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Processo nº 558/2018
(Autos de Recurso Contencioso)

Data: 20 de Fevereiro de 2020

ASSUNTO:
- Caducidade da concessão do terreno
- Falta de fundamentação
- Abuso de direito
- Princípios da imparcialidade, da igualdade, da justiça e da boa-fé

SUMÁRIO:
- O termo do prazo da concessão provisória sem esta ter sido convertida em definitiva determina inevitavelmente a declaração da caducidade da concessão, que consiste numa actividade vinculada da Administração.
- A fundamentação é um conceito relativo que depende do tipo legal do acto, dos seus termos e das circunstâncias em que foi proferido, devendo dar a conhecer ao seu destinatário as razões de facto e de direito em que se baseou o seu autor para decidir nesse sentido e não noutro, não se podendo abstrair da situação específica daquele e da sua possibilidade, face às circunstâncias pessoais concretas, de se aperceber ou de apreender as referidas razões, mormente que intervém no procedimento administrativo impulsionando o itinerário cognoscitivo da autoridade decidente.
- O abuso de direito, para vingar no recurso contencioso, impõe a prova de um exercício ilícito de direito, implica a demonstração de que o titular do direito o exerceu em termos clamorosamente ofensivos da justiça e que excedeu manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito (art.334º, do CC). E não preenche estes requisitos a actuação administrativa que se limita, como no caso vertente, a cumprir as cláusulas do contrato e a lei e a acatar as normas imperativas de direito público sobre o regime legal das concessões.
- Os princípios da imparcialidade, da igualdade, da justiça e da boa-fé não são operantes nas actividades administrativas vinculadas.
O Relator,
Ho Wai Neng

Processo nº 558/2018
(Autos de Recurso Contencioso)

Data: 20 de Fevereiro de 2020
Recorrente: Sociedade de Investimento Imobiliário Man Keng Van, S.A.
Entidade Recorrida: O Chefe do Executivo da RAEM

ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:

I – Relatório
Sociedade de Investimento Imobiliário Man Keng Van, S.A., melhor identificada nos autos, vem interpor o presente Recurso Contencioso contra o despacho do Chefe do Executivo de 03/05/2018, que declarou a caducidade da concessão do terreno com a área de 3,131m2, designado por lote 6 da Zona C do empreendimento denominado “Fecho da Baía da Praia Grande”, situado na península de Macau, concluíndo que:
1. O acto ora recorrido é o Despacho do Chefe do Executivo, de 3 de Maio de 2018, tornado público pelo Despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º 12/2018, publicado no Boletim Oficial n.º 23, II Série, de 16 de Maio de 2018, que declarou a caducicade da concessão a favor da Recorrente do terreno com a área de 3.131m2, designado por lote 6 da Zona C do empreendimento denominado "Fecho da Baía da Praia Grande", situado na península de Macau, descrito da Conservatória do Registo Predial sob o n.º 22517, a fls. 169, do Livro B49K, que ficou inscrito a favor da Recorrente sob o n.º 26670F;
2. Encontrando-se o direito ao arrendamento onerado com hipoteca e consignação de rendimentos para garantia do pagamento de HKD320,000,000.00 (trezentos e vinte milhões de dólares de Hong Kong a favor do Banco Industrial e Comercial da China (Macau), S.A. inscritas, respectivamente, sob os n.ºs 143459C e 33437F;
3. Por escritura outorgada na Direcção dos Serviços de Finanças de 30 de Julho de 1991 foram concedidos por arrendamento à Sociedade de Empreendimento Nam Van, S.A. ("Nam Van") vários lotes de terreno nas zonas B, B, C e D do empreendimento denominado «Fecho da Baía da Praia Grande», conforme consta dos Despachos n.º 73/SATOP/92, publicado no Boletim Oficial n.º 27, de 6/7/1992, e n.º 71/SATOP/92, publicado no Boletim Oficial n.º 33, de 18/8/1992;
4. Na data da concessão, todos os lotes de terreno que constituem as actuais zonas A, B, C e D estavam submersos, ficando como encargos especiais da Nam Van proceder à ccnstn.ção dos aterros e das numerosas e complexas infraestruturas;
5. A Nam Van a quem foram entregues os terrenos, a conquistar ao mar, por 25 anos, construiu todas as dispendiosas infraestruturas, nomeadamente, os aterros das zonas A, C e D necessários ao empreendimento, os dois lagos artificiais com uma ilha ecolóqica, sistemas de reciclagem de águas, diques, muralhas, estações elevatórias, redes e drenagers de águas residuais e pluviais, redes de distribuição de água e ligação à rede qeral, redes de distribuição de energia eléctrica, arruamentos, zonas pedonais, parques de estacionamento para uso público e do Governo;
6. Foi a Nam Van que procedeu ao desvio de todos os esgotos que eram directamente despejados na zona da Praia Grande e que eram há muito conhecidos como um foco de vários e gravíssimos problemas ambientais, o que foi feito através de um sistema de emissários ligados a estações de bombagem;
7. As infraestruturas que mencionadas nos contratos de concessão dos lotes Fecho da Baía da Praia Grande e nas respectivas revisões, só existem porque a Nam Van e as actuais concessionárias, a que foram transmitidos todos os direitos resultantes das concessões, os construíram e mantiveram, suportando todos os custos;
8. Em 23 de Julho e 25 de Novembro de 1999, foram realizadas as recepções provisórias das Infraestruturas, respectivamente, da Zona B e das Zonas C, D e dos Lagos 17 de Fevereiro de 2000, foram entregues à Câmara Municipal de Macau Provisória as obras de infraestruturas realizadas, que só tornaram existentes a partir do momento das recepções provisórias;
9. A Nam Van utilizou os primeiros 10 anos do prazo da concessão a cumprir os encargos especiais previstos nos contratos de concessão, a construir os aterros e todas as infraestruturas para as Zonas A, B, C e D;
10. Em 1 de Novembro de 1994, a Nam Van requereu ao Governador de Macau autorização para a transmissão onerosa, a favor da ora Recorrente, dos direitos resultantes da concessão por arrendamento do lote supra identificador justificando o pedido com o facto de dominar o capital social da sociedade e de assegurar o desenvolvimento conjunto dos empreendimentos a desenvolver em cada um dos lotes da Zona C;
11. Doutro passo, o Presidente do Conselho de Administração da Nam Van, Dr. Stanley Ho, recebeu, em 13 de Novembro de 2002, um pedido do Governo para que as subsidiárias da Nam Van, Sociedade de Investimento Imobiliário Hang Keng Van, S.A.R.L., Sociedade de Investimento Imobiliário U Keng Van, S.A.R.L., Sociedade de Investimento Imobiliário Iok Keng Van, S.A.R.L. e Sociedade de Investimento Imobiliário Hei Keng Van, S.A.R.L., desistissem das concessões dos lotes B/b, B/f, B/g e B/1 da Zona B, cada um com uma área de 6.480m2, e com uma área total de 25.920m2, em prol do desenvolvimento económico da Região Administrativa Especial de Macau ("RAEM");
