Processo nº 1039/2019
(Autos de Recurso Civil e Laboral)
Data: 21 de Novembro de 2019
Recorrente: B (Autor)
Recorrida: Yyy Yyy Yyy, S.A. (Ré)
ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
I - RELATÓRIO
Por sentença de 28/06/2019, julgou-se a acção parcialmente procedente e, em consequência, condenou-se a Ré Yyy Yyy Yyy, S.A. a pagar ao Autor B a quantia de MOP$85,119.84, acrescida de juros moratórios à taxa legal.
Dessa decisão vem recorrer o Autor, alegando, em sede de conclusões, os seguintes:
1. Versa o presente recurso sobre a parte da douta Sentença na qual foi julgada parcialmente improcedente ao Recorrente a atribuição de uma compensação devida pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal (isto é, pelo trabalho prestado no sétimo dia após seis dias de trabalho consecutivo em cada período de sete dias de trabalho) na medida de um dia de salário em dobro;
2. Porém, ao condenar a Recorrida a pagar ao Recorrente apenas o equivalente a um dia de trabalho (em singelo) pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal, o Tribunal a quo procedeu a uma não correcta aplicação do disposto na al. a) do n.º 6 do artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril, pelo que a decisão deve ser julgada nula e substituída por outra que condene a Ré em conformidade com o disposto na referida Lei Laboral;
3. Com efeito, resulta do referido preceito que o trabalho prestado em dia de descanso semanal deverá ser remunerado pelo dobro do salário normal, entendido enquanto duas vezes a retribuição normal, por cada dia de descanso semanal prestado;
4. Do mesmo modo, ao condenar a Recorrida a pagar ao Recorrente apenas e tão-só um dia de salário em singelo, o Tribunal a quo desviou-se da interpretação que tem vindo a ser seguida pelo Tribunal de Segunda Instância sobre a mesma questão de direito, no sentido de entender que a compensação do trabalho prestado em dia de descanso semanal deverá ser feita em respeito à seguinte fórmula: (salário diário X n.º de dias de descanso não gozados X 2);
5. De onde, resultando que o Recorrente prestou trabalho durante todos os dias de descanso semanal durante toda a relação de trabalho, deve a Recorrida ser condenada a pagar ao Recorrente a quantia de MOP$123,085.00 a título do dobro do salário - e não só apenas de MOP$61,542.50, correspondente a um dia de salário em singelo conforme resulta da decisão ora posta em crise - acrescida de juros até efectivo e integral pagamento.
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A Ré respondeu à motivação do recurso do Autor, nos termos constantes a fls. 98 a 101, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, pugnando pela improcedência do mesmo.
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Foram colhidos os vistos legais.
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II - FACTOS
Vêm provados os seguintes factos pelo Tribunal a quo:
- Entre 11/09/1999 a 21/07/2003, o Autor esteve ao serviço da XXXX, prestando funções de “guarda de segurança”, enquanto trabalhador não residente. (A)
- Por força do Despacho n.º 01949/IMO/SEF/2003, do Senhor Secretário para a Economia e Finanças da RAEM, de 17/07/2003, foi autorizada a transferência das autorizações concedidas para a contratação do Autor (e dos demais 279 trabalhadores não residentes) da XXXX para a Ré (YYY), com efeitos a partir de 22/07/2003. (B)
- Entre 22/07/2003 a 31/01/2009 o Autor esteve ao serviço da Ré (YYY), prestando funções de “guarda de segurança”, enquanto trabalhador não residente. (C)
- Durante o tempo que prestou trabalho, o Autor auferiu da Ré um salário de base de HK$7.500,00 por cada mês de trabalho prestado. (D)
- Durante o tempo que prestou trabalho, o Autor sempre respeitou as ordens e instruções emanadas pela Ré. (1º)
- Durante o tempo que prestou trabalho, o Autor sempre respeitou os períodos, horários e postos de trabalho fixados pela Ré. (2º)
- Entre 22/07/2003 a 31/12/2008, por ordem da Ré (YYY), o Autor estava obrigado a comparecer no seu local de trabalho, devidamente uniformizado, com, pelo menos, 30 minutos de antecedência relativamente ao início de cada turno. (3º)
