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Proc. nº 48/2019
Recurso Contencioso
Relator: Cândido de Pinho
Data do acórdão: 27 de Fevereiro de 2020
Descritores:
- Princípio da boa fé

SUMÁRIO:

A invocação da violação do princípio da boa fé (art. 8º, do CPA) só faz sentido ante uma atitude da Administração que fira a confiança que nela o particular depositou ao longo do tempo, levando-o a crer que diferente decisão administrativa estaria para ser tomada.



Proc. nº 48/2019

Acordam no Tribunal de Segunda Instância da RAEM

I – Relatório
A, com os demais sinais dos autos,
Recorre contenciosamente do despacho do CHEFE DO EXECUTIVO, datado de 30 de Novembro de 2018 e exarado na Proposta n.º 294/DSO/2018,---
Através do qual indeferiu o pedido de renovação da concessão de um terreno rústico, com a área de 886.74 m2, sito na ilha da Taipa, junto ao caminho da Povoação de Cheoc Ká (lote TN2b) destinado a fins agrícolas.
Na petição inicial, formulou as seguintes conclusões:
“1. O objecto do presente recurso é o despacho do Senhor Chefe do Executivo, datado de 30 de Novembro de 2018, que indeferiu, com fundamento no abandono e consequente falta de aproveitamento, o pedido feito pelo ora Recorrente de renovação da concessão de um terreno rústico, com a área de 886.74 m2, sito na ilha da Taipa, junto ao caminho da Povoação de Cheoc Ká (lote TN2b) destinado a fins agrícolas.
2. O acto recorrido padece, desde logo, de um vício de violação de lei por erro nos pressupostos de facto, porquanto não é verdade que o terreno esteja abandonado e sem aproveitamento.
3. O Recorrente juntou aos autos fotografias (cf. fls. 1223 a 1218 do PA) que comprovam que no referido terreno são cultivadas as seguintes espécies de plantas e vegetais, as quais se identificam em língua chinesa: 木瓜, 萬年青, 福建茶, 節瓜, 散尾葵, 非洲茉莉, 絲瓜, 粉葛, 竹芋, 蕉芋, 深薯, 姜, 田七, 白菜, 菜心, 金錢樹, 一帆風順, 發財樹, 榕樹, 鐵樹, 羅漢樹, 甘桔, 竹樹, 龍船花.
4. Para fundamentar a alegada falta de aproveitamento do terreno, a Entidade Recorrida limitou-se a juntar fotografias do terreno tiradas em diferentes ocasiões pelos Serviços sob sua orientação (cf. Anexos 1 (INF 221/DSODEP/2015, fls. 1240-1233v, em especial fls. 1234v - pág. 7, parágrafo 40), 5 (CSI 292/DJUDEP/2018, fls. 1209-1206 - pág. 4, parágrafo 8) e 6 (fotografias do terreno de fls. 1205-1199) juntos à Proposta n.º 294/DSO/2018).
5. As fotografias que servem de fundamento à decisão recorrida não só não demonstram o não aproveitamento do terreno, antes pelo contrário (cf. fotografias de fls. 1201-1205 e 1218-1223 do PA), como são manifestamente insuficientes para justificar o acto recorrido.
6. O efectivo aproveitamento do terreno só poderia ser aferido através de uma inspecção feita pela comissão de vistoria prevista no artigo 130.º, n.º 3, da Lei n.º 10/2013, o que não aconteceu.
7. Termos em que o acto recorrido é ilegal, por erro nos pressupostos de facto, sendo anulável de acordo com o disposto nos artigos 21.º, n.º 1, alínea d), do CPAC e 124.º do CPA.
8. O acto recorrido padece também de um vício de violação de lei por erro nos pressupostos de direito.
9. O artigo 166.º, n.º 2, alínea 2), da Lei n.º 10/2013 estabelece que as concessões provisórias de terrenos rústicos caducam quando “o aproveitamento seja suspenso, consecutiva ou intercaladamente, por um período superior a 12 meses”.
10. A Lei apenas refere as concessões provisórias e não as definitivas, pelo que, tratando-se de uma concessão definitiva, não há base legal para a não renovação com fundamento no não aproveitamento porque a Lei não impõe qualquer base temporal em caso de suspensão do aproveitamento nas concessões definitivas de terrenos rústicos.

11. Mesmo que se entenda ser aplicável o disposto na alínea 2) do n.º 2 do artigo 166.º às concessões definitivas de terrenos rústicos, impunha-se que a Entidade Recorrida tivesse verificado que a suspensão do aproveitamento se verificou, consecutiva ou intercaladamente, por um período superior a 12 meses, o que não foi feito.
12. Em consequência, padece a decisão recorrida de vício de violação de lei por erro nos pressupostos de Direito, nos termos conjugados nos artigos 21.º, n.º 1, alínea d), do CPAC e 124.º do CPA.
13. Finalmente, a decisão recorrida é ilegal por violação do princípio da boa fé.
14. A Entidade Recorrida reconhece que o terreno em causa deixou de ter aptidão agrícola face ao desenvolvimento social do local onde está situado.
15. Tendo em consideração que já desde os anos 80 a Administração vem considerando que o terreno em causa não tem vocação agrícola, o Recorrente submeteu à apreciação da DSSOPT diversos projectos de construção, o último dos quais de Março de 2015, na sequência da emissão, em 27 de Outubro de 2014, da planta de condições urbanísticas n.º 88A003, nos termos da qual se admite a construção de um edifício com noventa metros.
16. O projecto foi considerado passível de aprovação após merecer o parecer favorável do IACM, da DSAT, do Corpo de Bombeiros e da CEM (cf. fls. 763-769 do PA).
17. O acto recorrido configura uma situação de venire contra factum proprium e de violação do princípio da confiança que se traduz num exercício desrazoável dos poderes discricionários da Entidade Recorrida violando assim as mais elementares premissas da Boa Fé!

