Processo nº 967/2018
(Autos de Recurso Contencioso)
Data: 27 de Fevereiro de 2020
ASSUNTO:
- Falta da audiência prévia do interessado
- Princípios da proporcionalidade e da justiça
SUMÁRIO:
- A audiência de interessados é uma das formas da concretização do princípio da participação dos particulares no procedimento administrativo, legalmente previsto no artº 10º do CPAC, nos termos do qual os órgãos da Administração Pública devem assegurar a participação dos particulares, bem como das associações que tenham por objecto a defesa dos seus interesses, na formação das decisões que lhes disserem respeito.
- A preterição dessa formalidade pode, em certos casos, ser ultrapassada se daí não resulte qualquer ilegalidade determinante da anulação do acto, isto é, quando, atentas as circunstâncias concretas, a intervenção do interessado se tornou inútil, seja porque o contraditório já se encontre assegurado, seja porque não haja nada sobre que ele se pudesse pronunciar, seja porque, independentemente da sua intervenção e das posições que o mesmo pudesse tomar, a decisão da Administração só pudesse ser aquela que foi tomada
- Os princípios da proporcionalidade e da justiça não são operantes nas actividades administrativas vinculadas.
O Relator,
Ho Wai Neng
Processo nº 967/2018
(Autos de Recurso Contencioso)
Data: 27 de Fevereiro de 2020
Recorrente: Sociedade de Investimento Imobiliário Man Keng Van, S.A.
Entidade Recorrida: Secretário para os Transportes e Obras Públicas
ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
I – Relatório
Sociedade de Investimento Imobiliário Va Keng Van, S.A., melhor identificada nos autos, vem interpor o presente Recurso Contencioso contra o despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas de 13/07/2018, que ordenou o despejo do terreno com a área de 3,131m2, designado por lote 6 da Zona C do empreendimento denominado “Fecho da Baía da Praia Grande”, situado na península de Macau, concluíndo que:
1. A ora Recorrente interpõe recurso contencioso do despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas, de 13 de Julho de 2018, exarado sobre a Proposta n.º 213/DSO/2018, de 11 de Julho, que ordena o despejo do terreno, com a área de 3.131m2, designado por lote 6 da Zona C, do empreendimento denominado "Fecho da Baía da Praia Grande", situado na península de Macau, descrito da Conservatória do Registo Predial sob o n.º 22517, a fls. 169, do Livro B49, no prazo de 60 dias, com a demolição e remoção de construções temporárias de estrutura metálica, remoção de todos os bens móveis que se encontram naquele terreno, tais como todas as areias e pedras, materiais e máquinas de construção, contentores e os resíduos sólidos e lixo, bem como os veículos automóveis lá estacionados;
2. Não tendo sido realizada a audiência prévia, o despacho recorrido padece de vício de forma, por violação do princípio da participação e preterição absoluta do dever de audiência dos interessados, devendo ser anulado, nos termos dos artigos 21.º, n.º 1, al. c) do CPAC e 124.º do CPA;
3. Não se percebe a razão da urgência em ter o terreno em causa desocupado, quando a Administração nunca agiu com prontidão e tomou sempre decisões com atraso, nomeadamente no que diz respeito à alteração da finalidade, à revisão do contrato da concessão;
4. A Administração tem o dever de apurar se estão verificados os pressupostos de facto e de direito, pelo que a intervenção da Recorrente na fase de instrução do processo é indispensável para assegurar os seus interesses;
5. Ao contrário de outros recursos contenciosos de despejos ordenados na sequência de declarações de caducidade, onde foi realizada a audiência de interessados, neste caso foi efectuada a instrução, com fotografias aéreas e definição das confrontações do terreno (que constam do acto recorrido), mas o direito ao exercício da audiência prévia não foi exercido pela Recorrente;
6. A Administração não procedeu à audiência prévia da ora Recorrente antes de tomar a decisão de declarar a caducidade da concessão do terreno aqui em discussão, nem o fez em sede de despejo, como talo despacho recorrido padece de vício de forma, por violação do princípio da participação e preterição absoluta do dever de audiência ccs interessados, devendo ser anulado, nos termos dos artigos 21.º, n.º 1, al. c) do CPAC e 124.º do CPA;
