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Tribunal Administrativo da Região Administrativa Especial de Macau
Acção para Efectivação da Responsabilidade Civil Extracontratual n.º 317/18-RA



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   O processo já contém todos os elementos para a decisão sobre o pedido, sem necessidade de mais provas, cumpre conhecer imediatamente do mérito da causa, nos termos do art.º 429.º, n.º 1, alínea b) do CPCM.
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   Segue-se a sentença.
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Sentença

Processo n.º :317/18-RA

I. Relatório

   Autora SOCIEDADE DE IMPORTAÇÃO E EXPORTAÇÃO POLYTEX, LIMITADA (保利達洋行有限公司), melhor id. nos autos,
   vem intentar a presente
   Acção para Efectivação da Responsabilidade Civil Extracontratual
   Contra
   Ré, Região Administrativa Especial de Macau
   com os fundamentos constantes da p.i. de fls. 140 a 205 dos autos,
   Conclui pedindo que seja a Ré condenada a pagar:
   1. a indemnização referente aos danos emergentes:
   a. MOP5.441.769.760,47, acrescido de juros legais contados desde a citação até ao seu pagamento efectivo e integral.
   b. os montantes a liquidar em execução de sentença para pagamento das dívidas.
   2. a indemnização referente aos lucros cessantes:
   a. MOP18.476.801.194,92, pela perda patrimonial acrescido de juros à taxa legal até ao seu integral pagamento.
   b. MOP1.435.114.246,52, a título de perda de chance acrescido de juros legais até ao seu integral pagamento, bem como juros vincendos à taxa anual de 2% sobre aquele montante.
   3. a indemnização referente aos danos morais, no valor de MOP1,00.
   Ou em alternativa, seja a Ré condenada a atribuir uma nova concessão à Autora para o mesmo lote P de terreno, para efeitos de conclusão da obra.
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   A Ré contesta a acção com os fundamentos de fls. 1596 a 1643 dos autos, concluiu pedindo que sejam julgadas procedentes as excepções ou que seja improcedente a acção e absolvida a Ré dos pedidos.
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   A Autora apresenta a sua réplica com os fundamentos de fls. 1735 a 1789 dos autos.
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Seguidamente, a Ré apresenta a tréplica, com os fundamentos de fls. 2329 a 2335 dos autos.
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II. Saneamento
   Este Tribunal é o competente em razão da matéria e da hierarquia.
   As partes são dotadas de personalidade e capacidade judiciária e de legitimidade “ad causam”.
   O processo é o próprio.
   Inexistem nulidades, excepções dilatórias, ou questões prévias que obstem a apreciação “de meritis”.
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III. Fundamentos:

1. De facto
   Consideram-se assentes os seguintes factos que interessam à decisão da causa:
1 - Por Despacho n.º 160/SATOP/90, publicado no 2.º Suplemento ao n.º 52 do Boletim Oficial de 26 de Dezembro de 1990, foi concedido à Autora o terreno, a resgatar ao mar, com a área de 60,782m2, constituído por 3 lotes com a designação de Lote “O” para fins habitacionais, Lote “S” para fins habitacionais e Lote “Pa” para fins industriais (cfr. doc. 1 junto com a p.i.).
   2 - Nos termos da cláusula 2.ª, n.º 1, do contrato de 1990, o prazo de concessão foi fixado em 25 anos, contados a partir da outorga da escritura pública do contrato (cfr. doc. 1 cit.).
   3 - Nos termos da cláusula 2.ª, n.º 2, mais se previu que “O prazo do arrendamento fixado no número anterior poderá, nos termos da legislação aplicável e mediante condições a acordar, ser sucessivamente renovado até 19 de Dezembro de 2049” (cfr. doc. 1 cit.).
   4 - Por Despacho n.º 123/SATOP/93, publicado na II Série do Boletim Oficial n.º 35, de 1 de Setembro de 1993, e nos termos que já tinham sido previstos no Despacho n.º 160/SATOP/90, foi à Autora concedida a parcela de terreno designada por “Pb” destinada a ser anexada à parcela “Pa”, constituindo um lote único com a área global de 67,536m2 e destinava-se a viabilizar o projecto de instalação de um “complexo industrial” (cfr. doc. 2 junto com a p.i.).
   5 - As parcelas “Pa” e “Pb” foram anexadas e o respectivo terreno passou a estar descrito sob o n.º 22380 do Livro B68M, com a designação de Lote “P” (cfr. doc. 3 junto com a p.i.).
   6 - O “complexo industrial” foi construído no lote “P” e entrou em funcionamento, tendo as entidades competentes emitido as respectivas licenças (cfr. docs. 4 a 11 juntos com a p.i.).
   7 - Com vista a aferir da viabilidade da alteração da finalidade e aproveitamento, a Autora apresentou em 10/09/2004 um Estudo Prévio junto da Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes (DSSOPT) (T-4803), seguido de um estudo prévio complementar apresentado junto da mesma entidade em 15/12/2004 (T-6451) (cfr. docs. 13 e 13A juntos com a p.i.).
   8 - Por Despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º 19/2006, publicado no Boletim Oficial da RAEM n.º 9, II Série, de 1 de Março de 2006, foi “parcialmente revista, nos termos e condições do contrato em anexo, a concessão, por arrendamento, do terreno com a área global de 91 273m2, constituído por três lotes designado por “O”, “P” e “S”, situado nos Novos Aterros da Areia Preta (NATAP)” (cfr. doc. 12 junto com a p.i.).
   9 - Nos termos do n.º 4 dos termos e condições do contrato que constam do Anexo ao referido despacho (cfr. doc. 12 junto com a p.i.):
   “…a concessionária pretende alterar a finalidade do lote “P” de indústria para comércio e habitação, alegando prejuízos financeiros com a fábrica de têxtil aí instalada, devido à abolição das quotas de exportação dos produtos têxteis, o que levou à perda gradual de competitividade desta indústria de Macau, agravada, no caso concreto, pela suspensão do funcionamento da fábrica no período nocturno, para não prejudicar a tranquilidade dos residentes das imediações, e invocando ainda razões que se prendem com o futuro desenvolvimento daquela zona da cidade e a crescente procura de habitação…”
   10 - Nos termos do n.º 5 dos termos e condições do contrato que constam do Anexo ao Despacho n.º 19/2006, constituía condição para a revisão do contrato o facto de, no âmbito da análise anteriormente efectuada ao estudo prévio, se ter verificado que o mesmo era passível de aprovação (cfr. doc. 12 junto com a p.i.).
   11 - Aprovação, essa, que ocorrera em 21/01/2005 (cfr. doc. 14 junto com a p.i.).
   12 - Nos termos da redacção conferida à cláusula 3.ª, n.º 2.3.1, do contrato de concessão de arrendamento, passou a ser previsto que o lote “P” é aproveitado com a construção de um edifício, em regime de propriedade horizontal, constituído por um pódio com 5 pisos, sobre o qual assentam 18 torres com 47 pisos cada uma, afectado às seguintes finalidades e áreas brutas de construção (cfr. o n.º 3 do Artigo 1.º do Anexo ao Despacho n.º 19/2006 - doc. 12 junto com a p.i.):
   - Habitação: 599,730m2;
   - Comércio: 100,000m2;
   - Estacionamento: 116,400m2;
   - Área livre: 50,600m2.
   13 - O prazo para o aproveitamento foi acordado em 96 meses contados a partir da data da publicação no Boletim Oficial do despacho que titulasse a referida revisão (cfr. artigo 2.º do Anexo ao Despacho n.º 19/2006 - doc. 12 junto com a p.i.).
   14 - Após sucessivos pareceres e exigências da DSPA e consequentes apresentações de estudos de impacto ambiental por parte da Autora, foi o projecto finalmente aprovado, o que foi comunicado à Autora através do ofício n.º 11031/DURDEP/2013, em 15 de Outubro de 2013 (cfr. doc. 38 com a p.i.).
   15 - Em 24/10/2013 a Autora requereu junto da DSSOPT a emissão de licença para as obras de fundações, que foi emitida em 02/01/2014 (cfr. docs. 39, 40 junto com a p.i.).
   16 - Em 14/01/2014, a Autora apresentou o pedido de prorrogação do prazo de aproveitamento como o seguinte : (cfr. doc. 41 junto com a p.i.).
“…致:澳門特別行政區
土地工務運輸局 局長
賈利安工程師 閣下
   事由:透過第123/SATOP/93號批示規範並經運輸工務司司長第19/2006號批示修訂用途、利用、期限及年租,以租賃制度批予「保利達洋行有限公司」之一幅面積68,001平方米的名稱為“P地段”土地,用作興建一幢屬分層所有權制度,由一座五層高的樓裙及其上十八幢連一避火層在內均為四十七層高的塔樓組成的樓宇
   保利達洋行有限公司(葡文名稱:SOCIEDADE DE IMPORTAÇÃO E EXPORTAÇÃO POLYTEX, LIMITADA;英文名稱:POLYTEX CORPORATION LIMITED),法人住所設於澳門東北大馬路P地段I大廈,為題述土地(以下簡稱“批地”)之承批人,該批地標示於物業登記局B68M簿冊第14頁,標示編號為22380(參見附件一),茲向 閣下陳述和請求如下:
   一. 本公司為一家有限公司,所營事業包括房地產發展、樓宇之建築及維修工程等業務(參見附件二)。
   二. 根據運輸工務司司長第19/2006號批示之規定,該批地將利用以興建一幢屬分層所有權制度,由一座五層高的樓裙及其上十八幢連一避火層在內均為四十七層高的塔樓組成的樓宇,其總建築面積按用途分配如下:
   1)住宅(不包括避火層) : 599,730平方米;
   2)商業 : 100,000平方米;
   3)停車場 : 116,400平方米;
   4)室外範圍 : 50,600平方米。
   三. 該批地的利用發展期限為96個月,自2006年3月1日起計。
   四. 在土地的利用方面,承批人於2005年3月14日向行政長官請求批准更改該批地的原工業用途為商業及住宅用途之前,“P地段” (即該批地)的新利用的初步研究已獲 貴局視為可予核准。
   五. 正如上述,透過刊登於2006年3月1日第9期《澳門特別行政區公報》第2組之運輸工務司司長第19/2006號批示,上述之批地修訂合同獲當局核准。為此,承批人隨即積極籌備該土地之利用,儘管上述發展項目龐大及技術複雜性,承批人於2009年10月22日向 貴局提交了建築擴建工程計劃草案以請予核准(貴局之收件編為T-7191/2009附件三)。
   六. 承批人隨後獲通知 貴局2010年4月9日第4427/DURDEP/2010號公函,指出須遵守該公函中所述各項意見而作出修改,當中包括民政總署、消防局及交通事務局的意見。
   七. 為此,承批人隨即與各有關當局接觸,使上述的工程計劃草案在符合現行法例及各主管部門意見、指引下最後能獲得正式批准以展開上述批地之利用。
   八. 承批人隨即迅速地於2010年6月3日向 貴局作出回應,提交相應之建築擴建工程計劃草案(見 貴局之收件編號為T-5291/2010附件四)。
   九. 貴局於2011年1月7日向承批人發出第318/DURDEP/2011號公函,指出按照 局長閣下於2010年12月30日所作之批示,己核准上述建築計劃,但仍遵守該公函中列明之各項修改。
   十. 基於 貴局的上述要求和指示,承批人又隨即與各有關當局和部門接觸,力圖使上述建築計劃能按照以上 貴局公函中所提出之各項要求,與各有關當局和部門進行溝通、磋商工作,並於2011年5月11日提交相應的建築擴建工程計劃草案及環境評估報告(貴局之收件編號為T-5205/2011附件五)。
   十一. 然而,貴局又於2011年10月4日向承批人發出第11599/DURDEP/2011號公函,指出基於環境保護局第 1843/205/DPPA/DCPA/2011號公函中之意見,要求承批人跟進環境保護局的要求再次提交環境評估報告。
   十二. 為此,承批人於2012年4月19日向 貴局提交相應之環境評估報告(見 貴局之收件編號為T-4242/2012附件六)。隨後承批人又按環境保護局於2012年5月24日發出第1586/054/DAMA/DPAA/2012號公函對環境評估報告之新意見及正式要求遞交空氣流動評估報告,於是分別在2012年8月31日第三次提交了經修改的環境評估報告(信函編號:116-2012/LOT-P/PCL附件七)及於2012年9月7日提交新的空氣流動評估報告(信函編號:117-2012/LOT-P/PCL附件八) 。
   十三. 貴局於2012年12月28日向承批人發出第13023/DURDEP/2012號公函,要求承批人再次就環境評估報告及空氣流動報告進行修改。
   十四. 基於此,承批人於2013年3月15日向 貴局第四次提交了修改的環境評估報告及修改後的空氣流動報告以回應 貴局之要求(貴局之收件編號: T-3953/2013附件九)。此外,亦按照於2013年7月26日在 貴局舉行之技術會議中達成的共識及環境保護局於2013年5月3日發出的第1545/07I/DAMA/DPAA/2013號公函的技術意見,向 貴局提交對2013年3月15日遞交申請的修正後環境報告。
   十五. 承批人於2013年10月15日接獲 貴局發出第11031/DURDEP/2013號公函,指出 貴局局長2013年10月9日作出批示,“接納透過T-3953 de 15/03/2013及收件編號DMS 95688/2013遞交的環境評估及空氣流動報告”。
   十六. 為此,承批人才有條件於2013年10月24日向 貴局提交發出工程准照的申請(貴局收件編號:T-11874/2013附件十)。
   十七. 最終,承批人於2014年1月3日收到 貴局第66/DURDEP/2014號公函,指出 代局長閣下於2013年12月31日作出批示,核准上述計劃並批准發出有關之工程准照。
   十八. 鑑於上文第十一至第十五點提及之關於環境評估報告之非歸責於承批人之原因和情況,上述的建築計劃至今才獲 貴局正式批准而使承批人正式展開該批地之利用工程。
   十九. 基於以上情勢和事實,懇請 貴局理解和接受承批人如今才能正式開展該批地工程之解釋,鑑於土地利用期限為2014年2月28日,懇請 閣下批准承批人延長批地利用期限72個月。
   二十. 最後,承批人重申並承諾,將在當局所定的期限內履行合同及法例所規定的一切義務,包括呈交 貴局可能要求有關卷案所需的一切補充資料和文件。
   附上:10份文件。
保利達洋行有限公司
經理:柯為湘
二零一四年一月十四日於澳門
   …”
   17 - Em 30/01/2014, a Autora apresentou de novo o pedido de prorrogação do prazo de aproveitamento, com os mesmos fundamentos (cfr. doc. 3 junto com a contestação).
   18 - Em 25/03/2014, o então Secretario para os Transportes e Obras Públicas à proposta da DSSOPT (n.º 090/DSODEP/2014), despachou o seguinte: “Envie-se o processo à Comissão de Terras para parecer sobre o pedido do concessionário” (cfr. doc. 4 junto com a contestação).
   19 - Em 26/05/2014, o DSODEP da DSSOPT, na sequência da deliberação tomada pela Comissão de Terras na reunião realizada em 22/5/2014, oficiou à Autora a fim de inquirir se ela possui ou não condições para concluir num prazo inferior a 18 meses o aproveitamento do terreno (cfr. doc. 5 junto com a contestação).
   20 - Em 04/06/2014, a Autora na resposta à referida inquirição, requereu a prorrogação do prazo nos seguintes termos (cfr. doc. 6 junto com a contestação):
“SOCIEDADE DE IMPORTAÇÃO E EXPORTAÇÃO POLYTEX, LIMITADA
Exmo. Sr. Director dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes Eng.º Jaime Roberto Carion,
   Assunto: Pedido de prorrogação do prazo de aproveitamento dum terreno concedido por arrendamento, situado na península de Macau, nos NATAP, com área de 68,001m2, designado por lote “P”, cujo contrato de concessão é titulado por despacho n.º 160/SATOP/90 e modificado por despacho n.º 123/SATOP/93, despacho n.º 123/SATOP/99, despachos n.º 19/2006 e n.º 30/2011 do Secretário para os Transportes e Obras Públicas
   Recebida a vossa carta (n.º 398/954.06/DSODEP/2014), vem a nossa Sociedade apresentar os seguintes alegações e pedidos:
   1. O lote “P” foi destinado à unidade têxtil e foi concedido em 1990 à nossa Sociedade para ser aproveitado com a construção de fábricas avançadas e a produção têxtil. Em seguida, a nossa Sociedade, em função dos termos do contrato de concessão, procedeu à obra de aterros, construção de fábricas e exploração e cumpriu sempre o acordo. Até 2005, em face da carência de recursos tecnológicos e humanos, a competitividade tomou-se menor e foi difícil manter a exploração, pelo que pediu alterar o destino do terreno em habitação comercial.
   2. Por despacho n.º 19/2006 do Secretário para os Transportes e Obras Públicas, publicado no Boletim Oficial n.º 9, Série II, de 1 de Março de 2006, foi aprovado o contrato modificativo de concessão, mas o prazo de arrendamento não foi devidamente prorrogado, sendo mais curto o prazo de desenvolvimento em comparação com o dos projectos comuns. Mesmo sendo complexo o projecto, a nossa Sociedade dedicava-se activamente à apreciação do desenvolvimento do terreno sem preguiça. Em 2007, conforme as exigências, pediu de novo a planta de alinhamento, em 6 de Maio de 2008 apresentou o programa à vossa Direcção, que foi aprovado em Janeiro de 2011. Porém, por conseguinte, recebeu constantemente pareceres dos órgãos do Governo, como as questões de sombra, electricidade, trânsito e protecção do ambiente, etc. A nossa Sociedade sempre respondia imediatamente, várias questões entre estas foram critérios e exigências acrescentadas, não foram previstas no contrato modificativo de concessão de 2006, decorreram 8 anos da prolação do despacho de alteração do destino até a obtenção da licença oficial.
   3. Como o projecto é enorme, é objectiva e tecnicamente impossível ser completado dentro do prazo de arrendamento original, ou seja antes de 25 de Dezembro de 2015. Pede-se que seja autorizada no primeiro a prorrogação do prazo de aproveitamento de forma a permitir à nossa Sociedade pedir a licença para proceder à construção imediatamente, logo depois a nossa Sociedade vai pedir continuar a desenvolver legalmente o terreno após prescrito o prazo de arrendamento referido, proporcionando tempo suficiente à conclusão do projecto.