18. A conduta da Entidade Recorrida é agravada pelo facto de o Recorrente, através da sua procuradora substabelecida Sociedade de Investimento e Desenvolvimento B, Limitada e o Banco Tai Fung terem celebrado dois contratos de empréstimo, o primeiro, em 28 de Abril de 2010, no montante de HKD25.000.000,00, e o segundo, em 5 de Abril de 2012, no montante de MOP77.332.500,00, perfazendo o total de MOP103.165.000,00, para o efeito de financiar o projecto de construção de um edifício com fins habitacionais e de comércio, tendo sido constituídas duas hipotecas sobre o terreno.
19. A decisão de não renovação da concessão não só contraria a conduta prosseguida pela Administração em todo este processo, como também não se afigura a que melhor assegura o interesse público com vista a um mais eficaz aproveitamento do terreno, designadamente para uma futura finalidade habitacional, dada a evidente necessidade de construir mais habitação de forma a satisfazer as necessidades da população.
20. O acto recorrido viola flagrantemente exigências de boa fé impostas à Entidade Recorrida por força do disposto no artigo 8.º do CP A, pelo que o acto é também anulável nesta vertente nos termos conjugados dos artigos 21.º, n.º 1, alínea d), do CPAC e 124.º do CPA.
Nestes termos, e nos demais de Direito que Vossas Excelências melhor suprirão, deve o presente recurso contencioso ser admitido e anulado acto objecto do mesmo, devendo o conhecimento dos vícios pelo Douto Tribunal seguir a ordem das alegações apresentadas pelo Recorrente nos termos do artigo 42.º, n.º 3, do CPAC.”
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Contestou a entidade recorrida, pugnando pela improcedência do recurso em termos que aqui damos por integralmente reproduzidos.
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Houve lugar a produção de prova testemunhal.
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Posteriormente, o recorrente apresentou alegações facultativas, em que reiterou, essencialmente, a posição inicialmente defendida nos autos.
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O digno Magistrado do MP emitiu o seguinte parecer:
“Vejamos quanto ao erro nos pressupostos de facto.
O recorrente põe em causa a veracidade dos pressupostos “abandono” e “falta de aproveitamento” esgrimidos no acto, asseverando que jamais o terreno deixou de ser aproveitado para a sua finalidade, desde o início da concessão, já lá vão mais de 66 anos, e questiona o recurso a fotografias para documentar e provar os pressupostos referidos, pois entende que, para o efeito, devia ter intervindo a comissão de vistoria nos termos plasmados no artigo 130.º, n.º 3, da Lei de Terras.
Não tem razão. Desde logo, a intervenção da comissão de vistoria destinada a fazer prova do aproveitamento de terrenos rústicos, nos termos do artigo 130.º, n.º 3, da Lei de Terras, está prevista para as concessões provisórias, em vista da conversão destas em definitivas, como resulta claro da conjugação dos artigos 130.º e 131.º da Lei de Terras. Ora, no caso em apreço, estava em causa a renovação de uma concessão definitiva. Por outro lado, não divisamos razões legais para desconsiderar, como válidos meios de prova, fotografias tiradas ao terreno e local da concessão, em datas próximas do momento da renovação da concessão. Estas fotos, de 2012 e 2013, dão uma panorâmica nítida do terreno e do seu estado de abandono, em finais de 2012 e princípios de 2013, na ocasião em que se colocava a questão da renovação da concessão, como pode constatar-se a fls. 1138 e 1139 do processo instrutor. Contrariamente, outras fotos juntas ao mesmo processo, mas retratando momentos muito posteriores, nomeadamente de 2016, para além de não traduzirem a situação fáctica observada no momento relevante a ter em conta na prolação do acto, foram obtidas e oferecidas após a notificação do recorrente e outro interessado para efeitos de audiência prévia.
Temos, pois, que não há erro nos pressupostos de facto, pelo que improcede este primeiro vício imputado ao acto.
Em sede de erro nos pressupostos de direito, o recorrente afirma que a lei não impõe qualquer condicionamento ou limite temporal para a suspensão do aproveitamento, pelo que inexiste base legal para a não renovação da concessão com fundamento no não aproveitamento do terreno na actividade agrícola a que se destinava a sua concessão.
Também não se crê que neste ponto lhe assista razão. Como se retira dos normativos aplicáveis (artigos 59.º e 50.º a 52.º da Lei de Terras), a renovação das concessões de terrenos rústicos está dependente de prévia autorização do Chefe do Executivo, que a dá ou denega a coberto de poderes eminentemente discricionários. No exercício de tais poderes, a Administração tem que prosseguir o interesse público, sem menosprezo desnecessário pelos interesses particulares, estando obrigada a observar limites internos e externos impostos à actividade administrativa, avultando entre estes o dever de exteriorizar os fundamentos relevantes para a adopção da decisão, ou seja, o dever de fundamentação. Constata-se que, na fundamentação, um dos motivos arregimentados foi a ausência de aproveitamento do terreno, onde não se detectava qualquer indício de actividade agrícola (cf. despacho recorrido e pareceres para que remete, incluindo as considerações jurídicas avançadas na comunicação de serviço n.º 292/DJUDEP/2018, a fls. 1246 e 1189 do processo instrutor). Pois bem, não proibindo a lei que o juízo discricionário sobre a renovação assente em elementos relativos à forma como o terreno é ou não aproveitado, apresenta-se óbvio que nenhuma afronta a pressupostos de direito é cometida por via de uma tal referência, cuja ponderação faz todo o sentido, dada a finalidade social inerente à ocupação dos terrenos do Estado.
Improcede também o assacado erro nos pressupostos de direito.

