixar de ser notória em Macau.
O. Os próprios tribunais da China continental já reconheceram - também em relação a registos prévios de terceiros sobre a mesma marca "…" - que a marca em questão pertence à Recorrente, conforme sentenças proferidas pelo Supremo Tribunal da Cidade de Pequim nos processos n.ºs 3193(2016), a 17 de Julho de 2017, e 2657(2017), a 11 de Janeiro de 2018.
P. O facto de o referido registo ter caducado não significa que a marca não era usada pela Recorrente (sendo essa conclusão absurda) - simplesmente, o registo caducou porque não foi renovado e, assim, expirou nos termos da alínea a), do n.º 1 do artigo 51.º, RJPI.
Q. Como decidido por esse Tribunal no acórdão de 16 de Fevereiro de 2017 (Proc. n° 655/2016), "o eixo da marca notória é o seu conhecimento pelos destinatários, não o seu registo - que nem precisa de estar feito - num determinado universo mais ou menos alargado", acrescentando que "não é pelo facto de uma marca não estar registada em Macau que deixa de poder ser notória" e enaltecendo que "pensar o contrário é, esvaziar, precisamente, de conteúdo a noção de marca notória, é retirar-lhe a sua própria essência".
R. A marca da Recorrente cujo registo caducou (N/...) assinalava produtos da classe 9, sendo que o que está em causa no presente processo é o registo de marca na classe 25,que abrange os produtos comercializados pela Recorrente e para os quais a Recorrente adquiriu marca notória.
A recorrente limitou-se a tecer as considerações jurídicas, tendo esquecido da matéria no pano factual.
Para nós, a improcedência do invocado fundamento da notoriedade da marca deve-se à insuficiência da matéria de facto provada na primeira instância.
Ora, foi tida por assente a seguinte matéria de facto:
1). 2014年10月6日,上訴人A CO. LTD向經濟局遞交商標編號N/...的商標註冊申請書,指定類別為25類產品及服務,商標式樣為﹕…。
2). 上述申請刊登於2015年1月7日第1期第二組《澳門特別行政區公報》。
3). 2015年3月9日對立當事人提出聲明異議。
4). 經濟局知識產權廳廳長同意第108/DPI/2016號報告書內容,並於2016年5月6日在報告書上作出不批准N/...的商標註冊申請,主要認為存在不正當競爭情事。
5). 上述拒絕註冊商標批示公佈於2016年6月1日第22期《澳門特別行政區公報》第二組副刊內。
6). 2016年7月4日,上訴人向本院提起本上訴。
7). 對立當事人B Limited曾於澳門註冊N/...商標…,指定類別為第9類產品(眼鏡,太陽眼鏡,眼鏡框及放大鏡,眼鏡用盒及太陽眼鏡用盒,上述提及所有產品的零件及配件)。
8). 對立當事人的上述商標處於終止狀態,其有效期至2004年7月29日。
9). 對立當事人B Limited於1993年2月15日在韓國註冊…商標,並於1995年7月27日將上述就韓國之商標,出讓與XX國際株式會社。
10). 其後,XX國際株式會社將上述商標轉讓予C Co., Ltd.
11). 上訴人於2014年在韓國取得上述商標的權利。
12). 上訴人的商標…除在韓國註冊外,在緬甸、新加坡等國家也有註冊。
13). 對立當事人在其他地區(中國、日本等地區)曾註冊了有關商標。
14). 對立當事人在中國註冊的部份商標被宣告無效,部份處於無效宣告中。
Ora, perante esta matéria de facto, não impugnada pela ora recorrente nos termos do artº 599º do CPC, é de concluir que a tal matéria, manifestamente insuficiente, senão, incapaz de demonstrar a invocada notoriedade da marca alegadamente pertencente à ora recorrente, tal como sensatamente concluiu o Tribunal a quo.
Improcede esta parte do recurso.
3. Da concorrência desleal
Para a recorrente B Limited, o pedido de registo da marca registanda representa a prática flagrante de actos de concorrência desleal pela A CO, ou pelo menos, cria a possibilidade abstracta dessa prática.
Face ao disposto no artº 9º do RJPI, constitui, entre outros, fundamento geral de recusa da concessão dos direitos de propriedade industrial o reconhecimento de que o requerente pretende fazer concorrência desleal, ou que esta é possível independentemente da sua intenção.
Encontram-se definidos os actos de concorrência desleal no artº 158º do Código Comercial, nos termos do qual constitui concorrência desleal todo o acto de concorrência que objectivamente se revele contrário às normas e aos usos honestos da actividade económica.
Conjugando com o acima citado artº 9º/1-c) do RJPI, a contrariedade exigida nessa norma do Código Comercial tanto pode ser intencional como meramente objectiva, ou seja, não intencional.
Ora, para recusar o pedido de registo de uma marca com fundamento na concorrência desleal, é preciso que se reconheça que a requerente pretende fazer concorrência desleal, ou que a concorrência desleal é possível independentemente da sua intenção.
Falando-se de concorrência, é preciso que existam no mercado duas ou mais operadores de comércio.