12. Para viabilizar a construção das unidades hoteleiras e casinos das novas concessionárias e subconcessionárias de jogos de fortuna ou azar e outros jogos em casino, nomeadamente os Hotéis e Casinos Wynn Macau e MGM Macau, sem que daí resultassem quaisquer contrapartidas ou mais-valias financeiras pela perda dos lotes de terreno com a dita área total de 25.920m2 e com 898.774m2 de área de construção em zona prime;
13. Como contrapartida pelas desistências, o Governo garantiu à Nam Van e às suas subsidiárias, incluindo a Recorrente, que iria rever os planos de pormenor das Zonas C e D, para nelas incluir as áreas dos quatro lotes que reverteram para a RAEM;
14. As desistências foram negociadas e aceites pelos Despachos do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.ºs 33/2004, 34/2004, 35/2004 e 36/2004 de 1 de Abril, publicados no B.O. n.º 14, II Série, de 14 de Abril de 2004;
15. Embora os contratos de desistência, anexo aos Despachos do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º 33/2004 a 36/2004, de 1 de Abril, contenham, no número 4 do artigo primeiro, a obrigação de o Governo conceder um ou mais terrenos localizados nas zonas "C" ou "D" do Plano da Baía da Praia Grande ou em zona com uma área de construção e capacidade "aedificandi" equivalente, a verdade é que, até esta data, não se concretizou o compromisso assumido formalmente pelo Governo;
16. Por Despacho do STOP n.º 83/2001, de 5 de Setembro de 2001, foi autorizada a transmissão onerosa, a favor da ora Recorrente, dos direitos resultantes da concessão por arrendamento do lote supra identificado;
17. A transmissão dos direitos resultantes da concessão só ocorreu em 2001, por ter sido apenas nesse ano que os aterros e as demais infra-estruturas da Zona C exibiram condições de solidez e segurança da pavimentação dos aterros, conforme consta do auto de recepção definitiva, de 4 de Dezembro de 2001, como tal os lotes da Zona C só puderam ser aproveitados e desenvolvidos depois das recepções definitivas de todas as infraestruturas;
18. O contrato de transmissão a favor da Recorrente estabelece que a concessão por arrendamento é válida até 31 de Julho de 2016 e que o aproveitamento do terreno deve ocorrer no prazo global de 72 meses, contado a partir de 18 de Agosto de 1999, ou seja quando ainda não se sabia a data em que seria realizada a recepção definitiva;
19. Por despacho do STOP, de 23 de Janeiro de 2006, exarado na Informação 10/DPU/2006, de 5 de Janeiro de 2006, foi aprovado o Estudo de Alinhamento e Condicionamentos Urbanísticos e o Estudo preliminar de arquitectura relativo ao aproveitamento dos lotes C5 e C6 do Fecho da Baía da Praia Grande, tendo o Director da DSSOPT escrito uma nota, dando instruções ao Departamento de Planeamento Urbanístico ("DPU") para elaborar uma nova Planta de Alinhamento Oficial ("PAO");
20. Na Informação n.º 10/DPU/2006, que mereceu a aprovação do STOP, foram definidas, no âmbito do projecto de desenvolvimento imobiliário conjunto dos lotes C5 e C6, uma área bruta de 68.313,50m2 (de acordo com o estudo preliminar apresentado pelas concessionárias e registado com a referência T-7827) e uma altura de 113,50m;
21. A PAO, elaborada em 9 de Janeiro de 2006, prevê a demarcação da área de intervenção para o desenvolvimento do projecto imobiliário nos lotes C5 e C6, com uma cota altimétrica máxima permitida de 113,50m e uma altura máxima permitida do podium de 10,60m;
22. A PAO menciona que o projecto está dispensado do cumprimento da Portaria n.º 69/91/M de 18/04/91, ou seja, permitindo a dita altura de 113,50 metros;
23. Em 13 de Outubro de 2006, as concessionárias dos lotes C5 e C6 apresentaram um requerimento de alteração do projecto de arquitectura, registado com a referência T-6856, que foi considerado passível de aprovação pela DSSOPT, como consta do ofício n.º 411/DURDEP/2007, de 15 de Março de 2007;
24. Em 16 de Maio de 2007, foi elaborada uma tabela, pela DSSOPT, da qual constam as áreas brutas de construção para os lotes C5 e C6, que refere uma área bruta de construção para habitação de 57,948m2 (sem contar com a área de 2,470m2 destinada ao R/C) e uma área bruta de construção de 8,046m2;
25. Por requerimento conjunto de 1 de Junho de 2007 (registado com a referência T-3900), as concessionárias requereram a prorrogação do prazo de aproveitamento dos lotes C5 e C6;
26. Em resposta, a DSSOPT notificou as duas concessionárias, pelo Ofício n.º 289/2351 e 2316/DSODEP/2007, de 9 de Julho de 2007, de que os projectos apresentados eram passíveis de aprovação, mas que o procedimento administrativo ficava suspenso provisoriamente até que fosse aprovado o novo plano de intervenção urbanística das Zonas C e D do Fecho da Baía da Praia Grande;
27. De onde se conclui que, somente após aprovação desse plano de reordenamento das Zonas C e D do Fecho da Baía da Praia Grande, teria lugar a revisão dos contratos de concessão dos lotes C5 e C6, bem como a aprovação dos pedidos de prorrogação dos prazos de aproveitamento;
28. Em 29 de Janeiro de 2008, foi manuscrita uma informação da Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes ("DSSOPT"), para o assunto ser acompanhado pelo Eng.º Mário Ornelas, que refere que o Governo está a negociar com a Nam Van a definição das ABC' s (áreas brutas de construção) da Nam Van, e que o mercado financeiro, com influência da América, está fraco e que o custo de construção subiu 45%;
29. Compromisso reafirmado na comunicação de serviço interno, de 29 de Julho de 2008, onde é referido que a revisão dos contratos de concessão dos lotes C5 e C6 será realizada após a aprovação do plano urbanístico para a Zona C e D do Fecho da Baía da Praia Grande;
30. As concessionárias dos lotes C5 e C6, para além de muitos requerimentos para emissão de certidões, solicitaram, várias vezes, informações sobre o andamento dos processos;
31. Note-se que os pedidos formulados pelas concessionárias para a obtenção de licenças de construção dizem respeito à aprovação dada pela DSSOPT no Ofício n.º 411/DURDEP/2007, de 15 de Março de 2007, que tal como o Ofício n.º 289/2351 e 2316/DSODEP/2007, de 9 de Julho de 2007, reconheceram os direitos das duas concessionárias à revisão dos contratos de concessão e à aprovação dos projectos de desenvolvimento imobiliário dos lotes C5 e C6;
32. Acresce que, nas comunicações de serviço interno, de 19 de Fevereiro de 2013, de 15 de Maio de 2014 e de 1 de Abril de 2015, subscritas pelo Eng.º Mário Ornelas da DSSOPT, é referido que as concessionárias dos lotes C5 e C6 pretendem desenvolver o projecto imobiliário conjunto dos dois lotes, para o qual foi emitida a PAO n.º 2006A007, de 14 de Julho de 2007, que viabilizava o projecto de desenvolvimento conjunto dos dois terrenos, e que é necessário responder com urgência aos requerimentos formulados pelas concessionárias;
33. O Eng.º Mário Ornelas refere, ainda, na comunicação de 1 de Abril de 2015, que deve ser calendarizada, dentro do prazo da concessão, a aprovação do plano da Zona C do Fecho da Baía da Praia Grande, ou, na ausência de plano, ser desenvolvido o procedimento previsto na Lei n.º 12/2013 (Lei do Planeamento Urbanístico) para a emissão de Plantas de Condições Urbanísticas (PCU) para terrenos situados em zonas sem plano aprovado;
