Processo n.º 199/2019
(Autos de recurso cível)
Data: 14/Novembro/2019
Assuntos: Ineptidão da petição inicial
Forma de processo se pedir a execução específica
Teoria da substanciação
Documento em poder de terceiro (artigo 455.º, n.º 2 e 458.º, do CPC)
Impugnação da matéria de facto
SUMÁRIO
Só há contradição quando se verifique ausência de um nexo lógico entre a causa de pedir e o pedido.
Se a questão suscitada pelos Réus pode conduzir à improcedência parcial do pedido, entra já na categoria de inviabilidade, e não tem a ver com a ineptidão da petição inicial.
Se a lei permite que os titulares activos citados para o processo de inventário recorram aos meios comuns para exigir o pagamento (artigo 966.º, n.º 2 do CPC), não vemos razões para que estes meios não pudessem ser usados por aqueles titulares que nunca foram citados para o processo de inventário.
Pretendendo o Autor obter a execução específica do contrato-promessa, a forma de processo ― acção declarativa de condenação com processo ordinário ― foi bem empregue, não merecendo a decisão qualquer reparo.
Vigora na lei processual civil a chamada teoria da substanciação, segundo a qual a causa de pedir é o próprio facto jurídico genético do direito, ou seja, o acontecimento concreto de que procede a pretensão do Autor.
Não obstante o Autor ter anteriormente intentado outra acção, também com fundamento no incumprimento do contrato-promessa, e que foi julgada improcedente, a verdade é que os factos concretos alegados pelo Autor na presente acção que consubstanciam o incumprimento dos Réus são diferentes, daí que não há violação do caso julgado.
Nos termos do artigo 455.º, n.º 2, ex vi artigo 458.º, do CPC, não obstante ser possível ordenar a entrega de documento que estava em poder de terceiro, a verdade é que esta diligência só devia ser deferida se os factos que a parte pretendia provar tivessem interesse para a decisão da causa, o que não é o caso.
Reapreciada e valorada a prova de acordo com o princípio da livre convicção, se não conseguir chegar à conclusão de que houve erro manifesto na apreciação da prova, o recurso tem que improceder.
O Relator,
________________
Tong Hio Fong
Processo n.º 199/2019
(Autos de recurso cível)
Data: 14/Novembro/2019
Recursos interlocutórios e Recurso da sentença final
Recorrentes:
- Z, Y (menor, representada pela mãe Z), X (menor, representado pela mãe Z) e W (Réus)
Recorrido:
- V (Autor)
Acordam os Juízes do Tribunal de Segunda Instância da RAEM:
I) RELATÓRIO
Inconformados com o despacho proferido em sede do despacho saneador que julgou improcedentes as excepções deduzidas pelos Réus Z, Y (menor, representada pela mãe Z), X (menor, representado pela mãe Z) e W, recorreram os mesmos jurisdicionalmente para este TSI, em cujas alegações formulou as seguintes conclusões:
“I. 被上訴人的原請求B不符合合同中所載,而被上訴人的請求B超出了合同中所載: “甲方聲明上單位連現有租約一併出售,每月租金為HKD$8,800.00,租期至2013年5月10日止。”這個負擔。所以,基於原請求B與訴因不符,而新請求B事實不可行,上級法院應廢止原審法院的決定,並裁定起訴狀不當,並產生其法定後果。
倘不如此認定,則:
II. 基於限定接受的特性,被上訴人倘有的債權必須反映在限定接受之中,方能要求繼受人負責。被上訴人倘要求U之繼承人(亦即全部上訴人)履行的話,應當在當時的清冊程序中參與及要求清償,又或在清冊程序已完結後,聲請進行補充分割及附加分割。據此,上級法院應廢止原審的決定,並裁定被上訴人採用的訴訟形式錯誤,並產生其法定後果。
倘不如此認定,則:
III. 前案的催告已在前案獲得審理,兩級法院都一致認為不因這些催告而導致上訴人遲延或不履行。以前的催告和本案的“新催告”具有同樣的法律特徵和後果,“新催告”並不能支持被上訴人的請求,不應視為新的訴因,所以上訴人認為這只是重覆提起訴訟。據此,上級法院應廢止原審決定,並裁定上訴人提出的已有確定裁判抗辯成立,並產生其法律後果。
倘不如此認定,則:
IV. 法律沒有規定部份被上訴人沒有正當性的後果,而被上訴人認為第二原告有正當性,而原審法院認為沒有,則只能終止案件,因為法律被上訴人才有權能去刻劃被上訴人的正當性。所以,被上訴人應在原審駁回後,提起上訴或再次起訴,而絕不是由法院決定何人作為被上訴人繼續訴訟。據此,上級法院應廢止原審決定,裁定第二原告無正當性而駁回整個起訴,並產生其法律後果。”
Ao recurso respondeu o Autor V, nos seguintes termos conclusivos:
“I. O recurso dos RR. carece totalmente de fundamento – falta de fundamento manifesto que os Recorrentes não podem ignorar -, e é manifestamente improcedente.
II. Não existe, nem nunca existiu, qualquer contradição entre o pedido formulado pelo A. sob a alínea b) da sua petição inicial e o estipulado na cláusula 8ª do contrato-promessa.
III. A causa de pedir nos presentes autos radica no incumprimento do contrato-promessa pelos RR., consubstanciado nos factos descritos nos artigos 28º a 46º da petição inicial, e o pedido formulado pelo A. a final da sua petição inicial sob a alínea b) não está em contradição com essa causa de pedir, sendo antes uma decorrência dela.
IV. É pacífico que a sentença pode condenar em menos do que se pediu.
V. De modo a ultrapassar definitivamente a (não) questão suscitada pelos RR., o A. alterou o dito pedido na réplica nos termos previstos na primeira parte do n.º 2 do artigo 217º do CPC.
VI. O pedido formulado pelo A. a final da sua petição inicial, sob a alínea b), com a redacção que lhe foi dada na réplica não “ultrapassa o conteúdo da vontade das partes expressa no contrato-promessa”, nem é materialmente impossível.
VII. Incumbia exclusivamente aos RR. tomar as diligências necessárias para garantir que o dito contrato de arrendamento cessava efectivamente os seus efeitos no dia 10 de Maio de 2013, sob pena de incumprirem a cláusula 8ª do contrato-promessa.
VIII. Não o tendo feito os RR., a excepção alegada, para além de infundada e inusitada, consubstancia abuso de direito porquanto assenta no incumprimento da cláusula 8ª do contrato-promessa pelos próprios RR.
IX. Ainda que se admitisse que o facto de a fracção permanecer arrendada pudesse constituir um óbice à procedência do pedido em apreço – no que não se concede -, o mesmo sempre seria parcialmente procedente, por nada obstar a que os RR. fossem condenados a entregar ao A. a dita fracção autónoma livre de ónus ou encargos que não o arrendamento referido na cláusula 8º do contrato-promessa.
X. Não há erro na forma de processo porquanto os pedidos formulados a final da petição inicial – típicos de uma acção tendente a obter a execução-específica de um contrato-promessa – jamais poderiam ser conhecidos no âmbito de um processo de inventário.
XI. O n.º 2, in fine, do artigo 966º do CPC, dispõe com extrema clareza que os AA., enquanto titulares activos de encargos da herança poderiam sempre exigir o cumprimento pelos meios comuns, mesmo que tivessem sido citados para o processo de inventário – e não foram.
XII. Atento o disposto no n.º 1 do artigo 406º do CC, por morte do promitente-vendedor marido foram transmitidos aos ora RR. todos os direitos e obrigações resultantes do contrato-promessa e inerentes à qualidade daquele.
XIII. A arguição em apreço é demonstrativa da má-fé dos RR. e consubstancia abuso de direito, porquanto só os RR. são responsáveis pelo facto de o contrato-promessa não ter sido relacionado no dito inventário, nem o A. citado para os seus termos.
XIV. Foram os RR., mormente a primeira R. que desempenhou as funções de cabeça de casal no dito inventário, que, violando flagrantemente os deveres que lhe eram impostos pelo artigo 978º do CPC, deliberadamente omitiram a existência do contrato-promessa, e nunca informaram o A. do óbito do promitente-vendedor marido.