Resta abordar, por fim, a violação do princípio da boa-fé.
Está em causa o quebrar de expectativas que a Administração incutiu no recorrente, ao equacionar a hipótese de revisão do contrato, em vista da alteração da finalidade do aproveitamento, na sequência do que chegou a ser emitida uma PCU (planta de condições urbanísticas) e foi apresentado um projecto de construção (anteprojecto de arquitectura) considerado passível de aprovação. Esta alegada e comprovada matéria, que, em tese, poderia alicerçar a invocada violação da boa-fé, depara com uma contrariedade inultrapassável, no presente recurso contencioso, em que está em causa o acto de 30 de Novembro de 2018, que indeferiu pedido de renovação da concessão. É que essa aventada revisão do contrato, bem como a PCU e o juízo de probabilidade de aprovação do anteprojecto caíram por terra mediante despacho expresso de 5 de Agosto de 2015, do Secretário para os Transportes e Obras Públicas, através do qual foi posto termo a qualquer intento de revisão e revogados aquela PCU e o despacho que considerou o anteprojecto de arquitectura passível de aprovação - cf. fls. 1240 do processo instrutor. Por isso, e dado que o acto agora em escrutínio lidou com uma situação em que aquela aventada revisão já não se colocava, pois fora resolvida e deixara de estar pendente a partir do apontado acto de 5 de Agosto de 2015, não faz sentido imputar agora a violação do princípio da boa-fé ao acto de 30 de Novembro de 2018. Se violação do princípio da boa-fé tivesse havido, ela teria que ser suscitada relativamente ao acto revogatório de 5 de Agosto de 2015.
Soçobra também o invocado vício de violação do princípio da boa-fé.
Ante o exposto, o nosso parecer vai no sentido de ser recusado provimento ao recurso.”.
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Cumpre decidir.
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II – Pressupostos processuais
O tribunal é absolutamente competente.
O processo é o próprio e não há nulidades.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão bem representadas.
Não há outras excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento de mérito.
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III – Os Factos
1 - Por escritura pública outorgada em 11 de Novembro de 1974, lavrada a fls. 1 do Livro n.º 157 da Repartição Provincial das Serviços de Finanças de Macau, foi titulada a favor de A, a transmissão do direito resultante da concessão, por arrendamento, do terreno com à área de 886.74 m2, situado na ilha da Taipa, junto ao Caminho da Povoação de Cheok Ká, Lote TN2b, descrito na Conservatória do Registo Predial (CRP) sob o n.º 21 125 a fls. 106V do livro B47, conforme inscrição a seu favor sob o n.º 8409 a fls. 75V do livro F9.
2 - Foi estabelecido na cláusula segunda do aludido contrato que o terreno se destina, unicamente, a fins agrícolas, sendo, de acordo com o previsto na cláusula terceira do mesmo contrato, o prazo do arrendamento de 50 anos, a contar de 25 de Dezembro de 1952 (data da primitiva escritura do contrato), ou seja, até de 24 de Dezembro de 2002.
3 - Em 6 de Dezembro de 2002, “Companhia de Construção e Fomento Predial C, Limitada”, na qualidade de procuradora substabelecida de A, solicitou a renovação da concessão do referido terreno por mais um período de 10 anos.
4 - A DSSOPT efectuou o cálculo da contribuição especial devida pela renovação do prazo da concessão do terreno por um período de 10 anos e enviou à Direcção dos Serviços de Finanças (DSF) a respectiva folha de cálculo, solicitando que notificasse a requerente para cobrança.
5 - Por outro lado, a DSSOPT deu conhecimento à requerente do envio da aludida folha de cálculo à DSF e de que esta oportunamente a notificaria para pagamento da contribuição especial, nos termos da Portaria n.º 219/93/M, de 2 de Agosto, juntando ao ofício cópia do requerimento da interessada a fim de esta proceder ao registo da renovação junto da CRP.

6 - Por requerimento apresentado em 10 de Fevereiro de 2006, a sociedade “D- Companhia de Investimento e Desenvolvimento, Limitada”, depois de expor que adquiriu, por escritura pública de 31 de Outubro de 2005, outorgada no Cartório do Notário Privado Adelino Correia, lavrada a fls. 112 e seguintes do Livro n.º 43, os direitos resultantes da concessão por arrendamento do sobre dito terreno e de que a CRP recusou o registo de aquisição desses direitos a seu favor com fundamento na violação da alínea a) do artigo 146.º da Lei de Terras, apesar de terreno se encontrar aproveitado dado ter sido recentemente renovada a concessão por mais um período de 10 anos, solicitou que fosse autorizada a alteração da sua finalidade para fins habitacionais e comerciais, em virtude de não se justificar a continuidade dessa a concessão nos termos e moldes como foi inicialmente atribuída, atentos a falta de vocação dos terrenos naquela zona para a prática de actividades relacionadas com a agricultura e aumento do parque habitacional na Região Administrativa Especial de Macau (RAEM), sobretudo na zona da Taipa.
Essa requerente solicitou ainda que fosse autorizada, nos termos do artigo 143.º da Lei de Terras, a transmissão dos direitos resultantes da concessão por arrendamento do terreno em causa a seu favor.
7 - Todavia, em 11 de Maio de 2010, “D- Companhia de Investimento e Desenvolvimento, Limitada”, declarou a desistência dos aludidos pedidos.
8 - Posteriormente, em 21 de Junho de 2012, E e F, na qualidade de administradores da “Sociedade de Investimento e Desenvolvimento B, Limitada”, sendo esta sociedade na qualidade de procuradora substabelecida de A, declararam, nos termos do n.º 1 do artigo 55.º da Lei de Terras, que este concessionário pretende “a renovação por dez anos, a contar de 25 de Dezembro de 2012, da concessão definitiva, por arrendamento”.
9 - Foram tiradas fotografias no local, em 20 de Agosto de 2012 e 31 de Janeiro de 2013.
10 - Em 15/07/2015 foi elaborada a seguinte Proposta nº 221/DSODEP/2015:
“Proposta N.º: 221/DSODEP/2015
Data: 15/07/2015

Assunto: Pedido de renovação da concessão do terreno, com a área de 886,74 m2, situado na ilha da Taipa, junto ao Caminho da Povoação de Cheoc Ká (lote TN2b), concedido por arrendamento, destinado a fins agrícolas. (Processo n.º 6198.02)