   4. Foram vendidas cerca de 3000 fracções do projecto, para evitar demais danos e influências aos milhares compradores e familiares e riscos para a harmonia e estabilidade social de Macau, pede-se sinceramente que seja prorrogado de imediato o prazo de aproveitamento do terreno e emitida a licença até 25 de Dezembro de 2015. Compromete-se que a nossa Sociedade vai assumir todas as consequências depois da construção.
   Com os melhores cumprimentos
   Sociedade de Importação e Exportação Polytex, Limitada
IP WAI KING, CHIO KOC IENG
Aos 4 de Junho de 2014…”.
   21 – Em 03/07/2014, quanto ao requerimento da Autora, a Comissão de Terras emitiu o seguinte parecer n.º 59/2014 (cfr. doc. 8 junto com a contestação):
   “Proc.n.º 18/2014 - Respeitante ao pedido feito pela Sociedade de Importação e Exportação Polytex, Limitada, de prorrogação do prazo de aproveitamento do terreno concedido, por arrendamento, com a área global de 105 437m2, situado na península de Macau, nos Novos Aterros da Areia Preta (NATAP), constituído por 4 lotes, designados por «O», «P», «S» e «V», titulado pelo Despacho n.º160/SATOP/90, revisto pelos Despachos n.os 123/SATOP/93, 123/SATOP/99 e pelos Despachos do Secretário para os Transportes e Obras Públicas (SOPT) n.os 19/2006 e 30/2011.
   Pelo incumprimento do prazo de aproveitamento do lote «P», propõe que a situação real do lote «P» seja tida em consideração na decisão final que recair sobre o pedido, nomeadamente o conteúdo da carta da concessionária.
I
   1. Através do Despacho n.º 160/SATOP/90, publicado no suplemento ao Boletim Oficial de Macau n.º 52, de 26 de Dezembro de 1990, foi autorizada a concessão, por arrendamento e com dispensa de hasta pública, de um terreno com a área de 60 782m2, a conquistar ao mar, situado na península de Macau, nos Novos Aterros da Areia Preta (NATAP), a favor da Sociedade de Importação e Exportação Polytex, Limitada, concessão que foi depois revista pelos Despachos n.º 123/SATOP/93, publicado no Boletim Oficial de Macau n.º 35/1993, II Série, de 1 de Setembro e n.º 123/SATOP/99, publicado no Boletim Oficial de Macau n.º 50/1999, II Série, de 17 de Dezembro, destinado à construção de um complexo fabril, habitacional e comercial. Em consequência da referida revisão, a área global do respectivo terreno passou a ser de 91 273m2, composto por 3 lotes designados por «O», «P» e «S».
   2. Posteriormente, através do Despacho do SOPT n.º 19/2006, publicado no Boletim Oficial da Região Administrativa Especial de Macau (RAEM) n.º 9, II Série, de 1 de Março de 2006, foi parcialmente revisto o contrato de concessão do referido terreno em virtude de alteração do aproveitamento e objecto (área e limites) do lote «P» com a área de 67 536m2 e de alteração do aproveitamento do lote «S» com a área de 13 916m2.
   3. Por força dos novos alinhamentos, foram revertidas a favor da RAEM, livre de ónus ou encargos, duas parcelas de terreno, respectivamente com as áreas de 536m2 e 378m2, assinaladas com as letras «PA3» e «PA4» na planta n.º 3333/l990, emitida em 22 de Abril de 2005, pela Direcção dos Serviços de Cartografia e Cadastro (DSCC), destinadas a integrar o seu domínio público como via pública e passeio e revertida a favor da mesma uma outra parcela de terreno com a área de 1 065m2, assinalada com a letra «PA5» para integrar o seu domínio privado, todas a serem desanexadas do lote «P», descrita na Conservatória do Registo Predial (CRP) sob o n.º 22 380.
   4. Igualmente por força dos alinhamentos, foram concedidas, por arrendamento, quatro parcelas de terreno, respectivamente com as áreas de 887m2, 780m2, 342m2 e 435m2, assinaladas com as letras «PB1», «PB2», «PB3» e «PB4» na planta cadastral mencionada, não descritas na CRP e destinadas a serem integradas no lote «P», cuja área passou, por conseguinte, a ser de 68 001m2 e os seus limites definidos pelas parcelas assinaladas com as letras «PA1», «PA2», «PA6», «PB1», «PB2», «PB3» e «PB4».
   5. Além disso, foi concedido, por arrendamento, o lote «V» com a área de 13 699m2, assinalado com as letras «VA1» e «VA2» na respectiva planta cadastral e não descrito na CRP.
   6. Em consequência desta revisão e concessão, o terreno objecto do contrato de concessão passou a ser constituído pelos lotes «O», «P», «S» e «V» com a área global de 105 437m2.
   7. O prazo de aproveitamento do terreno é de 96 meses, contados a partir da publicação do Despacho do SOPT n.º 19/2006, ou seja, até 28 de Fevereiro de 2014.
   8. O valor do prémio do contrato foi integralmente liquidado pela concessionária.
   9. O lote «O» foi aproveitado com a construção de um edifício em regime de propriedade horizontal, constituído por um pódio com 3 pisos sobre o qual assentam 6 torres com 29 pisos cada, afecto às finalidades de habitação, comércio, estacionamento e jardim. Em 29 de Fevereiro e 26 de Julho de 1996 foram emitidas pela Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes (DSSOPT) as licenças de utilização n.os 46/96 e 109/96 à construção implantada (Edf. Polytec Garden) no respectivo lote.
   10. O lote «S» foi aproveitado com a construção de um edifício em regime de propriedade horizontal, constituído por um pódio com 3 pisos sobre o qual assentam 4 torres com 37 pisos cada uma e 1 torre com 36 pisos, as quais compreendem um piso de refúgio, afecto às finalidades de habitação, comércio, estacionamento e área livre. Em 3 de Julho de 2006 foi emitida pela DSSOPT a licença de utilização n.º 32/2006 à construção implantada (La Baie du Noble) no respectivo lote.
   11. Através do Despacho do SOPT n.º 30/2011, publicado no Boletim Oficial da RAEM n.º 28, II Série, de 13 de Julho de 2011, o lote «V» foi revisto para ser aproveitado com a construção de um edifício, em regime de propriedade horizontal, constituído por um pódio com 2 pisos sobre o qual assentam 5 torres com 44 pisos cada uma, compreendendo um piso de refúgio, destinado às finalidades de habitação, comércio, estacionamento e área livre. Em 17 de Agosto de 2012 foi emitida pela DSSOPT a licença de utilização n.º 33/2012 à construção implantada (Villa de Mer) no respectivo lote.
   12. O lote «P» está a ser aproveitado com a construção de um edifício em regime de propriedade horizontal, constituído por um pódio com 5 pisos sobre o qual assentam 18 torres com 47 pisos cada uma, compreendendo um piso de refúgio, destinado às finalidades de habitação, comércio, estacionamento e área livre.
II
   13. A concessionária apresentou respectivamente em 15 de Janeiro de 2014 e 30 de Janeiro de 2014 um requerimento e documentos complementares nos quais solicitou a prorrogação do prazo de aproveitamento do lote «P» por 72 meses, exprimindo que após autorização da alteração da finalidade do lote «P» (por Despacho do SOPT n.º 19/2006, a finalidade inicial de industrial tinha sido alterada para habitacional), tinha acompanhado activamente o desenvolvimento do empreendimento, no entanto, devido à grande dimensão e à complexidade técnica do mesmo, o projecto de arquitectura apresentado em 22 de Outubro de 2009 acabou por ser aprovado condicionalmente em 30 de Dezembro de 2010 após feitas várias alterações.
   14. Em seguida, a concessionária apresentou em 11 de Maio de 2011 o projecto de alteração de arquitectura, no entanto, a fim de cumprir as exigências da Direcção dos Serviços de Protecção Ambiental (DSPA), a concessionária apresentou em 19 de Abril de 2012, 31 de Agosto de 2012, 7 de Setembro de 2012 e 15 de Março de 2013 os relatórios da avaliação ambiental e da circulação do ar. Após feitas várias alterações, os respectivos relatórios acabaram por ser aceites em 9 de Outubro de 2013, assim sendo, a concessionária apresentou em 24 de Outubro de 2013 na DSSOPT um pedido de emissão da licença de obra, tendo o referido projecto sido aprovado e a emissão da respectiva licença de obra autorizada por despacho de 31 de Dezembro de 2013 da directora substituta da DSSOPT.
   15. Finalmente, a concessionária exprimiu que uma vez que a apresentação do relatório da avaliação ambiental exigido não era da sua responsabilidade, solicitava à Administração que autorizasse a prorrogação do prazo de aproveitamento do lote «P» por 72 meses e declarava que aceitava a aplicação de uma multa pelo atraso no aproveitamento do terreno.
   16. Atento o pedido supramencionado o Departamento de Gestão de Solos (DSODEP) da DSSOPT solicitou ao Departamento de Urbanização (DURDEP) o fornecimento de informações pormenorizadas sobre a apreciação dos projectos no sentido de comprovar os motivos para a prorrogação do prazo de aproveitamento do terreno solicitada pela concessionária.
   17. De acordo com as informações fornecidas pelo DURDEP através da comunicação do serviço interno (CSI) n.º 344/DURDEP/2014, de 28 de Fevereiro, e da proposta n.º 2025/DURDEP/2014, a requerente apenas apresentou os projectos de alteração de arquitectura e de fundações do lote, no entanto, os prazos de validade das licenças de obra dos respectivos projectos terminaram em 28 de Fevereiro de 2014 (o termo do prazo de aproveitamento do terreno) e os outros projectos de especialidade ainda não foram apresentados. Devido à grande dimensão da construção a decorrer no lote e ao facto de restarem menos de 21 meses para o termo do prazo de arrendamento do terreno (25 de Dezembro de 2015), iria ser muito difícil no referido prazo ficarem concluídas a apreciação e a aprovação de diversos projectos de especialidade bem como as obras das fundações e da superestrutura. No entanto, caso o andamento de todos os trabalhos decorresse bem, os operários qualificados, máquinas e equipamentos e materiais de construção fossem suficientes e as referidas obras pudessem ser executadas imediatamente, iria ser possível concluir-se o respectivo empreendimento.
   18. Após a análise do processo, o DSODEP da DSSOPT elaborou a proposta n.º 090/DSODEP/2014, de 25 de Março, referindo que o pedido era já o quarto pedido de prorrogação do prazo de aproveitamento do terreno (o prazo concedido inicialmente tinha sido até 25 de Dezembro de 1995, depois no 1º pedido, o prazo tinha sido prorrogado até 25 de Dezembro de 1997, o 2º até 26 de Dezembro de 2000 e o 3º até 28 de Fevereiro de 2014) e o atraso no aproveitamento do terreno era imputável à concessionária. De acordo com as fotografias tiradas in loco em 10 de Março de 2014, ainda não se tinha dado início a quaisquer obras das fundações do empreendimento, no entanto, a concessionária já tinha liquidado o prémio na sua totalidade, procedido a várias alterações do projecto de arquitectura e apresentado vários relatórios da avaliação ambiental, o que manifestava que a mesma tinha interesse no aproveitamento do lote. No entanto, o prazo de arrendamento do terreno terminaria no dia 25 de Dezembro de 2015, pelo que o DSODEP propôs superiormente na proposta que fosse indeferido o pedido de prorrogação do prazo por 72 meses formalizado pela concessionária, fosse autorizada a prorrogação do prazo de aproveitamento do terreno até 25 de Dezembro de 2015 e aplicada à concessionária uma multa máxima no valor de $180 000,00 patacas, nos termos do disposto na cláusula nona do respectivo contrato. Uma vez que no pedido a concessionária declarou que aceitava a aplicação de uma multa pelo atraso no aproveitamento do terreno, propôs-se superiormente que fosse dispensada a realização do procedimento de audiência prévia, nos termos das respectivas disposições do «Código do Procedimento Administrativo».