7. A este propósito, decidiu o Tribunal de Segunda Instância, nos Acórdãos n.ºs 841/2015 e 842/2015, ambos de 27 de Outubro de 2016, que "O acto do Secretário do Governo que determina o despejo e desocupação do terreno concessionado é de mera execução do acto declarativo de caducidade da autoria do Chefe do Executivo, podendo ser objecto de recurso contencioso se lhe forem imputadas ilegalidades próprias, como, por exemplo, a falta de audiência de interessados";
8. Estando a correr termos, pelo Tribunal de Segunda Instância, como Proc. n.º 558/2018, recurso contencioso de anulação da declaração de caducidade da concessão do terrerno a ordem de despejo ora em crise viola o princípio da proporcionalidade, previsto no artigo 5.º, n.º 2 do Código de Procedimento Administrativo;
9. No referido recurso contencioso n.º 558/2018, foi invocada uma causa impeditiva da caducidade da concessão, circunstância que, por si só, deveria obstar a qualquer decisão sobre o despejo até ser proferido acórdão final no recurso interposto;
10. Face à inércia da Administração, que se absteve de tomar as decisões relevantes que lhe competiam, nomeadamente a prometida aprovação do Plano Urbanístico das Zonas C e D do Fecho da Baía da Praia Grande, a alteração da finalidade e a revisão do contrato de concessão, é evidente que o despejo ordenado imediatamente a seguir ao recurso interposto da declaração de caducidade é uma medida desproporcional em termos de adequação, necessidade, exigibilidade e oportunidade;
11. A ordem de despejo, durante a pendência de um recurso de anulação do acto que a determinou, não pode ser considerada indispensável ou essencial ao resultado final pretendido, caso este venha a prevalecer a final;
12. Entendeu o Tribunal de Segunda Instância no Acórdão proferido no Proc. n.º 586/2018 - A que apesar de, na pendência do contencioso de anulação, poder vir a ser despossado das mãos da requerente, o terreno não desaparece no mundo físico nem é imediatamente aproveitado para outros fins, pelo que se o contencioso de anulação vier a triunfar no sentido de não ficar caducada a concessão do terreno, a Administração terá de reconstruir o status quo, bastando reinvestir a ora requerente na titularidade da concessão;
13. Ora, salvo o devido respeito, a manutenção do status quo é, certamente, mais prudente e menos lesiva dos interesses em jogo do que um despejo apressado e determinado na pendência de um recurso contencioso de anulação;
14. Com o registo da declaração de caducidade, que foi realizado por averbamento à respectiva inscrição, e a ordem de despejo determinada em 13 de Julho de 2018 já não existem obstáculos para a concessão do terreno a terceiros;
15. Se o terreno for concessionado a terceiros, mesmo que seja dado provimento ao recurso contencioso de anulação da declaração de caducidade interposto, a Recorrente não poderá ser reinvestida na sua titularidade, não podendo realizar o projecto imobiliário para o terreno;
16. Por isso, é mais adequado e menos lesivo manter uma situação jurídica do que reconstruí-la, tanto mais que nenhuma urgência justifica a necessidade de despejo imediato;
17. Se não há imediato destino a dar ao terreno nada justifica impor, desde já, à Recorrente que incorra em despesas com demolição de construções e remoção de viaturas, máquinas e equipamentos de construção, que poderão verificar-se desnecessárias e injustas se for dado provimento ao recurso contencioso de anulação da declaração de caducidade;
18. A ordem de despejo nas circunstância supra descritas não é proporcional ou adequacc ao benefício que a Administração pretende obter, pelo que, quer em comparação cca conduta da Administração, quer com o custo ou sacrifício da Recorrente provocado pela decisão ora recorrida, o despacho em causa viola gravemente o princípio da proporcionalidade consagrado no artigo 5.º do Código de Procedimento Administrativo;