34. Em 27 de Abril de 2007, 22 de Maio de 2008 e 9 de Setembro de 2008, a DSSOPT emitiu certidões às requerentes de teor coincidente, em que, apesar de ser referido que os prazos de aproveitamento terminaram em 18 de Agosto de 2005, é dado nota dos ofícios de 15 de Março e de 9 de Julho de 2007, que notificaram as duas concessionárias que o projecto de construção era passível de aceitação depois da aprovação do plano de intervenção urbanística das Zonas C e D da Baía da Praia Grande;
35. Acrescenta o Director da DSSOPT, na Certidão n.º 009/DSODEP/2008, que o processo de revisão dos contratos de concessão e a prorrogação dos prazos de aproveitamento terão lugar após a aprovação do mencionado plano de intervenção urbanística;
36. Com a conduta supra descrita, a Administração aceitou que se encontrava fundamentadamente justificado o não aproveitamento dos terrenos até 18 de Agosto de 2005, nos prazos referidos na cláusula quinta de cada um dos contratos de concessão;
37. De tal modo que, em 17 de Outubro de 2006, a DSSOPT emitiu a licença de obra n.º 600/2006 para o projecto de alteração da rede de drenagem pública nos lotes C5 e C6; em 17 de Outubro de 2006, foi emitida a licença de obra de vedação dos lotes C5 e C6 n.º 602/2006; e, em 23 de Março de 2007, foi emitida a licença de obras para cravar n.º 171/2007;
38. Todas estas licenças de obras foram emitidas e renovadas conforme resulta da Informação 3838/DURDEP/2008, de 7 de Agosto de 2008 e da Certidão n.º 009/DSODEP/2008, de 9 de Setembro de 2008, e do índice cronológico de requerimentos e aprovações para o projecto de desenvolvimento dos lotes C5 e C6;
39. Ao longo dos anos, como supra referido, as concessionárias interpelaram a Administração para que procedesse com brevidade à execução e aprovação do plano urbanístico das Zonas C e D do Fecho da Baía da Praia Grande e autorizasse, como se comprometeu, à revisão dos contratos de concessão por arrendamento, com a prorrogação dos prazos de aproveitamento e de concessão;
40. Contudo, a incapacidade de tomar decisões é evidenciada nas sucessivas comunicações de serviço internas que apenas referem que o assunto está a ser tratado;
41. Como agora se sabe, o plano de intervenção urbanística das Zonas C e D do Fecho da Baía da Praia Grande foi concluído pela DSSOPT em Novembro de 2014, necessariamente em coordenação e de acordo com as instruções do Gabinete do STOP;
42. Surpreendentemente, porém, a Proposta n.º 395/DSODEP/2016, concluiu que tendo chegado ao seu termo os prazos das concessões, não podem ser prorrogados os prazos de aproveitamento, nem revistos os contratos de concessão, independentemente da culpa da entidade concedente, negando, dessa forma, aquilo a que esta se comprometeu nos Ofícios n.º 411/DURDEP/2007, de 15 de Março de 2007 e n.º 289/2351 e 2316/DSODEP/2007, de 9 de Julho de 2007, e o propósito das autorizações e licenças para obras de cravação de estacas, colocação de tapumes e alteração da rede de drenagem nos lotes C5 e C6;
43. Acrescenta a Proposta n.º 395/DSODEP/2016, de 21 de Setembro de 2016, que os processos de autorização de todos os empreendimentos das Zonas C e D estavam suspensos até que fosse aprovado o novo plano de intervenção urbanística das Zonas C e D do Fecho da Baía da Praia Grande;
44. Explica a Proposta n.º 395/DSODEP/2016 que, em 15 de Julho de 2005, o "Centro Histórico de Macau" foi inscrito na lista do património mundial e que a referida suspensão se deve ao facto de as Zonas C e D se situarem a Sul do mesmo;
45. A Recorrente não detectou qualquer restrição sobre o aproveitamento para construção de imóveis na Zona Sul do Centro Histórico de Macau, nomeadamente dos empreendimentos nas Zonas C e D, que tenha sido ditada pela UNESCO para inscrição do "Centro Histórico de Macau" na lista do património mundial;
46. O documento da UNESCO tem uma descrição das propriedades classificadas e das áreas a proteger e define como "buffer zones" as áreas assinaladas na proximidade do património classificado que sofrem restrições de uso, para garantia uma zona de protecção, ficando o aproveitamento de terrenos nas ditas "buffer zones" sujeito a sujeito a restrições especiais;
47. Na planta da UNESCO, não existem monumentos classificado nas Zonas C e D e as Zonas C e D não fazem parte da "buffer zone" assinalada, isso mesmo pode ser confirmado no documento junto com o n.º 11, que mostra as Zonas C e D totalmente libertas no que respeita à classificação da UNESCO;
48. Mais, a Igreja da Penha não tem valor arquitectónico histórico e não está classificada como património mundial pela UNESCO;
49. Mesmo sem plano de intervenção urbanística a Administração construiu, no lote C2, o novo "Edifício Provisório dos Juízos Criminais do Tribunal Judicial de Base", com 3 pisos de cave, oito pisos acima do solo, uma área de 14.300m2 e uma altura de 35 metros;
50. O artigo 48.º da Lei de Terras estatui que as concessões provisórias não podem ser renovadas, tendo a Entidade Recorrida extrapolado essa regra para declarar a caducidade da concessão, não fundamentando o percurso percorrido para chegar a essa conclusão, o que consubstancia vício de falta de fundamentação, nos termos do artigo 21.º, n.º 1, al) c do CPAC;
51. O efeito extintivo do direito da concessionária não se produz automaticamente pela mera ocorrência de um facto objectivo, exigindo-se o juízo avaliativo do órgão público competente para declarar a caducidade, avaliação essa que deve ponderar todos os interesses concretamente em causa, públicos e privados, incluindo os do Banco a favor de que foram onerados com hipoteca e consignação de rendimentos os direitos da concessão;
52. Há uma exigência mínima de procedimentalização para a prática do acto declarativo da caducidade, nos termos do Código de Procedimento Administrativo da RAEM, nesta procedimentalização, sobre o órgão público competente recai o dever vinculado de verificar e avaliar as causas de caducidade, fazendo um juízo sobre a conduta do particular/sujeito privado, pois só assim poderá averiguar se há incumprimento e em que medida o incumprimento é imputável ao particular;
53. Mesmo que verificadas as causas de caducidade, incumbe à Administração o poderdever de avaliar, ponderar e decidir a declaração, ou não, da caducidade, no sentido de apurar se se encontram verificados os pressupostos de facto e de direito da caducidade - legais, regulamentares ou contratuais;
54. Para além disso, deverá ser averiguado se ocorrem, ou não, causas estranhas à vontade do sujeito privado, que, inclusivamente, podem ter por fonte condutas da própria Administração; ou, ainda, causas de força maior ou outro tipo de circunstâncias alheias à vontade do particular/sujeito privado;
55. O artigo 44.º da Lei de Terras estipula que a concessão por arrendamento é inicialmente dada a título provisório, por prazo a fixar em função das características da concessão, e só se converte em definitiva se, no decurso do prazo fixado, forem cumpridas as cláusulas de aproveitamento previamente estabelecidas e o terreno estiver demarcado definitivamente.
