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Processo nº 793/2018
Data do Acórdão: 26MAR2020


Assuntos:

Desocupação de terreno
Falta de fundamentação
Preterição da audiência prévia
Desrazoabilidade no exercício de poderes discricionários
Princípios da justiça, da proporcionalidade


SUMÁRIO

1. Enquanto nomen juris de um vício invalidante de actos administrativos, resultante do comando legal do artº 114º/1 do CPA, à luz do qual devem ser fundamentados os actos administrativos, diz-se falta de fundamentação quando o acto administrativo não encerra os fundamentos de facto e de direito que permitam conhecer o itinerário cognoscitivo e valorativo prosseguido pela Administração que culminou com a prática do acto. Ou seja, a falta diz respeito a razões que levam a Administração a praticar determinado acto administrativo.

2. A omissão da justificação da não audição do particular visado, quanto muito integra na questão da preterição da audiência prévia, e nunca convertível num vício autónomo da falta de fundamentação, invalidante do acto administrativo.

3. A emanação de uma ordem de despejo decorre da norma imperativa do artº 179º/1-1) da Lei de Terras.

4. Na actividade vinculativa, é impertinente a invocação do vício da manifesta e total desrazoabilidade no exercício de poderes discricionários, assim como dos princípios da justiça, da proporcionalidade e do princípio do respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos residentes, que a Administração deve respeitar no exercício dos poderes discricionários.


O relator



Lai Kin Hong


Processo nº 793/2018

I

Acordam na Secção Cível e Administrativa do Tribunal de Segunda Instância da RAEM