XV. Vieram, ademais, os RR. deduzir uma excepção de caso julgado cuja falta de fundamento não podem ignorar, porquanto é evidente que as pretensões deduzidas pelos AA. numa e noutra acção procedem de factos distintos.
XVI. Os factos concretos vertidos nos artigos 28º a 46º da petição inicial que consubstanciam o incumprimento dos RR. que está na base dos pedidos formulados nos presentes autos, ocorridos entre 29 de Julho e 29 de Novembro de 2016 – i.e. após o trânsito em julgado da decisão proferida naquela primeira acção ordinária -, nada têm que ver com os alegados na primeira acção, ocorridos entre 15 e 30 de Novembro de 2012 e ora reproduzidos nos artigos 16º a 23º da petição inicial apenas para melhor enquadramento da cronologia dos factos aqui relevantes.
XVII. Em face do que se conclui que bem andou a Decisão Recorrida ao julgar improcedentes as três excepções em apreço, devendo, por isso, ser mantida nos exactos termos em que foi proferida.
XVIII. Depois de terem defendido na sua contestação que não eram os sujeitos da relação material controvertida tal como foi configurada pelos então AA. quem tinha legitimidade nos presentes autos, mas só o A. marido por só ele ter outorgado o contrato-promessa, sendo a A. mulher parte ilegítima, e depois de obterem (salvo o devido respeito, mal) vencimento na questão suscitada e, assim, verem sanada a irregularidade a seu ver cometida, vieram os RR., em sede de recurso, defender que a consequência legal da ilegitimidade desta deve ser a absolvição dos RR. da instância, porquanto estando o A. marido desacompanhado da A. mulher não estão nos autos os sujeitos da relação material controvertida tal como foi configurada pelo A.
XIX. Com interesse para a apreciação séria da questão suscitada, diga-se, apenas, que se a A. mulher não tinha legitimidade activa para ser parte nos presentes autos, essa irregularidade ficou sanada no Despacho Recorrido com a declaração da sua ilegitimidade e com a absolvição dos RR. da instância no que tange à A. mulher, conforme se extrai da última parte do n.º 2 do artigo 230º do Código de Processo Civil, impondo-se necessariamente o prosseguimento dos autos quanto ao A. marido.
XX. Concluindo-se, apenas, que também a questão em apreço é manifestamente improcedente.
Termos em que, deve ser negado provimento ao Recurso apresentado pelos RR. e, consequentemente, confirmar-se integralmente o douto Despacho Recorrido, nos exactos termos em que foi proferido.”
*
Durante a audiência de julgamento, os Réus pediram, respectivamente, que a testemunha T e o próprio Autor fossem notificados para vir juntar aos autos cópia extraída de uma ordem de caixa (“cashier order”) destinada ao pagamento do remanescente do preço, mas foram os pedidos indeferidos.
Inconformados, recorreram os Réus jurisdicionalmente para este TSI, formulando as seguintes conclusões alegatórias:
“就第一個聲請
I. 庭審中,T作證,陳述在其工作中,買方夫婦有來到律師樓,有向其交出過用作支付買賣餘款的票據,有接觸過該文件並作了影印,該影印在樓師樓。其後,買方之一的妻子S,表明她並沒有到律師樓,沒有發出過也未曾持有過用作支付買賣餘款的票據。
II. 《民事訴訟法典》第六條第三款規定: “法官就其依法可審理之事實,應依職權採取或命令採取一切必需措施,以查明事實真相及合理解決爭議。”當庭審律師向證人問及一份文件,而該文件是調查基礎中的直接證據,而另一位證人又表示沒有這文件,為了查明事實真相以及合理解決這矛盾,法院應依職權要求聲稱持有該文件的人向法院交出文件,該人應交出、聲明沒持有或聲明根本不存在這文件。這當然不妨礙當事人要求這措施。
III. 被告行使CPC458之權利,基於第三人持有該文件,要求T向法院交出。在聲請中,被告已指出,這證據措施是用作證明調查基礎16,19A及20點。在適時與否上,被告表明,自起訴到庭審,沒有人發現存在上述文件,只是到庭審T作證向原告律師回答問題是,被告才知道有這文件。
IV. 原告有權舉證,被告就有權反證。反證永遠是針對事實反證,使原告主張受到質疑,而不是針對某項證據去反證。要注意,原告就調查基礎第16、19A及20點早已提出了書證及人證,被告在此時反證,是因為嗣後知悉文件存在。
V. 更何況,只有透過被告要求第三人交出文件,或未能交出,或聲明文件不存在之下,被告才能使某事實不獲證,使法院相信原告並沒有作出調查基礎16,19A及20點的事實,所以被告採取的措施正確。
VI. 基於此,原審法官不批准被告的聲請,違反了CPC 6,458,450以及451之規定,上級法院應廢止原審決定,決定命令原告交出文件,並發回重審。
就第二個聲請
VII. 庭審中,T作證,陳述在其工作中,買方夫婦有來到律師樓,有向其交出過用作支付買賣餘款的票據,有接觸過該文件並作了影印,該影印在樓師樓。其後,買方之一的妻子S,表明她並沒有到律師樓,沒有發出過也未曾持有過用作支付買賣餘款的票據。
VIII. 《民事訴訟法典》第六條第三款規定: “法官就其依法可審理之事實,應依職權採取或命令採取一切必需措施,以查明事實真相及合理解決爭議。”當庭審律師向證人問及一份文件,而該文件是調查基礎中的直接證據,而另一位證人又表示沒有這文件,為了查明事實真相以及合理解決這矛盾,法院應依職權要求聲稱持有該文件的人向法院交出文件,該人應交出、聲明沒持有或聲明根本不存在這文件。這當然不妨礙當事人要求這措施。
IX. 被告行使CPC455之權利,基於原告持有該文件,要求原告向法院交出。在聲請中,被告已指出,這證據措施是用作證明調查基礎16,19A及20點。在適時與否上,被告表明,自起訴到庭審,沒有人發現存在上述文件,只是到庭審T作證向原告律師回答問題是,被告才知道有這文件,而按常人邏輯,原告必然持有這文件。
X. 原告有權舉證,被告就有權反證。反證永遠是針對事實反證,使原告主張受到質疑,而不是針對某項證據去反證。要注意,原告就調查基礎第16、19A及20點早已提出了書證及人證,被告在此時反證,是因為嗣後知悉文件存在。
XI. 更何況,只有透過被告要求原告交出文件,或未能交出,或聲明文件不存在之下,被告才能使某事實不獲證,使法院相信原告並沒有作出調查基礎16,19A及20點的事實,所以被告採取的措施正確。
XII. 基於此,原審法官不批准被告的聲請,違反了CC 339,CPC 6以及455以及之規定,上級法院應廢止原審決定,決定命令原告交出文件,並發回重審。”
Respondeu o Autor ao referido recurso interlocutório, nos seguintes termos conclusivos:
“I. Os Despachos Recorridos não merecem qualquer reparo.
II. Não existe contradição entre os depoimentos da segunda e da terceira testemunhas, já que a última declarou a este propósito não se recordar das exactas datas em que se deslocou, em 2016, ao escritório de advogados e notários privados referido na alínea J) dos factos assentes, nem da emissão da Ordem de Caixa por ser o marido a tratar destes assuntos.
III. O expediente utilizado pelos RR. não é, à luz do CPC, o meio próprio para fazer prova da alegada oposição directa entre dois testemunhos.
IV. Os RR. impugnaram genericamente os factos alegados nos autos pelo A., e não invocaram a excepção de não cumprimento do contrato ao abrigo do artigo 422º do CC, motivo pelo o saneador não contem qualquer facto cujo ónus da prova impenda sobre os mesmos.
V. O remanescente do preço referido na alínea H) dos factos assentes já se encontra depositado à ordem dos autos, pelo que o A. está, como sempre esteve, preparado para proceder seu ao pagamento.