19. Para que exista um interesse legalmente protegido é necessário, pois, como refere Freitas do Amaral, que se verifiquem os seguintes requisitos: a) que exista um interesse próprio de um sujeito de direito; b) que a lei proteja directamente um interesse público que, se for correctamente prosseguido implicará a satisfação simultânea do interesse individual referido; c) que o titular do interesse privado não possa legalmente exigir da Administração que satisfaça o seu interesse, mas pode exigir-lhe que não prejudique esse direito ilegalmente; d) que a lei não impondo à Administração que satisfaça o interesse particular, a proíba de realizar o interesse público com ele conexo por forma a ilegal; e) e que, em consequência disto, a lei dê ao particular o poder de obter a anulação dos actos pelos quais a Administração tenha prejudicado ilegalmente o interesse privado - requisitos cuja existência aqui que se constata;
20. A ordem de despejo nas circunstância supra descritas não é proporcional ou adequada ao benefício que a Administração pretende obter, pelo que, quer em comparação com a conduta da Administração, quer com o custo ou sacrifício da Recorrente provocado pela decisão ora recorrida, o despacho em causa viola gravemente o princípio da proporcionalidade consagrado no artigo 5.º do Código de Procedimento Administrativo;
21. Ao ordenar o despejo imediatamente a seguir à declaração de caducidade sem ponderaos elementos acima expostos e sem que nenhum imperativo legal o ditasse e Administração manifestou total desrazoabilidade no exercício dos poderes discricionários;
22. Desta forma, é também violado o princípio da justiça previsto no artigo 7.º do Código de Procedimento Administrativo, pois é desrazoável a conduta que impõe ao particular, um sacrifício de direitos desnecessário e desproporcional aos benefícios pretendidos;
23. Constituindo a violação dos princípios da proporcionalidade e da justiça uma ilegalidade por vício de violação de lei, o acto recorrido é anulável por força do artigo 124.º de CPA e do artigo 21.º, n.º 1, al. d) do Código de Processo Administrativo Contencioso.
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Regularmente citada, a Entidade Recorrida contestou nos termos constantes a fls. 64 a 77 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, pugnando pelo não provimento do recurso.
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A Recorrente apresentou as alegações facultativas, mantendo na sua essência, a posição assumida na petição inicial.
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O Ministério Público emitiu o seguinte parecer:
“…
Na petição inicial e alegações facultativas, a recorrente solicitou a anulação do despacho proferido pelo Exmo. Senhor STOP e traduzido em ordenar a desocupação no prazo de 60 dias, assacando a preterição da audiência bem como a violação dos princípios da proporcionalidade, da justiça e do respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos.
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Para os devidos efeitos, perfilhamos a sensata jurisprudência que preconiza (vide. Acórdãos do TSI nos Processos n.º789/2018 e n.º843/2018): “I - O acto do Secretário do Governo que manda proceder à devolução do terreno, na sequência do acto do Chefe do Executivo que declara a caducidade da concessão, em virtude do decurso do respectivo prazo de duração sem aproveitamento, limita-se a dar execução a este. II - Se do acto que declara a caducidade foi interposto recurso contencioso e se para decretar a devolução do terreno não teve lugar nenhum acto de instrução relevante, torna-se despiciendo proceder a audiência de interessados. III - Só em casos de erro grosseiro e manifesto pode o tribunal fazer censura a um acto discricionário anulando-o com base na violação de princípios gerais de direito administrativo, tais como o do respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos administrados, da proporcionalidade e da justiça.”
Procedendo à análise comparativa, podemos chegar a colher que os pressupostos de facto e direito do despacho impugnados nestes autos e a causa de pedir reiteradamente invocada pela ora recorrente são idênticos aos verificados nos Processos n.º789/2018 e n.º843/2018.
