Processo n.º 1133/2019
(Autos de recurso em matéria cível)
Relator: Fong Man Chong
Data: 19/Março/2020
ASSUNTOS:
- Excepção ao princípio da indivisibilidade da hipoteca e forma especial de expurgação da hipoteca
SUMÁRIO:
I - O nº 2 do artigo 692º do CCM consagra uma excepção ao tradicional princípio da indivisibilidade da hipoteca, uma vez que permite que, no caso de a hipoteca incidir sobre imóvel sujeito ao regime da propriedade horizontal, seja susceptível de ela ser dividida em tantas hipotecas quantas as fracções autónomas em que o prédio se venha a dividir, para os estritos efeitos da alínea a) do artigo 716.º, garantindo cada uma das hipotecas um valor proporcional àquele que, nos termos do título constitutivo da propriedade horizontal, a fracção autónoma represente no valor global do prédio.
II – Quando o objectivo final é a expurgação da hipoteca indicada nas condições da alínea I), deve recorrer-se à acção especial de expurgação da hipoteca prevista no artigo 911º do CPC, a liquidação do valor necessário para cancelamento da respectiva hipoteca a fazer-se na acção declarativa comum não dispensa a propositura da referida acção especial.
O Relator,
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Fong Man Chong
Processo nº 1133/2019
(Autos de recurso em matéria cível)
Data : 19 de Março de 2020
Recorrente : Sociedade de Investimento Imobiliário A, S.A. (A置業發展股份有限公司) (Executada)
Objecto do Recurso : Despacho que fixa o montante do débito garantido pela hipoteca (訂定以抵押所擔保的債務金額之批示)
Exequente : B
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Acordam os Juízes do Tribunal de Segunda Instância da RAEM:
I – RELATÓRIO
Sociedade de Investimento Imobiliário A, S.A. (A置業發展股份有限公司), Recorrente, devidamente identificada nos autos, discordando do despacho proferido pelo Tribunal de primeira instância, datado de 12/06/2019 (fls. 341 a 343) que procedeu à fixação do montante a pagar pela ora Recorrente/Executada à Exequente/Recorrida (promitente-compradora) para expurgar das 2 hipotecas incidentes sobre 2 fracções autónomas, dele veio, em 03/09/2019, interpor recurso para este TSI, com os fundamentos constantes de fls. 3 a 11, tendo formulado as seguintes conclusões:
A. As provas carreadas para os autos pela Exequente e pela Recorrida, na fase de liquidação como preliminar da execução, não se afiguram suficientes para determinar o valor concreto da quantia exequenda.
B. Com efeito, a Exequente pretende que a Executada lhe pague um montante que seja suficiente para expurgar a hipoteca que se encontra registada sobre as Fracções dos autos.
C. No entanto, não há qualquer certeza sobre qual seja esse montante, sendo a obrigação exequenda, ainda, ilíquida.
D. Não obstante, o douto Tribunal a quo decidiu, sem mais, fixar a quantia exequenda em MOP1.560.143,75, a título de capital, acrescida de MOP10.566,94, a título de juros, sem que haja qualquer garantia de que tais montantes sejam adequados para cumprir a obrigação pecuniária a que a Recorrente foi condenada.
E. Sendo ainda ilíquida a obrigação exequenda, deveria o douto Tribunal a quo ter promovido diligências para a sua liquidação (como seja a notificação do credor hipotecário para informar qual o montante necessário para cancelar a hipoteca em causa).
F. Não o tendo feito, afigura-se à Recorrente, salvo o respeito devido por opinião diversa, que o douto Tribunal a quo acabou por violar o n.º 2 do artigo 691.º do CPC, devendo ser revogada e substituída por outra que ordene as diligências omitidas.