56. Esta noção legal de concessão provisória explica, com clareza, que o acto que declare a caducidade de uma concessão provisória nunca pode ter exclusivamente por fundamento o mero decurso do tempo;
57. Saber "se, no decurso do prazo fixado, forem cumpridas as cláusulas de aproveitamento mínimo previamente estabelecidas", implica, pressupõe e exige que a Administração avalie efectivamente o comportamento contratual do concessionário, para, de tal modo, concluir pelo cumprimento ou incumprimento daquelas cláusulas;
58. Da leitura deste preceito em conjugação com a do artigo 52.º, fácil é de concluir que a declaração de caducidade da concessão provisória exige dois pressupostos: (i) o decurso do prazo fixado e (ii) a diligência contratual do concessionário no cumprimento das cláusulas de aproveitamento mínimo; pelo que, na falta de avaliação quanto ao cumprimento do contrato de concessão, não pode a Administração declarar a caducidade da concessão de terreno apenas com base no decurso do prazo fixado no contrato;
59. Face aos supracitados factos documentalmente provados, dúvidas não restam que a Recorrente foi impedida, pela Administração, de aproveitar os terrenos concedidos no prazo contratualmente fixado;
60. É este o douto entendimento dos Professores Doutores Fernando Alves Correia e Licínio Lopes, Catedráticos da Universidade de Coimbra, que estiveram em Macau, entre os dias 17 e 20 de Outubro de 2016, a convite do Centro de Estudos Jurídicos e Judiciários da RAEM, para um Seminário sobre o tema;
61. Ao afirmar que a caducidade das concessões opera por mero decurso do prazo, a Administração faz tábua rasa do seu comportamento anterior e viola os princípios da boa fé e da igualdade, nomeadamente porque, nos Despachos do STOP n.º 20/2006, de 20 de Fevereiro de 2006, n.º 8/2009, de 3 de Fevereiro de 2009, e n.º 89/2007, de 23 de Outubro de 2007, publicado no BO n.º 44, II Série, de 31 de Outubro de 2007, considerou verificada a falta de culpa dos concessionários no cumprimento dos prazos, isto quando as previsões relevantes da antiga Lei de Terras, citadas nos Pareceres da Comissão de Terras referidos naqueles três Despachos, são iguais às da Lei de Terras em vigor;
62. A acção de indemnização não pode ser a única resposta para o incumprimento do contrato por culpa não imputável à Recorrente, pois a acção de indemnização pode não colocá-la numa situação equivalente à que estaria se a Entidade Recorrida tivesse cumprido o contrato;
63. A adopção de critérios diferentes para situações idênticas, dando por verificada a falta de culpa noutras concessões, para agora entender, no presente caso, que a caducidade opera independentemente da falta de culpa da Recorrente constitui abuso de direito, na modalidade de venire contra factum proprium, e uma flagrante violação do princípio da igualdade, previsto no artigo 5.º do CPA, e no artigo 25.º da Lei Básica;
64. Em total contradição com o disposto na alínea 9) do artigo 2.º da Lei n.º 10/2013, que aprovou a Lei de Terras, e que consagra o princípio da segurança jurídica, em garantia da estabilidade do regime legal vigente e o respeito pelas situações jurídicas validamente constituídas;
65. Nem se diga que não é o direito de propriedade que está em causa, pois o que a Recorrente adquiriu foi o direito do uso da propriedade, também consagrado e protegido naquele preceito fundamental da lei de Macau, que lhe permitiu onerar o terreno concessionado com a hipoteca e a consignação de rendimentos, acima identificada;
66. Entende a jurisprudência que o contrato pelo qual alguém é autorizado a fazer construções ou plantações em terreno alheio, conservando a propriedade delas, embora seja denominado locação, porque é temporário e o pagamento do solá rio se confunde com a renda, deverá ser classificado como direito de superfície e o Prof. Doutor Fernando Alves Correia defende aue a concessão por arrendamento de terrenos do Estado aproxima-se do direito de superfície de duração temporária;
67. A tutela da confiança pressupõe que exista uma actuação de um sujeito de direito que crie essa mesma confiança, quer na manutenção de urna situação jurídica, quer na adopção de outra conduta; uma situação de confiança justificada do destinatário na actuação de outrem; a efectivação de um investimento de confiança, isto é, o desenvolvimento de acções ou omissões, que podem ou não ter tradução patrimonial, na base da situação de confiança; o nexo de causalidade entre a actuação geradora de confiança e a situação de confiança, por um lado e entre a situação de confiança e o investimento de confiança, por outro;
68. Se a Administração puder criar obstáculos sucessivos, ou omitir a prática de actos relevantes, de modo a deixar passar o prazo das concessões, é evidente que é colocado em causa um princípio fundamental de direito, o princípio da boa fé;
69. Com essa actuação, a Administração usa o instituto jurídico da caducidade como uma punição sem merecimento, desembocando num efeito jurídico próximo do da expropriação sem compensação, em clara violação do espírito do artigo 103.º da Lei Básica;
70. A incapacidade de tomar decisões, que se verifica neste caso, causou e causa enormes prejuízos às Recorrentes, afecta negativamente a imagem de Macau, como centro de negócios, bem como a credibilidade do Governo da RAEM, que mostra ser incapaz de gerir processos e de cumprir as suas obrigações, e ofende o princípio da decisão e da eficiência a que aludem os artigos 11.º e 12.º do CPA;
71. A Administração criou legítimas expectativas nas Recorrentes, nomeadamente, ao emitir as licenças para obras para cravação de estacas nos lotes C5 e C6, para colocação de tapumes e para alteração da rede de drenagem dos referidos terrenos, para os quais a Recorrente teve de incorrer em avultadas despesas;
72. Foi a confiança depositada na Administração que levou a Recorrente a contrair empréstimos bancários e a onerar o terreno concessionado, para garantir o financiamento para a concretização do aproveitamento do terreno - tal como permite o artigo 42.º da Lei de Terras - e só depois da emissão dos ofícios de 15 de Março e de 9 de Julho de 2007 e das autorizações e licenças para as obras de construção de tapumes, cravação de estacas e de redes de drenagem nos lotes C5 e C6;
73. Em respeito pelos principios da boa fé, na sua vertente da tutela da confiança, da decisão e da eficiência da Administração, previstos nos artigos 7.º, 8.º, 11.º e 12.º do CPA, o Governo devia ter assumido as suas responsabilidades, aprovado em tempo o plano urbanístico de que disse depender as revisões das concessões e as prorrogações dos prazos de aproveitamento;
74. No caso vertente, dúvidas não restam de que a Administração violou a confiança que nela foi depositada;
75. A declaração de caducidade por parte da entidade recorrida, quando sempre da sua conduta resultou que não o iria fazer e sendo ela quem impediu a revisão do contrato de concessão, resulta na violação do princípio da boa fé, e consubstancia um abuso de direito, vg. artigos 8.º, n.º 2, al. a) do Código do Procedimento Administrativo e 326.º do Código Civil, na modalidade de venire contra factum proprium, princípio que se mostra violado;
76. A proibição da chamada conduta contraditória exige a conjugação de vários pressupostos reclamados pela tutela da confiança; esta variante do abuso do direito equivale a dar o dito por não dito, radica numa conduta contraditória da mesma pessoa, pois pressupõe duas atitudes espaçadas no tempo, sendo a primeira (factum proprium) contraditada pela segunda atitude, o que constitui, atenta a reprovabilidade decorrente da violação dos deveres de lealdade e de correcção, uma manifesta violação dos limites impostos pela boa fé;