VI. A Ordem de Caixa não tem a aptidão de servir de contraprova da matéria contida nos quesitos 16º, 19ºA e 20º.
VII. A Ordem de Caixa apenas seria apta a provar que o A. estava por essa via preparado para pagar o remanescente do preço (i.e. a última parte dos quesitos 16º e 20º), ónus que impende sobre o A. atento o artigo 335º do CC – e que este cumpriu atento o disposto no acórdão que decidiu a matéria de facto -, não sobre os RR.
VIII. Só o A. teria eventualmente interesse na junção da Ordem de Caixa aos autos.
IX. A não junção da Ordem de Caixa não prova que o A. não estava preparado para pagar o remanescente do preço, nem, tão-pouco, que a referida Ordem de Caixa não foi emitida.
X. Conforme resulta do n.º 2 do artigo 455º do CPC, aplicável em ambos os casos, no primeiro ex vi do artigo 459º, a notificação só é ordenada “se os factos que a parte pretende provar tiverem interesse para a decisão da causa”, o que não é o presente caso.
XI. O artigo 458º (e no artigo 460º) do CPC tem por requisito legal ser o (terceiro) notificado possuidor do documento.
XII. O documento em apreço não se encontra na posse da segunda testemunha, mas sim na posse do escritório de Advogados e Notários Privados referido na alínea J) dos factos assentes, não estando reunidos in casu os requisitos legais para a aplicação do artigo 458º do CPC.
XIII. Os Despachos Recorridos decidiram nos termos impostos pelos artigos 335º e 339º do CC e 450º e seguintes do CPC, em especial pelos seus artigos 455º e 458º, não merecendo qualquer reparo.
Termos em que, deve ser negado provimento aos Recursos apresentado pelos RR. e, consequentemente, confirmar-se integralmente os doutos Despachos Recorridos, nos exactos termos em que foram proferidos.”
*
Por sentença proferida pelo Tribunal recorrido, foi julgada procedente a acção.
Inconformados, interpuseram os Réus recurso jurisdicional para este TSI, tendo formulado as seguintes conclusões alegatórias:
“1. T說夫婦有出席,而夫婦之一R直接否認夫婦二人有出席,那麼審慎的法院萬萬不能認定夫婦有出席。
2. CPC 558規定,證據由法院自由評價,然而,法官之裁判必須依照審慎心證。而審慎心證下,定必應當採信R的證言。
3. 按上所述,重新評價T與R的證言後,上級法院應按訴訟法,認定原審法院違反CPC 558規定的審慎心證規定,並按尤其是CPC 599及629, 1, a)規定,當將調查基礎第16點及20點的獲證決定廢止,並認定為不獲證,並以新判決取代,產生依法應生之效果;
倘上級法院不認同以上,並認為重新審理該兩事實,則
4. 按CPC 629, 4上級法院應命令下放卷宗,由另一合議庭進行再審。
倘上級法院不認同以上,則
5. 原告對四名被告起訴,但在A項請求中,只要求第一、二、三被告作出給付,是不成立的,因為要滿足原告這個請求,須要全體繼承人作出給付。所以,應認定請求不成立,駁回起訴。據此,上級法院應廢止原審裁判,並裁定駁回訴訟。
倘上級法院不認同以上,則
6. 按同一理由,調查基礎13至19點第四被告沒有被催告。合同的主體沒有被催告下,不可能成立不履行,亦即不成立CC 820, 1中“不遵守”要求,所以請求不成立,應駁回起訴。據此,上級法院應廢止原審裁判,並裁定駁回訴訟。”
Ao recurso respondeu o Autor em cujas alegações formulou as seguintes conclusões:
“I. Face ao disposto no n.º 3 do artigo 589º do CPC, os RR. restringem o seu recurso a três questões: i) à alteração da resposta dada – “Provado” – pelo douto Tribunal a quo aos quesitos 16º e 20º da base instrutória, e, no que respeita à matéria de direito, ii) à improcedência do pedido principal que obteve vencimento no douto Acórdão, por ter sido formulado apenas contra a 1ª, 2ª e 3º RR. e, subsidiariamente, iii) por entenderem que não houve incumprimento definitivo da 4ª R. porque esta não foi interpelada pelo A. para o cumprimento do contrato-promessa.
II. O mui douto Acórdão Recorrido não merece qualquer reparo.
III. A 4ª R. foi absolvida pelo Acórdão Recorrido de todos os pedidos formulados contra si pelo A., pelo que não tem legitimidade para recorrer in casu à luz do disposto no n.º 1 do artigo 585º do CPC.
IV. Os RR. vêm recorrer, apenas, da resposta dada aos quesitos 16º e 20º da base instrutória, aceitando as demais, não obstante nunca terem alegado – com as consequências impostas pelo princípio da preclusão – quaisquer factos que lhes permitissem ilidir a presunção de culpa estatuída no artigo 788º do CC.
V. Conforme resulta de fls. 6 do douto Acórdão de 22 de Junho de 2018, o douto Tribunal a quo deu como provados os quesitos em crise não só com base no depoimento da 2ª e da 3ª testemunhas, como também da análise crítica das demais provas ali mencionadas.
VI. A lei não exige qualquer formalidade especial para a existência ou prova dos factos vertidos nos quesitos em crise, pelo que o princípio da livre apreciação das provas plasmado no artigo 558º do CPC vigora na sua plenitude no caso sub judice e, consequentemente, o douto Tribunal a quo tinha total liberdade para apreciar, como apreciou, as provas que lhe foram trazidas aos autos pelas partes de acordo com os princípios da livre apreciação das provas e da imediação.
VII. A decisão de facto recorrida não padece de qualquer erro manifesto na apreciação da prova, nem de deficiência, nem de contradição, nem de obscuridade e encerra todos os factos necessários para a boa decisão de facto, pelo que não merece alteração à luz do artigo 629º do CPC.
VIII. De resto, os Recorrentes também não lhe apontam tais vícios, limitando-se a discordar da convicção livremente formada pelo douto Tribunal a quo.
IX. É falso todo o vertido no paragrafo 5º das alegações dos RR., bem como o vertido na sua conclusão 1 quanto às afirmações ali imputadas à 3ª testemunha, sendo que as demais afirmações contidas nos parágrafos 4º a 15º não passam de meras deturpações dos depoimentos prestados e da verdade.
X. Não existe qualquer contradição entre os depoimentos das 2ª e 3ª testemunhas nomeadamente no que respeita aos quesitos em crise.
XI. As datas, horas e locais mencionados nos quesitos 16º e 20º da base instrutória resultam expressamente das cartas de interpelação juntas aos autos como Docs. 15 e 16 da petição inicial, cujo envio e conteúdo se encontra provado na resposta dada aos quesitos 11º a 15º e 17º a 19º-A da base instrutória.
XII. Andando o A. há mais de 6 anos a tentar por todas as vias, extrajudiciais e judicias, obter, em vão, dos RR. a celebração do contrato prometido, é seguro concluir, fazendo uso das regras da experiência, da lógica e da probabilidade, após a apreciação de toda essa factualidade e da actuação de reiterado incumprimento dos RR., que o A., como qualquer outro homem medianamente diligente, compareceu nos cartórios notariais que designou, nas datas e horas que designou, para a celebração da escritura de compra e venda e pagamento do remanescente do preço.
XIII. É, de resto, a comparência do A. em todas as datas designadas a seu pedido para a celebração do contrato-prometido e para pagamento do remanescente do preço, afirmando inclusivamente ter visto as cashier orders preparadas pelo A. para esse fim, que a 2ª testemunha confirma de forma peremptória na audiência de discussão e julgamento de acordo com as transcrições mencionadas nos parágrafos 15º a 29º das presentes alegações, fruto do contacto directo que, por força das suas funções, teve com a celebração do contrato-promessa e com as sucessivas tentativas frustradas de celebração do contrato prometido por falta de comparência dos vendedores.
XIV. É de lamentar a afirmação contida no parágrafo 12º das alegações de recurso, que pretende, de forma insidiosa, abalar a credibilidade e a idoneidade da 2ª testemunha, lançando mão de um argumento cuja falsidade resulta patente da resposta dada ao quesito 1º da base instrutória.
XV. A 3ª testemunha é mulher do A. e foi parte original dos presentes autos até ser declarada a sua ilegitimidade para tal a requerimento dos RR., por não ter participado na outorga do contrato-promessa.
