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Processo n.º 1242/2019
(Autos de recurso em matéria cível)

Relator: Fong Man Chong
Data: 27/Fevereiro/2020

ASSUNTOS:

- Documento particular como título executivo
- O nome do credor mencionado no título é diferente do nome do exequente
- Indeferimento liminar no processo executivo

SUMÁRIO:

I - É titulo executivo o documento particular, elaborado com base no Regulamento Administrativo nº 6/2002, de 1 de Abril (alterado pelo Regulamento Administrativo nº 27/2009, de 10 de Agosto) (que regula a actividade de promoção de jogos de fortuna ou azar em casino) por pessoa devidamente licenciada, em que uma pessoa reconhece ser devedora a outra (ambas identificadas) de determinada obrigação pecuniária, nos termos do art. 677º, al. c), do CPC.

II - Se o nome do credor existente nos títulos não é o do exequente, e se este, detentor dos títulos dados à execução, alega factos justificativos da sua titularidade do crédito incorporado nos títulos (factos constitutivos da sucessão dos créditos exequendos), não pode essa simples circunstância específica de identidade levar ao indeferimento liminar - com o fundamento de que o credor é outra pessoas e assim, o exequente não goza de legitimidade activa, face ao disposto nos arts. 58º, 68º, 394º, nº1, al. c), 677º, al. c), 695º, nº1, todos do CPC - devendo dar-se ao executado a possibilidade de suscitar a ilegitimidade, alegando, por exemplo, que não o reconhece como seu credor, que não o conhece sequer pessoalmente, que nunca lhe pediu dinheiro emprestado, ou outros motivos atendíveis.




O Relator,

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Fong Man Chong







Processo nº 1242/2019
(Autos de recurso em matéria cível)

Data : 27 de Fevereiro de 2020

Recorrente : A (Exequente)

Objecto do Recurso : Despacho que indeferiu liminarmente o requerimento inicial da execução (初端駁回請求執行的批示)

Réu/Executado : B

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   Acordam os Juízes do Tribunal de Segunda Instância da RAEM:

I – RELATÓRIO
    A, Recorrente, devidamente identificado nos autos, discordando do despacho proferido pelo Tribunal de primeira instância, datado de 08/07/2019 (fls. 70), que indeferiu liminarmente o requerimento inicial da execução por ele apresentado, alegando que o exequente não figura como credor no respectivo documento, discordando desta decisão, veio, em 13/09/2019, interpor recurso para este TSI, com os fundamentos constantes de fls. 77 a 86, tendo formulado as seguintes conclusões:
     一、原審判決認為本案之執行名義中載明債權人為“XX21”,該營業場所是以C之名義進行登記,而且上訴人所陳述之事實欠缺文件支持,因此未能認定其為有關法律關係之債權人,繼而裁定上訴人欠缺參與執行程序之積極正當性,因此作出初端駁回上訴人所提出之執行聲請之判決。
     二、然而,本澳主流之司法見解均認為訴訟程序之積極正當性不視為提起實質性條件,即正當性並不被視為與案件的實質或實體問題有關合法性條件,反之僅是一個訴訟前提。重點在於如何在訴訟程序中設定訴因,亦即是不論其是否擁有確實的實體法律地位,其亦可設定受爭議的實體關係。
     三、執行程序中有關正當性的問題除了適用《民事訴訟法典》第68條及續後數條所指“在執行事宜之正當性”之規定外,上述法典並沒有排除第58條及續後數條所指“一般規定”之適用。
     四、因此,訴訟正當性的判斷乃依據請求執行人所提出受爭議實體關係的版本為準,而透過上訴人在執行最初聲請書中所陳述之事實,可清楚得知上訴人為本案受爭議的實體關係的主體,因而其已具有訴訟中的起訴正當性。
     五、透過上訴人已在執行最初聲請書中所劃定之訴因中,可得知其自2005年5月17日與博彩承批公司簽訂《臨時信貸合同》後便開始合法經營“XX21”貴賓會,而上訴人已明確聲明於2005年10月29日其向被上訴人作出借貸以及被上訴人當時向上訴人簽發一張《借款單》文件(即本案之執行名義)時為“XX21”貴賓會之實際經營人,可見上訴人毫無疑問為簽訂為執行名義中所指的法律關係之債權人。
     六、即使財政局發出的營業稅登記冊資料證明書及商業登記證明均顯示本案執行名義上所載之的營業場所“XX21”貴賓會登錄於C名下,然而由財政局發出的營業稅登記冊資料證明書顯示該貴賓會於2007年3月開業,並於2015年8月結業,而透過C個人企業主之商業登記證明亦記載其名下有一所“XX21”之企業,自2006年6月28日開業。
     七、另外,雖然上述營業場所之文件均以C之名義進行登記,但結合上訴狀附件2及附件3由C與博彩承批公司所簽訂之合同文件可得知其最早僅2006年6月28日起方開始經營有關之貴賓廳,並於2006年11月29日方獲得博彩承批公司授權允許從事博彩或投注信貸業務。
     八、可見,C於至少於2006年11月29日前並不具備從事信貸業務的資格,反之該貴賓會向財政局而作出登記或在商業及動產登記局作開業登記之前已經由上訴人在澳門XX酒店新翼21樓內實際營運,並透過博彩承批公司於2005年5月17日所簽訂之《臨時信貸合同》獲得第5/2004號法律第3條第2款所指從事信貸業務的資格,因此上訴人向被上訴人作出涉案的2005年10月29日之借貸日期之借貸方為合法並產生法定債務。
     九、因此,透過上述《臨時信貸合同》足夠可以證明博彩承批公司允許上訴人自合同簽署日起在“XX21”貴賓會內提供博彩中介人的名義並為其利益而從事博彩或投注信貸業務,而本案所涉及之債務均在該《臨時信貸合同》生效期間所發出,因此可得知上訴人為有關債務之債權人,且具有提起執行訴訟程序之正當性。
     十、另一方面,雖然原審法院曾要求上訴人提供其先前或現時為執行名義中所指之場所所有人之官方文件,但根據當時生效的相關法律,尤其是經第5/2000號法律廢止部份條文的第56/99/M號法令,以及由該法令核准並經第5/2000號法律修改之《商業登記法典》第2條1款a)項及第3條d)項之規定,於2005年5月至2006年期間,上訴人以自然人商業企業主身份經營“XX21”貴賓會並不是強制性作出商業登記的,因此上訴人當時在經營貴賓會期間並沒有作出商業登記亦不足以為奇。
     十一、即使不認為如此,透過於2002年3月28日所簽訂之《批給合同》,澳門XX股份有限公司獲澳門特別行政區授權於澳門特別行政區經營娛樂場或其他博彩活動,當中包括於“XX21”貴賓廳所在之XX娛樂場經營該等活動。而該批給合同第42至44條規定,XX娛樂場內之所有用於博彩業務的設備和用具之所有權,均屬於澳門XX股份有限公司。
     十二、反之,作為博彩中介人僅可以推介娛樂場幸運博彩或其他方式的博彩,而博彩承批公司透過上指臨時信貸合同授權上訴人可在“XX21”貴賓廳內提供博彩或投注信貸的業務,但這並不意味上訴人在獲得“XX21”貴賓廳的所有權。
     十三、既然XX娛樂場轄下的所有娛樂場及貴賓廳,包括涉案之“XX21”貴賓廳在內的一切之幸運博彩或投注借貸的業務之所有權及經營權均屬澳門XX股份有限公司,因此上訴人亦根本無法或不可能提供“證明其為有關場所所有人之官方文件”。
     十四、事實上,訴人於提起本執行訴訟程序時一併提交了其與澳門XX股份有限公司於2005年5月17日所簽訂之《臨時信貸合同》,以證明後者已允許上訴人自合同簽署日起在“XX21”貴賓會內提供博彩中介人的名義並為其利益而從事博彩或投注信貸業務,因此,被上訴批示中所指上訴人所指出之事實欠缺文件支持之理由並不成立。
     十五、最後,本澳之司法見解亦指出由於執行之訴要求執行人必須具有法定執行名義才可提起相關訴訟,而被執行人則可透過異議反對執行。因此在持有異議人簽署相關借據的前提下,應由異議人提出及舉證相關借據內容不符合事實,即應由異議人舉證相關債務的不存在。為此,上訴人認為原審法院應向被上訴人作出傳喚,以便倘其認為上訴人並非有關債務之債權人或有關債務不存在時可適時提起異議以反對現有之執行程序,因此本案並不符合作出初端駁回起訴狀之前提,
     十六、綜上所述,透過上訴人所設定之訴因結合執行最初聲請書之附件10經已可充分地認為其具有提起本執行訴訟程序之正當性,或至少並不是明顯不具有訴訟正當性提起有關之執行程序,除應有尊重外,上訴人認為原審判決違反了《民事訴訟法典》第58條之規定,因而沾有錯誤適用《民事訴訟法典》第695條第1款配合第394條第1款c)項規定之瑕疵。
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    B, Réu/Executado, com os sinais identificativos nos autos, ofereceu a resposta constante de fls. 116 a 118, tendo formulado as seguintes conclusões:
     1. 上訴人於上訴狀結論第一至第十條指稱,其為債務爭議實體關係的主體,因此即使其不具有確實的實體法律地位,也具有提起訴訟之正當性。