Sociedade de Investimento Imobiliário Un Keng Van, S. A., devidamente identificada nos autos, vem recorrer do despacho do Senhor Secretário para os Transportes e Obras Públicas, datado de 13JUL2018, que lhe ordenou o despejo, no prazo de 60 dias, do terreno com a área de 9650 m², designado por lote 17 da zona C do empreendimento denominado «Fecho da Baía da Praia Grande», situado na península de Macau, descrito na CRP sob o nº XX a fls. XX do livro XX, cuja concessão foi declarada caducada por despacho do Chefe do Executivo de 03MAIO2018, assim como a demolição e a remoção de construções temporárias de estrutura metálica, a remoção de todos os bens móveis existentes no local, tais como contentores, máquinas e materiais de construção, resíduos sólidos e lixo, bem como os veículos automóveis nele estacionados, concluindo e pedindo:
a) Vem o presente recurso interposto do Despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas, de 13 de Julho de 2018, exarado na Proposta n.º 223/DSO/2018, comunicado à Recorrente pelo Ofício n.º 466/2322.02/DSO/2018, de 19 de Julho de 2018, que ordenou o despejo do terreno com a área de 9 650 m2, designado por lote 17 da zona C do empreendimento denominado "Fecho da Baía da Praia Grande", situado na península de Macau, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º 22 523, a fls. 175 do livro B-49K (o "Terreno");
b) Por Despacho do Chefe do Executivo, de 3 de Maio de 2018, tornado público pelo Despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º 13/2018, publicado no Boletim Oficial n.º 20, II Série, de 16 de Maio de 2018, foi declarada a caducidade da concessão do Terreno;
c) Em 15 de Junho de 2018, a Recorrente impugnou contenciosamente o acto do Chefe do Executivo que declarou essa caducidade, processo que corre termos nesse tribunal com o n.º 580/2018;
d) O acto é recorrível uma vez que a Recorrente lhe imputa vícios e ilegalidades próprias, integrando, assim, a excepção mencionada no n.º 4 do artigo 138.° do CPA;
e) A decisão da Administração vertida no acto recorrido, altamente lesiva dos direitos e interesses da Recorrente, não foi precedida da necessária audiência prévia prevista nos artigos 93.° e ss do CPA;
f) Acontece que a Administração também não procedeu à audiência prévia antes da tomada de decisão de declaração de caducidade;
g) A Entidade Recorrida não só não cumpriu o artigo 93.°, como não justificou a sua decisão de não audição da interessada, sendo que, do acto recorrido a Recorrente não consegue retirar qual a razão para esse facto, que, no entender da Recorrente, configura, por si, vício de forma por falta de fundamentação;
h) Se a Entidade Recorrida o fez:
(iv) por esquecimento, não é juridicamente aceitável;
(v) recorrendo à excepção mencionada na alínea a) do artigo artigo 97.°, tal não seria possível uma vez que a interessada não foi ouvida em sede de procedimento de declaração de caducidade;
(vi) por entender que não houve instrução, tal não corresponde à verdade já que, após a declaração de caducidade, a Entidade Recorrida fez um levantamento da situação concreta dos terrenos, fazendo um registo factual, nomeadamente fotográfico que, aliás, juntou ao acto recorrido, o que corresponde a uma instrução,
pelo que não se pode deixar de concluir que, em qualquer dos casos, esta falta de audição da interessada terá de ser sancionada com anulabilidade do acto.
i) Se a Recorrente tivesse sido notificada para se pronunciar, teria algo de novo a acrescentar já que, entre a data de declaração de caducidade e o despejo, a Recorrente intentou o Recurso Contencioso de Anulação, onde levantou questões, a seu ver, relevantes e que obstam à própria declaração de caducidade, facto que à data do despejo a Entidade Recorrida não tinha ainda conhecimento;
j) O princípio do aproveitamento do acto administrativo inválido deve ser a excepção, e não a regra, não devendo permitir-se que a omissão de diligências passe a ser um padrão nos procedimentos e que, dessa forma, a Administração, deixe de ouvir os interessados antes de tomar decisões que os afectam;
k) Razão pela qual o procedimento administrativo adoptado está ferido de vício de forma, por falta de fundamentação e também por preterição das formalidades essenciais, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 93.º do CPA, o que determina a ilegalidade do acto e a sua anulabilidade nos termos do disposto no artigo 124.º do referido diploma legal;
I) O acto recorrido viola os princípios da justiça, da protecção dos direitos e interesses dos residentes, bem como o princípio da proporcionalidade;
m) Porque a lei não impõe à Administração um prazo para que esta proceda ao despejo após a declaração de caducidade;
n) O acto de despejo, embora seja um acto de execução do acto da caducidade, tem alguma margem de discricionariedade no âmbito da qual a Administração não pode deixar de ponderar os valores e os interesses em causa, pois é à Administração que cabe ponderar e escolher o momento em que deverá ordenar o despejo!
o) Em 3 de Maio de 2018, o Chefe do Executivo declarou a caducidade do Terreno, a qual foi tornada pública no dia 16 do mesmo mês;
p) A caducidade foi imediatamente comunicada à Conservatória e encontra-se registada por averbamento à respectiva inscrição; e
q) Em 13 de Julho de 2018 a Entidade Recorrida determinou o despejo;
r) Ou seja, concretizada a ordem de despejo estão reunidas as condições para que a Administração concessione o Terreno a terceiros;
s) À Recorrente é reconhecido o direito de impugnação da decisão administrativa de caducidade, na qual invocou, entre outros vícios assacados ao acto, uma causa impeditiva que, por si só, impede que o presente despejo seja ordenado, pois o acto recorrido executa uma declaração relativa a uma caducidade que não se verificou!
t) Até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal que apreciar esta questão há uma hipótese objectiva da declaração de caducidade ser considerada inválida e da concessão voltar à esfera da Recorrente e ser cancelado o registo de caducidade;
u) Acresce que não existe imposição legal ou razão de urgência, nem a Entidade Recorrida as invocou no acto recorrido, para que o despejo seja ordenado imediatamente a seguir à declaração de caducidade e antes de ser proferida decisão a esclarecer a validade do acto que declarou a caducidade;
v) O Chefe do Executivo demorou quase dois anos a declarar a caducidade após o terminus da prevista no contrato de concessão do Terreno;
w) Por um lado, a Recorrente não conhece qualquer razão de interesse público que justifique o despejo antes que seja conhecida a decisão judicial relativa ao acto que declarou a caducidade e, por outro, a concessão do Terreno a terceiros causa lesão irreparável e colide com os direitos e interesses legalmente protegidos da Recorrente;
x) Está em causa a violação do princípio da necessidade e do equilíbrio;
y) A suspensão de eficácia do acto que declarou a caducidade, bem como do acto que ordenou o despejo, seria, no entender da Recorrente, uma forma jurídica adequada para prevenir esta situação e para acautelar a sua posição, no entanto, esse não tem sido o entendimento dos tribunais superiores que negaram provimento a todos os pedidos de suspensão de eficácia do acto de declaração de caducidade, bem como a todos os pedidos de suspensão de eficácia do acto de despejo de que a Recorrente tem conhecimento;
z) A lei permite situações de dispensa de concurso público, caso em que nem todas as intenções de concessão serão públicas e conhecidas e impedindo a Recorrente de fazer uso, por exemplo, de um pedido de suspensão de eficácia do acto de despejo ou do acto de caducidade, que até pode ser tardio e inútil, se o despejo já tiver sido efectivado e a Recorrente dessapossada do Terreno;
aa) Os prejuízos da Recorrente são de difícil reparação e quantificação já que nenhuma indemnização poderá calcular, de forma adequada, a compensação pelo investimento que a Recorrente teria com o Terreno se o tivesse aproveitado da forma por si planeada;
bb) Face ao recurso pendente e à incerteza jurídica em causa, não se vê de que forma seja mais adequado despejar primeiro, obrigando a Recorrente à remoção de materiais e/ou à demolição de estruturas no Terreno, alterando a situação jurídica existente, para reinvestir depois, caso seja dado provimento ao Recursos Contencioso de Anulação;
cc) Se não há intenção de concessionar e desenvolver o Terreno no imediato então também não é essencial nem necessário ordenar o despejo da Recorrente durante a pendência do Recurso Contencioso de Anulação, sendo o acto recorrido uma medida desproporcional face ao sacrifício dos interesses da Recorrente que estão em causa;
dd) O prejuízo que a actuação da Administração pode, nos termos acima expostos, causar à Recorrente é absolutamente desproporcional a qualquer benefício para o interesse público (que, como se disse, não se vislumbra qual seja);
ee) Ao ordenar o despejo face a toda esta incerteza jurídica, tendo em conta o enorme risco para os direitos e interesses da Recorrente, não estando em risco nenhum interesse público urgente e relevante e não estando obrigada a declarar o despejo num momento determinado, a Administração fez uma errada avaliação e violou de forma grave o princípio da justiça, do respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos residentes e da proporcionalidade previstos nos artigos 4.°, 5.° e 7.° do CPA e manifestou também total desrazoabilidade no uso desses poderes discricionários.
ff) Por tudo o acima exposto, o acto recorrido incorre em vício de forma, por falta de audência prévia e falta de fundamentação (também o artigo 115.º/2 CPA), nos termos previstos no artigo 21.º, n.º 1, al. c) do CPAC e viola a lei, nos termos previstos no artigo 21.º, n.º 1, al. d), do CPAC, e, em particular:
• lesa direitos e interesses legalmente protegidos;
• manifesta total desrazoabilidade no exercício de poderes discricionários;
• viola os princípios da justiça, da proporcionalidade e o princípio do respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos residentes previstos nos artigos 4.°, 5.° e 7.° do CPA;
devendo, por isso, ser anulado de acordo com o artigo 124.° do CPA.
Termos em que, e nos mais de Direito, deve o presente recurso ser julgado procedente, por o acto recorrido estar ferido de ilegalidade, devendo por isso ser anulado, com as consequências legais.