XVI. Quando questionada, a instâncias do A., se acompanhou o seu marido em todas as datas que foram agendadas para a outorga da escritura pública de compra e venda, a 3ª testemunha respondeu que “sim”.
XVII. Já a instâncias dos RR., quando lhe foi perguntado insistentemente se em 1 de Setembro de 2016 se deslocou ao local agendado para a outorga da escritura pública de compra e venda da fracção em crise, a 3ª testemunha respondeu que “係, depois da acção fomos muitas vezes mas essa data eu não consigo recordar”; quando lhe foi perguntado se se tinha deslocado com o seu marido ao escritório de advogados em apreço com o intuito de instruir uma nova carta de interpelação para a outorga da escritura pública de compra e venda, respondeu que “Para que a parte cumprisse o contrato, o acordo”; quando lhe foi perguntado se foi no ano de 2016 que haviam interpelado os proprietários da fracção para o cumprimento do contrato prometido, respondeu “Em 2016”, “2016”; quando lhe foi perguntado se ela e Recorrido sabiam que tinham a obrigação de pagar o remanescente do preço aos proprietários da fracção, respondeu que “係”; quando a mesma foi questionada sobre a data de emissão do cashier order que seria utilizado como meio de pagamento do remanescente do preço, respondeu “Não ponderamos nenhuma acção. Entendemos que na data da escritura tivemos que pagar o dinheiro”; quando questionada pelos Recorrentes se o ora Recorrido, em 2016, estava preparado para pagar o remanescente do preço, respondeu que “係”; quando questionada sobre a razão que levou o Recorrido a preparar o pagamento do remanescente do preço, afirmou “Para ver quando é que os proprietários estão prestes a celebrar a escritura”; e, por fim, quando mais uma vez inquirida sobre o facto de ter acompanhado o seu marido nas datas e locais agendados em 2016 para a outorga da escritura pública de compra e venda, respondeu “Eu não consigo recordar se essa data é mesmo essa data, ou não, que referiu há pouco tenho que perguntar ao meu marido”.
XVIII. As referidas transcrições infirmam as conclusões do Recorrente quanto à decisão de facto impugnada.
XIX. Os Recorrentes limitam-se a colocar em causa a livre e prudente convicção formada pelo douto Tribunal a quo com base na análise critica que fez da prova produzida, bem como a credibilidade que o mesmo atribuiu aos depoimentos das 2ª e 3ª testemunhas como se nada mais tivesse contribuído para a formação dessa convicção.
XX. Pelo que terá necessariamente de concluir-se pela improcedência total do recurso dos RR. no que respeita à decisão sobre a matéria de facto.
XXI. Os RR. nunca invocaram em sede própria, com as consequências decorrentes do princípio da preclusão estatuído no artigo 409º, n.º 1 do CPC, qualquer facto que consubstanciasse a excepção de não cumprimento do contrato prevista no artigo 422º do CC por (alegada) falta do A. nas datas marcadas para a escritura pública ou por (alegada) recusa deste em nessas datas pagar o remanescente do preço, pelo que não podem vir fazê-lo ex novo em sede de recurso.
XXII. A totalidade do remanescente do preço devido foi depositada pelo A. à ordem dos presentes autos nos termos do disposto no n.º 6 do artigo 820º do CC, o que demonstra que o A. sempre esteve preparado para a pagar, tivessem os RR. comparecido nas datas mencionadas na resposta dada aos quesitos 16º e 20º da base instrutória para cumprir a contraprestação a que estão vinculados contratualmente.
XXIII. Em face do que se conclui que o mui douto Acórdão Recorrido deve ser confirmado por este Venerando Tribunal, na senda do que vem decidindo quanto ao conteúdo do artigo 558º do CPC.
XXIV. Relativamente à matéria de direito em apreço, o Recorrido acompanha, com a devida vénia, a fundamentação vertida no douto Acórdão Recorrido, do parágrafo 3º de fls. 586 a fls. 588 dos autos.
XXV. Resulta da resposta dada aos quesitos 11º e 17º da base instrutória e das respectivas cartas ali dadas por integralmente reproduzidas, que as mesmas foram enviadas para todos os RR. (incluindo a 4ª R.) e para o seu mandatário judicial, que certamente lhes deu conta desse recebimento, não só por correio registado como aviso de recepção, como também por correio simples, o qual, como se sabe, é directamente depositado na respectiva caixa de correio sem necessidade de qualquer acção do respectivo destinatário.
XXVI. Se a 4ª R. optou por não ir levantar à estação de correios algum dos exemplares enviados por correio registado com aviso de recepção, colocando-se, assim, em situação de não poder ser notificada também por essa via, só a si pode ser imputado e de nada lhe pode valer por consubstanciar abuso de direito nos termos do artigo 326º do CC.
XXVII. O facto é que a 4ª R. não tinha de ser interpelada pelo A. para o cumprimento do contrato-promessa para entrar em incumprimento definitivo relativamente às obrigações decorrentes do contrato-promessa em cuja posição de promitente-vendedora ingressou, conjuntamente com os restantes RR. por força do disposto no artigo 406º, n.º 1 do CC.
XXVIII. Porquanto à data em que tais cartas de interpelação foram enviadas já se tinha colocado em situação de incumprimento definitivo, ao ter transmitido, em sede de inventário obrigatório, os direitos que adquiriu sobre a Fracção Autónoma por morte do promitente vendedor seu pai, à sua mãe e irmãos, restantes RR., conforme resulta dos factos dados como assentes sob as alíneas A, B, C e D.
XXIX. O A. enviou as cartas de interpelação em apreço para todos os RR. e, assim, também para a 4ª R., única e exclusivamente para os efeitos previstos no seu pedido subsidiário formulado contra todos os herdeiros do promitente vendedor falecido – todos eles responsáveis pela devolução do sinal em dobro -, por todos (incluindo a 4ª R.) lhe terem sucedido naquela posição contratual não partilhada.
XXX. O pedido principal que obteve vencimento no douto Acórdão Recorrido só podia ter sido formulado contra a 1ª, a 2ª e o 3º RR., únicos herdeiros do promitente vendedor falecido que, à data das cartas de interpelação, se encontravam em situação de cumprir integralmente o contrato promessa, por serem os únicos proprietários inscritos da totalidade da Fracção Autónoma, e únicos sujeitos aos quais o douto Tribunal a quo se poderia substituir, como substituiu, na emissão da declaração de venda da mesma.
XXXI. Resulta da matéria de facto dada como provada que o A. de tudo fez, quer por via extrajudicial (enviando inúmeras cartas, ao longo de quatro anos, para o antecessor falecido dos RR. e para os RR., bem como para o seu mandatário judicial), quer por via judicial (interpondo, inclusivamente, duas acções judiciais para o efeito), para obter, em vão, dos RR. o cumprimento do contrato-promessa.
XXXII. Por outro lado, resulta patente dos factos provados que os RR. nunca responderam às cartas de interpelação, nunca manifestaram interesse em cumprir o contrato-promessa, nunca informaram o A. de que o promitente vendedor, respectivamente seu marido e pai, havia falecido, não relacionaram em sede de inventário a posição contratual do falecido de promitente vendedor da Fracção autónoma, partilharam nessa sede a Fracção Autónoma adjudicando-a apenas à 1ª R. e aos seus filhos menores, abdicando a 4ª R. de todos os seus direitos sobre a mesma, não compareceram, sem dar qualquer justificação, a todas as datas agendadas pelo A. para a celebração do contrato-prometido e não instauraram, sem dar qualquer justificação, acção de autorização para venda da quota parte da Fracção Autónoma dos menores.
XXXIII. Destarte, sempre terá de concluir-se, como no douto Acórdão Recorrido, que os RR. nunca quiseram cumprir o contrato-promessa e que o incumpriram definitivamente por culpa exclusivamente sua, a qual, de resto, se presume nos termos do artigo 788º do CC.
XXXIV. É, assim, de má-fé e no mais evidente abuso de direito – que não lhes pode aproveitar atento o disposto no artigo 326º do CC -, que os RR. vêm tentar fazer uso de factos que eles próprios provocaram para tentar alterar o que foi decidido no douto Acórdão Recorrido em obediência aos mais elementares princípios de justiça.