Convém ter presente que o Venerando TUI vem asseverando que com a declaração de caducidade da concessão, há de proceder ao despejo do terreno que tem sido ocupado pelo concessionário, desocupação esta que é uma decorrência normal e necessária daquela decisão; depois da declaração de caducidade da concessão, normalmente não há necessidade de proceder novamente à instrução nem à audiência de interessados antes da decisão de despejo (vide. Acórdão no Processo n.º89/2018). Pois, o acto que determina despejo da concessionária, após declaração de caducidade da concessão, não tem de ser precedido de audiência daquela, por se tratar de acto vinculado; do disposto na alínea 1) do n.º1 do artigo 179.º da Lei de Terras, não resulta que a Administração possa deixar de executar o acto, determinando o despejo do terreno, a lei não concede à Administração margem de livre apreciação ou decisão, para aguardar ou deixar de aguardar a impugnação do acto que declarou a caducidade ou para aguardar quaisquer outros eventos. (vide. Acórdão no Processo n.º80/2019)
Ressalvado merecido respeito pelo melhor entendimento em sentido diferente, estamos convictos de que as inculcas jurisprudenciais supra aludidas são válidas e aplicáveis ao caso sub judice, o que nos cauciona a concluir que são infundados os argumentos da recorrente.
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Por todo o expendido acima, propendemos pela improcedência do presente recurso contencioso…”.
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Foram colhidos os vistos legais dos Mmºs Juizes-Adjuntos.
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II – Pressupostos Processuais
O Tribunal é o competente.
As partes possuem personalidade e capacidade judiciárias.
Mostram-se regularmente patrocinadas.
Não existem nulidades, excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
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III – Factos
É assente a seguinte factualidade com interesse à boa decisão da causa face aos elementos probatórios existentes nos autos:
1. Por despacho do Chefe do Executivo de 03/05/2018, foi declarada a caducidade da concessão do terreno com a área de 3,131m2, designado por lote 6 da Zona C do empreendimento denominado “Fecho da Baía da Praia Grande”, situado na península de Macau, descrito na Conservatória do Registo Predial (CRP) sob o n.º 22517 a fls. 169 do livro B49, a que se refere o Processo n.º 64/2016 da Comissão de Terras, pelo decurso do prazo, nos termos e com os fundamentos do parecer do Secretário para os Transportes e Obras Públicas (STOP), de 04 de Novembro de 2016, o qual faz parte integrante do referido despacho.
2. A declaração de caducidade da concessão acima referida foi publicada, pelo Despacho do STOP n.º 23/2018, no Boletim Oficial da RAEM, n.º 20, II Série, de 16 de Maio de 2018, e que foi notificada Sociedade de Investimento Imobiliário Man Keng Van, S.A. através do ofício n.º 151/DAT/2018 no mesmo dia.
3. Nestas circunstâncias, nos termos da alínea 1) do n.º 1 do artigo 179.º da Lei n.º 10/2013 «Lei de terras», por despacho do STOP de 13 de Julho de 2018, exarado na Proposta n.º 213/DSO/2018, é ordenado a Sociedade de Investimento Imobiliário Man Keng Van, S.A. o despejo do terreno em epígrafe no prazo de 60 dias a contar da data de recepção da notificação, devendo demolir e remover construções temporárias de estrutura metálica, remover todos os bens móveis existentes no local, tais como todas as areias e pedras, materiais e máquinas de construção, contentores e os resíduos sólidos e lixo, bem como os veículos automóveis lá estacionados. As benfeitorias por qualquer forma incorporadas no terreno são revertidas para a RAEM, livre de quaisquer ónus ou encargos, sem direito a qualquer indemnização.