1. Relativamente a um terreno com a área de 886,74 m2, situado na ilha da Taipa, junto ao Caminho da Povoação de Cheok Ká, destinado à finalidade rústica, cujo contrato de concessão por arrendamento titulado por escritura pública outorgada em 11 de Novembro de 1974 foi transmitido a favor de A, e após a análise do respectivo processo, sobretudo tomando como referência o parecer do Departamento Jurídico (DJUDEP) emitido para casos semelhantes, bem como tendo em consideração que:
1) O terreno cuja renovação foi solicitada encontra-se abandonado e sem qualquer indício de actividade rústica;
2) O concessionário do terreno não alterou a finalidade ou o aproveitamento do terreno simplesmente não desenvolveu qualquer actividade no mesmo;
3) O Departamento de Planeamento Urbanístico (DPUDEP) informou que, conforme o novo estudo do planeamento, basicamente, a finalidade rústica não é adequada aos terrenos situados naquela zona serem, devendo as condições principais de desenvolvimento serem de finalidade não industrial;
4) O concessionário ainda é vivo;
5) Foram considerados condicionalmente passíveis de aprovação, por esta Direcção de Serviços, os projectos de construção registados sob o n.º T-3304 de 6 de Julho de 1992 e sob o n.º T-5093 de 12 de Outubro de 1992 apresentados pelo concessionário, e foi emitido parecer favorável condicionado ao estudo prévio de alteração registado sob o n.º T-4839 de 13 de Outubro de 2006 apresentado pela “D - Companhia de Investimento e Desenvolvimento, Limitada” (procuradora substabelecida do concessionário);
Através da informação n.º 061/DSODEP/2013 (vide o original em anexo 1) de 4 de Fevereiro, este departamento solicitou as instruções superiores sobre a renovação ou não da concessão por arrendamento acima referida por 2 anos de acordo com a disposição do n.º 4 do artigo 61.º da Lei de Terras.
2. Para o efeito, pelo despacho do Sr. Director desta Direcção de Serviços de 15 de Março de 2013 exarado na referida informação, foi ordenado a este departamento a solicitação do parecer jurídico antes de submeter a informação ao Sr. Secretário para os Transportes e Obras Públicas (STOP).
3. Em cumprimento do referido despacho do Sr. Director, este departamento, através da CSI n.º 167/6198.02/2013 de 18 de Março, enviou a referida informação ao DJUDEP para análise e emissão de parecer. (Anexo 2)

4. Nestas circunstâncias, através da proposta n.º 67/DJUDEP/2013 (Anexo 3) de 30 de Outubro, o DJUDEP emitiu a análise do respectivo processo como segue:
「II - Enquadramento jurídico
11. Importa antes de mais averiguar se a Lei n.º 6/80/M, de 5 de Julho, é aplicável ao caso vertente, uma vez que a escritura de contrato foi outorgada em 11 de Novembro de 1974.
12. De acordo com a cláusula sétima do contrato em tudo a que neste foi omisso aplica-se as disposições do Regulamento de Ocupação e Concessão de Terrenos do Estado, aprovado pelo Diploma Legislativo n.º 1679, de 21 de Agosto de 1965 e demais legislação aplicável.
13. A este diploma sucedeu a Lei n.º 6/80/M, de 5 de Julho, que revogou toda a legislação geral e especial que contrarie as suas disposições (cfr artigo 202.º).
14. Em sede de disposições finais e transitórias, prevê o artigo 195.º da Lei n.º 6/80/M, com a redacção dada pela Lei n.º 8/83/M, de 13 de Agosto, que as concessões provisórias anteriores à sua entrada em vigor se passam a reger pela lei nova (Lei n.º 6/80/M), ainda que com algumas ressalvas.
15. No que concerne às concessões definitivas de pretérito, isto é, constituídas ao abrigo da legislação anterior, de acordo com o artigo 197.º, com a redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 78/84/M, de 21 de Julho, as concessionárias devem declarar, até 31 de Dezembro de. 1984, se desejam que os respectivos arrendamento continuem a rege-se pela ou do período decorrente dos seus contratos, se pretendem optar pelo regime da lei nova, considerando-se que optam por esta, na falta de declaração.
16. No caso vertente, tendo em conta que em 1974 o então Governador de Macau autorizou o pedido formulado por A de transmissão a seu favor do direito de arrendamento do aludido terreno, que havia sido concedido para fins agrícolas a seu irmão G, mas que este trespassara, sem autorização expressa da entidade concedente, ao requerente que o cultivava há mias de 15 anos, afigura-se que a concessão tem carácter definitivo.

17. Assim, não existindo no processo n.º 6198.02 da DSSOPT, nem no processo n.º 73/74 da Comissão de Terras a declaração a que se refere o artigo 197.º da Lei de Terras, a concessão do terreno em causa passou a reger-se pela lei nova (Lei n.º 6/80/M).
18. Dado que se trata de um arrendamento de terreno rústico destinado a fins agrícolas, afigura-se que o mesmo não pode beneficiar do regime de renovação previsto no artigo 55.º, na redacção dada pela Lei n.º 2/94/M, de 4 de Julho, aplicável tão só às concessões por arrendamento, onerosas e definitivas, de terrenos para fins urbanos.
19. A renovação das concessões definitivas de terrenos urbanos é praticamente automática, uma vez que basta a apresentação de uma declaração pelo titular ou contitular do direito à concessão, junto de DSSOPT (cfr. n.º 1 do artigo 55.º).
20. Por essa renovação é devida uma contribuição especial cujo montante, processamento e liquidação foram estabelecidas pela Portaria n. º 219/93/M, de 2 de Agosto.
21. Quanto ao registo de renovação, estabelece o n.º 1 do artigo 135.º da Lei de Terras que “A renovação da concessão onerosa definitiva é registada a requerimento de qualquer dos titulares, contitulares, credores ou demais interessados, como tal definidos nos termos desta lei.”, prevendo o n.º 2 deste artigo que “o requerimento é acompanhado do duplicado da declaração referida no n.º 1 do artigo 55.º , com registo de entrada nos serviços públicos a que se refere o artigo 112.º”, ou seja, na DSSOPT.
22. Às renovações dos arrendamentos de terrenos rústicos aplica-se a norma específica do n.º 4 do artigo 61.º da Lei de Terras, que estipula que “o prazo das renovações não deve exceder, para cada uma, dois anos”.
23. Neste contexto, a DSSOPT não devia ter efectuado e enviado o cálculo da contribuição especial à DSF, no seguimento do pedido de renovação do prazo de concessão por um período de 10 anos, apresentado pela Companhia de Construção e Fomento Predial C, Limitada, em 6 de Dezembro de 2002, o qual devia ter sido indeferido com fundamento no facto de a norma invocada para sustentar o pedido apenas ter aplicação nas concessões de terrenas urbanas, o que não é o caso.