XXXV. Em face do que espera o A., muito respeitosamente, ver confirmado por este Venerando Tribunal o douto Acórdão Recorrido, em face da justeza e da viabilidade do seu pedido e da manifesta improcedência do recurso dos RR.
Termos em que, deve ser negado provimento ao Recurso apresentado pelos RR. e, consequentemente, confirmar-se integralmente o douto Acórdão Recorrido, nos exactos termos em que foi proferido.”
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Corridos os vistos, cumpre decidir.
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II) FUNDAMENTAÇÃO
Foram interpostos pelos Réus três recursos, sendo dois interlocutórios e um da sentença final.
Começamos pelo primeiro interposto contra a decisão proferida no despacho saneador que julgou improcedentes as excepções dilatórias suscitadas pelos Réus.
Vejamos por partes.
Dizem os Réus recorrentes que a petição inicial é inepta com fundamento na contradição entre o pedido e a causa de pedir.
A nosso ver, sem mínima razão.
Pede o Autor ao Tribunal a emissão de sentença que produza os efeitos de declaração negocial de venda, por parte da 1ª, 2ª e 3º Réus, da fracção autónoma reportada nos autos e a condenação dos mesmos Réus a entregar ao Autor a dita fracção, livre de ónus e encargos, e devoluta.
Alegam os Réus que a segunda parte do pedido formulado pelo Autor estaria em contradição com o estipulado na cláusula 8ª do contrato-promessa.
Observa Viriato de Lima1 que “A contradição a que se refere a norma é a formal, isto é, de carácter lógico, excluída a contradição de substância, que entra já na categoria de inviabilidade.”
Efectivamente, só há contradição neste âmbito quando se verifique ausência de um nexo lógico entre a causa de pedir e o pedido.
No caso vertente, alega o Autor que houve incumprimento do contrato-promessa por parte da 1ª Ré e seu falecido marido, pedindo, em consequência, a execução específica do contrato-promessa.
Sem necessidade de delongas considerações, não vislumbramos a alegada contradição, sendo que o pedido formulado pelo Autor constitui decorrência normal e lógica daquela causa de pedir. O problema suscitado pelos Réus poderia conduzir apenas à inviabilidade ou improcedência parcial do pedido, e não a ineptidão como se requer.
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Alegam ainda os Réus que houve erro na forma do processo, defendendo que o Autor devia ter exigido o cumprimento do contrato-promessa no âmbito dos autos de inventário obrigatório que correram termos no TJB, e não por via da acção cível.
A nosso ver, também não lhes assistir qualquer razão.
É bom de ver que nos próprios autos de inventário, a cabeça-de-casal, ora 1ª Ré, nunca revelou ao Tribunal onde correram os autos de inventário que o inventariado tinha aquele crédito para com o Autor.
Se a 1ª Ré tivesse prestado informações ao Tribunal, o Autor teria sido citado para intervir nos autos de inventário, e se tivesse resolvido o problema lá, certamente não teria intentado a presente acção cível em separado.
Mas não tendo sido resolvido o problema no inventário, a lei não impede que o interessado intente acção própria com vista a obter a tutela efectiva dos seus direitos, como é o caso.
Prevê o n.º 2 do artigo 966.º do CPC que “Os titulares activos de encargos da herança são admitidos a intervir nas questões relativas à verificação e satisfação dos seus direitos, podendo reclamá-los, mesmo que estes não tenham sido relacionados pelo cabeça-de-casal, até à realização da conferência de interessados destinada à aprovação do passivo; se não o fizerem, podem, porém, exigir o pagamento pelos meios comuns, mesmo que tenham sido citados para o processo.” – sublinhado nosso
Ora bem, se a norma permite que os titulares activos citados para o processo de inventário recorram aos meios comuns para exigir o pagamento, não vemos razões para que estes meios não pudessem ser usados por aqueles titulares que nunca foram citados para o processo de inventário.
Em boa verdade, pretendendo o Autor obter a execução específica do contrato-promessa, a forma de processo ― acção declarativa de condenação com processo ordinário ― foi bem empregue, não merecendo a decisão qualquer reparo.
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Alegam ainda os Réus que está em causa a violação do caso julgado, na medida em que a acção agora intentada pelo Autor é idêntica à acção ordinária que correu termos no Processo n.º CV3-12-0100-CAO.
Mais uma vez, sem qualquer razão os Réus.
No que respeita à causa de pedir, tem-se entendido que na lei processual civil vigora a chamada teoria da substanciação, segundo a qual a causa de pedir é o próprio facto jurídico genético do direito, ou seja, o acontecimento concreto de que procede a pretensão do Autor2.
Em boa verdade, não obstante o Autor ter anteriormente intentado outra acção, também com fundamento no incumprimento do contrato-promessa, a qual foi julgada improcedente, a verdade é que os factos concretos alegados pelo Autor na presente acção que consubstanciam o incumprimento dos Réus são diferentes.
Mais precisamente, na acção tramitada no âmbito do Processo n.º CV3-12-0100-CAO, reporta-se ao incumprimento ocorrido entre 15 e 30 de Novembro de 2012, ao passo que na presente acção refere-se ao incumprimento dos Réus em relação ao período compreendido entre 29 de Julho e 29 de Novembro de 2016.
Improcede, pois, o recurso nesta parte.
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Aduzem ainda os Réus que, sendo julgada a 2ª Autora parte ilegítima, devem todos os Réus ser absolvidos da instância.
Ora bem, tendo a 2ª Autora sido julgada parte ilegítima, a questão de ilegitimidade activa ficou sanada, pelo que a acção terá que prosseguir pela e contra as restantes partes processuais.
Seguramente, só haverá lugar a absolvição dos Réus quando todos os Autores ou alguns dos Réus forem partes ilegítimas, o que não é o caso.
Isto posto, há-de negar provimento ao primeiro recurso interlocutório interposto pelos Réus.
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Durante a audiência de julgamento, os Réus pediram, respectivamente, que a testemunha T, funcionária do escritório de advogados e notários privados, e o próprio Autor, fossem notificados para vir juntar aos autos cópia extraída de uma ordem de caixa (“cashier order”) destinada ao pagamento do remanescente do preço da fracção referida nos autos, para contraprova da matéria de facto vertida nos quesitos 16º, 19º-A e 20º da base instrutória, mas foram os pedidos indeferidos.
Ora bem, é verdade que segundo o depoimento da referida testemunha, a mesma é funcionária do escritório de advogados e notários privados, e no exercício das suas funções, teve acesso a documentos destinados a instruir a escritura pública.
Contudo, como resulta da acta de fls. 537, os Réus bem sabiam que o documento solicitado se encontrava arquivado no escritório de advogados e notários privados, assim, não se vislumbrava que a testemunha (enquanto funcionária do escritório) ou o próprio Autor tinham a posse daquele documento.
Não obstante ser possível ordenar a entrega de documento que estava em poder de terceiro, a verdade é que esta diligência só devia ser deferida se os factos que a parte pretendia provar tivessem interesse para a decisão da causa (artigo 455.º, n.º 2, ex vi artigo 458.º, do CPC).
No caso em apreço, dizem os Réus que pretendiam fazer contraprova da matéria vertida nos quesitos 16º, 19º-A e 20º da base instrutória.
Dispõem aqueles quesitos o seguinte:
Quesito 16º - “Os AA., por seu turno, compareceram no dia 1 de Setembro de 2016, pelas 15:00, no supra referido Cartório, sito em Macau, na Avenida da ......, n.º ..., Edifício ......, ...º andar, a fim de outorgarem a escritura pública de compra e venda dos 2/3 da Fracção Autónoma pertencentes à 1ª R. e pagarem 2/3 do remanescente do preço?”
Quesito 19º-A – “Mais fixaram os AA. à 1ª R. o prazo máximo de 10 dias, para comprovar a propositura da competente acção judicial tendente a obter a autorização para alienação da quota-parte da fracção autónoma registada em nome dos RR. menores?”