     2. 除給予應有的尊重外,被上訴人並不同意上訴人的見解,且完全認同原審法院初端駁回起訴狀之判決。
     3. 眾所週知,在法律上要證明一所公司存在與否,以及有否正當性成為原告或被告,應以澳門商業及動產登記局或澳門財政局發出的證明證實。
     4. 在本案中,綜觀上訴人向法庭提交的多份文件,似乎都未能證明上訴人A與“XX集團”、“XX會”或“XX21”存有任何關係。
     5. 根據一般的學說理解“執行名義為訴因,為取得權利之依據,執行名義為必要條件(具有執行名義,方得進行執行程序),且執行名義為足夠條件(因透過執行名義推定存在債)至少為提起執行之訴。”
     6. 根據上訴人於2019年6月20日就主審法官要求提交補交文件的附件1(財政局發出的營業稅登記冊資料證明書)獲悉,C持有“XX21”之商號名稱,該商號於2007年3月開業,並於2015年8月結業;及附件2獲悉,C個人企業主之商業登記證明記載,於2006年6月28日開設企業名稱為“XX21”之企業,該企業於2015年8月25日註銷。
     7. 由此可見,根據相關文件顯示,僅在C又或是C個人企業主在向財政局申請開業後,又或是向澳門商業及動產登記局申請登記後,商業企業“XX21”方依法存在。
     8. 上訴人稱自2005年5月17日與博彩承批公司簽訂《臨時信貸合同》後,便開始合法經營“XX21”貴賓會;
     9. 上訴人於上訴狀結論第五至九點表示,“由於營業場所商業登記人C於2006年11月29日前仍未具備從事信貸業務的資格,而上訴人因自2005年5月17日起便簽訂了《臨時信貸合同》,因此在該貴賓會向財政局作出登記或在商業及動產登記局作開業登記之前,上訴人便為貴賓會之營運人,而由於本案所涉及之債務均在該《臨時信貸合同》生效期間發出,因此可得知上訴人為有關債務之債權。”
     10. 對此,被上訴人並不能認同及提出強烈質疑;倘若按照上訴人的思考邏輯,是否表示任何在2006年11月29日前與博彩承批公司簽訂《臨時信貸合同》之主體,均可聲稱自己為“XX21”貴賓會之實際營運人?並因此為信貸關係(被上訴人對此強烈反對並表示不能認同)之債權人呢?
     11. 根據澳門《民事訴訟法典》有關執行事宜上之正當性第68條正當性之確定第1款規定“執行程序須由執行名義中作為債權人之人提起,並應針對執行名義中作為債務人之人提起。”
     12. 再者,根據上訴人提交的文件顯示,上訴人是完全清楚知悉其並非執行名義中債權人“XX21”企業之商業登記人或持有人;為此,上訴人才會嘗試以《臨時信貸合同》此不具證明力之文件證明其為本案債務之債權人。
     13. 綜上所述,上訴人並非執行名義中之債權人,所以其欠缺提起執行之訴之積極正當性。
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    Corridos os vistos legais, cumpre analisar e decidir.
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II – PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
    Este Tribunal é o competente em razão da nacionalidade, matéria e hierarquia.
    O processo é o próprio e não há nulidades.
    As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária e são dotadas de legitimidade “ad causam”.
    Não há excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
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  III – OBJECTO DO RECURSO:
    É o seguinte despacho que constitui o objecto deste recurso, proferido pelo Tribunal de primeira instância:
     É dado consabido que a execução tem sempre por base um título, sendo com base nele que se determina o respectivo fim e limites – artº 12° nº1 do CPC
     Quer isto significar que é pelo seu conteúdo ou contexto intrínseco que se há-de determinar a espécie de prestação e da execução que lhe corresponde, o quantum dela e se fixará a legitimidade activa e passiva para a acção executiva.
     Nos termos do artº68° nº1 do C.P.C a execução deve ser promovida pela pessoa que no título tenha a posição de credor, sob pena de ilegitimidade processual passiva.
     No caso vertente foi dado à execução um título que identifica como titular passivo da relação jurídica dele emergente o executado B.
     Como titular activo consta a Gold 21, estabelecimento registado em nome de C como decorre de fls.64.
     Não obstante o exequente arroga-se dono desse estabelecimento, e por isso mesmo, titular activo da relação jurídica id. no título.
     Releva, pois, o que está documento e não o que sem suporte documental o exequente verbaliza.
     Por ser assim, é o exequente parte ilegítima, donde o indeferimento liminar do requerimento inicial.
     Pelo exposto rejeito a execução – artº695° nº1, 1ª parte, a contrário sensu, do CPC.
     Custas pelo exequente.
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IV – FUNDAMENTAÇÃO
    