24. Outrossim, a Conservatória do Registo Predial deveria ter recusado o registo porquanto compete ao conservador apreciar a viabilidade do pedido de registo em face das disposições legais aplicáveis, conforme preceitua o artigo 59.º do Código de Registo Predial, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 46/99/M, de 20 de Setembro.
À luz do artigo 59.º do Código de Registo Predial, compete ao conservador apreciar a viabilidade do pedido de registo em face das disposições legais aplicáveis, dos documentos apresentados e dos registos anteriores, verificando a legitimidade dos interessados, a regularidade formal dos títulos e a validade dos actos dispositivos nele contidos.
O sistema do registo na RAEM é, em geral, declarativo e não constitutivo de direitos. Isto quer dizer que o direito constituir-se fora do registo, designadamente por mero efeito do contrato, e ao assento registal fica apenas adstrito o papel de publicar (declarar) o direito.
Este sistema de registo não garante o direito, não torna incontestável nenhuma aquisição, mas em princípio quem figura no registo é havido como titular do direito (cfr. Artigo 7.º do CRP).
Deste modo, o efeito imediato ou automático do registo definitivo é a presunção de titularidade do direito. Trata-se de uma presunção elidível, ou seja, admite prova em contrário.
Mas enquanto não for comprovado e decidido o contrário (por decisão judicial), há-de consideram-se que a verdade que publicita é coincidente com a verdade material.
A impugnação dos factos registados só pode ter lugar no âmbito de uma acção judicial, nos termos decorrente do artigo 8.º da CRP.
Assim, embora se passa provar que o registo de renovação de concessão em apreço foi efectuado contra legem, tal só pode ser impugnado através de uma acção judicial, em que seja pedido o cancelamento do referido averbamento.
Resumindo, não é pelo facto de constar do registo a renovação de concessão por um período de 10 anos que se considera que essa renovação é válida, porque o registo não garante direito. Porém, o cancelamento do registo só pode ser efectuado com base na extinção dos direitos, ónus ou encargos nele definidos ou em execução de decisão judicial transitada em julgado (cfr. artigo 14.º do CRP)
25. O acto de liquidação da contribuição especial efectuado com base no n.º 4 do artigo 55.º de Lei de terras e na Portaria n.º 219/93/M, de 2 de Agosto está, pois, ferido de ilegalidade.