Quesito 20º - “O A. marido, por seu turno, compareceu no dia 29 de Novembro de 2016, pelas 15:00, no supra referido Cartório, a fim de outorgar a escritura pública de compra e venda dos 2/3 da Fracção Autónoma pertencentes à 1ª R. e pagar 2/3 do remanescente do preço?”
Em boa verdade, o documento que pretendia obter apenas seria apto a provar que o Autor estava preparado para pagar o remanescente do preço, não sendo prova suficiente para demonstrar ou contradizer a matéria vertida nos quesitos supra descritos, nomeadamente que o A. não compareceu no Cartório com vista a outorgar a escritura pública, ou a ordem de caixa não foi emitida, ou não foi fixado prazo para a 1ª Ré comprovar a propositura da competente acção judicial tendente a obter a autorização para alienação da quota-parte da fracção autónoma registada em nome dos Réus menores.
Nestes termos, somos a concluir que a diligência requerida não tinha utilidade nem interesse para a decisão da causa, nenhuma censura merece, assim, a decisão recorrida.
Nega-se provimento ao segundo recurso interlocutório.
***
Realizado o julgamento, ficou provada a seguinte matéria de facto:
Os RR. são os únicos herdeiros de U (U) respectivamente sua viúva e filhos, que faleceu em 11 de Abril de 2013, no estado de casado com a 1ª R. no regime da comunhão de adquiridos (cfr. fls. 36 e seguintes certidão judicial extraída dos respectivos autos de inventário obrigatório que correram termos pelo 1º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Base de Macau sob o n.º CV1-13-0055-CIV, com sentença transitada em julgado em 11 de Junho de 2015, doravante abreviadamente designados por “Autos de Inventário Obrigatório”, se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais). (alínea A) dos factos assentes)
No âmbito dos Autos de Inventário Obrigatório – no qual foram partilhados bens no valor total de MOP$17.926.819,32 – foi adjudicada à 1ª, 2ª e 3º RR., na proporção de 2/3 para a 1ª R. e de 1/6 para cada um dos dois RR. menores, a fracção autónoma designada por “ASR/C”, do rés-do-chão “AS”, para comércio, do prédio sito em Macau, com os n.ºs ... a ... da Avenida ......, ... a ... da Avenida do ...... e ... a ... da Rua ......, descrito na Conservatória do Registo Predial de Macau sob o nº 2****, a folhas 380 do Livro B175M . (alínea B) dos factos assentes)
A Fracção Autónoma encontra actualmente registada na mencionada Conservatória a favor dos 1ª, 2ª e 3º RR., na referida proporção, desde 1 de Julho de 2015, sob a inscrição nº 29**** do Livro G. (alínea C) dos factos assentes)
Encontra-se igualmente inscrita a seu favor na matriz predial urbana sob o nº 7****. (alínea D) dos factos assentes)
A Fracção Autónoma foi adquirida por U, no estado de casado no regime da comunhão de adquiridos com a 1ª R., em 29 de Julho de 2002, tendo então sido registada a seu favor na mencionada Conservatória sob a inscrição n.º 5**** do Livro G. (alínea E) dos factos assentes)
Por contrato-promessa de compra e venda celebrado por escrito em 16 de Maio de 2012, a 1ª R. e o seu falecido marido U (doravante também abreviadamente designados por “promitentes-vendedores”) prometeram vender ao A. marido, que já então era casado com a A. mulher no regime da comunhão de adquiridos, que lhes prometeu comprar, a fracção autónoma acima identificada (cfr. contrato-promessa de compra e venda de fls. 94). (alínea F) dos factos assentes)
O preço acordado pelas partes para a compra e venda foi de HKD$9.480.000,00 (nove milhões, quatrocentos e oitenta mil dólares de Hong Kong) equivalentes a MOP$9.778.620,00 (nove milhões, setecentas e setenta e oito mil, seiscentas e vinte patacas). (alínea F-1) dos factos assentes)
Conforme ficou estipulado no contrato-promessa, o A. marido pagou à 1ª R. a título de sinal e ao seu falecido marido U, que receberam no momento da assinatura do referido contrato-promessa, a quantia de HKD$3.000,000,00 (três milhões de dólares de Hong Kong). (alínea G) dos factos assentes)
O remanescente do preço, no momento de HKD$6.480.000,00 (seis milhões, quatrocentos e oitenta mil dólares de Hong Kong), seria pago aos promitentes-vendedores, de uma só vez, com a outorga da respectiva escritura pública de compra e venda. (alínea H) dos factos assentes)
Ficou ainda acordado no contrato-promessa que caso os promitentes-vendedores violassem o contrato, o promitente-comprador, aqui A. marido, poderia exigir o dobro do sinal pagou ou recorrer à execução específica. (alínea I) dos factos assentes)
Mais ficou estipulado no contrato-promessa que a outorga da escritura pública de compra e venda teria lugar no cartório privado associado ao escritório ###### – Advogados e Notários Privados, até ao 15 de Novembro de 2012. (alínea J) dos factos assentes)
Podendo ser excepcionalmente adiada até ao dia 30 de Novembro de 2012, caso os promitentes-vendedores não conseguissem proceder à realização das formalidades necessárias até àquela primeira data. (alínea K) dos factos assentes)
Os AA. recorreram às vias judiciais, mediante a instauração, em 5 de Dezembro de 2012, da Acção Ordinária n.º CV3-12-0100-CAO, tendente a obter a execução específica do dito contrato. (alínea L) dos factos assentes)
A Acção Ordinária foi julgada improcedente, bem como foi julgado improcedente o pedido reconvencional de resolução do contrato promessa formulado pelos promitentes-vendedores, ali RR., por sentença proferida em 5 de Junho de 2015 e confirmada pelo Tribunal de Segunda Instância em 8 de Junho de 2016, em decisão transitada em julgado em 27 de Junho de 2016 (cfr. fls. 55 a 87, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzidos para todos os efeitos legais). (alínea M) dos factos assentes)
Os RR. procederam ao envio de carta datada de 25 de Novembro de 2012 para o escritório de advogados supra referido, carta essa junta a fls. 36 e cujo teor aqui se reproduz para os legais e devidos efeitos. (alínea O) dos factos assentes)
U U usou também os nomes de U e U1. (resposta ao quesito 1º da base instrutória)
Conforme acordado pelas partes, a outorga da escritura pública de compra e venda foi marcada para o dia 15 de Novembro de 2012, pelas 14 horas e 30 minutos, no cartório privado associado ao escritório ###### – Advogados e Notários Privados. (resposta ao quesito 2º da base instrutória)
Os promitentes-vendedores recusaram, na data, hora e local previamente agendados, a outorga da escritura pública. (resposta ao quesito 3º da base instrutória)
Tendo a outorga a escritura pública de compra e venda sido remarcada para o dia 30 de Novembro de 2012, pelas 14 horas 30 minutos, no mesmo local. (resposta ao quesito 5º da base instrutória)
Por carta datada de 25 de Novembro de 2012, enviada para o escritório de advogados supra referido, os promitentes-vendedores comunicaram aos AA., nomeadamente, que o promitente-vendedor marido não poderia comparecer para a outorga da escritura pública. (resposta ao quesito 6º da base instrutória)
Os AA., enviaram, através dos seus mandatários, aos promitentes-vendedores, e estes receberam, no dia 28 de Novembro de 2012, uma carta registada interpelando-os a cumprir o contrato-promessa por meio de escritura pública a celebrar no dia 30 de Novembro de 2012 pelas 14 horas e 30 minutos, no mesmo local, mais comunicando, que, caso não comparecessem o Cartório, data e hora indicados, tal equivaleria a incumprimento definitivo do referido contrato promessa. (resposta ao quesito 7º da base instrutória)
Os promitentes-vendedores não compareceram no Cartório, na data e hora acordados para a outorga da escritura pública. (resposta ao quesito 8º da base instrutória)
No decurso dos autos de Acção Ordinária, os ora AA., por manterem o interesse na celebração do contrato prometido, voltaram a interpelar os promitentes-vendedores para a celebração da respectiva escritura de compra e venda. (resposta ao quesito 9º da base instrutória)