    Está em discussão um documento apresentado pelo exequente em que o Exequente não figura como credor, o qual serve de base da execução. Questiona-se, poderá instaurar directamente a execução o portador/Exequente deste documento?
    A propósito do título executivo refere Lebre de Freitas, in Código de Processo Civil Anotado, vol. 1, 2ª ed., Coimbra Editora, pág. 88:
“O título executivo constitui pressuposto de carácter formal da acção executiva, destinado a conferir à pretensão substantiva um grau de certeza reputado suficiente para consentir a subsequente agressão patrimonial aos bens do devedor. Constitui, assim, a base da execução, por ele se determinando o tipo de acção e o seu objecto (nº 1), assim como a legitimidade activa e passiva para a acção (art. 55º-1).
O objecto da execução tem de corresponder ao objecto da situação jurídica acertada no título, o que requer a prévia interpretação deste. (…)
É também pelo título que se determina o quantum da prestação. (…)”.
    
    Seguindo de perto este raciocínio o distinto colega de primeira instância, proferiu o despacho de indeferimento liminar acima transcrito. Terá razão?
    Ora, nesta matéria, a evolução legislativa vai num sentido mais permissivo, permitindo que, em certas condições, mesmo que o credor não figure no documento/título como credor, pode com base nele propor acção executiva, desde que alegue os factos de sucessão de crédito ou obrigações. É justamente o que o artigo 68º (nº 3) (Determinação da legitimidade) do CPC estipula e autoriza:
    1. A execução é promovida pela pessoa que no título executivo figure como credor e deve ser instaurada contra a pessoa que nele tenha a posição de devedor.
    2. Se o título for ao portador, é a execução promovida pelo portador do título.
    3. Tendo havido sucessão no direito ou na obrigação, têm legitimidade os sucessores das pessoas que no título figuram como credor ou devedor da obrigação exequenda, mencionando-se no próprio requerimento inicial da execução os factos constitutivos da sucessão.
    4. A execução por dívida provida de garantia real sobre bens de terceiro pode seguir directamente contra este, se o exequente pretender fazer valer a garantia, sem prejuízo de poder desde logo ser também demandado o devedor.
    5. Quando a execução tenha sido movida apenas contra o terceiro e se reconheça a insuficiência dos bens onerados com a garantia real, pode o exequente requerer, no mesmo processo, o prosseguimento da acção executiva contra o devedor, que é citado para completa satisfação do crédito exequendo.
    6. Estando os bens onerados do devedor na posse de terceiro, pode este ser desde logo demandado juntamente com o devedor.
    O nº 3 corresponde exactamente ao artigo 56º/1 do CPC de Portugal.
    No caso em apreciação, o que o Recorrente veio a fazer mediante alegações extensivas constantes do seu requerimento inicial é justamente tentar justificar a titularidade do crédito exequendo. Ou seja, foram alegadas relações subjacentes à titularidade do crédito que pretende executar mediante a respectiva acção em causa.
    Aliás, num caso semelhante, decidido por este TSI, foi seguida também esta posição permissiva (Proce. Nº 787/2014, de 12/03/2015):
    I. É titulo executivo o documento particular em que uma pessoa reconhece ser devedora a outra (ambas identificadas) de determinada obrigação pecuniária, nos termos do art. 677º, al. c), do CPC.
    II. Se o nome do credor existente nos títulos é apresentado de forma simplificada como sendo C, e se a exequente, detentora dos títulos dados à execução, inclui essa identidade no seu nome, não pode essa simples circunstância específica de identidade levar ao indeferimento liminar - com o fundamento de que tal nome é muito comum na população chinesa e que, assim, ela não goza de legitimidade activa, face ao disposto nos arts. 58º, 68º, 394º, nº1, al. c), 677º, al. c), 695º, nº1, todos do CPC - devendo dar-se à executada a possibilidade de suscitar a ilegitimidade, dizendo, por exemplo, que não a reconhece como sua credora, que não a conhece sequer pessoalmente, que nunca lhe pediu dinheiro emprestado, etc., etc.
    Aí pronunciou-se da seguinte forma:
“(…) 3 – Em todo o caso, o despacho sob censura também pode encobrir ou validar a ideia de que o que está em jogo é a ilegitimidade do credor/exequente por não haver necessariamente coincidência entre a identidade do exequente e a do credor referido em cada um dos títulos.
Todavia, se esse tiver sido o pensamento subjacente no despacho ora criticado, então nem por via dessa justificação se acolheria a decisão tomada.
É que ao aceitar que o apelido “C” é tão lato e comum que pode abranger muitas pessoas com C no nome, então está o próprio despacho a admitir que a exequente possa ser uma delas. Ou seja, a fundamentação utilizada no despacho, em vez de ser excludente do nome da executada, também pode ser inclusiva, no sentido de a poder abranger.
Ora, basta que esta possibilidade esteja em cima da mesa, para não ser aceitável que o tribunal exclua, à partida, a legitimidade à exequente para a instauração da execução. (sublinhado nosso)
É que, como bem se sabe, a legitimidade activa não é considerada condição substantiva da acção. Dito de outra maneira, a legitimidade não é encarada legitimidade-condição, ligada ao fundo ou mérito da causa, mas mero pressuposto processual. O que importa é olhar para a forma como se encontra configurada a causa de pedir, isto é, como a relação material controvertida é configurada, independentemente da titularidade da posição jurídica substantiva. (sublinhado nosso)
E isso, se já resulta da noção de legitimidade plasmada no art. 58º do CPC, não está posto em causa na determinação da legitimidade prevista no art. 68º, especificamente dedicado à legitimidade activa e passiva na execução.
Portanto, se o nome inscrito nos títulos cobre o nome da exequente e se esta deles é possuidora - tanto assim que os deu à presente execução – então não se vê razão para o tribunal negar desde logo legitimidade activa àquela, em vez de dar a voz e a palavra à executada para pessoalmente se defender dizendo, por exemplo, que, na realidade, não a reconhece como sua credora, que não a conhece sequer pessoalmente ou que nunca lhe pediu dinheiro emprestado, etc., etc. (coisa que, inclusive, podia ter feito na resposta ao recurso, mas que não foi capaz de fazer, preferindo abrigar-se à sombra de uma questão de ordem formal, dando até a impressão de com isso se querer eximir de uma aparente responsabilidade).
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4 - Serve isto para dizer que, qualquer que seja a perspectiva por que se encare a fundamentação ínsita na decisão recorrida, o tribunal não aplicou correctamente o disposto nos arts. 58º, 68º, 394º, nº1, al. c), 677º, al. c), 695º, nº1, todos do CPC. (…)”.