26. Ora, a ilegalidade de um acto administrativo determina como consequência a sua invalidade cuja sanção é, neste caso, a da anulabilidade, atento o disposto no artigo 124.º do Código do Procedimento Administrativo (CPA), por estarmos perante um vício de violação dele, por erro nos pressupostos de direito.
27. Porém, o acto anulável só pode ser revogado com fundamento na sua invalidade e dentro de certos prazos, nos termos do disposto nos n.ºs 1 e 2 do artigo 130.º do CPA.
28. Enquanto não for anulado, o acto é eficaz, produz efeitos como se fosse válido e se não for impugnado dentro do prazo legal, a ilegalidade não pode mais ser invocada, consolidando-se o acto na ordem jurídica.
29. É o que sucede no caso vertente, tendo em conta o tempo decorrido desde a prática do acto.
30. Cabe agora analisar a transmissão do direito de concessão pro arrendamento do referido terreno a favor de sociedade “D- Companhia de Investimento e Desenvolvimento, Limitada”, através do contrato de compra e venda titulado por escritura de 31 de Outubro de 2005, exarada a fls. 112 a 116 do livro 43.
31. Ora, na concessão de terrenos rústicos aplica-se o regime previsto no artigo 146.º da Lei de Terras.
32. Segundo esta norma é permitida a transmissão de concessão no caso de morte do arrendatário e pode ser autorizada em caso de execução judicial. Porém, se o terreno se destinar a fins agrícolas, no caso de morte do arrendatário os herdeiros só tem direito a manter a concessão pelo tempo indispensável para o integral aproveitamento das culturas já implantadas.
33. Daqui parece resultar que a transmissão inter-vivos só é permitida, mediante autorização, em caso de execução judicial.
34. Neste sentido, o aludido contrato de compra e venda do direito de concessão do terreno com a área de 886,74 m2 contraria o regime previsto no artigo 146.º da Lei de terras, de cariz imperativo.
35. Com efeito, em relação aos terrenos rústicos a lei não quis, de todo em todo, permitiu a realização de negócios que visem a transferência do direito de arrendamento da esfera jurídica do concessionário para a de outrem.
36. Assim, o referido contrato de compra e venda é nulo porque o seu objecto é contrário à lei, nos termos do disposto no artigo273.º do Código Civil.
37. Resta agora analisar a questão da declaração de renovação da concessão, por um período de dez anos a contar de 25 de Dezembro de 2012, apresentada pela “Sociedade de Investimento e Desenvolvimento B, Limitada”, na qualidade de procuradora substabelecida de A.
38. Como explicitámos anteriormente às concessões de terrenos rústicos não se aplica o regime de renovação previsto no artigo 55.º, mas sim o disposto no n.º 4 do artigo 61.º da Lei de Terras, segundo o qual o prazo das renovações não deve exceder, para cada uma, dois anos.
39. Sucede que, no coso vertente, há já longos anos o terreno deixou de ser utilizado para fins agrícolas, deixando portanto de prosseguir a finalidade que justificou a concessão.
40. As fotografias tiradas no local em 20 de Agosto de 2012 e 31 de Janeiro de 2013 confirmam que o terreno se encontra devoluto.
41. Com o desenvolvimento urbanístico da ilha da Taipa, devido à escassez de terrenos disponíveis na península de Macau, a zona onde o terreno se insere perdeu a sua vocação agrícola e industrial, conforme resulta da CSI n.º 1486/DPU/2012, de 25 de Outubro.
42. Como é consabido, a configuração do espaço urbano e os usos dos solos não permanecem estáticos, mas antes em permanente evolução.
43. Não obstante essa alteração, afigura-se que tendo há muito cessado o aproveitamento e finalidade do terreno, este (prédio rústico) deixa de preencher a sua função socioeconómica, que foi causa da concessão pelo que não se justifica a renovação da concessão por dois anos, ao abrigo do disposto no n.º 4 do artigo 61.º da Lei de Terras.
44. Aliás, em nosso entender, o facto de no terreno não está a sua explorada qualquer actividade agrícola não pode deixar de constituir uma alteração pela abstenção ou omissão do aproveitamento do terreno e da finalidade subjacente à concessão, tão ou mais reprovável do que a alteração positiva, não autorizada, do aproveitamento e da finalidade, atento o interesse público que enforma as concessões de terrenos do domínio privado do Estado.
45. Tal situação de facto constitui incumprimento do contrato de concessão e justifica a rescisão do contrato ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 169.º da Lei de Terras.
46. Face a todo o exposto, não obstante as irregularidades cometidas pela DSSOPT e pela CRP nos anteriores procedimentos de renovação, e bem como o facto de o terreno não estar a prosseguir a finalidade de agrícola para que foi concedido, assim sendo, somos de parecer que a concessão não deve ser renovada, e consequentemente o terreno deve reverter ao Estado, devendo a decisão ser precedida de audiência dos interessados nos termos dos artigos 93.º e 94.º do CPA.」
5. Em 27 de Outubro de 2014, esta Direcção de Serviços emitiu a Planta de Condições Urbanísticas (PCU) n.º 88A003, mas na altura o prazo de arrendamento do terreno já tinha terminado em 24 de Dezembro de 2012. (Anexo 4)
6. Através da CSI n.º 1101/DURDEP/2015 de 7 e Julho, o DURDEP informou este departamento de que conforme o despacho do Subdirector, substituto, de 24 de Junho de 2015, o anteprojecto de arquitectura (T-4817) apresentado pelos procuradores do concessionário em 27 de Março de 2015 foi considerado passível de aprovação, devendo o SDODEP proceder à revisão do contrato de concessão do terreno. Pelo ofício n.º 8874/DURDEP/2015 de 7 de Julho, os procuradores foram informados do referido despacho.
7. De acordo com o ponto 4 da presente proposta que se refere o parecer jurídico do DJUDEP, deve-se desencadear o procedimento de rescisão do contrato da concessão ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 169.º da Lei de Terras.
8. Face a todo o exposto, dado o parecer do DJUDEP, submete-se a presente proposta à consideração superior sobre o acompanhamento do anteprojecto de arquitectura relativo ao terreno em causa.
À consideração superior
A Chefe do Departamento de Gestão de Solos,
XXX”
11 - O Secretário para os Transportes e Obras Públicas, por despacho de 5/08/2015, pôs termo a eventualidade de revisão, revogando a PCU e o despacho que considerou o anteprojecto de arquitectura passível de aprovação para efeito de construção no terreno de um edifício habitacional e comercial.
12 - Em 8/11/2018 foi elaborada a Proposta nº 294/DSO/2018, com o seguinte teor:
“Pedido de renovação do prazo de concessão do terreno coma área de 886,74 m2, situado na ilha da Taipal junto ao Caminho da Povoação de Cheoc Ka (lote TN2b), concedido por arrendamento, destinado a fins agrícolas (Proc. nº 6198.02)
