Processo nº 1231/2019
Data do Acórdão: 12MAR2020
Assuntos:
Intervenção provocada principal passiva
SUMÁRIO
É de indeferir o requerimento da intervenção provocada principal passiva, se a pretensão do réu não é chamar à demanda um terceiro como co-devedor numa mesma relação jurídica controvertida para com o Autor, mas sim fazer intervir o terceiro e imputar a este terceiro a responsabilidade exclusiva da satisfação do crédito reclamado pelo Autor, com vista à absolvição total do pedido dele próprio (do réu) e à condenação do chamando no pedido como único responsável perante o Autor.
O relator
Lai Kin Hong
Processo nº 1231/2019
Acordam em conferência na Secção Cível e Administrativa no Tribunal de Segunda Instância da RAEM:
I
Em sede de contestação deduzida à acção intentada por A, os Réus B e C requereram a intervenção principal deD.
No saneador, o Exmº Juiz titular do processo indeferiu o requerido chamamento à demanda nos termos seguintes:
誘發主參加
被告在其答辯提出以主參加的方式召喚D參與本案,理由是就原告以補充方式主張的不當得利請求方面,一旦D參加了本案並被裁定敗訴,即可認定本案被告無須向原告返還任何金錢。
然而,除了應有尊重外,除非為著彌補訴訟內當事人的複數正當性,在原告根本沒有針對D提起訴訟的前提下,是不允許以主參加的方式召喚D參加本案的,因為原告從未針對D提出任何請求。
因此,現決定駁回被告提出誘發參加的聲請。
Não se conformando com o segmento do despacho saneador que lhe decidiu indeferir o requerimento de intervenção provocada principal, os Réus vieram interpor recurso concluindo e pedindo:
1. 一人是否於某一訴訟中存有正當性,並非取決於原告有否對其提出任何請求,而是正如《民事訴訟法典》第58條所規定般究竟於受爭議的實體法律關係中該人是否存有“角色”。
2. 本案中,原告於其起訴狀實際上一直都是表示其如何基於地產經紀D透過簽訂不動產預約買賣合同此一詭計而將涉案的金額存入了上訴人的銀行戶口,故原告從而針對上訴人提出了一個補充請求,就是宣告上訴人不當得利,因而要求其向原告作出返還涉案的金額。
3. 就此,上訴人於其答辯中根據《民法典》第475條第1款提出了“得益被無償轉讓”此一抗辯。
4. 毫無疑問,一旦證實了上訴人已將有關款項根據地產經紀D的指示存入了其指定的銀行戶口(有關戶口亦是只有D才能操控),那麼根據上指法律的規定,地產經紀D必須代替被告承擔返還涉案款項的責任。
5. 基於訴訟經濟原則,就原告提出的不當得利之實際法律關係中,似乎應傳召最後得益者參加本案,皆因正如學說所言,“o artigo 481.º, restringindo o dever de restituição aos casos em que o terceiro tenha adquirido gratuitamente, mostra que, em princípio, a pretensão de enriquecimento só vale contra os casos de enriquecimento imediato, não valendo, por conseguinte, para os casos de duas aquisições sucessivas”
6. 如此,根據《民事訴訟法典》第58及60條第1款之規定,地產經紀D具有本案的被告正當性。
7. 基於此,根據《民事訴訟法典》第262條a)項結合第267條第1款規定,上訴人應可以誘發參加的方式傳召地產經紀D作為本案的被告,以便本案日後的裁判能對其產生倘有的向原告返還涉案款項的效力。
*
基於上述所有事實及法律理由,懇求尊敬的各法官 閣下裁定本上訴理由成立,因而命令傳召D以被告身份參與本訴訟程序。
Contra-alegou o Autor, pugnando pela improcedência do recurso interposto pelos Réus.
II
Foram colhidos os vistos, cumpre conhecer.
Conforme resulta do disposto nos artºs 563º/2, 567º e 589º/3 do CPC, são as conclusões do recurso que delimitam o seu objecto, salvas as questões cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras e as que sejam de conhecimento oficioso.
Em face das conclusões na petição do recurso, a única questão que constitui objecto do presente recurso consiste em saber se é legal o chamamento, a título principal, de D à demanda.