Pois o perigo de concorrência desleal só se torna possível quando no mesmo mercado há duas ou mais empresas a exercer a sua actividade económica no mesmo ramo de actividade.
In casu, tal como sucede com a supra julgada improcedência do fundamento de marca notória, perante a matéria de facto tida por assente na primeira instância, não impugnada pela recorrente em sede do presente recurso, nenhum facto dela constante habilita-nos a reconhecer a presença da B Limited no mercado de Macau, muito menos a sua dedicação ao ramo de actividade envolvendo a transacção do tipo de produtos a que se destina a marcar a marca registanda.
Para além da inexistência dos factos assentes demonstrativos da sua presença no mercado, o facto de a marca N/... com validade até 29JUL2004, de que era titular a B Limited, se encontrar já caducada pelo não uso em Macau, se não puder constituir fundamento de per si suficiente para afastar a possibilidade da concorrência desleal por parte da A CO., é-nos sempre um argumento fortíssimo para reforçar o juízo conclusivo da ausência das actividades pela B Limited no mercado de Macau, o que afasta naturalmente a possibilidade da concorrência, muito menos a concorrência desleal.
Assim sendo, caem por terra todos os argumentos vertidos na tese da ora recorrente de que o pedido de registo da marca registanda visa à prática de concorrência desleal, ou pelo menos cria a possibilidade da concorrência desleal.
Resumindo e concluindo:
1. Não obstante a natureza híbrida do recurso judicial previsto no RJPI, dada a sua função indeclinável de corrigir eventuais erros com vista à reposição da justiça, algumas regras próprias do recurso jurisdicional regido no CPC, devem aplicar-se mutatis mudantis ao recurso judicial previsto no RJPI que embora tenha por objecto apenas uma decisão administrativa e não judicial.
2. Uma dessas regras é justamente o artº 590º/1 do CPC, à luz do qual se forem vários os fundamentos da acção ou da defesa, o tribunal de recurso conhece do fundamento em que a parte vencedora decaiu, desde que esta o requeira, mesmo a título subsidiário, na respectiva alegação, prevenindo a necessidade da sua apreciação.
3. Aplicando mutatis mutandis esta norma, se a parte contrária do procedimento administrativo tiver invocado, em sede da reclamação por ela deduzida, vários fundamentos e tiver saído vencedora na decisão administrativa que acabou por recusar o pedido de registo, a parte contrária reclamante pode, na resposta ao recurso judicial interposto para o Tribunal Judicial de Base pela requerente, da decisão que lhe recusou o pedido de registo da marca registanda, requerer ao Tribunal o conhecimento daquele fundamento em que decaiu na decisão do procedimento administrativo, prevenindo a necessidade da sua apreciação, nos termos prescritos no artº 590º/1 do CPC, por aplicação analógica.
4. Para recusar o pedido de registo de uma marca com fundamento na concorrência desleal, é preciso que se reconheça que a requerente pretende fazer concorrência desleal, ou que a concorrência desleal é possível independentemente da sua intenção.
5. Se perante a matéria de facto tida por assente, nenhum facto dela constante habilita o Tribunal a reconhecer a presença da uma empresa no mercado de Macau, muito menos a sua dedicação ao ramo de actividade envolvendo os produtos a que se destina a marcar a marca registanda, não há lugar à recusa do pedido de registo com fundamento na concorrência desleal.
Tudo visto, resta decidir.
III
Nos termos e fundamentos acima expostos, acordam em:
* Julgar procedente a arguição da nulidade da sentença, declarando nula a sentença na parte que omitiu a pronúncia sobre o fundamento da violação de autores e determinado a remessa dos autos à instância para novo julgamento nos termos acima consignados; e
* Julgar improcedente a restante parte do recurso.
Custas a final pelas na proporção do seu decaimento.
Registe e notifique.
RAEM 14NOV2019
Lai Kin Hong
Fong Man Chong
Ho Wai Neng
1 詳見中級法院第170/2016號裁判。
2 Marca notória é a marca que adquiriu um tal renome que se tornou geralmente conhecida por todos aqueles, produtores, comerciantes ou eventuais consumidores, que estão mais em contacto com o produto, e como tal reconhecida. (Cfr. Carlos Olavo, in ob. cit., p. 55)
3 參見該作者著《商法》第二冊,第180頁及第181頁。.
4 譬如Luís M. Couto Gonçalves,見《商標法》(Direito de Marcas), Almedina,2000年,第176頁及第177頁﹔Amério da Silva Carvalho,見商標法》(Direito de Marcas),Coimbra Editora,2004年,第530頁﹔Jorge Manuel Coutinho de Abreu,見《商法教程》(Curso de Direito Comercial),第一冊,第四版,第393頁。
5 中級法院第39/2014號裁判、第122/2016號裁判、等等。
6 Marca notória é a marca que adquiriu um tal renome que se tornou geralmente conhecida por todos aqueles, produtores, comerciantes ou eventuais consumidores, que estão mais em contacto com o produto, e como tal reconhecida. (Cfr. Carlos Olavo, in ob. cit., p. 55)
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Ac. 1011/2018-1