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--- Decisão Sumária nos termos do art.º 407º, n.º 6 do C.P.P.M. (Lei n.º 9/2013). ----------------
--- Data: 27/02/2020 --------------------------------------------------------------------------------------------
--- Relator: Dr. Chan Kuong Seng .-------------------------------------------------------------------------

Processo n.º 85/2020
(Autos de recurso penal)
Recorrente: Ministério Público





DECISÃO SUMÁRIA NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA
1. Veio o Digno Procurador-Adjunto junto do Tribunal Judicial de Base (TJB) recorrer, para este Tribunal de Segunda Instância (TSI), da deliberação tomada pelo Tribunal Colectivo – encarregado de julgar de novo, no âmbito do ora subjacente Processo Comum Colectivo n.o CR4-18-0347-PCC, o crime de tráfico de estupefacientes então imputado ao 3.o arguido alegadamente como co-autor dos 1.o e 2.o arguidos, todos desse mesmo processo, na sequência do reenvio do processo ordenado no anterior acórdão de recurso do TSI – no sentido de os 1.o e 2.o arguidos serem ouvidos na (nova) audiência de julgamento apenas como arguidos, e não como testemunhas, a respeito da matéria objecto do reenvio ordenado pelo TSI, para rogar a revogação dessa deliberação (por alegada errada interpretação da norma do art.o 120.o, n.o 1, alínea a), do Código de Processo Penal (CPP)), com consequente pretendida admissão da audição dos 1.o e 2.o arguidos como testemunhas (cfr. a motivação do recurso apresentada a fls. 801 a 809v dos presentes autos correspondentes).
Ao recurso, defenderam os 1.o, 2.o e 3.o arguidos a manutenção da decisão judicial recorrida (cfr. as respostas de fl. 815, de fl. 813 e de fl. 816, respectivamente).
Subido imediatamente o recurso para este TSI, a Digna Procuradora-Adjunta emitiu parecer (a fls. 826 a 827), opinando pela possibilidade de os 1.o e 2.o arguidos serem ouvidos na audiência de julgamento na qualidade de testemunhas, sem prejuízo do disposto no art.o 119.o, n.o 2, do CPP.
Feito o exame preliminar, é de emitir a presente decisão sumária nos termos do art.o 407.o, n.o 6, alínea a), do CPP.
2. Do exame preliminar dos autos, sabe-se o seguinte (nomeadamente em face do teor da acta da audiência de julgamento de fls. 794 a 795):
Na sessão da audiência de julgamento de 15 de Novembro de 2019 do subjacente Processo n.o CR4-18-0347-PCC do TJB, convocada na sequência, e para efeitos de execução, do acórdão de reenvio do mesmo processo para novo julgamento em relação ao crime de tráfico de estupefacientes então imputado pelo Ministério Público ao 3.o arguido, alegadamente, como co-autor dos 1.o e 2 .o arguidos (cfr. o acórdão de reenvio proferido pelo TSI a fls. 686 a 691v dos autos), foi deliberado pelo novo Tribunal Colectivo, a respeito da questão levantada pelo Ex.mo Defensor constituído do 1.o arguido, concordada pelo Ex.mo Defensor constituído do 2.o arguido, mas com oposição do Digno Procurador-Adjunto, que os 1.o e 2.o arguidos seriam ouvidos na audiência de julgamento na qualidade de arguidos (e não na de testemunhas) a propósito da matéria fáctica então acusada pelo Ministério Público ao 3.o arguido, apesar de a condenação penal dos 1.o e 2.o arguidos já ter transitado em julgado.
Ante esta deliberação, o Digno Procurador-Adjunto presente na audiência declarou aí a interposição do recurso, e pediu que o processo aguardasse pelo resultado de decisão do recurso, por a questão de qual a qualidade com que os 1.o e 2.o arguidos iriam ser ouvidos na audiência de julgamento constituir, no entender dele, uma questão prévia.
Acabou o mesmo Tribunal Colectivo por qualificar tal questão como uma questão prévia nos termos do art.o 293.o do CPP, e por deliberar, em prol, no seu entender, do princípio da economia processual, em designar nova data para audiência, em momento oportuno após a saída do resultado do recurso em causa.