Citado, veio o Senhor Secretário para os Transportes e Obras Públicas contestar pugnando pela improcedência do recurso.

Não havendo lugar à produção de prova, foram a recorrente e a entidade recorrida notificadas para apresentar alegações facultativas.

Tanto a recorrente como a entidade recorrida apresentaram alegações facultativas, reiterando a recorrente grosso modo os mesmos fundamentos já deduzidos na petição do recurso e insistindo a entidade recorrida na improcedência do recurso.

Em sede de vista final, o Dignº Magistrado do Ministério Público opinou no seu douto parecer pugnando pela improcedência do presente recurso.

Foram colhidos os vistos, cumpre conhecer.

O Tribunal é competente em razão da nacionalidade, da matéria e da hierarquia.

O processo é o próprio e inexistem nulidades e questões prévias que obstam ao conhecimento do mérito do presente recurso.

Os sujeitos processuais gozam de personalidade e capacidade judiciárias e têm legitimidade.

O Tribunal é competente em razão da nacionalidade, da matéria e da hierarquia.

Antes de mais, é de salientar a doutrina do saudoso PROFESSOR JOSÉ ALBERTO DOS REIS de que “quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão” (in CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL ANOTADO, Volume V – Artigos 658.º a 720.º (Reimpressão), Coimbra Editora, 1984, pág. 143).

Conforme resulta do disposto nos artºs 563º/2, 567º e 589º/3 do CPC, ex vi do artº 1º do CPAC, são as conclusões do recurso que delimitam o seu objecto, salvas as questões cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras e as que sejam de conhecimento oficioso.

Em face das conclusões tecidas na petição do recurso e reiteradas nas alegações facultativas, são as questões que constituem o objecto da nossa apreciação:


1. Da preterição da audiência; e

2. Da violação dos princípios da justiça, da proporcionalidade e do princípio do respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos residentes.

Apreciemos.


1. Da preterição da audiência

Em síntese, a recorrente entende que, sendo altamente lesiva dos seus direitos e interesses, a decisão da Administração vertida no acto recorrido deveria ter sido precedida da audiência prévia.

Para a recorrente, não tendo cumprido o disposto no artº 93º do CPA, nem se encontrando a lidar com qualquer das situações permissivas da inexistência ou dispensa da audiência prévia, previstas nos artºs 97º do CPA, a Administração fez inquinar a sua decisão por vício da preterição da audiência.

Ora, por força do princípio da participação consagrado no artº 10º do CPA, os órgãos da Administração Pública devem assegurar a participação dos particulares, bem como das associações que tenham por objecto a defesa dos seus interesses, na formação das decisões que lhes disseram respeito, designadamente através da respectiva audiência.

Concretizando este princípio, dispõe o artº 93º do CPA que “concluída a instrução, os interessados têm o direito de ser ouvido no procedimento antes de ser tomada a decisão final, devendo ser informado, nomeadamente, sobre o sentido provável desta”.

Trata-se de um direito legalmente conferido aos particulares à participação constitutiva na formação das decisões que lhes dizem respeito, ao qual corresponde o dever da Administração de proporcionar aos particulares a possibilidade de se pronunciarem sobre o objecto do procedimento e associá-los à tarefa de preparar a decisão final.

Por outro lado, o estabelecimento do direito à audiência prévia visa assegurar aos particulares interessados o contraditório quanto ao eventual sentido, que lhe é desfavorável, da decisão a tomar pela Administração, por forma a evitar a prolação de uma decisão que constitui uma surpresa ao visado.

Todavia, tal como sucede com a maioria dos princípios, senão todos, por mais sagrados sejam, comportam excepções.

O princípio da participação não pode fugir a esta regra.

Na verdade, a própria lei estabelece dois grupos de excepções ao princípio da participação retirando aos particulares o seu direito à audiência prévia, quais são o grupo das circunstâncias determinantes da inexistência de audiência dos interessados e o das da dispensa de audiência dos interessados, previstas nos artºs 96º e 97º do CPA.

Dispõem estes dois artigos:

Artigo 96.º
(Inexistência de audiência dos interessados)

Não há lugar a audiência dos interessados:
a) Quando a decisão seja urgente;
b) Quando seja razoavelmente de prever que a diligência possa comprometer a execução ou a utilidade da decisão;
c) Quando o número de interessados a ouvir seja de tal forma elevado que a audiência se torne impraticável, devendo nesse caso proceder-se a consulta pública, quando possível, pela forma mais adequada.

Artigo 97.º
(Dispensa de audiência dos interessados)

O órgão instrutor pode dispensar a audiência dos interessados nos seguintes casos:
a) Se os interessados já se tiverem pronunciado no procedimento sobre as questões que importem à decisão e sobre as provas produzidas;
b) Se os elementos constantes do procedimento conduzirem a uma decisão favorável aos interessados.

In casu não estamos perante qualquer das situações previstas nesses dois artigos.