   19. A chefe do DSODEP concordou com a proposta de aplicar à concessionária uma multa e exprimiu que já se tinha vendido no mercado metade das fracções autónomas para fins habitacionais do edifício em construção, assim sendo, concordou também por isso com a prorrogação do prazo de aproveitamento do terreno até 25 de Dezembro de 2015. Caso não se pudesse concluir o aproveitamento dentro do prazo de arrendamento, a concessão provisória do terreno não poderia ser renovada, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 48.º da Lei n.º 10/2013.
   20. A subdirectora da DSSOPT exprimiu que o atraso no aproveitamento do lote «P» por parte da concessionária se devia ao acompanhamento dado à modificação do aproveitamento do lote «V» autorizada por Despacho do SOPT n.º 30/2011 (a lícença de utilização do edifício tinha sido emitida em 17 de Agosto de 2012). Em seguida, a concessionária tinha apresentado por sua iniciativa em 2011 o projecto de alteração de arquitectura do lote «P», necessitando de apresentar relatórios da avaliação ambiental e da circulação do ar por a distância mínima entre as torres não cumprir as exigências da PAO, ou seja, por essa distância não corresponder a 1/6 da altura das torres. Posteriormente, os respectivos relatórios acabaram por ser aceites e o respectivo projecto acabou por ser aprovado em 9 de Outubro de 2013, assim sendo, a subdirectora concordou com a proposta de se prorrogar o prazo de aproveitamento do terreno e exprimiu que caso a referida concessão não pudesse ser convertida em definitiva antes do termo do prazo de arrendamento do terreno (25 de Dezembro de 2015), deveria proceder-se à respectiva análise.
   21. O director da DSSOPT emitiu parecer concordante e propôs-se autorização superior para o envio do processo à Comissão de Terras para emissão de parecer sobre à prorrogação do prazo de aproveitamento do terreno e o montante da multa a aplicar, tendo o SOPT concordado com a respectiva proposta.
   22. A Comissão de Terras, reunida em sessão de 22 de Maio de 2014, após o estudo e análise do processo, considera que caso fosse prorrogado o prazo de aproveitamento do lote 《P》até à data do termo do prazo de arrendamento, restando apenas menos de 18 meses, duvida assim que se possa concluir durante esse prazo a construção por parte da concessionária de um edifício constituído por um pódio com 5 pisos e sobre o qual assentão 18 torres com 47 pisos, as quais compreendem um piso refúgio. Sendo assim, a Comissão deliberou a devolução do processo ao DSODEP da DSSOPT, a fim de inquirir se a concessionária possui ou não condições para concluir num prazo inferior a 18 meses o aproveitamento do terreno. (Constante na Acta n.º 11/2014 da Comissão de Terras)
   23.Nestas circunstâncias, através do oficio n.º 398/954.06/DSODEP/2014, de 26 de Maio, o DSODEP da DSSOPT solicitou à concessionária a resposta acerca de reúnem ou não condições para concluir o respectivo edifício dentro do prazo de arrendamento do terreno.
   24. Em 4 de Junho de 2014, Yip, Wai King e Chio, Koc Ieng, na qualidade de representantes da Sociedade de Importação e Exportação Polytex, Limitada, deram a seguinte resposta através da carta apresentada:
   24.1 Inicialmente o lote «P» estava destinado a uma fábrica de têxteis, tendo em 1990 sido concedido a esta sociedade a construção de uma fábrica avançada de produção têxtil. Deste modo, conquistámos ao mar um aterro, construímos e começámos a operar a fábrica, observando sempre o estipulado no contrato de concessão. Em 2005, com a falta de tecnologia e recursos humanos que se sentia em Macau na altura, a competitividade (da actividade em causa) estava em declínio, impossibilitando a sua operação eficaz, pelo que solicitámos a alteração da finalidade inicial do terreno para as finalidades comercial e habitacional;
   24.2 Através do Despacho do SOPT n.º 19/2006, publicado no Boletim Oficial da RAEM n.º 9, II Série, de 1 de Março de 2006, a revisão do contrato do terreno concedido acima referido foi aprovada pelas autoridades, no entanto, como o prazo de arrendamento não foi prorrogado adequadamente na altura, isso fez com que o prazo de desenvolvimento tenha sido mais curto que o dos outros projectos. Embora o nosso projecto de desenvolvimento seja complexo, temos de uma forma activa e sem demoras inquirido sobre a aprovação do desenvolvimento do respectivo terreno por parte da Administração. Em 2007, solicitámos novamente uma PAO de acordo com as exigências; em 6 de Maio de 2008 foi entregue à DSSOPT um projecto de arquitectura, o qual foi aprovado em Janeiro de 2011. No entanto, após essa data, temos recebido constantemente pareceres inerentes à área de sombra, electricidade, tráfego, ambiente, entre outras, vindas de diferentes serviços públicos. E para essas questões, respondemos sempre de forma contínua e rápida, apesar de as normas e as exigências de certas questões serem novas. Em 2006 a revisão do contrato do terreno concedido não foi concretizada, tendo decorrido já 8 anos desde o despacho de alteração da finalidade até à obtenção da licença de obra.
   24.3 Tendo em consideração a envergadura desse projecto, do ponto de vista objectivo e técnico é impossível concretizá-lo antes de 25 de Dezembro de 2015, prazo inicial de aproveitamento do terreno. Por esta razão, solicitamos à Administração que seja autorizada previamente a prorrogação do prazo de aproveitamento do terreno, de modo que possamos requerer a licença de obra para iniciar de imediato as obras. Além disso, a fim que haja tempo suficiente para concluir o projecto de desenvolvimento, iremos solicitar também em seguida, a continuação para do desenvolvimento do respectivo terreno após o termo do prazo de aproveitamento.
   24.4 Tendo em vista que a promessa de venda do projecto acima referido era de cerca de três mil fracções, assim, a fim de evitar causar eventuais danos e prejuízos em milhares de compradores e respectivas famílias e evitar quaisquer impactos na harmonia e estabilidade de Macau, esperamos que as autoridades autorizem previamente e com a maior brevidade possível a prorrogação do prazo de aproveitamento do terreno e que concedam a licença de obra até 25 de Dezembro de 2015. Comprometemo-nos em assumir todas as consequências após a realizaçao da obra.
   25. Relativamente à carta da concessionária, esta Comissão realizou uma nova reunião e após estudar e analisar o processo, considerou que caso se emitisse parecer favorável à prorrogação do prazo de aproveitamento do terreno, mesmo sabendo da impossibilidade da concessionária concluir o aproveitamento do terreno dentro do prazo de arrendamento, criar-se-ia evidentemente na mesma a expectativa de que talvez ainda pudesse continuar a aproveitar o terreno depois do termo do prazo de arrendamento. Por outro lado, a concessão provisória não poderá ser convertida em definitiva porquanto o aproveitamento do terreno não poderá ficar concluído antes do termo do prazo de arrendamento, impondo-se nessa altura declarar a caducidade da concessão. Para além disso, a Administração não pode comprometer-se a conceder novamente o terreno originário, uma vez que nos termos do artigo 54.º da Lei n.º 10/2013 (Lei de terras), a nova concessão deve ser efectuada através de concurso público, concurso esse que pode ser dispensado apenas nos casos previstos no artigo 55.º da mesma lei. Assim sendo, só no caso da concessionária corresponder aos requisitos previstos nos diplomas legais é que a mesma poderá obter a concessão do lote para efeitos de aproveitamento. Para além disso, estima-se que mesmo que o prazo de aproveitamento seja prorrogado, a concessionária só possa concluir parte das obras de fundação, podendo no entanto isto criar indirectamente condições favoráveis à concessionária para que esta se aproveite do facto como fundamento para lograr ficar com a concessão do terreno.
   26. Face ao exposto, esta Comissão, após ter analisado o processo, considera que embora a concessionária esteja interessada na conclusão do aproveitamento do terreno, não é materialmente possível a sua concretização antes do termo do prazo de arrendamento que terminará em breve, pelo que sendo a concessão provisória não poderá ser convertida em definitiva. Assim, findo o prazo do arrendamento, tem de ser declarada a caducidade da concessão. Nestas circunstâncias, esta Comissão propõe que a situação real do processo, anteriormente descrita seja tida em consideração na decisão final que recair sobre o pedido, nomeadamente o conteúdo da carta da concessionária de 4 de Junho de 2014 (vide ponto 24 deste parecer).
III
   Reunidas em sessões de 22 de Maio, 26 de Junho e 3 de Julho de 2014, respectivamente, a Comissão de Terras, após a análise e o estudo do processo, considera que embora a concessionária esteja interessada na conclusão do aproveitamento do terreno, esta não pode concretizar-se antes do termo do prazo de arrendamento que irá terminar em breve, pelo que sendo a concessão provisória não poderá ser convertida em definitiva. Assim, findo o prazo de arrendamento, tem de declarar-se a caducidade da concessão. Nestas circunstâncias, esta Comissão propõe que a situação real do processo, anteriormente descrita seja tida em consideração na decisão final que recair sobre o pedido, nomeadamente o conteúdo da carta da concessionária de 4 de Junho de 2014.
   Comissão de Terras, aos 3 de Julho de 2014.
   …”
   22- Em 02/07/2014, a Autora requereu de novo a prorrogação do prazo nos seguintes termos (cfr. doc. 9 junto com a contestação):
   “...澳門特別行政區
   運輸工務司司長 閣下鈞鑒
   事由:關於一幅以租賃制度批出,位於予澳門半島黑沙灣新填海區, 面積68,001平方米,一幅稱為“P”地段,其批給合同由第160/SATOP/90號批示規範,並經第123/SATOP/93號批示、第123/SATOP/99號批示、第19/2006號及第30/2011號運輸工務司司長批示修訂的土地之土地利用期限延期申請
   關於上述批地之土地利用期限(2014年2月28日)之延期手續,本公司早於本年1月30日向土地工務運輸局提交有關申請(見附件1)。四個月後,該局於本年5月26日發出第398/954.06/DSODEP/2014號公函,要求本公司能否在土地租賃期限內具備條件完成興建由一座5層高的樓裙及其上建有十八幢連一避火層在內均為47層高的塔樓組成的樓宇回覆意見。為此,本公司於本年6月3日與該局領導和主管人員舉行會議並於6月4日向該局提交有關意見(見附件2),惟至今已逾一個月仍未獲當局回覆任何具體決定。基此,鑑於本公司一直以來從未就土地之利用發展有任何故意或過錯拖延之處(見附件1之第五點),尤其很早於2009年10月22日已向該局提交了建築工程計劃草案,四年多之後,於2014年1月3日收到該局於2013年12月31日發出之工程准照。事實上,上述發展項目已根據“樓花法”生效前之原有法例出售大約3000個 “樓花”單位,基於合約精神,本公司確實有責任予以履行。此外,現行法例並沒有規定批租期餘下期間的長短與批地上的施工繼續進行有任何直接關係,而在本項目的具體情況中,鑒於該批租期仍未屆滿,為此,茲藉此函再次懇請特區政府關注上述各項情事,先行批准土地利用期限之延長並發出工程准照,以便本公司能儘快啓動工程,然後本公司適時請求特區政府依法處理本項目在批租期告滿後的發展。無論如何,本公司重申和鄭重承諾承擔工程進行後的一切後果。
   附上:2份文件。
保利達洋行有限公司
葉惠琼、焦幗瑛
二零一四年七月二日於澳門
   ...”
   23 - Em 10/07/2014, o então Secretário para os Transportes e Obras Públicas, com base no parecer n.º 59/2014 da Comissão de Terras, emitiu o seguinte parecer (cfr. doc. 10 junto com a contestação):
   “Governo da Região Administrativa Especial de Macau Gabinete do
    Secretário para os Transportes e Obras Públicas
Parecer
Proc. n.º 18/2014 - a Sociedade de Importação e Exportação Polytex, Limitada, pediu prorrogar o prazo de aproveitamento dum terreno concedido por arrendamento, situado na península de Macau, nos NATAP, constituído pelos lotes designados por “O”, “P”, “S” e “V”, com área total de 105,437m2, cujo contrato de concessão é titulado por despacho n.º 160/SATOP/90, modificado por despacho n.º 123/SATOP/93, despacho n.º 123/SATOP/99, despachos n.º 19/2006 e n.º 30/2011 do Secretário para os Transportes e Obras Públicas.