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B, Exequente, com os sinais identificativos nos autos, ofereceu a resposta constante de fls. 357 a 360, tendo formulado as seguintes conclusões:
a) Do douto despacho recorrido não resulta uma sucumbência da Recorrente, nem se vislumbra que a decisão cause, de algum modo, prejuízo à Recorrente.
b) Aliás, a Recorrente considera que devia pagar à Recorrida uma quantia exequenda de valor muito superior àquele que foi fixado pelo Tribunal no despacho de fls. 328 e ss.
c) A Recorrente refere-se à vontade hipotética do banco credor hipotecário, argumentando como se tivesse a recorrer em nome e representação deste, sem legitimidade para tal.
d) Desconhece-se qual o direito ou o interesse legítimo que a Recorrente pretende assegurar com a impugnação do douto despacho recorrido.
e) A decisão recorrida é bem mais favorável à Recorrente do que seria uma decisão tomada de harmonia com a temerária tese plasmada no recurso.
f) Deste sorte, o presente recurso é inadmissível nos termos do art.º 583.°, n.º 1, a contrario, do CPC.
g) Quanto ao princípio da indivisibilidade da hipoteca e das suas excepções, previstas nos números 2 e 3 do art.° 692.° do CC, a Recorrente limita-se a alegar contra lei expressa, nomeadamente contra o n. ° 3 daquele normativo.
h) O texto da lei é tão claro e inequívoco que qualquer esforço de distorção da vontade real do legislador para interpretar a norma jurídica em causa é ostensivamente atentatório dos princípios fixados no art.º 8.° do CC.
i) A "tese subjectivista" da Recorrente não tem na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, e a Recorrente não indica os textos legais a considerar para reconstituição do pensamento legislativo e de que forma o despacho recorrido colocou em causa a unidade do sistema jurídico.
j) O despacho recorrido não coloca em causa a certeza e segurança jurídica dos "credores hipotecários", pois a estes basta-lhes ler o texto legal para conhecer o regime aplicável.
k) Para justificar a iliquidez da obrigação exequenda a Recorrente volta a alegar que as duas fracções identificadas nos autos garantem créditos de um valor superior àquele que o Tribunal considerou no despacho recorrido.
I) Argumenta a Recorrente com a incerteza sobre a aceitação do valor fixado pelo Tribunal por parte do credor hipotecário e a possibilidade deste se recusar a emitir a declaração de cancelamento da hipoteca sobre as duas fracções!
m) Admitindo-se, por mera hipótese de raciocínio, que o credor hipotecário se recusasse a cumprir a Lei aplicável e as decisões do Tribunais, a única parte processual prejudicada com essa recusa e, indirectamente, com a decisão impugnada, era tão somente a Exequente e ora Recorrida - e não a Recorrente.
n) Também por aqui não resulta do despacho recorrido qualquer vencimento ou sucumbência para a Recorrente que legitime o presente recurso.
o) Consequentemente, o douto despacho recorrido, ao contrário do que alega a Recorrente, não violou o disposto no art.º 691.°, n.º 2, do CC, não servindo a alegada iliquidez da obrigação exequenda senão para, por via do recurso, retardar a acção da justiça.
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Corridos os vistos legais, cumpre analisar e decidir.
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II – PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
Este Tribunal é o competente em razão da nacionalidade, matéria e hierarquia.
O processo é o próprio e não há nulidades.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária e são dotadas de legitimidade “ad causam”.
Não há excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
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III – OBJECTO DO RECURSO:
É o seguinte despacho que constitui o objecto deste recurso, proferido pelo Tribunal de primeira instância:
Fls.323:
Veio o credor hipotecário - Baco C- manifestar a sua discordância com o valor de liquidação oferecido pelo exequente, entendendo em suma que a hipoteca é indivisível e que para a expurgação da hipoteca deve proceder ao pagamento da totalidade das dívidas e juros.
Antes de tudo, é de realçar que o Banco C não é parte dos presentes autos de execução, ele foi notificado apenas para lhe dar conhecer da existência dos presentes autos por o exequente ter insistido.
Os presentes autos de execução limita-se apenas a fixar o montante para que o exequente proceda a expurgação da hipoteca junto ao Banco C, a qual eventualmente terá lugar noutra sede e não nos presentes autos de execução conquanto nestes autos apenas se limita a executar o valor que o exequente pretende liquidar - isto é, o valor que a executada deve pagar ao exequente para expurgação da hipoteca referente às duas fracções autónomas subjudice.
Assim, o Banco não sendo parte neste processo de execução, não pode intervir na discussão da matéria, limitando-se tão-só no fornecimento de dados atinentes ao montante que a sua devedora (ora a executada) ainda está em dívida.
Isto é, sendo credor hipotecário, o Banco apenas se limita informar ao Tribunal o quantum da dívida que a devedora (ora executada) falta por pagar.
Nestes termos, toda a matéria alegada pelo Banco que não se refere ao quantum da dívida não é atendida pelo Tribunal.