1. Pelo despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas (STOP) de 5 de Agosto de 2015, exarado na proposta n.º 221/DSODEP/2015 de 15 de Julho de 2015, através dos ofícios n.ºs 642/6198.02/DSODEP/2015 e 664/6198.02/DSODEP/2015, foi comunicada, respectivamente, ao “Banco Tai Fung S.A.” (credor hipotecário) e à “Sociedade de Investimento e Desenvolvimento B, Limitada” (procuradora do concessionário), a intenção de tomada de decisão sobre o indeferimento do pedido de renovação do prazo de Concessão do terreno, com a área de 886,74 m2, situado na ilha da Taipa, junto ao Caminho da Povoação de Cheoc Ká (lote TN2b), concedido por arrendamento, destinado a fins agrícolas, bem como a audiência prévia no prazo de 10 dias. (Anexo 1)
2. Através da entrada n.º 116794/2015 de 2 de Setembro de 2015, o “Banco Tai Fung S.A.” apresentou uma resposta escrita na fase de audiência, indicando que se trata de uma concessão definitiva e que a «Lei de Terras» não proíbe a conversão, mediante a revisão do contrato de concessão, de terrenos rústicos em terrenos urbanos devido à alteração do plano urbanístico. (Anexo 2)
3. Além disso, através da entrada n.º 125 063/2015 de 21 de Setembro de 2015, a “Sociedade de Investimento e Desenvolvimento B, Limitada” também apresentou uma resposta escrita na fase de audiência. (vide o teor exarado em anexo 3)
4. Em cumprimento do despacho do Senhor Director destes Serviços, de 24 de Março de 2016, exarado na proposta n.º 055/DSODEP/2016 de 22 de Março de 2016, através das CSI’s n.ºs 0228/6198.02/DSODEP/2016, 0638/6198.02/2016 e 427/6198.02/2018, (Anexo 4), solicitámos ao Departamento Jurídico a emissão de parecer sobre as respostas escritas apresentadas na fase de audiência, e o respectivo parecer jurídico já foi emitido mediante a CSI n.º 292/DJUDEP/2018 de 15 de Outubro de 2018. (Anexo 5)
5. De acordo com as fotografias tiradas no local, verifica-se: (Anexo 6)
Data de fotografias
Situações concretas de terreno
20 de Agosto de 2012
O terreno está coberto de vegetação natural.
31 de Janeiro de 2013
O terreno está coberto de vegetação natural.
29 de Fevereiro de 2016
A pequena parte do terreno está a ser plantada, no local existem algumas construções temporárias de estrutura metálica, árvores e alguns veículos automóveis cujos proprietários são desconhecidos.
26 de Outubro de 2018
A pequena parte do terreno está a ser plantada, no local existem algumas construções temporárias de estrutura metálica, árvores e alguns veículos automóveis cujos proprietários são desconhecidos.
Análise e conclusão
6. Em primeiro lugar, dado que não se encontra qualquer declaração apresentada à Administração, a Lei n.º 10/2013 «Lei de Terras» aplica-se ao presente caso conforme os n.º s 1 e 3 do artigo 216.º da mesma lei.
7. Quanto às respostas escritas apresentadas pelo “Banco Tai Fung S.A.” e pela procuradora do concessionário, a “Sociedade de Investimento e Desenvolvimento B, Limitada”, tendo em conta o parecer emitido pelo departamento jurídico destes Serviços em anexo 5, que aqui se dá por integralmente reproduzido, nomeadamente a análise nos n.ºs 5 a 17, julga-se de que os argumentos trazidos pelo concessionário e pelo credor hipotecário em sede de audiência prévia não contribuíram para uma alteração do projecto de decisão, devendo ser mantido o sentido da decisão de indeferir o pedido de renovação de concessão, como tal, impõe-se à Administração declarar a caducidade da concessão do terreno em apreço.
8. Assim sendo, considerando o parecer jurídico acima referido, nomeadamente a análise nos n.ºs 5 a 17, submete-se a presente proposta à consideração de V. Ex.ª, a fim de:
8.1. Indeferir o pedido de renovação do prazo de concessão do terreno, com a área de 886,74 m2, situado na ilha da Taipa, junto ao Caminho da Povoação de Cheoc Ká (lote TN2b) concedido por arrendamento, destinado a fins agrícolas, tendo em conta o parecer jurídico em anexo 5 e nos termos do artigo 59.º da Lei n.º 10/2013 «Lei de Terras»;
8.2. Autorizar o seguimento de declaração da caducidade da concessão em causa nos termos do artigo 52.º da mesma Lei;
8.3 Notificar as interessadas do despacho sobre o indeferimento do pedido de renovação do prazo de concessão do terreno, bem como enviar o processo à Comissão de Terras para efeitos de parecer e ulterior tramitação sobre a declaração da caducidade da concessão em causa mediante a publicação do despacho do Chefe do Executivo no Boletim Oficial, nos termos do artigo 167.º da mesma Lei.
À consideração superior.
A Técnica Superior
XXX”
13 - O Chefe do DSO, na mesma data, pronunciou-se assim:
“Considerando o parecer jurídico constante dos pontos 5 a 17 da CSI nº 292/DJUDEP/2018 no anexo 5, propõe-se que seja autorizado o proposto nos pontos 8.1 a 8.3 ou seja, indeferimento do pedido de renovação da concessão, seguimento do processo de declaração da caducidade da concessão, comunicação aos interessados do despacho que vier a recair sobre esta proposta, e envio do processo à Comissão de Terras para parecer e ulterior tramitação.”.
14 - Após o Director de Serviços ter manifestado a sua concordância com o proposto pelo Chefe do DSODEP, o Secretário para os Transportes e Obras Públicas, em 20/11/2018 despachou:
“À consideração superior com a minha concordância” (fls. 10 dos autos).
15 - O Chefe do Executivo, em 30/11/2018, proferiu o seguinte despacho (a.a.):
“ Indeferido conforme proposta” (fls. 10 dos autos).
16 - No momento a que se referem as fotografias referidas no facto 10, o terreno apresentava uma situação de incultivo revelando estado de abandono.
17 - Posteriormente a recorrente juntou aos autos novas fotografias ao procedimento, obtidas após a notificação do recorrente para efeito de audiência prévia de interessados.
18 - A sociedade “B” tem administrado o terreno, sob procuração de A, que por sua vez o tem cedido gratuitamente, a terceiros, nomeadamente a testemunha que depôs em audiência, H, que mora muito perto do terreno, a fim de, gratuitamente, e em proveito próprio, numa parcela do terreno ali ir fazendo algum cultivo de vegetais e legumes, desde início de 2017.
19 - Em 2012 o terreno não estava a ser utilizado para fins agrícolas pelo recorrente.
***
IV – O Direito
1. Este terreno tinha sido concedido ao recorrente para fins agrícolas, pelo período de 50 anos, com termo previsto para 24/12/2002. Era uma concessão definitiva.
Contudo, foi requerida a renovação da concessão. Em consequência, porém, da utilização de fotografias tiradas ao local em 2012 e 2013, teve a Administração oportunidade de constatar que o fim agrícola não estava a ser respeitado, dado que o recorrente não exercia ali nenhuma actividade agrícola com carácter regular e permanente.
E, com este fundamento, foi o pedido de renovação indeferido.
*
2. O recorrente acha que a decisão de indeferimento (a.a.) sofre dos vícios de:
- Erro nos pressupostos de facto;
- Violação de lei (por erro nos pressupostos de direito);
- Violação do princípio da boa fé.
Apreciemo-los.
*
3. Do vício de erro nos pressupostos de facto