Como não se observou o prazo de aproveitamento do lote “P”, propõe-se considerar a situação real do lote “P”, nomeadamente o teor da carta da concessionária, para tomar a decisão final.

Ficou prescrito o prazo de aproveitamento do terreno referido em 28 de Fevereiro deste ano, ficará prescrito o prazo de arrendamento em 25 de Dezembro do próximo ano (2015).

A Sociedade concessionária declara que aceita a eventual multa de prorrogação, realça e compromete-se que “vai assumir todas as consequências depois da construção.”

Analisado o parecer da Comissão de Terras e ponderando os 17º a 21º pontos desse parecer e a carta da concessionária constante do 24º ponto, nomeadamente o teor do ponto 24.4, concordo, em princípio, com os pontos 14.2 e 14.3 da informação n.º 090/DSODEP/2014 da Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes, isto é, prorrogar o prazo de aproveitamento até 25 de Dezembro de 2015 e aplicar a multa no montante de MOP$180,000.00, pressupondo que a Sociedade concessionária aceite previamente por escrito as seguintes condições, para garantir interesses públicos:

1. Se não for completado o aproveitamento antes da prescrição de arrendamento, mesmo estando preenchidos os requisitos previstos no art.º 5.º da Lei n.º 7/2013 (Regime jurídico da promessa de transmissão de edifícios em construção), a Sociedade concessionária não vai pedir autorização prévia para fazer negócios jurídicos de promessa de transmissão ou oneração de edifícios em construção no lote P, nem vai realizar esses negócios jurídicos, excepto a eventual obtenção legal de nova concessão desse terreno;
2. Se não mais lhe for concedido o terreno, a Sociedade concessionária não pode pedir à RAEM qualquer indemnização ou compensação.

À consideração do Exmo. Sr. Chefe do Executivo.

10 de Julho de 2014
Secretário para os Transportes e Obras Públicas
Ass. vide o original
Lao Si Io”
   24 - Em 15/07/2014, sobre este parecer, o Chefe do Executivo despachou: “Concordo” (cfr. doc. 10 junto com a contestação).
   25 - Em 29/07/2014 foi enviado à Autora um ofício assinado pela Directora Substituta da DSSOPT, com o seguinte (cfr. doc. 11 junto com a contestação):
“Governo da Região Administrativa Especial de Macau
Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes
c/c: DURDEP (185/1991/L)
DATSEA (18/2014)
Para
Avenida do Nordeste, Lote “P”, Edifício “I”, Macau
Sociedade de Importação e Exportação Polytex, Limitada

Sua referência Sua comunicação de Nossa referência C. Postal 467 - Macau
81054, 86028 02/07/2014, 14/07/2014 572/954.06/DSODEP/2014
68260 e 68264 04/06/2014
15554, 6818 30/01/2014, 15/01/2014
29/JUL/2014
Assunto: sobre o pedido de prorrogação do prazo do aproveitamento de terreno, de um terreno concedido por arrendamento, situado na zona de Novos Aterros da Areia Preta (NATAP) Macau, com uma superfície total de 105437 m2, constituído por quatro lotes designados por “O”, “P”, “S”, “V”, cujo contrato de concessão foi regulado pelo Despacho n.º 160/SATOP/90, e revisto pelo Despacho n.º 123/SATOP/93, pelo Despacho n.º 123/SATOP/99, pelo Despacho n.º 19/2006 e pelo Despacho n.º 30/2011 do Secretário para os Transportes e Obras Públicas

1. Nos termos da cláusula n.º 2 do contrato de concessão de terreno revisto pelo Despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º 19/2006, o prazo de aproveitamento do terreno já ficou caduco aos 28 de Fevereiro de 2014; no entanto, nos termos do art.º 2.º do Despacho n.º 160/SATOP/90, o prazo de arrendamento do terreno vai acabar aos 25 de Dezembro de 2015.

2. Como o atraso do aproveitamento do terreno é imputável à vossa empresa, e tendo em conta que esta não é a primeira vez que a vossa empresa requer prorrogar o aproveitamento de terreno, e visto que já concordou aceitar a forma de punição para o atraso prevista no contrato; para o efeito, nos termos do Despacho proferido pelo Chefe do Executivo aos 15 de Julho de 2014, autoriza-se prorrogar o prazo de aproveitamento do terreno até 25 de Dezembro de 2015, e aplica-se a multa no valor de MOP$180000,00 (cento e oitenta mil patacas). Mas para garantir os interesses públicos, a empresa concessionária obriga-se previamente a prometer por escrito aceitar as seguintes condições:

2.1. Antes de o prazo de concessão por arrendamento do terreno caducar, se o aproveitamento do terreno ainda não for concluído, mesmo se está de acordo com os requisitos dispostos no artigo 5.º da Lei n.º 7/2013, Regime jurídico da promessa de transmissão de edifícios em construção, a concessionária não vai pedir autorização prévia para efectuar os actos jurídicos da promessa de transmissão do edifício em construção no Lote “P” ou da promessa de oneração, nem vai praticar esses actos jurídicos, excepto se o terreno for concedido de novo nos termos legais;

2.2. Se no futuro o terreno não for concedido nos termos legais, a empresa concessionária não pode reclamar qualquer indemnização ou compensação à RAEM.

3. Nestes termos, avisa-se a vossa empresa para entregar a promessa escrita acima mencionada, para ser transferida à Comissão de Terras para acompanhar, a fim de emitir a guia do pagamento da multa.”
   26 - Em 04/08/2014 a Autora comunicou ao Director da DSSOPT o seguinte (cfr. doc. 11 junto com a contestação):
“Sociedade de Importação e Exportação Polytex, Limitada
Ex. Sr. Eng.º Jaime Carion
Director da DSSOPT
RAEM

Assunto: sobre o pedido de prorrogação do prazo do aproveitamento de terreno, de um terreno concedido por arrendamento, situado na zona de Novos Aterros da Areia Preta (NATAP) Macau, com uma superfície de 68001 m2, designado por Lote “P”, cujo contrato de concessão foi regulado pelo Despacho n.º 160/SATOP/90, e revisto pelo Despacho n.º 123/SATOP/93, pelo Despacho n.º 123/SATOP/99, pelo Despacho n.º 19/2006 e pelo Despacho n.º 30/2011 do Secretário para os Transportes e Obras Públicas

A SOCIEDADE DE IMPORTAÇÃO E EXPORTAÇÃO POLYTEX, LIMITADA (o nome em inglês: POLYTEX CORPORATION LIMITED, doravante designada simplesmente por “concessionária”), com a sede de pessoa colectiva na Avenida do Nordeste, Lote “P”, Edifício “I”, Macau, a concessionária do terreno em título, em resposta ao pedido no ofício n.º 572/954.06/DSODEP/2014 emitido pela DSSOPT aos 29 de Julho do ano corrente, declara aceitar a multa no valor de MOP 180000, condenada segundo o despacho proferido aos 15 de Julho de 2014, declara mais aceitar as seguintes condições:

1. Antes de o prazo de concessão por arrendamento do terreno caducar, se o aproveitamento do terreno ainda não for concluído, mesmo se está de acordo com os requisitos dispostos no artigo 5.º da Lei n.º 7/2013, Regime jurídico da promessa de transmissão de edifícios em construção, a concessionária não vai pedir autorização prévia para efectuar os actos jurídicos da promessa de transmissão do edifício em construção no Lote “P” ou da promessa de oneração, nem vai praticar esses actos jurídicos, excepto se o terreno for concedido de novo nos termos legais;

2. Se no futuro o terreno não for concedido nos termos legais, a empresa concessionária não pode reclamar qualquer indemnização ou compensação à RAEM.
Sociedade de Importação e Exportação Polytex, Limitada
IP WAI KING, CHIO KOC IENG
Aos 4 de Agosto de 2014”.
   27 - Em 30/12/2015, foi elaborada a proposta n.º 393/DSODEP/2015 no sentido de ser declarada a caducidade da concessão relativamente ao lote “P” (cfr. doc. 43 com a p.i.).
   28 - A declaração de caducidade foi objecto de decisão em 26/01/2016, conforme publicitado, nos termos do Despacho do STOP n.º 6/2016, no Boletim Oficial em 29/01/2016.
   29 - Em 23/05/2018, o Tribunal de Última Instância julgou improcedente o recurso jurisdicional interposto pela Autora do acórdão proferido pelo Tribunal de Segunda Instância que tinha negado provimento ao recurso contencioso de anulação contra a supra referida decisão de declaração de caducidade.
*
   A decisão sobre a matéria de facto baseou-se essencialmente na análise da prova documental junta aos autos, e na admissão por acordo dos alegados.
*

2. De direito

   Pede a Autora que seja ressarcida dos prejuízos emergentes na execução do contrato de concessão por arrendamento de terreno em que esta tomou parte como concessionária, alegadamente, por causa da actuação da Ré que constituiu um entrave injustificada ao seu aproveitamento do terreno dentro do prazo fixado e que veio a conduzir à declaração da caducidade da respectiva concessão.
   Face à pretensão indemnizatória assim configurada, são várias excepções suscitadas pela Ré na contestação, designadamente, a prescrição do pedido indemnizatório, a existência da renúncia abdicativa ao direito indemnizatório feita pela Autora, bem como a incompatibilidade entre as causas de pedir e a inadequação da forma do processo utilizado.
   
E não sendo vinculada pela ordem das questões suscitadas, começamos, desde logo, a análise por tal suposta renúncia abdicativa do direito indemnizatório, devidamente registada nos documentos, que se transcreve nos seguintes termos:
“A SOCIEDADE DE IMPORTAÇÃO E EXPORTAÇÃO POLYTEX, LIMITADA (o nome em inglês: POLYTEX CORPORATION LIMITED, doravante designada simplesmente por “concessionária”), com a sede de pessoa colectiva na Avenida do Nordeste, Lote “P”, Edifício “I”, Macau, a concessionária do terreno em título, em resposta ao pedido no ofício n.º 572/954.06/DSODEP/2014 emitido pela DSSOPT aos 29 de Julho do ano corrente, declara aceitar a multa no valor de MOP 180000, condenada segundo o despacho proferido aos 15 de Julho de 2014, declara mais aceitar as seguintes condições:
   1. Antes de o prazo de concessão por arrendamento do terreno caducar, se o aproveitamento do terreno ainda não for concluído, mesmo se está de acordo com os requisitos dispostos no artigo 5.º da Lei n.º 7/2013, Regime jurídico da promessa de transmissão de edifícios em construção, a concessionária não vai pedir autorização prévia para efectuar os actos jurídicos da promessa de transmissão do edifício em construção no Lote “P” ou da promessa de oneração, nem vai praticar esses actos jurídicos, excepto se o terreno for concedido de novo nos termos legais;
   2. Se no futuro o terreno não for concedido nos termos legais, a empresa concessionária não pode reclamar qualquer indemnização ou compensação à RAEM…”

Invoca a Ré a referida declaração abdicativa feita pela Autora com vista à obtenção da autorização da prorrogação do prazo de aproveitamento e a emissão da licença de obra até ao termo do prazo de concessão, isto é, 25 de Dezembro de 2015, a qual, ao ter-se por validamente efectuada, excluiria a possibilidade desta de tornar a responsabilizar a Ré e imporia a sua absolvição do pedido.
Insurge-se a Autora contra esta tese, argumentando que a renúncia feita nestes termos não poderia ser válida, e requerendo portanto a anulação da mesma a título incidental, com base nos fundamentos que se poderia resumir aos termos seguintes:
   1. A nulidade da declaração por ser provocada pela actuação administrativa ilegal, inclusivamente, as violações legais cometidas contra a ordem pública, os princípios fundamentais do direito administrativo como os de imparcialidade, proporcionalidade, igualdade etc;
   2. A anulabilidade da renúncia em virtude da verificação dos vícios de vontade, em especial, da coacção moral, nos termos do disposto no art.º 249.º do CCM;
   3. A nulidade da renúncia por indeterminabilidade do seu objecto, nos termos do disposto do art.º 273.º, n.º 1do CCM; e
4. A nulidade da declaração por se consubstanciar numa renúncia antecipada do direito do credor nos termos do disposto do art.º 798.º, n.º 1 do CCM.
*
Cumpre-nos apreciar a bondade de cada um dos seus argumentos.

   1. Foi desde logo imputada a actuação administrativa ilegal da Ré, resultante da violação das regras de boa-fé, dos deveres de protecção, de informação e de lealdade, bem como dos princípios fundamentais do direito administrativo, o que, na óptica da Autora, merece censura e determina a invalidade da declaração, por a mesma ser extorquida em consequência da exigência ilegal.

   Começaremos por dizer que não concordamos com este entendimento.

Em bom rigor, saber se é censurável o comportamento da Ré é uma coisa, outra coisa é saber até que ponto esta censurabilidade poderia chegar a comprometer a validade da declaração abdicativa em causa.

   O que se discute nesta causa, recorde-se, é a validade de uma declaração da Autora no sentido de se autovincular à renúncia do direito à indemnização pela eventual não concessão, no futuro, do terreno de que esta era concessionária. E ao contrário do que entende a Autora, do que se trata aqui julgamos ser caracterizável como um acto jurídico unilateral pelo qual o declarante manifestou sua vontade de abdicar o direito à indemnização perante o declaratário, pelos motivos que se passa a expor:
   
   Repare-se, em primeiro lugar, que de acordo com a factualidade assente, a Autora começou logo no dia 14/01/2014 a pedir, por carta dirigida ao Director da DSSOPT, a prorrogação do prazo de aproveitamento pelo período de 72 meses, e reiterou esse pedido na carta datada de 30/01/2014.

   Mais tarde, vendo o seu pedido insatisfeito e ao ser inquerida pela DSSOPT sobre a possibilidade da conclusão tempestiva do aproveitamento, manifestou, pela primeira vez, em 4/6/2014, de querer assumir todas as consequências depois da construção, requerendo para tal a prorrogação imediata do prazo de aproveitamento até 25 de Dezembro de 2015. E subsequentemente, esta vontade de assunção de todas consequências, incorridas “de qualquer forma” (em chinês“無論如何”), foi sempre reiterada no seu posterior requerimento apresentado em 2/7/2014.
   
   Assim, face ao solicitado pela Autora e em sede da resposta às suas sucessivas cartas, a Ré informou no dia 29/07/2014, por seu ofício n.º 572/954.06/DSODEP/2014, a Autora para prestar as declarações nos termos supracitados. O que a Ré pediu nessa altura foi, no fundo, a formalização de uma intenção da Autora de declarar, que já tinha sido anunciada e enfatizada desde há algum tempo.
   
   Dito por outra forma, pese embora o facto de a Autora ter sido convidada a prestar a declaração nestes termos, esta, ao que nos parece, nem por isso perdeu a sua iniciativa na tomada da referida declaração, se analisando o contexto cronológico em que esta declaração foi efectuada, que se vem de expor.
   
Neste sentido, cremos que resultaram em vão os esforços da Autora na sua defesa de que as supra referidas cartas datadas de 4/6/2014 e 2/7/2014 não deveriam ser interpretadas como assunção da responsabilidade por não aproveitamento do terreno, conforme se alega nos artigos 172.º a 180.º da réplica, e que no nosso entender, mesmo aí, não foi inteiramente explícita tal intenção de não assunção de nenhuma responsabilidade. E nesta medida, essa leitura da Autora ainda que fosse considerada verossímil, não seria de todo incompatível com a sua intenção inequívoca posteriormente anunciada no sentido de exonerar a Ré, de forma absoluta e incondicional – nomeadamente quando afirmou que iria suportar “todas as consequências.”

   E se assim é, a declaração abdicativa de direito em causa, não obstante a intervenção antecedente da Ré, não deverá deixar de poder ser qualificada como acto jurídico unilateral. Não se perceberia, portanto, como uma actuação administrativa da Ré enquanto mera declaratária, se bem que não estivesse tutelada por nenhuma norma jurídica vigente, ou viciada das várias violações legais imputadas, poderia “contaminar” a validade desse acto de declaração emitida pela própria declarante, fazendo com que este não pudesse produzir efeitos em termos normais.
   
   Com efeito, dificilmente se poderia vislumbrar a pertinência das teses elegidas pela Autora que nos apontam para este sentido, e que por esta razão, não devem proceder.
   
   2. Seguidamente, vejamos se naquela declaração se verificou a invocada coacção moral.
   
   Segundo o que se alega, a declaração foi viciada por uma pressão e uma chantagem ilegitimamente exercida pela Ré, determinada pelo receio da Autora de perda do investimento realizado.
   