    Mutatis mudantis, o raciocínio vale perfeitamente para o caso em apreciação. Logo, o despacho posto em crise não pode manter-se, o que tem por efeito o prosseguimento normal da execução, a não ser que alguma outra causa a tal obste.
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    Síntese conclusiva:
    I - É titulo executivo o documento particular, elaborado com base no Regulamento Administrativo nº 6/2002, de 1 de Abril (alterado pelo Regulamento Administrativo nº 27/2009, de 10 de Agosto) (que regula a actividade de promoção de jogos de fortuna ou azar em casino) por pessoa devidamente licenciada, em que uma pessoa reconhece ser devedora a outra (ambas identificadas) de determinada obrigação pecuniária, nos termos do art. 677º, al. c), do CPC.
    II. Se o nome do credor existente nos títulos não é o do exequente, e se este, detentor dos títulos dados à execução, alega factos justificativos da sua titularidade do crédito incorporado nos títulos (factos constitutivos da sucessão dos créditos exequendos), não pode essa simples circunstância específica de identidade levar ao indeferimento liminar - com o fundamento de que o credor é outra pessoas e assim, o exequente não goza de legitimidade activa, face ao disposto nos arts. 58º, 68º, 394º, nº1, al. c), 677º, al. c), 695º, nº1, todos do CPC - devendo dar-se ao executado a possibilidade de suscitar a ilegitimidade, alegando, por exemplo, que não o reconhece como seu credor, que não o conhece sequer pessoalmente, que nunca lhe pediu dinheiro emprestado, ou outros motivos atendíveis.
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    Tudo visto e analisado, resta decidir.
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V ‒ DECISÃO
    Em face de todo o que fica exposto e justificado, os juízes do Tribunal de 2ª Instância acordam em conceder provimento ao recurso, revogando-se a decisão impugnada, e determinar a sua substituição por outra que determine o prosseguimento da execução, a menos que outra causa tanto o impeça.
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    Custas pela parte vencida a final.
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    Registe e Notifique.
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RAEM, 27 de Fevereiro de 2020.
Fong Man Chong
Ho Wai Neng
José Cândido de Pinho




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