Todavia, nem por isso a falta de audiência da recorrente antes da tomada da decisão ora recorrida constituiu uma preterição de uma formalidade essencial capaz de invalidar a decisão.

Diz o artº 179º/1 da Lei de Terras que:
1. O despejo do concessionário ou do ocupante é ordenado por despacho do Chefe do Executivo quando se verifique qualquer dos seguintes casos:
1) Declaração da caducidade da concessão;
2) ……;
3) ……;
4) …….

Face ao disposto na alínea 1) do nº 1, declarada a caducidade da concessão de terreno, não há outra alternativa que não seja a de ordenar o despejo.

Sendo consequência jurídica necessária, sem alterantiva, da declaração da nulidade da concessão, ao ordenar a desocupação do terreno e a remoção dos objectos nele existentes, a Administração não fez mais do que o uso de um poder na actividade vinculada.

É justamente o que in casu sucedeu.

Na esteira da doutrina preconizada nos seus Doutos Acórdãos, nomeadamente os tirados nos processos nºs 20/2016 e 91/2018, o Venerando Tribunal de Última Instância chegou a afirmar no sentido de que se a decisão administrativa tomada for a única concretamente possível, a falta de audiência do interessado, prevista no artº 93º/1 do CPA degrada-se em formalidade não essencial do procedimento administrativo, não geradora da invalidade da decisão.

Mais alega a recorrente que não se consegue retirar qual a razão pela qual a entidade recorrida não cumpriu o requisito procedimental do artº 93º, o que, no seu entender, configura, por si, um vício de forma por falta de fundamentação.

Enquanto nomen juris de um vício invalidante de actos administrativos, diz-se falta de fundamentação quando o acto administrativo não encerra os fundamentos de facto e de direito que nos permitam conhecer o itinerário cognoscitivo e valorativo prosseguido pela Administração que culmina com a prática do acto.

Ou seja, a falta diz respeito a razões que levam a Administração a praticar determinado acto administrativo.

Aliás, isso resulta claramente do comando legal do artº 114º/1 do CPA, à luz do qual devem ser fundamentados os actos administrativos.

A alegada omissão da justificação da não audição do visado, quanto muito integra na questão da preterição da audiência prévia, e nunca convertível num vício autónomo, invalidante do acto administrativo, tal como bem observou o Ministério Público no seu Douto parecer.

Portanto, improcede o recurso nesta parte.

2. Da manifesta desrazoabilidade no exercício de poderes discricionários e da violação dos princípios da justiça, da proporcionalidade e do princípio do respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos residentes

A recorrente fundou a invocada violação dos vários princípios no ponto fáctico comum, que é o momento em que foi ordenado o despejo.

Para a recorrente, não impondo a lei um prazo para se proceder ao despejo após a declaração de caducidade, ao decidir ordenar o despejo, imediatamente, isto é, em 13JUL2018, do terreno cuja concessão foi declarada caducada em 03MAIO2018, antes de ser proferida decisão judicial a esclarecer a validade do acto que decretou a caducidade, a Administração violou uma série de princípios, por não ter ponderado e escolhido o momento adequado por forma a evitar causar lesão irreparável e colidir com os seus direitos e interesses legalmente protegidos.

Em sede de vista final, o Ministério Público pronunciou-se sobre estas questões no seu parecer onde se diz:
  2.2.
  A Recorrente alega, em segundo lugar, a manifesta desrazoabilidade no exercício de poderes discricionários por parte da Administração.
  Em seu entender, a lei não impõe um prazo para o decretamento do despejo subsequente à declaração de caducidade da concessão por arrendamento do terreno. Por isso, diz, ao ordenar o despejo imediatamente a seguir à declaração de caducidade sem ponderar os elementos acima expostos, a Administração manifestou também total desrazoabilidade no uso desses poderes discricionários (cfr. artigo 81.º da petição de recurso).
  Parece-nos que também este fundamento do seu recurso não poderá proceder.
  Ao contrário daquilo que a Recorrente sustenta, a Administração não dispõe, nesta matéria, de qualquer margem de discricionariedade, sendo a norma da alínea 1) do n.º 1 do artigo 179.º da Lei n.º 10/2013 inequívoca a esse respeito: declarada a caducidade da concessão, é ordenado despejo.
  A boa doutrina assinala que o poder discricionário é uma concessão legislativa que se traduz num poder de escolha da Administração, o qual se repercute directamente na fixação dos efeitos da respectiva decisão.
  Por isso, parece-nos que a maior ou menor celeridade no decretamento do despejo depois de declarada a caducidade da concessão, não tem nada que ver com o exercício de poderes discricionários por parte da Administração. Se bem vemos, seria de falar de tais poderes se a lei concedesse margem à Administração para poder ordenar ou não ordenar o despejo ou se dissesse que a Administração decretaria o despejo se ou quando entendesse conveniente. Mas isso não se verifica. Pelo contrário, a Administração está obrigada a agir no sentido de ordenar o despejo após a declaração da caducidade, acto contínuo a esta, tratando-se, portanto, de uma situação de vinculação quanto à oportunidade da actuação.
  Ainda que assim não fosse e, portanto, se admitisse estarmos perante um espaço de discricionariedade dentro do qual a Administração escolheria o melhor momento para ordenar o despejo, ainda assim o vício alegado não poderia proceder.
  É que, como se sabe, a actividade fiscalizador do tribunal, nessa situação, limita-se ao erro manifesto ou total desrazoabilidade no exercício de poderes discricionários, sendo que só em casos flagrantes de mau uso do poder discricionário e de evidentes e intoleráveis violações dos princípios gerais da actividade administrativa como o da proporcionalidade ou o da justiça, deve o acto contenciosamente atacado ser objecto de anulação judicial (assim, por todos e por mais recente com ampla referência a jurisprudência anterior, veja-se o Ac. do Tribunal de Última Instância de 30.4.2019, processo 35/2019).
  É patente, porém, que não é esse o caso. Diríamos, até, que pelo contrário. Na verdade, sabendo-se que o recurso contencioso do acto que declarou a caducidade da concessão não tem efeito suspensivo (cfr. artigo 22.º do CPAC), é patente que o despejo podia ter sido ordenado mais cedo.
  Por isso, somos a entender que este fundamento do recurso deve merecer a mesma sorte do anterior.