Notifique.
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Do valor da liquidação da execução:
Nos presentes autos de execução de sentença sob a forma ordinária veio a Exequente requerer a liquidação do montante do valor em dívida e garantido pela hipoteca que incide sobre as fracções autónomas "G16" e "F17" do prédio descrito na CRP sob o n.º XX, a fls. XX do Livro XX, na parte correspondente a essas fracções, para efeitos da expurgação da hipoteca em causa.
Aperfeiçoado o seu requerimento, veio o exequente a fls. 202 fixar o valor da obrigação exequenda em MOP$1,571,472.38 (que corresponde ao capital no montante de HKD$1,512,500.00 equivalente a MOP$1,571,472.38 e juros vencidos até 26/09/2018 de HKD$10,244.25, a que acrescerão os juros vincendos desde a citação até integral pagamento, calculados à taxa legal (9,75%).
Contestada a liquidação, veio a executada a fls 243 a 251 opor-se ao valor oferecido pelo exequente e, em contrapartida ofereceu um outro valor calculado com base na conjugação entre o valor médio por m2 do imóvel (valor médio esse no seu entender é deduzido pelo valor do imóvel indicadas na petição inicial da acção principal artigo 52.º)-[como se referiu a executada no artigo 7. ° e ss da sua peça processual de fls. 245 e ss] e a área que as duas fracções autónomas em crise se ocupam.
Parece-nos que o executado pretende calcular o valor da obrigação garantida com base no valor do imóvel, o que não tem lógica, que adiante se demonstra.
Além disso, também opõe-se a fixação do valor da liquidação porque se entende que uma vez que o credor hipotecário - o Banco C - não é parte nos presentes autos, a decisão dos presentes autos não lhe é oponível e por isso não pode fixar o valor da dívida exequenda.
Cumpe-nos decidir.
Quanto à posição do credor hipotecário - o Banco C -, já tínhamos oportunidade de dizer que ele não é parte nos presentes autos de execução.
É que os presentes autos de execução limitam-se tão só executar o que tiver sido julgado na acção principal: "condenando-se a Ré a pagar à Autora o montante do débito garantido pela hipoteca acrescido dos juros respectivos vencidos e vincendos no valor que se vier a apurar em execução de sentença para expurgação da hipoteca incidente sobre o prédio na parte correspondente às fracções autónomas destes autos" (vide fls. 424 e 425v da acção principal).
Ou seja, cabe aos presentes autos de execução de quantia certa fixar o valor da dívida exequenda que a executada deve pagar ao exequente para expurgação da hipoteca incidente sobre as fracções autónomas "G16" e "F17" do prédio descrito na CRP sob o n.º XX, a fls. XX do Livro XX, melhor id nos autos.
Quanto à efectivação e processamento da expurgação, há-de ser resolvido com o Banco noutra sede (no processo especial de expurgação de hipoteca) nos termos do artigo 911.º e ss do CPC, mas nunca nesta sede de execução de quantia certa.
Quanto ao valor da dívida exequenda, pese embora segundo o método de cálculo oferecido pela executada (conjugação entre o valor médio por m2 do imóvel e a área que as duas fracções autónomas em crise se ocupam) o valor ser superior ao oferecido pelo exequente (vide artigo 17.º a 20.º de fls. 247 a 248 dos presentes autos, que aqui se dá por integralmente reproduzido); a verdade é que o cálculo peca por defeito.
É que, nos termos do artigo 682.º do Código Civil a hipoteca é uma garantia real que serve para garantir uma obrigação e não para medir o valor do imóvel. Se bem que o valor do imóvel (hipotecado) é um dos factores preponderantes em que o credor e o devedor hão-de considerar para a constituição da hipoteca, mas essa opção logicamente caberá ao credor ponderar aquando da aceitação ou não da concessão do empréstimo do dinheiro ao devedor.
Por isso, aqui na sede de apuramento do valor que a Ré (ora executada) deve pagar à Autora (ora exequente) para expurgação da hipoteca incidente sobre o prédio na parte correspondente às fracções autónomas dos presentes autos, o que se deve apurar é o valor da obrigação sobre a qual as duas fracções hipotecadas se inserem.