77. O artigo 41.º da Lei de Terras estabelece, quanto ao regime jurídico aplicável à concessão por arrendamento, que a "concessão por arrendamento e o subarrendamento de terrenos urbanos ou de interesse urbano rege-se pelas disposições da presente lei e diplomas complementares, pelas cláusulas dos respectivos contratos e, subsidiariamente, pela lei civil aplicável, e o artigo 220.º, preceitua que, em tudo quanto não estiver, expressamente, previsto na presente lei, são aplicáveis subsidiariamente, consoante a natureza das matérias, o Código do Procedimento Administrativo, o Decreto-Lei n.º 52/99/M, de 4 de Outubro, o Código Penal, o Código de Processo Penal e o Código do Registo Predial;
78. O artigo 99.º da Lei de Terras estipula a sujeição do concessionário às vinculações prescritivas do plano urbanístico que vigore na zona onde o terreno concedido se encontre situado e a cumprir as condições que lhe sejam impostas para a racional utilização dos recursos naturais do terreno concedido;
79. O artigo 55.º da Lei do Planeamento Urbanístico determina que, quando a execução de um plano urbanístico colida com a finalidade da concessão ou com o aproveitamento de um terreno concedido, o concessionário tem direito, nos termos da Lei de Terras, a requerer a revisão do contrato de concessão ou, tratando-se de concessão onerosa, a transmissão das situações resultantes da concessão, sem prejuízo de ser indemnizado pelos danos que tenha sofrido, preceito que se considera violado;
80. De resto, o artigo 48.º, n.º 1 da Lei de Terras só dispõe sobre a renovação da concessão provisória, não existindo nenhum obstáculo legal que impossibilite a prorrogação do prazo da concessão;
81. Como acima se referiu, a suspensão do procedimento para a aprovação do projecto de arquitectura e para a revisão dos contratos de concessão tem origem na decisão do Governo de proteger o Centro Histórico de Macau;
82. A este propósito, o artigo 55.º da Lei do Planeamento Urbanístico determina que, quando a execução de um plano urbanístico colida com a finalidade da concessão ou com o aproveitamento de um terreno concedido, o concessionário tem direito, nos termos da Lei de Terras, a requerer a revisão do contrato de concessão ou, tratando-se de concessão onerosa, a transmissão das situações resultantes da concessão, sem prejuízo de ser indemnizado pelos danos que tenha sofrido;
83. Permite o artigo 55.º, n.º 2, 1), (3), ii) e (4) da Lei de Terras a dispensa de concurso público, quando a concessão se funde no interesse público que favoreça o desenvolvimento da RAEM;
84. Demorar anos sem aprovar o plano de intervenção urbanística, de que dependia a revisão do contrato de concessão e a execução do projecto de construção que a entidade recorrida considerou passível de aprovação e, no final do prazo das concessões, ignorar todos actos praticados e vir fazer apelo à caducidade dessas concessões é inaceitável, e demonstra a falta de razoabilidade a que alude a al. d) do n.º 1 do artigo 21.º do Código de Processo Administrativo Contencioso;
85. Ainda assim, com o reconhecimento expresso dos direitos que assistem às concessionárias, ora Recorrentes, a Administração provocou o efeito jurídico impeditivo da caducidade, previsto no artigo 323.º, n.º 2 do Código Civil;
86. Este preceito determina que quando se trate de prazo fixado por contrato ou disposição legal, o reconhecimento do direito por parte daquele contra quem deve ser exercido impede a caducidade;
87. Ora, tendo a Administração reconhecido os direitos da concessionária de ver aprovado o projecto que apresentou e da revisão do contrato de concessão que requereu, não pode, agora, vir a mesma Administração afirmar que a caducidade ocorreu ipsu iure, escudandose nos supra referidos preceitos da Lei de Terras, em clara violação do artigo 8.º do Código Civil, que proíbe o intérprete de se cingir à letra da lei;
88. Com tal interpretação, a Administração desconsiderou sobretudo a unidade do sistema jurídico a que alude o referido artigo 8.º, em clara violação pelos princípios da igualdade, da proporcionalidade, da boa-fé, da decisão e da eficiência a que se encontra obrigada.nos termos da Lei Básica e do CPA;
89. Num claro exercício de abuso do direito, proibido nos termos do artigo 326.º do Código Civil;
90. O acto recorrido padece de falta de fundamentação, nos termos do artigo 21.º, n.º 1, al. c) do CPAC, viola o artigo 323.º, n.º 2, o artigo 326.º do Código Civil, os princípios da igualdade, boa fé, na sua vertente da tutela da confiança, da decisão e da eficiência da Administração, previstos nos artigos 5.º, 8.º, 11.º e 12.º do CPA; o artigo 55.º da Lei do Planeamento Urbanístico e os artigos 7.º, 25.º e 103.º da Lei Básica da RAEM, incorrendo também em erro manifesto nos pressupostos de facto e de direito, nos termos previstos no artigo 21.º, n.º 1, al, d), do CPAC, devendo, por isso, ser anulado de acordo com o artigo 124.º do CPA.
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Regularmente citada, a Entidade Recorrida contestou nos termos constantes a fls. 161 a 177 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, pugnando pelo não provimento do recurso.
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Tanto a Recorrente como a Entidade Recorrida ambas apresentaram as alegações facultativas, mantendo, no essencial, as posições já tomadas, respectivamente, na petição inicial e na contestação.
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O Mº Pº emitiu o parecer no mesmo sentido.
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Foram colhidos os vistos legais dos Mmºs Juizes-Adjuntos.
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II – Pressupostos Processuais
O Tribunal é o competente.
As partes possuem personalidade e capacidade judiciárias.
Mostram-se regularmente patrocinadas.
Não existem nulidades, excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
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III – Factos
É assente a seguinte factualidade com interesse à boa decisão da causa face aos elementos probatórios existentes nos autos:
1. Por escritura pública de 30 de Julho de 1991, exarada a fls. 4 e seguintes do livro 285 da Direcção dos Serviços de Finanças, celebrada em conformidade com o Despacho n.º 203/GM/89, publicado no 4.º Suplemento ao Boletim Oficial de Macau n.º 52, de 29 de Dezembro de 1989, e com as alterações introduzidas pelos Despacho n.º 73/SATOP/92, publicado no Boletim Oficial de Macau n.º 27, de 6 de Julho de 1992, Despacho n.º 57/SATOP/93, publicado no Boletim Oficial de Macau n.º 17, de 26 de Abril de 1993, Despacho n.º 56/SATOP/94, publicado no Boletim Oficial de Macau n.º 22, II Série, de 1 de Junho de 1994, e Despacho n.º 71/SATOP/99, publicado no Boletim Oficial de Macau n.º 33, II Série, de 18 de Agosto de 1999, foi titulada a concessão por arrendamento de vários lotes de terreno inseridos nas zonas A, B, C e D do empreendimento denominado «Fecho da Baía da Praia Grande», situados na Baía da Praia Grande e nos Novos Aterros do Porto Exterior, a favor da Sociedade de Empreendimentos Nam Van, S.A., com sede na XXX, em Macau, registada na Conservatória dos Registos Comercial e de Bens Móveis com o n.º XXX a fls. XXX do livro C10.
2. Posteriormente, através do Despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º 84/2001, publicado no Boletim Oficial da Região Administrativa Especial de Macau n.º 37, II Série, de 12 de Setembro de 2001, foi titulada a transmissão onerosa dos direitos resultantes da concessão do terreno com a área de 3,131 m2 , designado por lote 6 da zona C do referido empreendimento a favor da Sociedade de Investimento Imobiliário Man Keng Van, S.A., com sede na XXX, em Macau, registada na Conservatória dos Registos Comercial e de Bens Móveis com o n.º XXX a fls. XXX do livro C23.