Ora, as questões colocadas pela recorrente foram bem observadas e analisadas no parecer, com que estamos inteiramente de acordo.

Na verdade, in casu, a emanação de uma ordem de despejo decorre da norma imperativa do artº 179º/1-1) da Lei de Terras.

Estamos na apreciação da bondade de um acto administrativo praticado no âmbito da actividade vinculada, em que a Administração se limitou a efectivar no caso concreto a estatuição imperativa fixada na lei depois de verificado aquilo que consta da previsão da norma.

Dada a óbvia vinculatividade jurídica, é impertinente a invocação do vício da dita manifesta e total desrazoabilidade no exercício de poderes discricionários, assim como dos princípios da justiça, da proporcionalidade e do princípio do respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos residentes, que a Administração deve respeitar no exercício dos poderes discricionários.

A propósito do âmbito da aplicação desses princípios gerais de direito, que ganham especialidades no Direito Administrativo, os Tribunais administrativos da RAEM já chegaram a pronunciar-se repetida e unanimemente que os tais princípios só funcionam no exercício dos poderes discricionários – vide os Acórdãos do TUI nos proc. nºs 32/2016, 79/2015, 46/2015, 14/2014, e os Acórdãos do TSI, nos proc. nºs 966/2018, 969/2018.

Pelo que foi doutamente defendido no parecer do Ministério Público que se dá por reproduzido como parte do fundamento do recurso e por aquilo que dissemos supra, é de julgar improcedente a invocação da manifesta desrazoabilidade no exercício de poderes discricionários e da violação dos princípios da justiça, da proporcionalidade e do princípio do respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos residentes.


Em conclusão:

1. Enquanto nomen juris de um vício invalidante de actos administrativos, resultante do comando legal do artº 114º/1 do CPA, à luz do qual devem ser fundamentados os actos administrativos, diz-se falta de fundamentação quando o acto administrativo não encerra os fundamentos de facto e de direito que permitam conhecer o itinerário cognoscitivo e valorativo prosseguido pela Administração que culminou com a prática do acto. Ou seja, a falta diz respeito a razões que levam a Administração a praticar determinado acto administrativo.

2. A omissão da justificação da não audição do particular visado, quanto muito integra na questão da preterição da audiência prévia, e nunca convertível num vício autónomo, invalidante do acto administrativo.

3. A emanação de uma ordem de despejo decorre da norma imperativa do artº 179º/1-1) da Lei de Terras.

4. Na actividade vinculativa, é impertinente a invocação do vício da manifesta e total desrazoabilidade no exercício de poderes discricionários, assim como dos princípios da justiça, da proporcionalidade e do princípio do respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos residentes, que a Administração deve respeitar no exercício dos poderes discricionários.


Resta decidir.

III

Nos termos e fundamentos acima expostos, acordam em conferência julgar improcedente o recurso.

Custas pela recorrente, com taxa de justiça fixada em 8UC.

Registe e notifique.

RAEM, 26MAR2020
_________________________ _________________________
Lai Kin Hong Mai Man Ieng
_________________________
Ho Wai Neng
_________________________
Fong Man Chong (Com declaração de voto vencido em chinês)
行政司法上訴卷宗編號 : 793/2018
上 訴 人 : 源景灣建築置業股份有限公司 (Sociedade de Investimento Imobiliário Un Keng Van, S.A.)
被 上 訴 實 體 :運輸工務司司長




落敗票聲明 (Declaração de Voto Vencido)


第一部份: 前言

在尊重合議庭多數意見之前提下,本人對本案的理據及判決部分皆持不同的觀點,故作成本落敗票聲明。
*
一、 本案為行政長官對有關土地臨時批給失效後,承批人不服向中級法院提起司法上訴(卷宗編號Proce nº 580/2018),在卷宗未有確定判決之前,運輸工務司司長根據《土地法》第208條及第209條之規定作出騰空土地的命令。
二、 在上述案件內,上訴人提出阻止宣告失效之理由,但法院未就該事宜作出認定,在本案件內,上訴人稱:
「a) Vem o presente recurso interposto do Despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas, de 13 de Julho de 2018, exarado na Proposta n.º 223/DSO/2018, comunicado à Recorrente pelo Ofício n.º 466/2322.02/DSO/2018, de 19 de Julho de 2018, que ordenou o despejo do terreno com a área de 9 650 m2, designado por lote 17 da zona C do empreendimento denominado "Fecho da Baía da Praia Grande", situado na península de Macau, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º XX, a fls. XX do livro XX (o "Terreno");
b) Por Despacho do Chefe do Executivo, de 3 de Maio de 2018, tornado público pelo Despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º 13/2018, publicado no Boletim Oficial n.º 20, II Série, de 16 de Maio de 2018, foi declarada a caducidade da concessão do Terreno;
c) Em 15 de Junho de 2018, a Recorrente impugnou contenciosamente o acto do Chefe do Executivo que declarou essa caducidade, processo que corre termos nesse tribunal com o n.º 580/2018;」
基此,在尊重不同意見的前提下,本人認為較佳的處理做法是應先中止本案之程序,待上述案件有終局裁判為止。
但由於這並非法庭的大多數的立場,而且對本案之實體問題作出認定,故亦需對此作出分析及表明立場。
*
第二部份: 請求