Pretende o recorrente com este vício investir contra o fundamento com base no qual a decisão foi tomada. Para si, não é verdade que o terreno não estivesse a ser aproveitado para os fins agrícolas estabelecido no contrato de concessão.
Acontece que o procedimento administrativo revela um conjunto de fotografias que mostram claramente o estado de abandono e incultivo na data em que foram tiradas. E se alguma pequena franja do terreno apresentasse alguma cultura incipiente, o recorrente nem sequer demonstrou que fosse ele quem a estivesse a efectuar.
E a prova efectuada em audiência no âmbito do presente processo judicial de recurso contencioso também não revelou melhor prova. Com efeito, apenas se apurou que o terreno tem vindo a ser pontualmente cultivado, mas a título gratuito e precário por uma pessoa (testemunha) residente nas imediações do local, aparentemente contrariando o disposto no art. 147º da Lei de Terras. Quem tirava proveito de parte do terreno era, pois, a testemunha e não o concessionário.
E quando foi feita a concessão para aquele efeito, obviamente o objectivo era extrair a utilidade e aptidão do terreno com aquela finalidade agrícola, ao serviço da população e do interesse público do fornecimento de alimentos de origem vegetal, e com carácter regular e permanente (e nunca ao serviço de um interesse privado, tal como vem acontecendo com a utilização precária por parte de um vizinho).
Ora, assim sendo, não tendo o recorrente feito prova do que alega (e era seu o ónus de prova neste caso) e como o terreno não estava a ser utilizado, ao tempo da prática do acto, com a finalidade para a qual foi concedido, temos que dar por inexistente o vício de erro nos pressupostos de facto.
*
4. Do vício de violação de lei
A este respeito, o digno Magistrado do MP tece ocasião de sublinhar que «…o recorrente afirma que a lei não impõe qualquer condicionamento ou limite temporal para a suspensão do aproveitamento, pelo que inexiste base legal para a não renovação da concessão com fundamento no não aproveitamento do terreno na actividade agrícola a que se destinava a sua concessão.
Também não se crê que neste ponto lhe assista razão. Como se retira dos normativos aplicáveis (artigos 59.º e 50.º a 52.º da Lei de Terras), a renovação das concessões de terrenos rústicos está dependente de prévia autorização do Chefe do Executivo, que a dá ou denega a coberto de poderes eminentemente discricionários. No exercício de tais poderes, a Administração tem que prosseguir o interesse público, sem menosprezo desnecessário pelos interesses particulares, estando obrigada a observar limites internos e externos impostos à actividade administrativa, avultando entre estes o dever de exteriorizar os fundamentos relevantes para a adopção da decisão, ou seja, o dever de fundamentação. Constata-se que, na fundamentação, um dos motivos arregimentados foi a ausência de aproveitamento do terreno, onde não se detectava qualquer indício de actividade agrícola (cf. despacho recorrido e pareceres para que remete, incluindo as considerações jurídicas avançadas na comunicação de serviço n.º 292/DJUDEP/2018, a fls. 1246 e 1189 do processo instrutor). Pois bem, não proibindo a lei que o juízo discricionário sobre a renovação assente em elementos relativos à forma como o terreno é ou não aproveitado, apresenta-se óbvio que nenhuma afronta a pressupostos de direito é cometida por via de uma tal referência, cuja ponderação faz todo o sentido, dada a finalidade social inerente à ocupação dos terrenos do Estado».
Fazemos nossa a fundamentação acabada de transcrever.
Improcede, pois, invocado vício de erro nos pressupostos de direito.
*
5. Do vício de violação do princípio da boa fé (art. 8º).
A este propósito, o recorrente vem afirmar que, já desde finais da década de 80 do século passado, vem tentando junto da Administração a alteração da finalidade da concessão, de modo que passe a ser possível a sua conversão em finalidade habitacional e comercial, por ao terreno faltar vocação agrícola. E que com vista a esse desiderato tem apresentado vários projectos, o ultimo dos quais em Março de 2015. E apenas nesta data, diz o recorrente, em virtude de só em Outubro de 2014 ter sido emitida pela DSOP a planta de condições urbanísticas (PCU 88A003).
Ao vir agora a Administração indeferir o pedido de renovação, e dessa maneira inviabilizar a alteração da finalidade que estava em marcha, entende ele estar perante uma posição que contraria a conduta anterior, além de não contribuir para assegurar o interesse público com vista a um mais eficaz aproveitamento do terreno, designadamente para fins habitacionais, o que contraria o princípio da boa fé previsto no art. 8º do CPA.
Apreciando.
Não cremos que ao recorrente assista razão. Com efeito, desde Agosto de 2015 que o recorrente já sabia que não haveria lugar a revisão, e que a PCU fora revogada e que fora impossibilitada a aprovação do projecto de arquitectura.
Além disso, é preciso não esquecer que estes factos (emissão de PCU e a passibilidade de aprovação do projecto de arquitectura) foram todos posteriores ao decurso do prazo de arrendamento, que era Dezembro de 2012.
Portanto, não cremos que, pelo menos, desde 2015, o recorrente pudesse manter a esperança no deferimento do pedido de renovação, ou que a Administração lhe tivesse incutido a ideia de que a sua pretensão.
De qualquer maneira, e como é sabido, “O princípio da boa fé plasmado no art. 8º do CPA significa que devem ser considerados os valores fundamentais do direito relevantes em cada caso concreto, em face da confiança suscitada na contraparte pela actuação em causa (nº2, al. a)), ou em face do objectivo a alcançar com a actuação empreendida (al. b)). A invocação da violação do princípio a boa fé só faz sentido ante uma atitude da Administração que fira a confiança que nela o particular depositou ao longo do tempo, levando-o a crer que diferente decisão estaria para ser tomada.” (Ac. do TSI, de 5/06/2014, Proc. nº 625/2013).
Ora, tendo em conta o que se disse, ao recorrente não era legítimo pensar que a Administração tudo fez para o levar a crer que o terreno iria mudar de finalidade de aproveitamento e que o pedido de renovação iria ser deferido e que, uma vez renovado, iria ser aprovado o projecto de arquitectura para a construção de um edifício habitacional e comercial.
Acresce que, no domínio da actividade discricionária, a sindicabilidade dos actos administrativos praticados, só nos casos de erro notório ou manifesto e grosseiro é possível (v.g., Ac. do TSI, de 27/06/2019, Proc. nº 531/2018). E, sinceramente, não vemos qualquer motivo para avistar no acto em crise qualquer erro grosseiro e manifesto.
Improcede, pois, o vício.
***
V – Decidindo
Face ao exposto, acordam em julgar improcedente o recurso contencioso.
Custas pelo recorrente, com taxa de justiça em 8 UC.
T.S.I., 27 de Fevereiro de 2020
José Cândido de Pinho
Tong Hio Fong
Lai Kin Hong
Joaquim Teixeira de Sousa



Proc. nº 48/2019 1