Quanto ao valor da obrigação sobre a qual as duas fracções hipotecadas se inserem vejamos,
A fls. 139 foi informado pelo banco credor hipotecário C que até a 26/09/2018 (exclusive) o montante total garantido pela hipoteca que incide todo o prédio n.º XX é de HKD$250,000,000.00 a título de capital e de HKD$1,679,385.79 a título de juros.
Por seu turno, conforme a escritura constante a fls. 121 e o registo a fls. 92, a hipoteca (total) incide sobre os direitos resultantes da concessão por arrendamento do prédio rústico denominado FECHO BPG - Zona A- Lote 6, ou seja, incide sobre o actual prédio n.º XX (vide também o registo de fls. 92 dos autos).
As fracções autónomas "G16" e "F17", melhor id nos autos, ocupam respectivamente 0.294% e 0.311 % da totalidade do prédio n.º XX (cfr informação de registo a fls. 97). Isto é, as duas referidas fracções autónomas ocupam 0.605% (0.294% + 0.311 %) da totalidade do prédio.
Dispõe o artigo 962.° n.° 2 que " ... a hipoteca sobre imóvel, que venha a ficar sujeito ao regime da propriedade horizontal, é susceptível de ser dividida em tantas hipotecas quantas as fracções autónomas em que o prédio se venha a dividir, para os estritos efeitos da alínea a) do artigo 716.º"
Mais dispõe o n.° 3 do mesmo artigo que "cada uma das hipotecas referidas no número anterior garantirá um valor proporcional àquele que, nos termos do título constitutivo da propriedade horizontal, a fracção autónoma represente no valor global do prédio.”
Isto é, para efeitos da expurgação da hipoteca e pagamento integral ao credor hipotecário das dívidas a que os bens (neste caso as duas fracções "G16" e "F17") estão hipotecados, o valor é calculado com base no valor proporcional em que as fracções autónomas envolventes estão garantidas.
É essa regra de cálculo segundo o método de valor proporcional que a lei fixa para calcular o valor para a expurgação da hipoteca.
Assim, se a hipoteca (total) que incide sobre o prédio n.º XX serve para garantir, até a 26/09/2018 (exclusive), o pagamento de HKD$250,000,000.00 a título de capital e de HKD$1,679,385.79 a título de juros, então a porção de 0.605% (que as duas fracções autónomas em causa ocuparam) servirá para garantir, até à mesma data, HK$1,512,500.00 (HKD$250,000,000.00 X 0.605%) a título de capital e HKD$10244.25 (HKD$1,679,385.79 X 0.605%) a título de juros.
Nestes termos, fixa-se o montante do débito garantido pela hipoteca que incide sobre as duas fracções autónomas "G16" e "F17" do prédio descrito na CRP sob o n.º XX, a fls. XX do Livro XX, melhor id nos autos., calculado até a 26/09/2018, no valor de MOP$1,560,143.75 (correspondente a HK$1,512,500.00) a título de capital e de MOP$10,566.94 (correspondente a HKD$10244.25) a título de juros.
Após trânsito, segue-se os termos da execução com o valor fixado.
Notifique.
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IV – FUNDAMENTAÇÃO
Ora, toda a “história” começa com a sentença condenatória cível proferida pelo Tribunal de 1ª Instância no âmbito do processo nº CV1-14-0091CAO, que veio a ser confirmado na íntegra por acórdão do TSI, proferido no âmbito do processo nº 1147/2017, datado de 22/03/2018, que transitou em julgado.
A decisão condenatória da 1ª instância tem o seguinte teor:
Nestes termos e pelos fundamentos expostos:
- Julga-se improcedente a excepção peremptória invocada de que os contratos de promessa de compra e venda foram resolvidos;
- Julga-se a acção procedente por que provada e em consequência em substituição da Ré Sociedade de Investimento Imobiliário B SARL declara-se transmitido para a Autora A, o direito resultante da concessão por arrendamento incluindo a propriedade de construção sobre as fracções autónomas “G16” e “F17” do prédio descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº XX a fls. XX do Livro XX e inscrito na matriz sob o nº XX, condenando-se a Ré a pagar à Autora o montante do débito garantido pela hipoteca acrescido dos juros respectivos vencidos e vincendos no valor que se vier a apurar em execução de sentença para expurgação da hipoteca incidente sobre o prédio na parte correspondente às fracções autónomas objectos destes autos. (destaque nosso)
- Julgar improcedente todos os pedidos reconvencionais da Ré absolvendo a Autora dos mesmos.