一、有關批給涉及一幅面積9,650平方米、位於澳門半島「南灣湖計劃」C區17地段的土地,透過公佈在二零零一年九月十二日第三十七期«澳門特別行政區公報»第二組的第90/2001號運輸工務司司長批示將土地批予源景灣建築置業股份有限公司;
    二、 根據第90/2001號運輸工務司司長批示的規定,批給期至2016年7月30日屆滿;
三、上訴人請求法院撤銷行政長官於2018年5月3日作出之宣告其獲批之上述土地失效之批示(刋登在2018年5月16日之«政府公報»內-見第13/2018號運輸工務司司長批示),有關案件編號為580/2018。
*
四、 在本案裏,上訴標的為運輸工務司司長於2018年7月13日作出命令騰空土地的批示,上訴人提出之理據為:
1) – 損害聽證權;
2) – 侵犯居民的基本權益及不合理運用自由裁量權;
3) – 違反行政法之基本原則:善意原則、合適原則及適度原則。
*

第三部份: 事實

先列出對解決爭議問題屬關鍵、且獲證實之事實:

1. 根據公佈於1989年12月29日第52期《澳門政府公報》第四副刊的第203/GM/89號批示,透過載於財政局1991年7月30日第285冊第4頁及續後數頁的公證書,並經公佈於1992年7月6日第27期《澳門政府公報》的第73/SATOP/92號批示、1993年4月26日第17期《澳門政府公報》的第57/SATOP/93號批示及1994年6月1日第22期《澳門政府公報》第二組的第56/SATOP/94號批示作為憑證的修改合同作出修改,以租賃制度將位於南灣及外港新填海區稱為「南灣湖計劃」之A、B、C及D區的多幅地段批給予南灣發展股份有限公司。
2. 由上述公證書作為憑證的批給合同第二條款的規定,租賃的有效期為25年,由簽訂該公證書之日起計。
3. 根據第56/SATOP/94號批示作為憑證的修改批給合同第二條的規定,批給C區11幅地段及D區2幅地段,租賃期間於2016年7月30日屆滿。
4. 按照同一合同第四條款的規定,C及D區各地段的利用須根據公佈於1991年4月18日第15期《澳門政府公報》第二副刊的第69/91/M號訓令核准的《南灣海灣重整計劃之細則章程》及有關規章來進行。其中面積9,650平方米的C區17地段用作興建一幢屬分層所有權制度,作酒店及停車場用途的樓宇,其最大許可高度為海拔72.6米。
5. 根據經前述第56/SATOP/94號批示作為憑證的合同第三條修改之上述第73/SATOP/92號批示作為憑證的修改合同第六條款的規定,C及D區各地段的利用期間為96個月,由1992年7月6日起計,即至2000年7月5日屆滿。
6. 另一方面,考慮到項目的複雜性及南灣發展股份有限公司在合同執行上所遇到的困難,為保障合同雙方的利益,雙方同意新的修改批給,並由公佈於1999年8月18日第33期《澳門政府公報》第二組的第71/SATOP/99號批示作為憑證。
7. 該修改涵蓋透過放棄B區兩幅地段的權利、縮減合同標的、重新評估基礎建設的興建費用及更改溢價金金額及有關付款條件。
8. 此外,根據該修改批給合同第四條的規定,各區每一地段的利用期間獲延長,其中C及D區的利用期間延長72個月,由1999年8月18日起計,即至2005年8月17日屆滿。
9. 及後,透過公佈於2001年9月12日第37期《澳門特別行政區公報》第二組的第90/2001號運輸工務司司長批示,將上述計劃稱為C區17地段的土地批給所衍生的權利有償移轉予源景灣建築置業股份有限公司(下稱承批人)作為憑證。
10. 題述土地標示於物業登記局XX冊第XX頁第XX號,其批給所衍生的權利以承批人的名義登錄於第XX號,並沒有設定任何抵押負擔。
11. 南灣發展股份有限公司已按批給合同規定,透過以實物及現金方式繳付全部溢價金。
12. 透過公佈於2006年8月21日第34期《澳門特別行政區公報》第一組的第248/2006號行政長官批示,廢止由第69/91/M號訓令核准的《南灣海灣重整計劃之細則章程》。
13. 「澳門歷史城區」於2005年7月15日列入世界遺產名錄。根據土地工務運輸局城市規劃廳透過2015年4月28日第446/DPU/2015號內部通訊發表關於C及D區地段情況的意見,由於這些城區位處該歷史城區的南端,具有其地理位置的重要性,相關規劃一直受到社會各界及世遺專家學者的關注及討論。為配合世界遺產委員會的監測,澳門特別行政區政府一度中止了南灣湖C及D區所有發展項目的審批程序,直至2014年11月該廳才完成該等城區的規劃研究,但仍須等待上級批核有關規劃,始有條件發出規劃條件圖。
14. 然而,由於南灣湖C及D區的規劃一直未獲批准,因此,C17地段的土地批給合同修改程序並沒有落實。
15. 南灣發展股份有限公司透過2016年5月6日的申請書,請求中止土地之利用期間。
16. 自2010年至2016年,承批人多次向行政長官辦公室遞交申請書,請求盡快落實南灣湖C及D區的發展計劃、批准中止土地的利用期間,並將之延長多10年及同時將臨時批給期間續期10年;或是在宣告題述土地的批給失效後,以免除公開招標方式將之重新批予申請人,或者以另一幅具同等建築面積及建築能力的鄰近土地的批給權利作置換。
17. 根據由1991年7月30日公證書作為憑證的原批給合同第二條款的規定,租賃有效期為25年,由簽訂該公證書日起計,即已於2016年7月30日屆滿。由於土地仍未被利用,批給仍屬臨時性,按照《土地法》第四十八條第一款的規定,臨時批給不可續期。
18. 基於此,土地工務運輸局土地管理廳於2016年9月12日透過第376/DSODEP/2016號建議書分析有關情況,並建議批准跟進基於租賃期間已過而宣告批給失效的程序,將案卷送交土地委員會發表意見及按照《土地法》第一百六十七條跟進宣告臨時批給失效的後續程序,運輸工務司司長於2016年9月19日作出同意批示。
19. 綜上所述,土地委員會經分析案卷,由於有關合同第二條款所定的25年的租賃期已於2016年7月30日屆滿,因此有關的臨時批給經已失效(喪失權利的失效)。