   Como se sabe, a coacção moral nos releva para determinar a anulação de uma declaração negocial, na medida em que afecta o processo formativo da vontade declarativa, reconduzindo-se assim à categoria de vícios de vontade. E além disso, só existe este vício da vontade quando for totalmente retirada ao coacto a possibilidade da escolha.1
   
   A este respeito, determina-se no disposto dos art.º s 248.º e 249.º do CCM no seguinte:
“Artigo 248.º
(Coacção moral)
   1. Diz-se feita sob coacção moral a declaração negocial determinada pelo receio de um mal de que o declarante foi ilicitamente ameaçado com o fim de obter dele a declaração.
   2. A ameaça tanto pode respeitar à pessoa como à honra ou património do declarante ou de terceiro.
   3. Não constitui coacção a ameaça do exercício normal de um direito nem o simples temor reverencial.
Artigo 249.º
(Efeitos da coacção)
   A declaração negocial extorquida por coacção é anulável, ainda que esta provenha de terceiro; neste caso, porém, é necessário que seja grave o mal e justificado o receio da sua consumação.” (sublinhado nosso).
   
Nos termos acima enunciados, a delimitação do conceito jurídico de coacção moral assenta em três elementos: a ameaça de um mal, a ilicitude desta e o seu carácter intencional ou cominatório. E além do mais, a relevância invalidante da coacção moral depende ainda da invocação e da prova pelo coagido do requisito da dupla causalidade, traduzida na necessidade de a ameaça ser a causa do medo e de este ser a causa da declaração negocial2.

Na situação sub judice, em face dos factos todos assentes, o nosso entendimento é que inexiste tal ameaça que deveria ser supostamente dirigida pela Administração à pessoa dos representantes da Autora enquanto coacto, ou ao seu património, no sentido de desencadear o mal contra esta, muito menos se conhece em que termos esta ameaça foi feita, e em que consiste a ilicitude desta ameaça.

É que, contextualizando o caso, nos resultaria evidente que o acto de declaração em causa foi praticado não por causa do medo ou receio que a Autora representava na sua mente, de um mal ou de um sacrifício a ser infligido à sua pessoa ou aos seus bens visados por “ameaça”, mas com uma outra intenção que é de obter os eventuais benefícios provenientes da autorização da prorrogação do prazo de aproveitamento do terreno, junto à entidade da Administração Pública.

Não se tendo verificado os elementos constitutivos da coacção moral, desnecessário é saber se a mesma terá relevância invalidante ou não no caso concreto.

Nestes termos, parece-nos óbvio que a tese da Autora assente na verificação da coacção moral carece de apoio legal.

   E além disso, pelo que fica enunciado sobre os acontecimentos antecedentes daquele acto de declaração em causa, a vontade declarativa da Autora foi livre, esclarecida, ponderada, portanto nem se nos afigura que em relação à mesma, se tenha verificado outros vícios na formação de vontade, igualmente determinantes da anulabilidade da declaração.

3. Ainda entende a Autora que a respectiva declaração é nula por indeterminabilidade do objecto, nos termos do disposto do art.º 273.º, n.º 1 do CCM, já que esta, no momento em que efectuou aquela declaração, não representava como prováveis os danos que iriam ocorrer, nem conhecia a sua exacta extensão.

Não nos parece que a Autora nesta parte tenha razão.

É quase consensual que para o negócio ser válido, não é necessário que o respectivo objecto se encontre determinado aquando da sua conclusão, bastando apenas que seja determinável em momento posterior, com base nos critérios convencionados pelas partes ou estabelecidos na lei.3

É evidente que a mesma lógica vale para o acto de declaração em causa.

Ora bem, tendo em conta o contexto em que esta declaração foi emitida, através dos seus representantes e naqueles exactos termos, parece-nos forçado dizer que a Autora, aquando na prática daquele acto declarativo, estava inconsciente dos danos que iria sofrer, no caso de não lhe vir a ser renovada a concessão de terreno. Ou seja, a alegada inconsciência sua quanto à existência dos danos naturalmente não nos convence.

Nem a ignorância da extensão dos eventuais danos poder-se-ia obstar a que os danos fossem determináveis e determinados no momento posterior à emissão da declaração, sendo certo que a extensão dos danos neste caso não é de todo inconcebível - os quais deveriam se reportar aos ocasionados pela suposta actuação administrativa ilegal no âmbito da execução do contrato de concessão, e que se tornariam efectivos pela eventual não renovação do contrato no futuro.

Nestes termos, julgamos que o objecto da mesma declaração é determinável, e não se verifica a nulidade prevista no disposto do art.º 273.º, n.º 1 do CCM.

   4. Por último, mais invoca a nulidade do acto de declaração por configurar uma “renúncia antecipada do direito”, por força do disposto do art.º 798.º, n.º 1 do CCM, e ainda pela violação de ordem pública na medida que exonera a Administração da responsabilidade civil.

Vejamos se tem razão.

Como se vê, nos termos configurados pela Autora, estamos perante uma situação em que a alegada actuação ilícita e culposa da Ré represente:
   - por um lado, uma violação do contrato de concessão, em especial, o incumprimento pela Ré dos deveres acessórios inerentes ao seu estatuto de concedente na execução do contrato de concessão;
   - por outro lado, um facto ilícito extracontratual, ou seja, a actuação por culpa do serviço da Ré enquanto autoridade administrativa, traduzida, nomeadamente, na colocação sucessiva de um conjunto de novas exigências ao projecto de arquitectura e ao estudo de impacto ambiental, e a demora injustificada na pronúncia e na comunicação do resultado dos respectivos estudos.
   
   E abrindo-se por esta forma ao credor lesado a tutela contratual, e simultaneamente a tutela extracontratual ou delitual em face do comportamento do devedor lesante.
   
E aqui, importa ver que, a admissibilidade de uma renúncia abdicativa do direito indemnizatório só depende em último ratio, tanto no domínio da responsabilidade civil delitual como no da contratual, dos motivos imperiosos da ordem pública, de índole moral.

Assim, uma declaração de renúncia abdicativa, no plano da responsabilidade contratual, tal como sucede com qualquer cláusula de irresponsabilidade típica, não implica necessariamente a violação da ordem pública porque poderia não pôr em causa a eficácia preventiva e sancionatória de princípio da responsabilidade civil, no sentido precisamente contrário às doutrinas e jurisprudências citadas pela Autora, devendo-se por isso afastar a ideia “de uma possível objecção liminar à clausula exoneratória, fundada na natureza de ordem pública de que se revestiria a responsabilidade contratual”, como defendido por Professor Pinto Monteiro4.

Uma vez que, ainda segundo o mesmo Professor, a cláusula de exclusão “não deixa o credor sem protecção (tanto teórica como praticamente), visto que o único direito que fica prejudicado, por força daquela cláusula, é o direito à indemnização, mantendo-se, porém, em caso de não cumprimento (lato sensu), e apesar de cláusula de irresponsabilidade, todos os outros meios de defesa e de reacção contra a prática de um facto ilícito contratual – como sejam, entre outros, o direito à resolução, a exceptio e à própria execução especifica.”5

À parte disso, “É que com a cláusula de irresponsabilidade, o credor não autoriza o devedor a faltar ao cumprimento mantendo, por isso o direito de exigir judicialmente o cumprimento da obrigação, - podendo socorrer-se mesmo, para o efeito, de uma sanção pecuniária compulsória (art.º 829-A) – até porque aquela cláusula não afasta, obviamente, as obrigações emergentes do contrato celebrado”.6

   Nesta linha de pensamento, parece-nos legítimo concluir que as considerações de ordem pública não poderiam ser invocadas para impor sem mais a sanção de nulidade a qualquer cláusula exoneratória, ou à declaração da renúncia abdicativa no caso vertente.
   
   Poder-se-ia, no entanto, considerar a norma de ordem pública como infringida pela introdução da cláusula exoneratória, nas situações especialmente censuráveis, por exemplo, quando ela visa exonerar o devedor inadimplente que agiu com dolo ou culpa grave, porque nestes casos a exclusão da responsabilidade entraria em choque com as regras de valor moral e social de natureza imperativa, as quais nunca poderiam ser contrariadas. Mas isso já não acontece com a cláusula exoneratória por culpa leve do devedor em que é a censurabilidade do seu comportamento é muito menos acentuada.
   
É que a tal conclusão se pode chegar em face do texto normativo do art.º 798.º do CCM, nos seguintes termos:
“Artigo 798.º
(Renúncia do credor aos seus direitos)
   1. É nula a cláusula pela qual o credor renuncia antecipadamente a qualquer dos direitos que lhe são facultados nas divisões anteriores nos casos de não cumprimento ou mora do devedor, salvo o disposto no n.º 2 do artigo 789.º.
   2. É contudo válida, salvo disposição legal em contrário, a cláusula pela qual se exclua ou limite a responsabilidade pelo não cumprimento, cumprimento defeituoso ou mora, para os casos em que não haja dolo ou culpa grave.” (sublinhado nosso).
   
   Cremos que, fora do citado texto normativo, não deverá ser possível a invocação de violação, só de per si, da cláusula geral de ordem pública em relação à matéria em causa.

   Ao passo que em sede da responsabilidade delitual, as considerações a respeito do papel interventivo da ordem pública não deveriam variar muito. Bem como observou Vaz Serra, “a ordem pública não está sempre interessada na reparabilidade de todos os danos resultantes de factos ilícitos. Pode estar e pode não estar, e só quando estiver deve ter-se como nula a convenção de irresponsabilidade”.7

   À semelhança do que subscrevemos quanto à cláusula exoneratória da responsabilidade contratual, também aqui as razões de ordem pública impõem-se apenas no âmbito dos casos limitados de dolo e culpa grave do lesante e ainda quando recair sobre os danos atendados contra os direitos indisponíveis, como os que afectam a própria pessoa humana.

Concluindo, seja numa situação ou noutra, não é em virtude das simples razões de ordem pública que se determina o afastamento radical da admissibilidade da cláusula exoneratória, ou da renúncia ao direito indemnizatório pelo credor lesado com vista a fazer excluir a responsabilidade do lesante, quer no nosso ordenamento jurídico, quer no ordenamento jurídico comparado de Portugal.