4. O técnico do DSSOPT elaborou, em 11/07/2018, a seguinte proposta (nº 213/DSO/2018):
“…
1. Por despacho do Chefe do Executivo de 3 de Maio de 2018, foi declarada a caducidade da concessão do terreno com a área de 3 131 m2, designado por lote 6 da zona C do empreendimento denominado «Fecho da Baía da Praia Grande», situado na península de Macau, descrito na Conservatória do Registo Predial (CRP) sob o n.º 22517 a fls. 169 do livro B49, a que se refere O Processo n.º 64/2016 da Comissão de Terras, pelo decurso do seu prazo, nos termos e com os fundamentos do parecer do Secretário para os Transportes e Obras Públicas (STOP), de 4 de Novembro de 2016, os quais fazem parte integrante do referido despacho.
2. A declaração de caducidade da concessão acima referida foi publicada, pelo Despacho do STOP n.º 23/2018, no Boletim Oficial da RAEM n.º 20, II Série, de 16 de Maio de 2018, e através dos ofícios n.ºs 151/DAT/2018 e 152/DAT/2018, ambos de 16 de Maio de 2018, foi notificado respectivamente à “Sociedade de Investimento Imobiliário Man Keng Van, S.A.” e à credora hipotecária o conteúdo do referido despacho. (Anexo 1)
3. Conforme as fotografias tiradas pelo pessoal deste Departamento em 31 de Maio de 2018, verifica-se que no terreno referido existem veículos automóveis cujos proprietários são desconhecidos, areias e pedras, materiais e máquinas de construção, contentores e armazém em estrutura metálica. (Anexo 2)
4. Enfrentando o seguimento da caducidade de concessão, deve considerar-se o seguinte:
4.1 Nos termos do artigo 117.º e do n.º 1 do artigo 136.º do «Código do Procedimento Administrativo» (CPA) aprovado pelo Decreto-Lei n.º 57/99/M de 11 de Outubro, o acto administrativo produz os seus efeitos desde a data em que for praticado e é executório logo que eficaz, não obstando à perfeição do mesmo por qualquer motivo determinante de anulabilidade, salvo os actos previstos no artigo 137.º do CPA;
4.2 Por outro lado, ao abrigo das disposições do artigo 22.º do «Código do Processo Administrativo Contencioso» aprovado pelo Decreto-Lei n.º 110/99/M de 13 de Dezembro, o recurso contencioso não tem efeito suspensivo da eficácia do acto recorrido;
4.3 Assim sendo, quer interponha o recurso contencioso quer não, a ordem emitida pela Administração pode ser executada;
4.4 Com base no n.º 2 do artigo 179.º da Lei n.º 10/2013 «Lei de terras», o despejo processa-se nos termos e com as necessárias adaptações do Decreto-Lei n.º 79/85/M, «Regulamento Geral da Construção Urbana» (RGCU), de 21 de Agosto;
4.5 Os objectos, materiais e equipamentos abandonados no terreno serão tratados de acordo com as disposições do artigo 210.º da «Lei de terras».
5. Em face do exposto, em conformidade com a alínea 1) do n.º 1 do artigo 179.º da «Lei de terras» e com o artigo 55.º do RGCU, submete-se a presente proposta à consideração superior, a fim de:
5.1 Ordenar o despejo da «Sociedade de Investimento Imobiliário Man Keng Van, S.A.», no prazo de 60 dias contado a partir da data de notificação, do terreno com a área de 3131 m2, designado por lote 6 da zona C do empreendimento denominado «Fecho da Baía da Praia Grande», situado na península de Macau, descrito na CRP sob o n.º 22517 a fls. 169 do livro B49, cuja concessão foi declarada caduca por despacho do Chefe do Executivo de 3 de Maio de 2018, devendo demolir e remover construções temporárias de estrutura metálica, remover todos os bens móveis existentes no local, tais como todas as areias e pedras, materiais e máquinas de construção, contentores e os resíduos sólidos e lixo, bem como os veículos automóveis lá estacionados;
Caso não se execute voluntariamente no referido prazo de 60 dias,
5.2 A DSSOPT irá executar coercivamente o referido despejo de acordo com o artigo 56.º do RGCU.
À consideração superior.…”.
5. O Secretário para os Transportes e Obras Públicas, em 13/07/2018, proferiu, na proposta n.º 213/DSO/2018 de 11/07/2018, o seguinte despacho: “Concordo”.