- Durante o referido período de tempo, tinha lugar um briefing (leia-se, uma reunião) entre o Team Leader (leia-se, Chefe de turno) e os “guardas de segurança”, na qual eram inspecionados os uniformes de cada um dos guardas e distribuído o trabalho para o referido turno, mediante a indicação do seu concreto posto dentro do Casino. (4º)
- Durante o referido período de tempo, o Autor sempre compareceu no início de cada turno com a antecedência de, pelo menos, 30 minutos, tendo aí permanecido às ordens e às instruções dos seus superiores hierárquicos. (8º)
- O Autor nunca se ausentou dos locais de reunião que antecediam o início de cada um dos seus respectivos turnos. (9º)
- A Ré nunca pagou ao Autor qualquer quantia (normal e/ou adicional) pelo período de tempo que antecedia o início de cada um dos turnos. (10º)
- Entre 22/07/2003 a 31/12/2008, o Autor prestou a sua actividade de segurança para a Ré (YYY) num regime de turnos rotativos de sete dias de trabalho consecutivos. (11º)
- Após a prestação pelo Autor de trabalho durante sete dias de trabalho consecutivos, seguia-se um período de vinte e quatro horas de descanso, em regra no oitavo dia, que antecedia a mudança de turno. (12º)
- Entre 22/07/2003 a 31/12/2008, a Ré (YYY) não fixou ao Autor um período de descanso de vinte e quatro horas consecutivas, em cada período de sete dias. (13º)
- Durante o referido período de tempo, o Autor prestou trabalho para a Ré (YYY) em cada um dos sétimos dias que se seguiram a seis dias de trabalho consecutivos, sem prejuízo de 24 dias de férias anuais por cada ano civil e dispensas de trabalho não remuneradas, nomeadamente entre 6/4/2004 e 5/5/2004 (30 dias),entre 6/9/2005 e 27/9/2005 (22 dias), entre 16/8/2006 e 19/9/2006 (35 dias), entre 8/9/2007 e 29/9/2007 (22 dias) e entre 4/9/2008 e 28/9/2008 (25 dias). (14º)
- A Ré pagou sempre ao Autor o salário correspondente aos dias de descanso semanal. (15º)
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III – FUNDAMENTAÇÃO
O recurso do Autor não deixará de se julgar provido face à jurisprudência unânime deste TSI nos processos congéneres em que a Ré também é parte.
Assim, a fórmula para a compensação do descanso semanal é: dias não gozados X salário diário X 2, para além do salário-base já recebido.
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Tudo visto, resta decidir.
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IV – DECISÃO
Pelas apontadas razões, acordam em conceder provimento ao recurso do Autor, em consequência, revogar a sentença na parte respectiva e condenar a Ré a pagar ao Autor, a título da compensação pelo não gozo dos dias de descanso semanal, a quantia de MOP$123,085.00, com juros de mora à taxa legal a partir da data do presente aresto (cfr. Ac. do TUI, de 02/03/2011, Proc. nº 69/2010).
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Custas pela Ré.
Notifique e D.N..
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RAEM, aos 21 de Novembro de 2019.
(Relator)
Ho Wai Neng
(Primeiro Juiz-Adjunto)
José Cândido de Pinho
(Segundo Juiz-Adjunto)
Tong Hio Fong
(Vencido quanto à fórmula adoptada na compensação do trabalho prestado em dias de descanso semanal, por entender que, sendo o trabalho prestado nesses dias pago pelo “dobro da retribuição” (cfr. se refere na alínea a) do nº 6 do artigo 17º do DL nº 24/89/M), este “dobro” seria constituído por um dia de salário normal (ao qual o trabalhador teria sempre direito mesmo que não prestasse trabalho) mais um dia de acréscimo. Provado que o Autor já recebeu da Ré ora sua entidade patronal o salário diário em singelo, teria apenas mais um dia de salário pelo trabalho prestado em dias de descanso semanal, sob pena de o Autor, salvo o devido respeito, incluindo o dia de descanso compensatório previsto no n.º 4 do artigo 17.º a que tem direito, estar a receber um acréscimo salarial correspondente ao “triplo” da retribuição normal.
Pelo que não merece, a meu ver, reparo a fórmula adoptada pelo Tribunal recorrido para cálculo da compensação do trabalho prestado em dias de descanso semanal.)
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