Nesta conformidade, salvo melhor opinião, estamos em crer que, quanto ao acto de declaração em apreço, não se verifica a nulidade deste pela violação da ordem pública em termos gerais.

   Portanto, a tese da Autora só deve naufragar.

5. Resta-nos saber então se a referida declaração é nula nos termos do disposto do citado art.º 798.º do CCM, pondo ainda em crise o sentido de ordem pública que se encontra aí incorporado. Ou em termos concretos, se estamos ou não perante uma situação em que o credor declarante renunciou antecipadamente a qualquer dos direitos que lhe legalmente assiste, nomeadamente, o direito à indemnização pelos comportamentos faltosos do devedor com dolo ou culpa grave.

Mas antes disso, o essencial consiste ainda em descortinar o limite temporal relevante para a determinação da validade da renúncia efectuada – quando a renúncia deste tipo se considera como antecipada?

A respeito desta questão, tem-se entendido que “o artigo sob anot. cuida da renúncia em momento anterior ao cumprimento da obrigação. É este o horizonte temporal relevante. Neste sentido, não fica prejudicada a plena eficácia, consoante o caso, de uma renúncia posterior, isto é, em momento ulterior ao do inadimplemento ou mora, no exercício da autonomia privada. Com efeito, nesta eventualidade, não se suscitam os mesmos obstáculos jurídicos quanto à validade da abalação consentida pelo credor ao exercício dos direitos que lhe assistam”8 (sublinhado nosso).

Reitera, quanto a este ponto, a Ré na sua defesa que não há, no caso sub judice, qualquer renúncia antecipada ao direito, tendo em conta o facto de que a Autora, sendo lesada, prescindiu voluntariamente do seu direito ainda depois de ter plena consciência da ocorrência dos alegados factos ilícitos danosos, como também de todos os danos presentes ou futuros descritos na petição inicial.

   Vejamos.

Da factualidade assente resulta que a declaração da renúncia abdicativa chegou a ser formalizada pela carta dirigida ao Director da DSSOPT em 4 de Agosto de 2014.

E a causa de pedir essencial configurada neste caso, isto é, o funcionamento deficiente da administração durante a execução do contrato de concessão (inclusivamente, a colocação sucessiva de um conjunto de novas exigências relativas ao projecto de arquitectura e ao estudo de impacto ambiental, a demora injustificada na pronúncia e na comunicação do resultado dos respectivos estudos), como sendo idóneo de ocasionar os danos reclamados pela Autora, ocorreu entre 06/05/2008 aquando da apresentação do projecto de arquitectura para a 1ª fase do complexo à DSSOPT, e 15/10/2013 momento em que o resultado do estudo de impacto ambiental chegou a ser finalmente comunicado à Autora (conforme se alega nos artigos 60.º a 188.º da p.i.).

Nesta linha de consideração, mesmo aderindo à tese da Autora, os factos concretos integradores da situação de inadimplemento ou de mora, tudo imputável à Ré, verificaram-se em momento bem anterior ao acto de declaração renunciativa em causa.

   Ao que acresce que a própria Autora já assumiu, categoricamente, que uma vez decorrido o referido período temporal, “já não era possível executar essa mesma obra – como se verificou na realidade dos factos – entre 15/10/2013 e a data do termo do prazo de concessão” (conforme se alega nos artigos 309.º a 325.º da p.i.). Significa que para ela, é este período temporal que é determinante para se estabelecer uma causalidade adequada entre o facto ilícito culposo e os danos verificados, e tudo que se passava depois não lhe interessaria.
   
Face ao exposto, é-nos evidente que tal renúncia não pode ser “antecipada”, mas sim “posterior”, constituindo portanto ainda uma expressão da autonomia privada da respectiva autora que ao tempo da sua feitura, tinha consciência da situação de inadimplemento ou da mora da Administração devedora, e por conseguinte, do direito à indemnização eventualmente que lhe assistirá.

   Por conseguinte, não temos dúvida de que a dita renúncia é válida na medida em que é idónea de produzir os efeitos preclusivos do direito à indemnização naqueles termos configurados pela Autora, seja tal direito exercido na forma de reconstituição natural, seja na forma de indemnização por equivalência.
   
   Posto isto, sempre temos presente que a propósito da mesma matéria, o acima concluído vai precisamente ao encontro do entendimento perfilhado, em sede do processo de suspensão da eficácia da respectiva decisão de declaração de caducidade do Chefe do Executivo, pelo Venerado Acórdão do Tribunal de Segunda Instância que se pronunciou concluindo, embora a mero título incidental, nos seguintes termos:
   “…
   Ora, se os prejuízos que ora invoca decorrem do facto objectivo da caducidade (embora declarada), podemos dizer que a requerente já tinha a consciência de que tais prejuízos podiam vir, efectivamente, a ocorrer. Tanto é assim que, após o deferimento do pedido de prorrogação de 4/06/2014 (facto 20 supra), ela mesma viria a renunciar a eventuais direitos compensatórios ou indemnizatórios “Se no futuro o terreno não for concedido nos termos legais…” (facto 24).
   Isto parece querer dizer que os danos que ela poderia vir a sofrer e de cujo direito ressarcitório se despojou pela via abdicativa ou renunciativa também não poderão agora valer como fundamento para a suspensão de eficácia da declaração de caducidade, sob pena de contradição nos termos e na vontade manifestados. Parece-nos que a renúncia vale para o futuro e para todo o sempre, bem como para todas as situações em que o direito pudesse ser invocado. Assim, neste particular, parece ser de entender que os prejuízos que deixem de poder ser invocados pela requerente enquanto fundamento ressarcitório, deixem igualmente de poder servir de fundamento para a suspensão, visto que aquela aparente renúncia não pode operar num único campo, mas em todos os campos processuais em que eles possam servir de causa de pedir.
   …”(sublinhado nosso) (veja-se melhor o Acórdão do TSI, Processo n.º 179/2016/A, de 8 de Junho de 2016).

6. Para terminar, cumpre ver ainda o último pedido indemnizatório da Autora, a respeito da questão de danos morais.

Para o efeito, alega a Autora que sofreu os danos morais pela lesão da sua boa reputação e bom nome, pedindo que seja ressarcida uma pataca, a título “simbólico”.

Quanto a isto, como é natural, uma renúncia abdicativa validamente efectuada, em qualquer dos casos, seja no âmbito da responsabilidade contratual, seja no da extracontratual, não deveria ter alcance de atingir os danos morais pessoais, ligados ao bem da incolumidade pessoal.

À parte disto, segundo o que se alega, a causa de pedir que está na base deste pedido formulado é mais ampla, que se assenta ainda nas actividades desenvolvidas pelo Governo na posterior divulgação das notícias na comunidade pública sobre o sucedido – as quais dizem respeito tanto à pessoa da Autora como à relação esta com os promitentes-compradores e com o Governo (conforme se alega nos artigos 281.º a 308.º da p.i.).

   Sendo assim, o destino da acção formulada nesta parte terá de ser apreciado autonomamente, como se segue:
   
Ora bem, tem-se entendido em relação às pessoas colectivas, que estas constituem sujeitos activos de direitos de personalidade ou estruturalmente idênticos e de que, da sua violação, pode emergir compensação por danos não patrimoniais, sem que no entanto se pode deixar de reconhecer “a menor densidade ética dos valores imateriais ligados às sociedades comerciais em relação aos sujeitos particulares”.9

   Com isto quer dizer, no que respeita às pessoas colectivas, “há uma maior exigência quanto à gravidade merecedora da tutela do direito do que a relativa às pessoas singulares”.10

No nosso caso, a lesada que está em causa é uma sociedade comercial. Contudo, os factos por si alegados nesta parte, ainda que fossem todos comprovados, não nos demonstrariam, seguramente, como a sua reputação chegou a ser concretamente comprometida por aquela actuação administrativa, muito menos a gravidade daqueles danos sofridos.

Por outro lado, como a Autora peticionou tão-só uma pataca a título “simbólico”, parece que tenha renunciado implicitamente a tutela jurídica legalmente conferida nesta parte, que é de obter, no tribunal, uma justa compensação pelos danos sofridos. Ficamos portanto impedidos de a partir daí inferir a gravidade daqueles danos alegados, e de determinar se são danos dignos de tutela jurídica, por exigência do disposto do artigo.º 489.º, n.º 1 do CCM.

   Ante o exposto, o que foi peticionado nesta parte carece manifestamente de viabilidade.
   
   Por consequência, sem necessidade de se debruçar sobre outras questões de excepção colocadas, dúvida não há que se deve julgar improcedente a acção interposta e absolver a Ré de todos os pedidos da Autora.
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IV. Decisão:

   Assim, pelo exposto, decide-se:
   Julgar improcedente a acção e em consequência, absolver a Ré Região Administrativa Especial de Macau dos pedidos formulados pela Autora.
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   Custas pela Autora.
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   Registe e notifique.
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Aos 30 de Março de 2020
Juiz
Rong Qi
1 Cfr. Carlos Alberto da Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, pp.529.
2 Cfr. Comentário ao Código Civil, Parte Geral, Universidade Católica Editora, pp.613 a 614.
3 Cfr. Comentário ao Código Civil, Parte Geral, Universidade Católica Editora, pp.693.
4 Cfr. António Pinto Monteiro, Cláusulas Limitativas e de Execução de Responsabilidade Civil, Almedina, pp.183 a 184.
5 Cfr. obra cit, pp.449 a 450.
6 Cfr. obra cit, pp.450.
7 Apud. António Pinto Monteiro, obra cit. pp.408.
8 Cfr. Comentário ao Código Civil, Direito das Obrigações, Das Obrigações em Geral, Universidade Católica Editora, pp.1148. No mesmo sentido, Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil anotado, volume II (Artigos 762.º a 1250.º), 4.ª edição revista e actualizada, Coimbra Editora, pp.72.

9 Cfr. Acórdão do STJ, 366/12.OTVLSB.L1.SI. consulta disponível:
http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/4e32a16c60a9d7dc80257d17003c4013
10 ibid.

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317/18-RA 1 /39