Custas a cargo da Ré.
Registe e notifique…”.
Na sequência disto, veio a Autora em 10/05/2018 a propor uma acção de Execução da sentença sob forma ordinária por apenso ao processo principal, em que foi formulado o seguinte pedido:
Que “se digne mandar prosseguir a execução logo que liquidada a obrigação nos termos supra mencionados, citando-se a Executada para, no prazo de 20 dias, pagar a quantia exequenda ou nomear bens à penhora ou para, nesse prazo, contestar a liquidação, com a explícita advertência da cominação relativa à falta de contestação.”
Ora, não resta um mínimo da dúvida que o que a Exequente quer é receber quantias necessárias à expurgação das hipotecas incidentes sobre as 2 fracções autónomas identificadas nos autos.
Na sequência disto, foi proferida pelo Tribunal recorrido a decisão acima transcrita, ou seja, foi dado escrupulosamente cumprimento ao artigo 692º do CCM, que dispõe:
1. Salvo convenção em contrário, a hipoteca é indivisível, subsistindo por inteiro sobre cada uma das coisas oneradas e sobre cada uma das partes que as constituam, ainda que a coisa ou o crédito seja dividido ou este se encontre parcialmente satisfeito.
2. Porém, a hipoteca sobre imóvel, que venha a ficar sujeito ao regime da propriedade horizontal, é susceptível de ser dividida em tantas hipotecas quantas as fracções autónomas em que o prédio se venha a dividir, para os estritos efeitos da alínea a) do artigo 716.º
3. Cada uma das hipotecas referidas no número anterior garantirá um valor proporcional àquele que, nos termos do título constitutivo da propriedade horizontal, a fracção autónoma represente no valor global do prédio.
O nº 2 (e 3) é uma novidade em relação à redacção do artigo 696º do CC de 1966, porque consagra uma excepção ao tradicional princípio da indivisibilidade da hipoteca, razão pela qual se diz, com razão, a epígrafe do artigo é enganosa!
Nestes termos, é da nossa conclusão:
1) – Em termos de solução material, não merece censura a decisão recorrida, e nos termos do disposto no artigo 631º/5 do CPC, é de a manter.
2) – Em termos de meio processual utilizado, temos alguma ressalva, já que a decisão nestes autos proferida não vincula o credor hipotecário, uma vez que este nunca intervém no processo. Tal como o próprio colega de instância reconheceu que o litígio só poderá ser definitivamente resolvido com recurso ao mecanismo do processo especial prevista no artigo 911º do CPC (Expurgação através do pagamento integral aos credores hipotecários — Requerimento) :
“(…)
Quanto à efectivação e processamento da expurgação, há-de ser resolvido com o Banco noutra sede (no processo especial de expurgação de hipoteca) nos termos do artigo 911.º e ss do CPC, mas nunca nesta sede de execução de quantia certa.”
Assim sendo, confirma-se a decisão.
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Síntese conclusiva:
I - O nº 2 do artigo 692º do CCM consagra uma excepção ao tradicional princípio da indivisibilidade da hipoteca, uma vez que permite que, no caso de a hipoteca incidir sobre imóvel sujeito ao regime da propriedade horizontal, seja susceptível de ela ser dividida em tantas hipotecas quantas as fracções autónomas em que o prédio se venha a dividir, para os estritos efeitos da alínea a) do artigo 716.º, garantindo cada uma das hipotecas um valor proporcional àquele que, nos termos do título constitutivo da propriedade horizontal, a fracção autónoma represente no valor global do prédio.
II – Quando o objectivo final é a expurgação da hipoteca indicada nas condições da alínea I), deve recorrer-se à acção especial de expurgação da hipoteca prevista no artigo 911º do CPC, a liquidação do valor necessário para cancelamento da respectiva hipoteca a fazer-se na acção declarativa comum não dispensa a propositura da referida acção especial.
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Tudo visto e analisado, resta decidir.
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V ‒ DECISÃO
Em face de todo o que fica exposto e justificado, os juízes do Tribunal de 2ª Instância acordam em negar provimento ao recurso, mantendo-se a decisão recorrida,.
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Custas pela Recorrente.
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Registe e Notifique.
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RAEM, 19 de Março de 2020.
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Fong Man Chong
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Ho Wai Neng
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José Cândido de Pinho
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