Ora, tendo em conta os elementos existentes nos autos, nomeadamente a matéria levada à especificação e à base instrutória no saneador, as relações jurídicas controvertidas que as partes configuraram nos articulados são em síntese o seguinte:
* O Autor assinou o contrato promessa de compra e venda, cuja cópia se juntou aos autos a fls. 30 e 31 (onde foram mencionados como promitente comprador o Autor e promitentes vendedores os Réus B e C), numa agência imobiliária, com a intervenção da agente imobiliária D;
* Na convicção de que celebrou com os Réus este contrato-promessa de compra e venda, nos termos do qual o Autor promete comprar e os Réus promete vender um imóvel, tendo ambos acordado no pagamento de um sinal no valor de HKD$1.000.000,00, e na sequência da aposição da sua assinatura no contrato, o Autor entregou à agente imobiliária D uma ordem de caixa, emitida a favor de Ré C, para o pagamento do sinal;
* A ordem de caixa veio a ser depositada na conta bancária dessa mesma Ré C;
* A agente imobiliária D contactou a Ré C;
* Com o pretexto da impossibilidade da movimentação da sua conta bancária, a chamanda D pediu à Ré C que lhe transferisse o valor do sinal, entretanto depositado na sua conta bancária, para uma outra conta bancária de que é titular a X Sociedade Unipessoal, Limitada, de que é única sócia e administradora a chamanda D;
* A pedido da agente imobiliáriaD, a Ré fez a transferência do valor, da sua conta para a conta de que é titular a X Sociedade Unipessoal, Limitada;
* Contactada pela namorada do Autor, a Ré C disse-lhe que nunca tinha celebrado o tal contrato-promessa com o Autor;
* O Autor pretende que lhe seja devolvido o valor entregue à Ré C e pede ao Tribunal a condenação dos Réus no pagamento do valor com fundamento jurídico no enriquecimento sem causa;
* A defesa dos Réus consiste essencialmente em que o valor acabou por ter sido transferido para a sociedade de que é única sócia D, portanto esta é que o verdadeiro devedor; e
* Em sede de contestação, os Réus requereram a intervenção principal passiva da agente imobiliária D .
Trata-se de um incidente tradicionalmente denominado na doutrina, de forma muito ilustrativa, por chamamento à demanda a título principal, que visa essencialmente suprir a ilegitimidade passiva.
É o que sucede nomeadamente as situações em que, havendo vários devedores ou responsáveis, apenas um ou alguns deles são demandados, então estes chamam os não demandados pelo Autor para intervir na acção.
É óbvia a razão de ser da lei que permite a intervenção desses terceiros, não demandados pelo autor, pois numa situação deste, a demanda contra só um ou alguns dos devedores pode não regular definitivamente o litígio.
Para Alberto dos Reis, especificam-se os casos em que pode ter lugar o chamamento à demanda. Todos eles se condensam nesta fórmula: a obrigação impende sobre várias pessoas; o credor demanda unicamente uma delas; o demandado quer que os outros responsáveis sejam colocados na posição de réus para, dado o caso de a acção proceder, serem condenados conjuntamente com ele, chama-os, para esse efeito, à demanda. ……o chamamento à demanda aspira a investir na posição de réu um co-obrigado, uma pessoa que, juntamente com o demandado, é sujeito passivo da relação substancial em litígio – in CPC Anotado, Vol I, p. 449.
Voltemos ao caso sub judice.
De acordo com as relações jurídicas controvertidas, pelo Autor configuradas na petição inicial e interpretadas na resposta ao recurso, o valor do sinal titulado na ordem de caixa emitida a favor da Ré C chegou acertadamente ao seu destinatário e beneficiário final que é justamente essa Ré C, reputada como promitente vendedor do imóvel, sendo irrelevantes as alegadas vicissitudes posteriores ocorridas sobre o tal valor, nomeadamente a transferência do valor pela Ré C para a conta de uma sociedade comercial de que é única sócia a chamanda D, a pedido desta última.
Não negando o depósito do valor do sinal na sua conta bancária, a Ré, um dos chamantes, veio contestar alegando que, tendo o valor sido posteriormente transferido, a pedido da chamanda D, da sua conta bancária para a conta da sociedade comercial de que é única sócia a chamanda D, esta é que deve ser o verdadeiro responsável pelo reembolso perante o Autor.
Ora, em vez de chamar alguém à demanda ao seu lado, como co-devedor ou ser co-sujeito do polo passivo de uma mesma relação jurídica controvertida para com o Autor, o que os Réus realmente pretendem é fazer intervir a chamanda D e imputar-lhe a responsabilidade exclusiva de restituir o valor do sinal ao Autor, em substituição deles (os Réus) na mesma relação jurídica controvertida para com o Autor, com vista à absolvição total do pedido deles próprios (dos Réus) e à condenação no pedido da chamanda como única devedora responsável pelo reembolso do valor do sinal ao Autor.
Obviamente não é a situação a que o incidente de intervenção principal provada passiva visa, pois in casu não são os Réus chamantes e a chamanda configurados co-devedores nem estão numa mesma posição nas relações jurídicas controvertidas para com o Autor.
Inverificando-se assim os pressupostos da intervenção principal provocada passiva, é de rejeitar logo o chamamento.
Bem andou o Tribunal a quo ao decidir como decidiu.
Em conclusão:
É de indeferir o requerimento da intervenção provocada principal passiva, se a pretensão do réu não é chamar à demanda um terceiro como co-devedor numa mesma relação jurídica controvertida para com o Autor, mas sim fazer intervir o terceiro e imputar a este terceiro a responsabilidade exclusiva da satisfação do crédito reclamado pelo Autor, com vista à absolvição total do pedido dele próprio (do réu) e à condenação do chamando no pedido como único responsável perante o Autor.
Tudo visto, resta decidir.
III
Nos termos e fundamentos acima expostos, acordam julgar improcedente o recurso.
Custas pelos recorrentes.
Notifique.
RAEM, 12MAR2020
Lai Kin Hong
Fong Man Chong
Ho Wai Neng