Os promitentes-vendedores (e/ou os sucessores de U) não manifestaram qualquer intenção de cumprir o contrato promessa, nem, tão pouco, informaram os AA. do falecimento do promitente-vendedor marido. (resposta ao quesito 10º da base instrutória)
Os ora AA. enviaram, através dos seus mandatários judiciais, aos ora RR. e ao seu mandatário judicial, por carta simples, correio registado e correio normal, no dia 29 de Julho de 2016, uma carta, interpelando-os para o cumprimento de contrato-promessa (cfr. carta de interpelação, de fls. 155 a 159 que se dá por integralmente reproduzida para todos os efeitos legais). (resposta ao quesito 11º da base instrutória)
Na carta de interpelação de 29 de Julho de 2016, os AA. concederam à 1ª R. o prazo de 30 dias a contar dessa mesma data, para proceder à transmissão aos AA. dos 2/3 de Fracção Autónoma inscritos em seu nome, por meio de escritura pública a celebrar no cartório notarial associado ao escritório ###### – Advogados e Notários Privados, em data e hora a marcar pela mesma, com, pelo menos, dois dias de antecedência. (resposta ao quesito 12º da base instrutória)
Mais comunicaram os AA. à 1ª R. por meio da carta de interpelação de 29 de Julho de 2016, que caso a 1ª R. não procedesse à marcação da escritura dentro do referido prazo, ficaria devidamente interpelada, por aquele meio, para celebração da mesma no dia 1 de Setembro de 2016, pelas 15:00 horas, no supra referido cartório, sito em Macau, na Avenida da ......, nº ..., edifício ......, ...º andar, devendo remeter ao referido cartório, até ao dia 22 de Agosto de 2016, toda a documentação e informações necessárias à preparação da referida escritura, nomeadamente a relativa à sua identificação. (resposta ao quesito 13º da base instrutória)
Mais interpelaram os AA. a 1ª R., na qualidade de representante legal dos seus dois filhos menores, aqui 2ª e 3º RR., por meio da carta de interpelação de 29 de Julho de 2016, para, no prazo de 40 dias a contar da data da dita carta, instaurar acção judicial para obter a autorização para a alienação dos 2/6 da Fracção Autónoma pertencentes aos referidos menores, sob pena de, não o fazendo, os AA. recorrerem, designadamente, às vias judicias. (resposta ao quesito 14º da base instrutória)
A 1ª R. não procedeu à marcação da escritura pública no prazo de 30 dias que lhe foi concedido, não remeteu ao referido cartório os documentos necessários à feitura da dita escritura até ao dia 22 de Agosto de 2016, não compareceu no dito cartório no dia 1 de Setembro de 2016, pelas 15:00 horas, para a celebração da escritura de compra e venda dos 2/3 a Fracção Autónoma inscritos em seu nome, nem, que seja do conhecimento dos AA., instaurou, no prazo de 40 dias que lhe foi concedido para o efeito – i.e. até 7 de Setembro de 2016 – a acção judicial tendente a obter a autorização para a alienação dos 2/6 da Fracção Autónoma inscritos a favor dos seus dois filhos menores. (resposta ao quesito 15º da base instrutória)
Os AA., por seu turno, compareceram no dia 1 de Setembro de 2016, pelas 15:00 horas, no supra referido Cartório, sito em Macau, na Avenida da ......, nº ..., edifício ......, ...º andar, a fim de outorgarem a escritura pública de compra e venda dos 2/3 da Fracção Autónoma pertencentes à 1ª R. e pagaram 2/3 do remanescente do preço. (resposta ao quesito 16º da base instrutória)
Decorridos mais de 2 meses sobre esta última data sem que os RR. tivessem estabelecido qualquer contacto com os AA., vieram os AA. em 10 de Novembro de 2016, por intermédio dos seus mandatários judiciais, interpelar novamente, os RR. para cumprimento do contrato-promessa (cfr. carta de interpelação de fls. 177 a 181, que se dá por integralmente reproduzida para todos os efeitos legais doravante também designada por “última carta de interpelação”). (resposta ao quesito 17º da base instrutória)
Através da última carta de interpelação, foi a 1ª R. interpelada para o cumprimento aos AA. dos 2/3 da Fracção Autónoma que lhe pertencem, por meio de escritura pública a celebrar no cartório notarial da Sra. Dra. Q, sito em Macau, na Avenida da ......, nº..., Edifício ......, ...º andar, em data a determinar pela 1ª R., dentro do prazo máximo de 15 dias a contar de 10 de Novembro de 2016. (resposta ao quesito 18º da base instrutória)
Mais foi a 1ª R. informada que caso não procedesse à marcação da escritura dentro do referido prazo, ficaria devidamente interpelada, por aquele meio, para a celebração da mencionada escritura no dia 29 de Novembro de 2016, pelas 15:00 horas, no supra referida Cartório, devendo, para tanto, remeter ao mesmo, até ao dia 24 de Novembro de 2016, toda a documentação e informações necessárias à preparação da referida escritura, nomeadamente a relativa à sua identificação. (resposta ao quesito 19º da base instrutória)
Mais fixaram os AA. à 1ª R. o prazo máximo de 10 dias, para comprovar a propositura da acção judicial tendente a obter a autorização para alienação da quota-parte da fracção autónoma registada em nomes dos RR. (resposta ao quesito 19º-A da base instrutória)
O A. marido, por seu turno, compareceu no dia 29 de Novembro de 2016, pelas 15:00 horas, no supra referido Cartório, a fim de outorgar a escritura pública de compra e venda dos 2/3 da Fracção Autónoma pertencentes à 1ª R. e pagar 2/3 do remanescente do preço. (resposta ao quesito 20º da base instrutória)
Até à presente data os RR. não deram qualquer resposta à última carta de interpelação, nem estabeleceram qualquer contacto com os AA. (resposta ao quesito 21º da base instrutória)
Os Réus insurgem-se contra a sentença final.
Vejamos.
Antes de mais, conforme resulta da sentença recorrida, a 4ª Ré foi absolvida do pedido, pelo que, esta deixa de ter legitimidade para recorrer, ao abrigo do n.º 1 do artigo 585.º do CPC.
A 1ª, 2ª e 3º Réus vêm impugnar a decisão sobre a matéria de facto provada nos quesitos 16º e 20º da base instrutória, com fundamento na suposta existência de erro na apreciação das provas produzidas em sede dos presentes autos, mormente no tocante ao depoimento das testemunhas do Autor ouvidas em audiência de julgamento, a Sr.ª T, funcionária do escritório de advogados e notários privados, e a Sr.ª R, esposa do Autor.
O Tribunal recorrido respondeu aos referidos quesitos da seguinte forma:
Quesito 16º - “Os AA., por seu turno, compareceram no dia 1 de Setembro de 2016, pelas 15:00, no supra referido Cartório, sito em Macau, na Avenida da ......, n.º ..., Edifício ......, ...º andar, a fim de outorgarem a escritura pública de compra e venda dos 2/3 da Fracção Autónoma pertencentes à 1ª R. e pagarem 2/3 do remanescente do preço?”, e a resposta foi: “Provado”.
Quesito 20º - “O A. marido, por seu turno, compareceu no dia 29 de Novembro de 2016, pelas 15:00, no supra referido Cartório, a fim de outorgar a escritura pública de compra e venda dos 2/3 da Fracção Autónoma pertencentes à 1ª R. e pagar 2/3 do remanescente do preço?”, e a resposta foi igualmente: “Provado”.
Ora bem, dispõe o artigo 629.º, n.º 1, alínea a) do CPC que a decisão do tribunal de primeira instância sobre a matéria de facto pode ser alterada pelo Tribunal de Segunda Instância se, entre outros casos, do processo constarem todos os elementos de prova que serviram de base à decisão sobre os pontos da matéria de facto em causa ou se, tendo ocorrido gravação dos depoimentos prestados, tiver sido impugnada a decisão com base neles proferida.
Estatui-se nos termos do artigo 558.º do CPC que:
“1. O tribunal aprecia livremente as provas, decidindo os juízes segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto.
2. Mas quando a lei exija, para a existência ou prova do facto jurídico, qualquer formalidade especial, não pode esta ser dispensada.”