第四部份: 法理分析

一、 按照同類案之裁判理由,主流的意見認為:
1) - 有關通知遷出被宣告失效土地的騰空土地命令是一個行政行為,可以提起行政司法上訴。
2) - 騰空土地程序是宣告失效程序之延續及組成部份。
3) - 除非有特別理由提出,或特別狀況,否則在執行程序內無需再聽證,亦無需再進行其他調查措施。
4) - 按照這個思路,承批人在宣告批給失效的主訴訟內提出的上訴理據,對命令騰空土地的程序必然產生關連作用。

*
二、 如此,在尊重不同意見之前提下,關於宣告土地批給(concessão)失效之問題,在2018年6月7日第377/2015號案件(落敗票聲明)、2018年6月28日第499/2016號案件(落敗票聲明)及2018年7月12日第617/2015號案件(投票表決聲明),已闡述本人在法律上之觀點及立場,上述案件之投票聲明中之第四部份: 法律分析,經必要配合後(mutatis mudantis),亦適用於本案,其內容在此視為完全轉錄,作為本案表決聲明之組成部份。
在涉及南灣湖土地的問題上,主要的結論部份為:

第五部份 : 結論
綜上所述,本個案存在多處法律相悖之處,其中包括:
一、 土地批給合同包含兩個核心元素: 狹意之批給–指行使當局之權力,單方設定一些基本內容,原則上不允許另一方變更,例如批准行政相對人使用公共資源 (在特定條件下),這永遠都是由行政當局掌握的權力,從不會發生私人對政府作出批給。因為批給是統治權的一種體現。
另一個就是合同之元素,它源自立約雙方之合意(共識)而達成之一種協議,關於這部分之內容,在不抵觸行政法基本原則的前提下,仍然受合同法的基本原則約束,信約必守原則,善意履行協議,對應給付等這一系列原則仍然是行政合同 (土地批給合同就是其中一種) 的規範性準則,雙方當事人仍須遵守。
葡萄牙行政法學院教授 Prof. Marcelo Rebelo de Sousa在其《行政法總論》(Direito Administrativo Geral, Tomo III)1一書中,關於履行行政合同時應遵守的基本原則及規範時就指出:

“ 行政合同之履行受制於行政活動之各項基本原則,法律特別強調善意原則,謀求公共利益原則,及合法性原則,權利及義務雙方皆須遵守。」
履行行政合同之特別原則包括「個人執行原則(princípio da execução pessoal),雙方合作原則 (princípio da colaboração reciproca),及共同關係人保護原則 (princípio da protecção do co-contratante ……”。

二、 在訂立行政合同後,如基於公共利益之需要,立法者仍然承認行政當局享有一個超然的權力,正因為如此,立法者在《行政程序法典》第167條中規定:
第一百六十七條
(行政當局之權力)
除因法律規定或因合同之性質而不得作出下列行為外,公共行政當局得:
a)單方變更給付之內容,只要符合合同標的及維持其財政平衡;
b)指揮履行給付之方式;
c) 基於公共利益且經適當說明理由,單方解除合同,但不影響支付合理之損害賠償;
d)監察履行合同之方式;
e)科處為不履行合同而定之處罰。
這一條條文清楚反映出作為行政合同之其中一方之立約人 - 行政當局,其地位超然,在某方面凌駕於私人立約人之上,但並非全無代價,例如如行政當局單方變更合同內容,同時影響另一方立約人之財政平衡 (即造成大幅度之財政超支,而且不合理),行政當局雖然為了公共利益可單方變更合同內容,但須作出賠償。這一點明顯體現出行政當局有足夠權力及手段去謀求及實踐公共利益。