3. O mencionado lote está descrito na Conservatória do Registo Predial, adiante designada por CRP, sob o n.º 22517 a fls. 169 do livro B49 e o direito resultante da concessão inscrito a favor daquela sociedade sob o n.º 26670F, encontrando-se o terreno onerado com uma hipoteca voluntária inscrita sob o n.º 143459C e uma consignação de rendimentos inscrita sob o n.º 33437F a favor do Banco Industrial e Comercial da China (Macau), S.A.
4. De acordo com o estipulado na cláusula segunda do contrato de transmissão titulado pelo sobredito Despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º 84/2001, o arrendamento do terreno é válido até 30 de Julho de 2016.
5. Segundo o estabelecido na cláusula terceira do mesmo contrato de transmissão, o terreno seria aproveitado com a construção de um edifício, em regime de propriedade horizontal, destinado a habitação, comércio e estacionamento, em conformidade com o plano de pormenor e respectivo regulamento, relativo à zona C, aprovado pela Portaria n.º 69/91/M, de 18 de Abril de 1991.
6. O prazo de arrendamento do aludido terreno expirou em 30 de Julho de 2016.
7. Em 04/11/2016, o Secretário para os Transportes e Obras Públicas emitiu o seguinte parecer:
“…
1. Em conformidade com o Despacho n.º 203/GM/89, publicado no 4.º Suplemento ao Boletim Oficial de Macau n.º 52, de 29 de Dezembro de 1989, por escritura de 30 de Julho de 1991, exarada a fls. 4 e seguintes do livro n.º 285 da Direcção dos Serviços de Finanças, com as alterações introduzidas pelos contratos de revisão titulados pelos Despachos n.ºs 73/SATOP/92, 57/SATOP/93 e 56/SATOP/94, publicados respectivamente no Boletim Oficial de Macau n.º 27, de 6 de Julho de 1992, no Boletim Oficial de Macau n.º 17, de 26 de Abril de 1993 e no Boletim Oficial de Macau n.º 22, II Série, de 1 de Junho de 1994, foram concedidos por arrendamento a favor da Sociedade de Empreendimentos Nam Van, S.A., vários lotes de terreno inseridos nas zonas A, B, C e D do empreendimento denominado «Fecho da Baía da Praia Grande», situadas na Baía da Praia Grande e nos Novos Aterros do Porto Exterior (NAPE).
2. Nos termos do disposto na cláusula segunda do contrato de concessão titulado pela mencionada escritura, o arrendamento é válido pelo prazo de 25 anos, contados a partir da data da outorga da mesma.
3. Através do Despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º 84/2001, publicado no Boletim Oficial da Região Administrativa Especial de Macau (RAEM) n.º 37, II Série, de 12 de Setembro de 2001, foi titulada a transmissão onerosa do direito resultante da concessão do terreno designado por lote 6 da zona C do referido empreendimento, a favor da Sociedade de Investimento Imobiliário Man Keng Van, S.A..
4. De acordo com o estabelecido na cláusula segunda do sobre dito contrato de transmissão do direito resultante da concessão do aludido lote, o prazo do arrendamento expirou em 30 de Julho de 2016.
5. Segundo o disposto na cláusula terceira do mesmo contrato, o terreno deveria ser aproveitado com a construção de um edifício em regime de propriedade horizontal, destinado a habitação, comércio e estacionamento, de acordo com as condições urbanísticas fixadas nos Regulamentos dos Planos de Pormenor do Plano de Reordenamento da Baía da Praia Grande aprovados pela Portaria n.º 69/91/M, publicada no 2.º Suplemento ao Boletim Oficial de Macau n.º 15, de 18 de Abril de 1991. A altura máxima permitida seria de 34,5 mNMM.
6. Uma vez que o prazo de arrendamento do terreno terminou em 30 de Julho de 2016 e o aproveitamento do terreno não foi concluído, a Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes propôs que fosse autorizado o seguimento do procedimento relativo à declaração da caducidade da concessão por decurso do prazo de arrendamento e o envio do processo à Comissão de Terras para efeitos de parecer, o que mereceu a minha concordância, por despacho de 19 de Setembro de 2016.
7. Reunida em sessão de 27 de Outubro de 2016, a Comissão de Terras, após ter analisado o processo, tendo em consideração que o prazo de arrendamento terminou, sem que o aproveitamento estabelecido no contrato se mostre realizado, e que, sendo a concessão provisória, não pode ser renovada, de acordo com o previsto no n.º 1 do artigo 48.º da Lei n.º 10/2013 (Lei de terras), aplicável por força dos seus artigos 212.º e 215.º. Deste modo, a concessão encontra-se caducada pelo termo do respectivo prazo de arrendamento (caducidade preclusiva), devendo esta caducidade ser declarada por despacho do Chefe do Executivo.
Consultado o processo supramencionado e concordando com o que vem proposto, solicito a Sua Excelência o Chefe do Executivo que declare a caducidade da concessão do referido terreno…”.
8. Em 03/05/2018, o Senhor Chefe do Executivo proferiu o seguinte despacho:
“…Concordo, pelo que declaro a caducidade da concessão, por arrendamento, a que se refere o Processo n.º 64/2016 da Comissão de Terras, nos termos e com os fundamentos do Parecer do Secretário para os Transportes e Obras Públicas, de 4 de Novembro de 2016, os quais fazem parte integrante do presente despacho”.
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IV – Fundamentação
1. Da requerida produção da prova testemunhal:
A Recorrente requereu a produção da prova testemunhal no presente recurso contencioso.
O Mº Pº emitiu o parecer no sentido da sua não realização por ser desnecessária para a boa decisão do mérito da causa.
Não foi decidida no momento oportuno quanto à realização ou não da requerida diligência probatória, pelo que cumpre agora decidir.
Analisada a situação concreta do caso, concordamos com a douta observação do Mº Pº no sentido da desnecessidade da realização da requerida prova testemunhal, visto que a caducidade da concessão foi declarada com fundamento no decurso do prazo da concessão provisória sem que esta convertida em definitiva.
Nesta medida, a Recorrente nunca poderá proceder ao seu aproveitamento por qualquer forma face à legislação vigente.
Assim, em nome da economia processual e com vista a evitar a prática de actos inúteis, fica indeferida a realização da requerida prova testemunhal.
2. Do recurso contencioso:
O presente recurso contencioso consiste em apreciar a eventual legalidade/ilegalidade do acto recorrido, pelo qual se declarou a caducidade da concessão do terreno em questão.
Sobre o assunto, o Mº Pº emitiu o seguinte parecer:
“…
Na petição inicial e nas alegações, a recorrente solicitou a anulação do despacho do Exmo. Senhor Chefe do Executivo quem declarou, clara e propositadamente que “Concordo, pelo que declaro a caducidade da concessão, por arrendamento, a que se refere o Processo n.º64/2016 da Comissão de Terras, nos termos e com os fundamentos que constam do Parecer do Secretário para Os Transportes e Obras Públicas, de 4 de Novembro de 2016, os quais fazem parte integrante do presente despacho.” (vide. fls.204 do P.A.)
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1. Da natureza do despacho recorrido
Interpretando o acto recorrido em coerência com o Parecer do Sr. STOP de 04/11/2016 (doc. de fls.200 a 203 do P.A.), adquirimos que a declaração da caducidade titulada por esse acto tem por base factual que a concessão cuja titular era a recorrente tinha sido sempre provisória até à irreversível expiração do prazo de 25 anos, nunca convertida em definitiva.
