Processo n.º 1140/2019 Data do acórdão: 2019-11-21
Assuntos:
– revogação da suspensão da execução da pena
– art.o 54.o, n.o 1, alínea b), do Código Penal
S U M Á R I O
A postura de o arguido não ter honrado a sua promessa de não cometimento de novo crime feita ao tribunal autor da anterior decisão de prorrogação da suspensão da execução da pena de prisão faz com que já não se possa acreditar, nesta vez, aquando da apreciação do seu recurso interposto da decisão judicial revogatória da suspensão da execução da pena por causa da prática, por ele, de um novo crime doloso, que as finalidades que estavam na base da suspensão pudessem, por meio dela, ser alcançadas, pelo que é de manter essa decisão revogatória nos termos do art.o 54.o, n.o 1, alínea b), do Código Penal.
O relator,
Chan Kuong Seng
Processo n.º 1140/2019
(Recurso em processo penal)
Recorrente: A (A)
ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA
REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU
I – RELATÓRIO
Inconformado com o despacho judicial proferido a fls. 325 a 326 do ora subjacente Processo Comum Colectivo n.o CR5-15-0055-PCC do 5.o Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base (TJB) que lhe revogou, nos citados termos do art.o 54.o, n.o 1, alínea b), do Código Penal (CP), a suspensão da execução da pena de prisão, veio o arguido condenado A recorrer para este Tribunal de Segunda Instância (TSI), assacando a esse despacho a violação do disposto nos art.os 53.o e 54.o do CP, por opinar ele pela inexistência, até agora, de prova suficientemente comprovativa da impossibilidade de a suspensão da pena e de a punição aplicada surtirem os seus efeitos, para rogar, com fundamento no seu já sentido arrependimento, a revogação da dita decisão revogatória da suspensão da execução da pena (cfr. o teor da motivação de fls. 340 a 342v dos presentes autos correspondentes).
Ao recurso, respondeu o Ministério Público (a fls. 344 a 345v dos autos), no sentido de improcedência da argumentação do recorrente.
Subido o recurso, emitiu a Digna Procuradora-Adjunta parecer (a fls. 355 a 356), pugnando pela manutenção do julgado.
Feito o exame preliminar e corridos os vistos, cumpre decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICA
Com pertinência à decisão, é de coligir dos autos os seguintes dados:
– Por acórdão proferido a fls. 204 a 209 do subjacente Processo Comum Colectivo então n.o CR1-15-0096-PCC, actualmente n.o CR5-15-0055-PCC do TJB, transitado em julgado em 13 de Janeiro de 2016, o arguido A ficou condenado como co-autor de um crime consumado de usura para jogo com aceitação ou exigência de documento para servir de garantia, p. e p. pelo art.o 14.o da Lei n.o 8/96/M, na pena de dois anos e três meses de prisão, suspensa na execução por três anos, com interdição, por três anos, de entrada nos casinos de Macau;
– Por sentença do Processo Sumário n.o CR2-16-0175-PSM do TJB, transitada em julgado em 21 de Novembro de 2016, o mesmo arguido ora recorrente ficou condenado pela prática, em 27 de Outubro de 2016, de um crime consumado de desobediência simples, p. e p. conjugadamente pelo art.o 12.o, alínea 2), da Lei n.o 10/2012 e pelo art.o 312.o, n.o 1, alínea a), do CP, na pena de cinco meses de prisão, suspensa na execução por dois anos (cfr. o teor da sentença ora certificado a fls. 255 a 258v);
– Em face disso, o acima referido período de três anos de suspensão da execução da pena de dois anos e três meses de prisão do arguido veio a ser prorrogado por um ano, por decisão judicial tomada a fl. 271 logo após a audição, em 12 de Janeiro de 2017, do próprio arguido, o qual prometeu ao Tribunal que não iria voltar a cometer crime (cfr. o teor das declarações dele registadas na acta de fls. 270 e seguintes);
– Entretanto, por sentença do Processo Comum Singular n.o CR3-18-0374-PCS do TJB, transitada em julgado em 4 de Julho de 2019, o mesmo arguido ficou condenado pela prática, em 23 de Setembro de 2018, de um mesmo crime consumado de desobediência simples, na pena de quatro meses de prisão efectiva (cfr. o teor da respectiva sentença a que se referem as fls. 303 a 305v e a certidão do respectivo trânsito em julgado de fl. 316);
– Ante essa nova condenação penal do arguido, foi proferida (a fls. 325 a 326) a decisão judicial, ora recorrida, de revogação, nos aí citados termos do art.o 54.o, n.o 1, alínea b), do CP, da suspensão da execução da pena de dois anos e três meses de prisão do arguido, logo após a audição deste em 25 de Setembro de 2019.
III – FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
De antemão, cabe notar que mesmo em processo penal, e com excepção da matéria de conhecimento oficioso, ao tribunal de recurso cumpre resolver apenas as questões material e concretamente alegadas na motivação do recurso e devidamente delimitadas nas conclusões da mesma, e já não responder a toda e qualquer razão aduzida pela parte recorrente para sustentar a procedência das suas questões colocadas (nesse sentido, cfr., de entre muitos outros, os acórdãos do TSI, de 7 de Dezembro de 2000 no Processo n.o 130/2000, de 3 de Maio de 2001 no Processo n.o 18/2001, e de 17 de Maio de 2001 no Processo n.o 63/2001).
No caso, perante os elementos acima coligidos dos autos, é de verificar que mesmo após a anterior decisão da prorrogação do respectivo período de suspensão da execução da pena, o arguido recorrente voltou a cometer, durante o período de suspensão da execução da pena de prisão então imposta no presente processo penal, novo crime doloso (aliás, um mesmo tipo legal de crime de desobediência simples) pelo qual ficou também condenado, a despeito de ele ter prometido pessoalmente em 12 de Janeiro de 2017 ao Tribunal autor daquela anterior decisão de prorrogação do período da suspensão que não iria cometer novo crime.
Segundo o art.o 54.o, n.o 1, alínea b), do CP, a suspensão da execução da pena de prisão é revogada sempre que, no decurso dela, o condenado cometer crime pelo qual venha a ser condenado, e revelar que as finalidades que estavam na base da suspensão não puderam, por meio dela, ser alcançadas.
Assim, tal postura do arguido de não honrar a sua promessa perante o Tribunal faz com que já não se possa acreditar, nesta vez, que as finalidades que estavam na base da suspensão pudessem, por meio da suspensão, ser alcançadas. Nota-se que essa conclusão é um juízo de valor formado com base na apreciação dos elementos constantes dos autos.
Há, pois, que manter a decisão recorrida, proferida sensatamente nos termos do art.º 54.º, n.º 1, alínea b), do CP, sem mais indagação por ociosa.
IV – DECISÃO
Nos termos expostos, acordam em julgar não provido o recurso, com custas pelo recorrente, com duas UC de taxa de justiça e mil e oitocentas patacas de honorários da sua Ex.ma Defensora Oficiosa.
Macau, 21 de Novembro de 2019.
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Chan Kuong Seng
(Relator)
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Tam Hio Wa
(Primeira Juíza-Adjunta)
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Chou Mou Pan
(Segundo Juiz-Adjunto)
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