6. Pela Ordem Executiva n.º 113/2014, o Chefe do Executivo delegou no STOP as competências executivas em relação a todos os assuntos relativos às áreas de governação e aos serviços e entidades referidos no artigo 6.º do Regulamento Administrativo n.º 6/1999.
7. A Ordem Executiva nº 113/2014, de 20/12/2014, foi publicada no B.O. de 20/12/2014, I Série, Número Extraordinário.
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IV – Fundamentação
Imputa a Recorrente ao acto recorrido os seguintes vícios:
- falta de audiência prévia; e
- violação dos princípios da justiça e da proporcionalidade.
Vamos agora analisar se assiste razão à Recorrente.
(1) Da falta de audiência prévia:
Como é sabido, a audiência de interessados é uma das formas da concretização do princípio da participação dos particulares no procedimento administrativo, legalmente previsto no artº 10º do CPAC, nos termos do qual os órgãos da Administração Pública devem assegurar a participação dos particulares, bem como das associações que tenham por objecto a defesa dos seus interesses, na formação das decisões que lhes disserem respeito.
E destina-se a evitar, face ao administrado, o efeito surpresa e, no mesmo passo, garantir o contraditório, de modo a que não sejam diminuídos os direitos ou interesses legalmente protegidos dos administrados.
A doutrina e a jurisprudência portuguesa, cujo sistema jurídico é igual ou semelhante ao nosso, pelo que citamos a título do Direito Comparado, têm vindo a entender que a preterição dessa formalidade pode, em certos casos, ser ultrapassada se daí não resulte qualquer ilegalidade determinante da anulação do acto, isto é, quando, atentas as circunstâncias concretas, a intervenção do interessado se tornou inútil, seja porque o contraditório já se encontre assegurado, seja porque não haja nada sobre que ele se pudesse pronunciar, seja porque, independentemente da sua intervenção e das posições que o mesmo pudesse tomar, a decisão da Administração só pudesse ser aquela que foi tomada (Ac. do STA, proferidos nos Recursos nºs 1240/02, 671/10 e 833/10, respectivamente, de 03/03/2004, 10/11/2010 e 11/05/2011).
No caso em apreço, com a declaração da caducidade da concessão, a desocupação do terreno é inevitável nos termos da al. 1) do nº 1 do artº 179º da actual Lei de Terras (Lei nº 10/2013).
Trata-se, portanto, duma actividade vinculada da Administração.
Mesmo que haja recurso contencioso em curso do acto da declaração da caducidade, tal recurso não tem efeito suspensivo da eficácia do acto recorrido (cfr. artº 22º do CPAC).
Nesta conformidade, a audiência prévia da Recorrente deixa de ter qualquer efeito útil, uma vez que nada pode influenciar a decisão a tomar pela Entidade Recorrida.
Improcede-se assim o recurso nesta parte.
(2) Da violação dos princípios da proporcionalidade e da justiça:
Os vícios supra identificados só existem nas actividades administrativas discricionárias.
Já vimos que com a declaração da caducidade da concessão, a desocupação do terreno é inevitável nos termos da al. 1) do nº 1 do artº 179º da actual Lei de Terras (Lei nº 10/2013).
Ora, sendo uma actividade administrativa vinculada, os alegados vícios nunca são operantes.
No mesmo sentido, vejam-se os acórdãos do TUI, de 08/06/2016 e 22/06/2016, proferidos, respectivamente, nos Proc. nº 9/2016 e 32/2016.
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Tudo visto, resta decidir.
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V – Decisão
Nos termos e fundamentos acima expostos, acordam em julgar improcedente o presente recurso contencioso, mantendo o acto recorrido.
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Custas pela Recorrente com 8UC taxa de justiça.
Notifique e registe.
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RAEM, aos 27 de Fevereiro de 2020.
Ho Wai Neng
José Cândido de Pinho
Tong Hio Fong
Mai Man Ieng
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