三、 如果說在整個履行批給合同之過程中承批人有過錯,行政當局亦有過錯! 而所用的處理手法亦不符合決定原則 (見 «行政程序法典» 第11條),亦違反善意原則 (同法典第8條)及適度原則。主要原因為第69/91/M號訓令已透過2006年8月21日第248/2006號行政長官批示予以廢止,城規部門未能為該區域訂定新的規劃指引及發出街道準線圖,故土地利用一直未能進行。
四、 行政當局在無南灣湖城市規劃的前提下,如何要求承批人發展土地?再加上按«民法典»第323條之規定,一方承認另一方權利時,亦阻止宣告權利失效。
五、 由此可知,責任應由行政當局承擔。
一如我們所強調,在批給合同內,批給方與承批方皆有主給付及輔助給付之義務,特徵在於雙方以合同及法規為基礎互相合作及善意履行有關規定,有別於在一般情況下向行政當局提出的單獨請求。
六、 行政當局的建議書整個篇幅以承批人有過錯為前提,行政當局無過錯,故建議將批給宣告失效,我們認同這種思維方式(須考慮過錯的問題),但不認同建議書的結論內容,因為承批人並非是唯一的過錯方,而行政當局亦有責任,如前文分析般,因為行政當局的過錯及拖延,例如無城市規劃或更改該區域的規劃,導致承批人未能開展土地的利用,而承擔責任方應為行政當局。
七、 按上文分析及結論,«土地法»第47條的規定之批給期,我們認為是懲罰性除斥期,如因行政當局之過錯,無履行相關義務導致承批人無條件展開土地之利用,則可以延期,但決定權由行政當局掌握。本案就是一個典型的情況。
八、 按照«民法典»第323條之規定,當行政當局作出任何體現其承認承批人有權利用土地時,行政當局會被阻止宣告土地利用權之失效。
九、 續期及延期是兩個不同概念,法律不允許續期,並不表示不可延期,尤其是補償因行政當局因而拖長之時間。2
十、 至今特區政府都無關於南灣湖的規劃,如何發展該區?建築高度為多高?有什麼規劃?如何叫承批人設計建築計劃?
十一、 立法者在«土地法»第104條第5款內明確使用“過錯”這個概念,即要求行政當局必須考慮未能在指定期內利用土地的原因誰屬,如為行政當局,後者應承擔責任。”

三、 事實上,在命令騰空批給失效的土地的程序內依然存在許多問題:
a) - 土地佔用人提出多項理由,例如因存放大型物件在土地上(甚至是結構建築物),未能在指定期內遷出土地,行政機關應否進行調查及分析?
b) - 又或在土地上存放有大量屬於第三人的財物,在搬遷時需協調或採取特別措施,故亦無法於指定期內遷出土地,是否應聽證及調查?
c) - 又或有關遷出需另一政府部門的協助或支援等。
所以免聽證或不作調查,不是必然的處理方法,而是因應每宗具體個案而定。
d) - 又或上訴人提出在主案內無提出的理據,是否應作出審理?
這一切都是值得研究及分析的問題。
四、 按照上文所引述的既證事實,存在多項理由及事實阻止除斥期屆至,尤其是:
“(…)
12. 透過公佈於2006年8月21日第34期《澳門特別行政區公報》第一組的第248/2006號行政長官批示,廢止由第69/91/M號訓令核准的《南灣海灣重整計劃之細則章程》。
13. 「澳門歷史城區」於2005年7月15日列入世界遺產名錄。根據土地工務運輸局城市規劃廳透過2015年4月28日第446/DPU/2015號內部通訊發表關於C及D區地段情況的意見,由於這些城區位處該歷史城區的南端,具有其地理位置的重要性,相關規劃一直受到社會各界及世遺專家學者的關注及討論。為配合世界遺產委員會的監測,澳門特別行政區政府一度中止了南灣湖C及D區所有發展項目的審批程序,直至2014年11月該廳才完成該等城區的規劃研究,但仍須等待上級批核有關規劃,始有條件發出規劃條件圖。
14. 然而,由於南灣湖C及D區的規劃一直未獲批准,因此,C17地段的土地批給合同修改程序並沒有落實。
15. 南灣發展股份有限公司透過2016年5月6日的申請書,請求中止土地之利用期間。
16. 自2010年至2016年,承批人多次向行政長官辦公室遞交申請書,請求盡快落實南灣湖C及D區的發展計劃、批准中止土地的利用期間,並將之延長多10年及同時將臨時批給期間續期10年;或是在宣告題述土地的批給失效後,以免除公開招標方式將之重新批予申請人,或者以另一幅具同等建築面積及建築能力的鄰近土地的批給權利作置換。
17. 根據由1991年7月30日公證書作為憑證的原批給合同第二條款的規定,租賃有效期為25年,由簽訂該公證書日起計,即已於2016年7月30日屆滿。由於土地仍未被利用,批給仍屬臨時性,按照《土地法》第四十八條第一款的規定,臨時批給不可續期。


故此,批給失效的原因在於行政當局,即後者在過錯的情況下造成,宣告臨時批給失效的理據不成立,繼而引致要求承批人騰空土地的理由亦不成立。

五、 加上針對宣告臨時批給失效的訴訟仍在待決期間,如行政當局在這般時間作出騰空土地的命令,應進行聽證,因為之前的宣告失效批示的合法性受到質疑,除非有特殊的原因及迫切性或援引公共利益,但本案不屬此列。
*
據上論結,在尊重不同見解的前提下,在不妨礙對本案涉及之問題作更深入研究之情況下,按照卷宗所載之資料及證據,由於有關批示沾有多項有違行政法基本原則之瑕疵,應撤銷運輸工務司司長命令騰空有關土地之批示。

2020年3月26日。

第一助審法官
                      
                      
_________________
馮文莊


1 D. Quixote, 2ª edição, 第402頁及續後。
2一如足球比賽,在不改變90分鐘完場的前提下,如因各種原因導致浪費了時間(例如球員受傷、球迷入場搗亂),應作出時間上的補償。
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793/2018-28