Ora, é pacífica e consolidada a brilhante jurisprudência, segundo a qual decorrido o prazo de 25 anos da concessão provisória (se outro prazo não estiver fixado no contrato) o Chefe do Executivo deve declarar a caducidade do contrato se considerar que, nesse prazo, não foram cumpridas as cláusulas de aproveitamento previamente estabelecidas, e o Chefe do Executivo não tem que apurar se o incumprimento das cláusulas de aproveitamento se deve ter por motivo não imputável ao concessionário (cfr. Acórdãos do TUI nos Processos n.º28/2017, n.º43/2018 e n.º72/2019). Pois a jurisprudência de Macau vai sempre no sentido de considerar a caducidade da concessão do terreno pelo decurso do prazo de arrendamento como caducidade preclusiva (a título exemplificativo, cfr. Acórdãos do TUI nos Processos n.º69/2017, n.º102/2018 e n.º26/2019).
A nossa leitura dos arestos dos Venerandos TUI e TSI convence-nos de ser constante e unânime a orientação jurisprudencial, no sentido de que é vinculado o poder administrativo para declarar a caducidade, quer de preclusão quer de sanção, das concessões de terrenos (cfr. Acórdãos do TUI nos Processos n.º62/2017 e 111/2018, do TSI nos n.º433/2015, n.º436/2015 e n.º743/2016).
Ora, a frase reiterada pelo Venerando TUI de que “se outro prazo não estiver fixado no contrato” significa iniludivelmente que o prazo da concessão, seja de 25 anos seja de duração mais curta, não é decisivo, o que causa directa e inevitavelmente à caducidade preclusiva da concessão é a peremptória expiração do prazo de concessão contratualmente fixado.
Nestes termos e na medida em que o despacho n.º83/2001 do STOP estipula que é válida até 31/07/2016 a concessão transmitida à recorrente na qualidade de terceiro outorgante, não podemos deixar de concluir que o despacho impugnado nestes autos é acto vinculado.
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2. Da arguida falta de fundamentação
Ora, é praticamente uniforme a inculca de que “A fundamentação é um conceito relativo que depende do tipo legal do acto, dos seus termos e das circunstâncias em que foi proferido, devendo dar a conhecer ao seu destinatário as razões de facto e de direito em que se baseou o seu autor para decidir nesse sentido e não noutro, não se podendo abstrair da situação específica daquele e da sua possibilidade, face às circunstâncias pessoais concretas, de se aperceber ou de apreender as referidas razões, mormente que intervém no procedimento administrativo impulsionando o itinerário cognoscitivo da autoridade decidente.” ( a título exemplificativo, Acórdão do STA no processo n.º44302)
Não se deve olvidar que concordar é uma coisa, e compreender é outra, a discordância duma posição não se equivale à incompreensão ou à incompreensibilidade. Por isso, a não concordância do interessado com a posição da Administração não germina a falta de fundamentação. De outra banda, interessa realçar que a falta de fundamentação se distingue da falta de fundamentos (cfr. Acórdão do TSI no Processo n.º663/2009)
Bem, sufragamos a douta jurisprudência que preconiza (cfr. Acórdão do TSI no Processo n.º288/2015): O acto administrativo considera-se fundamentado quando o administrado, colocado na posição de um destinatário normal … possa ficar a conhecer as razões factuais e jurídicas que estão na sua génese, de modo a permitir-lhe optar, de forma esclarecida, entre a aceitação do acto ou o accionamento dos meios legais de reacção, e de molde a que, nesta última circunstância, o tribunal possa também exercer o efectivo controle da legalidade do acto, aferindo o seu acerto jurídico em face da sua fundamentação contextual.
Em esteira, e considerando o supramencionado Parecer do Exmo. Sr. STOP e o Parecer n.º127/2016 da Comissão de Terras (docs. de fls.200 a 203 e 190 a 199 do P.A.), não podemos deixar de concluir que é falida a arguição da falta de fundamentação, pois, o ponto 7 do Parecer do Exmo. Sr. STOP assegura a recorrente a apreender suficientemente os fundamentos de facto e de direito da declaração da caducidade da concessão.
Por cautela e na mera hipótese de ser insuficiente a fundamentação do despacho recorrido, colhemos que tal insuficiência é irrelevante, dado que ao caso sub judice se aplica o princípio do aproveitamento dos actos administrativos praticados no exercício de poderes vinculados.
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3. Da não verificação da caducidade e causa impeditiva
Bem, sustentando o pedido de anulação do despacho em questão, a recorrente arguiu a não verificação da caducidade bem como o erro nos pressupostos de direito e da causa impeditiva da caducidade, arrogando que o incumprimento das cláusulas do contrato de concessão é imputável à Administração e esta reconheceu os direitos resultantes da transmissão à recorrente relativos ao terreno identificado no contrato de concessão.
Repare-se que “As vicissitudes ocorridas no prazo de concessão e respeitantes ao aproveitamento do terreno não se revelam pertinentes, já que, no caso de declaração da caducidade pelo decurso do prazo de arrendamento do terreno, não é essencial a questão de culpa no não aproveitamento do terreno, pois com o decurso do prazo máximo da concessão provisória sem a conclusão do aproveitamento do terreno, a mesma concessão não pode ser renovadas, desde que não se verifique a excepção prevista na lei (art.48.º n.ºs 1 e 2 da Lei n.º 10/2013).” (cfr. Acórdão do TUI no Processo n.º29/2019) Daí resulta que mesmo sejas constatadas e verdadeiras, a não imputabilidade e inocência da recorrente não obstam à verificação da caducidade preclusiva da concessão.
É bom de lembrar a brilhante jurisprudência inculcando que “Ainda que estivessem em causa direitos disponíveis, uma informação da Direcção dos Serviços de Programação e Coordenação de Empreendimentos, independentemente do que ela contivesse, nunca poderia constituir reconhecimento de nenhum direito da recorrente por parte da RAEM, dado que informações burocráticas de técnicos da Administração ou mesmo de directores de serviços não representam nem obrigam a RAEM, pelo que nunca poderiam reconhecer direito algum da recorrente, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º2 do artigo 323.º do Código Civil.” (cfr. Acórdão do TUI no Processo n.º16/2019)
Pois, as comunicações de serviço interno da DSSOPT, bem como a atitude da DSSOPT revelada nos ofícios, com os quais as recorrentes foram notificadas que os projectos apresentados eram passíveis de aprovação pela DSSOPT, mas que o procedimento administrativo ficava suspenso provisoriamente até que fosse aprovado o novo plano de intervenção urbanística da zona onde se encontram os terrenos concedidos, nunca poderiam constituir reconhecimento de nenhum direito das recorrentes por parte da RAEM, uma vez que as informações ou opiniões nelas contidas não representam nem obrigam a RAEM, muito menos depois do termo do prazo de arrendamento dos terrenos. (cfr. Acórdão do TUI no Processo n.º2/2019)
E, os actos praticados pela Administração, invocados pela recorrente para demonstrar que a Administração criou legítimas expectativas na recorrente, nomeadamente, ao afirmar que iria rever o contrato de concessão atenta a alteração de finalidade do terreno, nunca poderiam constituir o reconhecimento de algum direito da recorrente por parte da RAEM (por exemplo o direito de aproveitar o terreno depois do termo do prazo de arrendamento) nem obstar à declaração da caducidade pelo decurso de tal prazo. (cfr. Acórdão do TUI no Processo n.º12/2019)
Em sintonia com tais sensatas jurisprudências, estamos convictos de que falece incuravelmente a arguição da não verifica da caducidade e da existência da causa impeditiva da mesma, portanto, o despacho atacado no presente recurso não colide com o art.323º do Cód. Civil.