Como se referiu no Acórdão deste TSI, de 20.9.2012, no Processo n.º 551/2012: “…se o colectivo da 1ª instância, fez a análise de todos os dados e se, perante eventual dúvida, de que aliás se fez eco na explanação dos fundamentos da convicção, atingiu um determinado resultado, só perante uma evidência é que o tribunal superior poderia fazer inflectir o sentido da prova. E mesmo assim, em presença dos requisitos de ordem adjectiva plasmados no art. 599.º, n.º 1 e 2 do CPC.”
Também se decidiu no Acórdão deste TSI, de 28.5.2015, no Processo n.º 332/2015 que:“A primeira instância formou a sua convicção com base num conjunto de elementos, entre os quais a prova testemunhal produzida, e o tribunal “ad quem”, salvo erro grosseiro e visível que logo detecte na análise da prova, não deve interferir, sob pena de se transformar a instância de recurso, numa nova instância de prova. É por isso, de resto, que a decisão de facto só pode ser modificada nos casos previstos no art. 629.º do CPC. E é por tudo isto que também dizemos que o tribunal de recurso não pode censurar a relevância e a credibilidade que, no quadro da imediação e da livre apreciação das provas, o tribunal recorrido atribuiu ao depoimento de testemunhas a cuja inquirição procedeu.”
A convicção do Tribunal alicerça-se no conjunto de provas produzidas em audiência, sendo mais comuns as provas testemunhal e documental, competindo ao julgador atribuir o valor probatório que melhor entender, nada impedindo que se confira maior relevância ou valor a determinadas provas em detrimento de outras, salvo excepções previstas na lei.
Não raras vezes, acontece que determinada versão factual seja sustentada pelo depoimento de algumas testemunhas, mas contrariada pelo depoimento de outras. Neste caso, cabe ao tribunal valorá-las segundo a sua íntima convicção.
Ademais, não estando em causa prova plena, todos os meios de prova têm idêntico valor, cometendo-se ao julgador a liberdade da sua valoração e decidir segundo a sua prudente convicção acerca dos factos controvertidos, em função das regras da lógica e da experiência comum.
Assim sendo, estando no âmbito da livre valoração e convicção do julgador, a alteração das respostas dadas pelo Tribunal recorrido à matéria de facto só será viável se conseguir lograr a existência de erro grosseiro e manifesto na apreciação das provas.
Analisada a prova produzida na primeira instância, nomeadamente atendendo à prova documental junta aos autos e ao depoimento das testemunhas, entendemos que não somos capazes de dar razão aos Réus recorrentes.
Em boa verdade, de acordo com o depoimento da testemunha T, esta relatou que tinha ajudado o Autor a preparar os documentos com vista a outorga da escritura pública, tendo o Autor comparecido no Cartório nas datas e local marcados para a escritura, ao passo que os Réus, apesar de lhes ter enviado notificações para o mesmo efeito, não compareceram no local.
Por outro lado, quanto à testemunha R, esposa do Autor, decorre inicialmente alguma confusão do seu depoimento, mas acabando posteriormente por dizer que não se lembrou muito bem dos factos, pois o seu marido melhor saberia por que todas as formalidades foram tratadas por ele mesmo.
Conforme resulta da decisão sobre a matéria de facto, o Tribunal Colectivo deu como provados os quesitos em causa com a seguinte fundamentação: “Atentas as várias cartas de interpelação remetidas pelo Autor à 1ª Ré e o seu mandatário com marcação das datas para a outorga da escritura pública, complementado com o depoimento das 2ª e 3ª testemunhas da Autora que deram conta de que em todas as marcações o promitente-comprador compareceu mas os promitentes-vendedores não compareceram no cartório indicado, mais considerando o facto de até a actualidade (com duas acções interpostas pelo Autor para esse efeito) não foi feita a outorga da escritura pública, levamos a acreditar os factos alegados pelo Autor, de que a 1ª Ré faltou às novas marcações feitas após o findo da acção anterior e não estabeleceu contacto com o Autor. Nestes termos, deram-se por provados os factos dos quesitos 15º, 16º, 20º e 21º.”
Seguramente, não é difícil concluir que o Tribunal recorrido deu como provados aqueles quesitos com base não só no depoimento daquelas duas testemunhas, mas também em outros elementos probatórios. No fundo, os Réus recorrentes pretendem simplesmente sindicar a íntima convicção do Tribunal recorrido formada a partir da apreciação e valoração global das provas produzidas nos autos.
A nosso ver, não se vislumbra qualquer erro grosseiro e manifesto por parte do Tribunal recorrido na análise da prova nem na apreciação da matéria de facto controvertida, antes pelo contrário, os dados trazidos aos autos permitem a este Tribunal chegar à mesma conclusão a que o Tribunal a quo chegou, pelo que improcedem as razões dos Réus recorrentes nesta parte.
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Entendem ainda os Réus recorrentes que a acção intentada pelo Autor devia ser julgada improcedente por que o pedido principal de execução específica do contrato–promessa foi apenas formulado contra a 1ª, 2ª e 3º Réus, faltando o Autor de deduzir o mesmo pedido contra a 4ª Ré. Por outro lado, invoca que a 4ª Ré nunca foi interpelada, devendo, assim, a acção ser julgada improcedente.
Começamos por esta última parte.
A nosso ver, não é correcto dizer que a 4ª Ré não foi interpelada para celebrar a escritura pública de compra e venda.
Conforme resulta da decisão sobre a matéria de facto, foi dado como provado que o Autor enviou, através de seus mandatários judiciais, cartas aos Réus, incluindo a 4ª Ré, e seu mandatário judicial, nos dias 29.7.2016 e 10.11.2016, interpelando-os para o cumprimento do contrato-promessa. Esta parte da matéria consta da resposta aos quesitos 11º e 17º da base instrutória, mas não foi objecto de impugnação, pelo que improcedem as razões dos Réus recorrentes nesta parte.
Aliás, mesmo que não tivesse feita a interpelação à 4ª Ré, também não constituiria qualquer omissão por parte do credor, porquanto esta Ré não tinha que ser interpelada pelo Autor para o cumprimento do contrato-promessa.
Dispõe o n.º 1 do artigo 406.º do CC: “Os direitos e obrigações resultantes do contrato-promessa, que não sejam exclusivamente pessoais, transmitem-se aos sucessores das partes.”
No caso presente, à data em que as cartas de interpelação foram enviadas aos Réus, o bem imóvel objecto do contrato-promessa já havia sido transmitido, no âmbito do processo de inventário, à 1ª, 2ª e 3º Réus, ou seja, encontrando-se o referido bem imóvel registado em nome daqueles indivíduos.
Na medida em que o Autor pretendia obter a execução específica do contrato-promessa de imóvel cuja propriedade passou a pertencer à 1ª, 2ª e 3º Réus, o pedido principal só podia ser formulado contra aqueles, e não, também, contra a 4ª Ré.
Aqui chegados, entendemos que a decisão de condenação não merece qualquer reparo, termos em que deve negar-se provimento ao recurso interposto pela 1ª, 2ª e 3º Réus.
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III) DECISÃO
Face ao exposto, acordam em:
- negar provimento aos recursos interlocutórios interpostos pelos Réus Z, Y, X e W;
- negar provimento ao recurso final interposto pelos Réus Z, Y e X;
- Julgar a 4ª Ré W não ter legitimidade para recorrer da sentença final, ao abrigo do n.º 1 do artigo 585.º do CPC.
Custas dos recursos interlocutórios pelos Réus Z, Y, X e W, em partes iguais.
Custas do recurso final pelos Réus Z, Y e X, em partes iguais.
Custas pela 4ª Ré W, por falta de legitimidade recursal.
Registe e notifique.
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RAEM, 14 de Novembro de 2019
(Relator)
Tong Hio Fong
(Primeiro Juiz-Adjunto)
Lai Kin Hong
(Segundo Juiz-Adjunto)
Fong Man Chong
1 Manual de Direito Processual Civil, Acção Declarativa Comum, 3.ª Edição, 2018, pág. 156
2 Viriato de Lima, obra citada, pág. 151
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Recurso Cível 199/2019 Página 1