Subiu o recurso em questão (motivado a fls. 801 a 809v, para pedir que se admitisse a audição dos 1.o e 2.o arguidos na audiência de julgamento como sendo testemunhas acerca da matéria objecto do reenvio do processo ordenado pelo TSI no anterior acórdão de recurso) nos próprios autos imediatamente para este TSI, por determinação no despacho judicial de fl. 817.
3. Verificando-se em sede de exame preliminar dos autos que o recurso do Ministério Público acima identificado subiu imediatamente nos próprios autos para este TSI.
Entretanto, independentemente do demais, urge aquilatar do acerto, ou não, do momento de subida desse recurso, sob aval da norma do n.o 3 do art.o 404.o do CPP.
De antemão, observa-se que a decisão judicial ora recorrida não chegou a pôr termo à causa penal então instaurada pelo Ministério Público contra o 3.o arguido, acusado pela prática do crime de tráfico de estupefacientes.
Assim sendo, nos termos jusprocessuais poderá esse recurso ter subido imediatamente para este TSI?
A resposta estará na norma do n.o 2 do art.o 397.o do CPP.
Sobre o sentido e alcance desta norma, é de seguir a posição jurídica já detalhadamente veiculada pelo TSI no acórdão de 14 de Dezembro de 2000 no Processo n.o 186/2000, reiterada no acórdão de 2 de Maio de 2002 no Processo n.o 212/2001, e também no acórdão de 17 de Julho de 2003 no Processo n.o 137/2003.
Nessa esteira, é de entender, no presente caso, que:
– não se tratando o recurso vertente de nenhum dos casos expressamente elencados no n.º 1 desse art.º 397.º do CPP, resta, ajuizar se lhe é aplicável o disposto no seu n.º 2, sob pena de se cair, em princípio, na alçada do disposto no seu n.º 3;
– ora, um recurso penal só é de subir imediatamente ao abrigo do art.º 397.º, n.º 2, quando a sua retenção o tornará absolutamente inútil, por se tratar precisamente de um recurso cujo resultado, seja qual for, devido à retenção, já não pode ter qualquer eficácia dentro do processo, e não daquele cujo provimento possibilita a anulação de algum acto, mesmo do julgamento, por ser isso o risco próprio ou normal do recurso diferido; ou, dito por outro modo, a subida imediata de um recurso intercalar só tem lugar quando a retenção do mesmo o torna absolutamente inútil para o corrente, e não por outra razão, como a economia processual ou a perturbação que possa provocar no processo onde o mesmo recurso foi interposto; não basta, assim, uma inutilidade relativa para justificar a subida imediata do recurso; a situação há-de ser tal que, se o recurso não for apreciado imediatamente, já não servirá de nada;
– dest’arte, há que concluir que a retenção do recurso em apreço não o torna absolutamente inútil, pois caso este recurso venha a proceder no futuro, o resultado dessa procedência ainda poderá ter eficácia no processo perante o estado de coisas entretanto a verificar-se, já que tudo se processará, com o provimento do recurso, com a inquirição, de novo, dos 1.o e 2.o arguidos como testemunhas (e não como arguidos) em audiência de julgamento nos termos pretendidos pelo Ministério Público;
– o recurso em questão subiu, pois, extemporaneamente, no sentido de prematuramente, devendo, em princípio, só vir a subir nos termos do art.º 397.º, n.º 3, do CPP, conjugado com o art.º 396.º, n.º 1, do mesmo diploma, e, portanto, a ser instruído e julgado conjuntamente com o recurso interposto da decisão que tiver posto termo à causa (decisão deste tipo que, frisa-se, ainda não surgiu nos autos quanto à causa penal instaurada contra o 3.o arguido), ou, caso o haja antes, com o primeiro recurso a subir imediatamente, nos termos do art.º 602.º, n.º 1, do Código de Processo Civil de Macau, ex vi do art.º 4.º do CPP, daí que presentemente não se pode fazer conhecer, neste TSI, do mesmo recurso.
4. Face ao exposto, decide-se, pela presente decisão sumária, em não fazer tomar conhecimento agora, neste Tribunal de Segunda Instância, do recurso do Ministério Público, ordenando-se a baixa do processo ao Tribunal a quo para efeitos de prosseguimento dos seus termos.
Sem custas.
Macau, 27 de Fevereiro de 2020.
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Chan Kuong Seng
(Relator)



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