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4. Do abuso de direito e violação dos princípios gerais
Como causa de pedir, a recorrente assacou, ao despacho em escrutínio, ainda o abuso de direito e a violação dos princípios da igualdade, da boa fé na sua vertente da tutela de confiança, da decisão e da eficiência da Administração, previstos nos arts.5º, 8º, 11º e 12º do CPA.
4.1. Ora, o abuso de direito, para vingar no recurso contencioso, impõe a prova de um exercício ilícito de direito, implica a demonstração de que o titular do direito o exerceu em termos clamorosamente ofensivos da justiça e que excedeu manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito (art.334º, do CC). E não preenche estes requisitos a actuação administrativa que se limita, como no caso vertente, a cumprir as cláusulas do contrato e a lei e a acatar as normas imperativas de direito público sobre o regime legal das concessões.” (cfr. Acórdãos do TSI nos Processos n.º179/2016, n.º290/2017 e n.º578/2018)
Essa sagaz jurisprudência encoraja-nos a concluir que o despacho em questão não constitui abuso de direito, e por isso, não infringe o preceito no art.326º do Código Civil.
4.2. Na nossa óptica, é doutrinal e jurisprudencialmente assente que do princípio da decisão nascem para a Administração o dever geral de pronúncia e o específico de decisão (Lino Ribeiro, José Cândido de pinho: Código do Procedimento Administrativo de Macau Anotado e Comentado, pp.119 a 121; Mário Esteves de Oliveira e outros: Código do Procedimento Administrativo Comentado, 2ª ed., p.125 e ss.)
Afigura-se-nos igualmente pacífica a doutrina inculcando que a não observância ao princípio da decisão e o incumprimento do dever de decisão não pode germinar a invalidade, pese embora possam dar lugar a acto administrativo tácito (arts.101º e 102º do CPA), ou a responsabilidade civil por acto ilícito de gestão (Mário Esteves de Oliveira e outros: ob. cit., p.129). Assim, podemos tranquilamente extrair que mesmo a falta da resposta ao requerimento aludido no art.231º da petição infringisse o princípio da decisão, tal falta daria luz, no máximo e tão-só, ao indeferimento tácito, por não se descortinar nenhuma norma que preveja o contrário (arts.101º e 102º do CPA).
Na medida em que o incumprimento de qualquer dos dois deveres nascidos do princípio da decisão não tem virtude de causar invalidade ao despacho em causa, a arguição (pela recorrente) da violação do princípio da decisão não pode deixar de ser necessariamente inoperante.
4.3. No actual ordenamento jurídico de Macau vê-se solidamente consolidada a brilhante jurisprudência, no sentido de que os princípios gerais de igualdade, de proporcionalidade, da imparcialidade, da justiça e de boa fé se aplicam apenas ao exercício de poderes discricionários, semdo assim inoperante para os actos vinculados. (a título exemplificativo, cfr. Acórdãos do TUI nos Processos n.º32/2016, n.º79/2015 n.º46/2015, n.º14/2014, n.º54/2011, n.º36/2009, n.º40/2007, n.º7/2007, n.º26/2003 e n.º9/2000, a jurisprudência do TSI vem andar no mesmo sentido).
Seja como for, a violação do princípio da igualdade não releva no exercício de poderes vinculados, já que não existe um direito à igualdade na ilegalidade, o princípio da igualdade não pode ser invocado contra o princípio da legalidade: um acto ilegal da Administração não atribui ao particular o direito de exigir a prática no futuro de acto de conteúdo idêntico em face de situações iguais (cfr. Acórdão do TUI no Processo n.º7/2007).
Ainda preconiza peremptoriamente o Venerando TUI que “Havendo fundamento para declarar a caducidade de concessão de terreno urbano, porque houve culpa da concessionária no não aproveitamento do terreno no prazo fixado, tal constitui um acto vinculado para a Administração. Se esta, noutros procedimentos administrativos, ilegalmente, não declarou a caducidade de outras concessões, supostamente havendo semelhança dos mesmos factos essenciais, tal circunstância não aproveita, em nada, à concessionária em causa visto que os administrados não podem reivindicar um direito à ilegalidade.” (cfr. Acórdão do TUI no Processo n.º111/2018)
Assim sendo e na medida em que o despacho atacado nestes autos constitui a única resolução legalmente admissível, não podemos deixar de colher que tal despacho não pode ofender nem ofende os princípios da boa fé na vertente da tutela da confiança e da igualdade.
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5. Da violação dos preceitos da Lei Básica
Quanto à arguição da violação do disposto nos arts.7º, 25º e 103º da Lei Básica, interessa ter presente a consolidada jurisprudência do Venerando TUI, no sentido de que no caso de declaração da caducidade da concessão por decurso do prazo de arrendamento do terreno, não se vislumbra violação das normas contidas nomeadamente nos art.ºs 6.º, 103.º e 120.º da Lei Básica (a título exemplificativo, cfr. Acórdão nos Processos n.º26/2019).
Por sua vez, o Venerando TSI assevera inequivocamente que “Os artigos 6º, 7º e 103º da Lei Básica não apresentam qualquer relevância para os casos em que é declarada administrativamente a caducidade de uma concessão e em que, consequentemente, não está em causa propriedade privada da concessionária.” (cfr. Acórdãos do TSI nos Processos n.º370/2016, n.º419/2017 e n.º571/2018)
Ora, interessa acrescentar que o n.º1 do art.48º da Lei n.º10/2013 e a caducidade preclusiva não impedem que um concessionário inocente e lesado por declaração da caducidade venha invocar e provar a eventual culpa da Administração na acção, a intentar por ele, para efectivação da responsabilidade contratual ou extracontratual nos termos gerais.
Nestes termos e ao abrigo da disposição no n.º1 do art.168º da Lei n.º10/2013, não podemos deixar de concluir que o art.48º desta Lei não infringe nenhum preceito da Lei Básica e que em consequência, o despacho recorrido não contende com qualquer disposição da Lei Básica, nem ofendeu o direito fundamental (da recorrente) à propriedade privada.
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Por todo o expendido acima, propendemos pela improcedência do presente recurso contencioso…”.
Trata-se duma posição com a qual concordamos na sua íntegra e que está conforme com a jurisprudência do TUI e deste TSI nos processos congéneres.
A título exemplificativo, vide os Acs. do T.U.I. de 11/10/2017, Proc. n.º 28/2017; de 06/06/2018, Proc. n.º 43/2018; de 31/07/2018, Proc. nº 13/2018; de 05/12/2018, Proc. n.º 98/2018 e de 19/12/2018, Proc. n.º 91/2018.
Nesta conformidade e com a devida vénia, fazemos como nossos os fundamentos invocados no parecer acima transcrito para julgar a improcedência do presente recurso contencioso.
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V – Decisão
Nos termos e fundamentos acima expostos, acordam em indeferir a realização da produção da prova testemunhal e julgar improcedente o recurso contencioso, confirmando o acto recorrido.
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Custas pela Recorrente com 10UC de taxa de justiça.
Notifique e D.N..
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RAEM, aos 20 de Fevereiro de 2020.

Ho Wai Neng
José Cândido de Pinho
Tong Hio Fong

Mai Man Ieng
1


36
558/2018